Sei sulla pagina 1di 44

Clélio Monteiro de Menezes

HEBEL E VAIDADE: APROXIMAÇÕES E


DISTANCIAMENTOS

Faculdade Evangélica de Teologia de Belo Horizonte


Belo Horizonte
2007
2

Clélio Monteiro de Menezes

HEBEL E VAIDADE: APROXIMAÇÕES E


DISTANCIAMENTOS

Trabalho de conclusão de curso apresentado à


Coordenação de Pós-graduação Lato Sensu da
Faculdade Evangélica de Teologia de Belo
Horizonte, como requisito parcial para obtenção
do grau de Especialista em Estudo da Bíblia.

Orientadora: Profa. Ms. Súsie Helena Ribeiro

Belo Horizonte
2007
3

Dedicatória

Dedico este trabalho as minhas filhinhas Jéssica e Ana Vitória, presentes de Deus, frutos do
meu amor, continuidade da Igreja de Cristo.
4

AGRADECIMENTOS

- Ao nosso Deus, pela salvação em Cristo Jesus.


- A minha querida esposa, pelo amor, dedicação, compreensão e o sorriso sem os quais não
seria possível terminar este trabalho.
- Ao Pr. Daniel Sampaio, por me confiar a classe de Ensino Bíblico da Igreja Batista
Central do Barreiro.
- À Profa. Súsie Ribeiro, pelo exemplo de amor e alegria ao falar da palavra de Deus na sala
de aula e durante a orientação deste trabalho.
5

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.......................................................................................................................... 7

1 VAIDADE ........................................................................................................................ 9
1.1 Conceito moral da palavra “vaidade”....................................................................... 10
1.2 A palavra “vaidade” no texto grego ......................................................................... 11
1.3 A palavra “vaidade” no texto hebraico..................................................................... 12
1.4 Hebel nas traduções das Bíblias católicas e protestantes ......................................... 13
1.5 O sentido de hebel na Tanak .................................................................................... 15
1.6 O sentido de hebel em Eclesiastes............................................................................ 15

2 HEBEL EM ECLESIASTES ............................................................................................. 18


2.1 Datação e Autoria de Eclesiastes.............................................................................. 18
2.2 Ambiente histórico social ......................................................................................... 20
2.3 Temas teológicos ...................................................................................................... 21
2.4 Estrutura ................................................................................................................... 22
2.5 Hebel e o conhecimento de Deus e do ser humano .................................................. 23
2.6 Hebel e a ética........................................................................................................... 25
2.7 Hebel e “vaidade”..................................................................................................... 27
2.8 “Vaidade”, uma tradução inadequada de hebel ........................................................ 28

3 CONCEITO DE VAIDADE NA MÚSICA TUDO É VAIDADE ..................................... 29


3.1 Compositor – Biografia ............................................................................................ 29
3.2 Análise musical ........................................................................................................ 30
3.3 Análise geral do texto ............................................................................................... 31
3.4 Análise teológica do texto ........................................................................................ 31

4 COÉLET E JOÃO ALEXANDRE .................................................................................... 34


4.1 A religião segundo Coélet e João Alexandre............................................................ 34
4.1.1 Distanciamentos de Coélet e João Alexandre........................................................... 35
4.2 “Vaidade” para Coélet e João Alexandre ................................................................. 36
4.3 João Alexandre e as expressões e o método de Coélet............................................. 37
4.4 Atualização da leitura de Eclesiastes a partir de Tudo é vaidade............................. 37

CONCLUSÃO.......................................................................................................................... 39

ANEXO .................................................................................................................................... 41

BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................................... 42
6

RESUMO

A interpretação do texto bíblico não é uma prática exclusiva e cativa de líderes e


teólogos. Através de canções, textos são interpretados e comunidades assimilam tais
ensinamentos. Essas canções utilizam-se de expressões bíblicas que a princípio outorgam uma
aparente autoridade ao contexto dessas composições. Dentre tantas canções, destaca-se a
canção Tudo é vaidade do compositor João Alexandre. A canção se utiliza de expressões do
livro de Eclesiastes e do cotidiano da Igreja protestante Brasileira. Como exemplo, ante essa
composição, é possível indagar se as expressões utilizadas estão em consonância com a
exegese de Eclesiastes. A palavra “vaidade”, presente em Eclesiastes e na canção Tudo é
vaidade, é comum entre os textos, tornando-se emblemática e sustentadora para a
interpretação dos mesmos. Compreender a significação de “vaidade” e sua origem remete a
uma pesquisa sobre contexto histórico em que está inserida. O trajeto da palavra é marcado
por mudanças profundas de sentido, do concreto para o abstrato e tornando-se por fim
estandarte do pensamento de escritor de Eclesiastes. Após a investigação de “vaidade”, a
leitura da canção Tudo é vaidade clareia-se, devido ao entendimento literário e teológico do
vocábulo. A canção denuncia o comportamento de alguns cristãos através da palavra
“vaidade”. Conhecer “vaidade”, segundo a ótica do escritor de Eclesiastes, e a sua
significação na canção possibilita instrumentalizar à releitura desse livro. Propõe-se, através
desta pesquisa validar a leitura de Tudo é vaidade, a partir da exegese de Eclesiastes, servindo
de modelo para orientação ao processo do estudo de outras canções evangélicas.

PALAVRAS-CHAVE
Vaidade; hebel; Coélet; João Alexandre; Igreja; valores.
7

INTRODUÇÃO

“Vaidade de vaidades, diz o pregador, vaidade de vaidades! Tudo é vaidade” (Ec 1:2).
Essa expressão é a marca registrada do livro de Eclesiastes. Alguns teólogos descrevem a
mensagem deste livro como pessimista, fatalista, cética, materialista, existencialista entre
outras definições1. Tais descrições contribuem para que leitores da Bíblia se afastem do livro,
ou realizem leitura superficial. Apesar dessas dificuldades, mesmo assim, teólogos e leigos
aproximam-se do texto, aprofundam-se e trazem para a Igreja uma leitura atualizada e
saudável de Eclesiastes. Um exemplo desta vertente é a música Tudo é vaidade do compositor
João Alexandre.
Em sua discografia, João Alexandre tem optado pela composição de músicas que
discutem a postura da fé cristã frente os problemas do cotidiano e da Igreja como: Tudo é
Vaidade, Coração de Pedra, Justiça Social, Casa Grande, Deixa que eu Deixo, Pra Cima,
Brasil e Em Nome da Justiça2. A canção Tudo é Vaidade remete a uma nova leitura do texto
de Eclesiastes, além de suscitar a seguinte pergunta: Qual é o papel da arte, em especial a
música, na interpretação do texto bíblico?
Esta monografia tem como objetivo geral verificar a relação dos textos de Eclesiastes e
da música Tudo é vaidade. No decorrer do trabalho, também se verificará a significação de
“vaidade” em Eclesiastes e na canção Tudo é Vaidade. Também serão avaliados as
aproximações e os distanciamentos do vocábulo nestes textos, por fim, haverá uma reflexão
sobre a exegese e a hermenêutica do texto de Eclesiastes a partir da composição de João
Alexandre. Assim sendo, este trabalho é uma pequena incursão sobre “arte e hermenêutica”.
O marco teórico desta monografia é o bíblico-exegético e da semiótica do texto. Para a
pesquisa bibliográfica, serão utilizados textos que tratam da exegese de Eclesiastes, textos
introdutórios de semiótica e da prática pastoral nas Igrejas protestantes no Brasil a partir da
década de 80 do século passado. Adotar-se-a palavra “vaidade” como recorte para o início da
abordagem de “arte e hermenêutica”. Portanto, esta pesquisa se concentrará nas semelhanças
e diferenças de “vaidade” e sua colaboração na interpretação de Eclesiastes e Tudo é vaidade.
Sendo apenas uma incursão sobre “arte e hermenêutica”, e devido às limitações de
uma monografia, não se constituem como objetivos deste trabalho: 1) o estudo aprofundado
da história da interpretação de Eclesiastes; 2) estudo de outras composições de João
Alexandre; 3) estudo sobre os fenômenos sócio-religiosos da Igreja protestante brasileira; 4) o

1
FISCHER, 1999. p.273.
2
Essas músicas encontram-se nos CD’s (Compact Disk): Acústico, Voz e violão, e, Voz e violão e algo mais.
8

estudo do papel da arte na religião cristã. A pesquisa é de caráter estritamente bibliográfico e


não serão realizadas pesquisas de campo ou entrevistas.
No primeiro capítulo estudará a significação da palavra “vaidade”, sua origem, sua
migração nos textos grego e hebraico, sua carga moral e as diferenças das traduções na língua
portuguesa.
O segundo capítulo tratará da ambientação sócio-histórico da palavra “vaidade” e as
contribuições desse ambiente para sua significação.
O terceiro capítulo apresentará a canção Tudo é vaidade, analisando a melodia e o
texto nos aspectos literários e teológicos.
O quarto capítulo convergirá os conceitos teológicos do capítulo cinco de Eclesiastes e
da canção Tudo é vaidade apresentando suas aproximações e distanciamentos.
Conclui-se no decurso deste trabalho que é possível uma releitura de Eclesiastes a
partir de Tudo é vaidade, propiciando uma ampliação da hermenêutica do texto e atualizando
a mensagem deste livro.
9

1 VAIDADE

A acepção da palavra “vaidade” evoca o desejo do ser humano de atrair a admiração às


suas obras ou à sua aparência. Quando se designa como vaidosos homens e mulheres, o
objetivo é ressaltar o cuidado especial, ou mesmo exagerado dessas pessoas com a forma de
se apresentarem. Chega-se a abrandar o significado negativo desta palavra, associando-a ao
cuidado pessoal, quando se depara com indivíduos sem o mínimo de atenção com os seus
trajes e seus corpos. Porém, a palavra “vaidade” também é encontrada no texto bíblico,
Antigo e Novo Testamento, e em especial no livro de Eclesiastes.
Em uma primeira leitura deste livro, observa-se que a palavra “vaidade” é associada a
diversas situações da vida humana. Ante esta leitura, cria-se uma motivação de se fazer
algumas perguntas: a palavra “vaidade” possui algum significado que vá além de vanglória ou
reconhecimento? O que significava “vaidade” para o escritor de Eclesiastes?
Para responder tais perguntas, será necessária a compreensão da palavra “vaidade”
considerando sua origem e seu emprego no texto bíblico como se verá no decorrer deste
trabalho.
O significado do vocábulo “vaidade” pode ser entendido como: “qualidade do que é
vão; desejo imoderado e infundado de merecer a admiração dos outros; vanglória, presunção;
futilidade”3. Estas definições são comuns entre os lexicógrafos brasileiros: Aurélio, Antônio
Cunha, Houaiss e Michaelis.
Aurélio acrescenta “fatuidade” e “tolice” ao significado da palavra4. Houaiss adiciona
a expressão “vazio firmado sobre aparência ilusória”5. O dicionário Larousse inclui um ponto
positivo e que migra da ética para a estética quando se refere à “preocupação com a boa
aparência, o bem-vestir”6.
O substantivo feminino abstrato flexionável em número, mas não em gênero “vaidade”
é oriundo da palavra latina vanitas, plural vanitates7, cujo significado é: vaidade; futilidade;
frivolidade, aparência vã. No século XIII, a palavra era grafada como uaydade e no século
XIV vãydade8.
Ao se verificar os enunciados propostos pelos dicionários consultados, nota-se
convergência de significados. “Vaidade” está ligada ao que é “vão”. Entretanto, este vocábulo

3
MICHAELIS, 1998. s/n.
4
FERREIRA, 1998. p.663.
5
HOUAISS, 2001. p.2823.
6
GRANDE, 1999. p.902.
7
SARAIVA, 1927. p.1254.
8
CUNHA, 1982. p.809.
10

não é utilizado apenas para exprimir a qualidade ilusória de promover o reconhecimento


próprio na esfera social. Houve uma apropriação da palavra pelo discurso teológico. Assim,
“vaidade” deixa de ser simplesmente comportamento humano, mas um “vício” capaz de
separar a humanidade de Deus.
Para se compreender a transição do significado antropológico da palavra para a
significação teológica, deve-se ater à visão cristã do que é “vaidade”.

1.1 Conceito moral da palavra “vaidade”


A “vaidade” já figurou na lista dos “pecados capitais”9 da Igreja Católica Apostólica
Romana. De acordo com o livro Sacred Origins of Profound Things de Charles Panati, a
primeira lista de “crimes” e “paixões” humanas foi composta pelo monge grego Evário do
Ponto (345-399), a saber: gula, luxúria, avareza, melancolia, ira, preguiça espiritual,
“vaidade” e orgulho. No século VI, o papa Gregório uniu a “vaidade” ao “orgulho”. No
século XVII, a Igreja revisou a lista e o “orgulho”, ao qual estava associada a “vaidade”
passou a ser enunciado como “arrogância”10. Atualmente a Igreja adota a seguinte lista:
soberba, avareza, luxúria, ira, gula, inveja, preguiça11.
A doutrina dos vícios capitais encontra sua máxima profundidade no tratamento dado
por Tomás de Aquino. Para o teólogo católico a lista de pecados capitais seria: “vaidade”,
avareza, inveja, ira, luxúria, gula e acídia (preguiça).
O termo pecado ou vício capital deriva da palavra latina caput: cabeça, líder, chefe. A
soberba para Tomás de Aquino era um pecado supra-capital, a mãe de todos os vícios. E a
“vaidade”, a inanis gloria, o vício que lhe é mais próximo.
O De Malo é uma quaestio disputata12. Nesta obra, Tomás de Aquino responde sobre
o tema: “os pecados capitais”. Em De Malo, 9.1, Tomás de Aquino fala de vanglória ou
“vaidade” como pecado capital. “A perversão do bem da glória é precisamente a glória vã da
vaidade”. Em De Malo 9.3, afirma que “sendo o fim próprio da “vaidade” a manifestação da
própria excelência, [...] o homem tende a manifestar a própria excelência”13.
Assim, “vaidade” segundo Tomás de Aquino14, é um pecado grave, que aponta para o
desejo do ser humano de manifestar a excelência divina pretendida pela soberba. Vemos

9
São chamados capitais porque geram outros pecados, ou vícios. Os vícios podem ser classificados segundo as
virtudes que contrariam.
10
Apud CASTRO, 2007. s/n.
11
CATECISMO, 2007. s/n.
12
Possivelmente ocorrida em Roma, no ano de 1266 a 1267, ou em Paris, no ano de 1269 a 1270.
13
AQUINO, Tomás apud LAUAND, 2007. s/n.
14
AQUINO, Tomás apud LAUAND, 2007. s/n.
11

então, que a teologia expande o sentido da palavra colocando-a como um problema de ordem
espiritual.
A leitura do Novo Testamento também apresenta “vaidade” como atitude contrária a
Deus. A palavra utilizada no texto grego é mataiotes que, posteriormente, seria traduzida para
a palavra latina vanitas15. Torna-se necessário, conhecer a palavra mataiotes para identificar
sua contribuição na expansão de sentidos de “vaidade”.

1.2 A palavra “vaidade” no texto grego


A palavra grega mataios, correlata de mataiotes, significa: destituído de força,
verdade, sucesso; inútil, de nenhum propósito16. Tiedtke traduz mataios por: vazio,
infrutífero, inútil, incapaz, sem valor17. Esta palavra é derivada de matê: esforço vão, nulo. Na
literatura grega, mataios e seus cognatos são revestidos de valores morais e religiosos, muito
comuns nas tragédias gregas.
A Septuaginta18 empregou a palavra mataios para traduzir várias palavras hebraicas
como: hebel (vapor), shãw (vacuidade, vaidade), kãzub (decepção, impostura), tohu (deserto,
falta de realidade), hinnãm (em vão), ãwen (aflição, maldade).
No Novo Testamento, a palavra mataios e seus cognatos aparecem 11 vezes,
ocorrendo apenas no livro de Atos, nas epístolas paulinas e nas epístolas gerais. Mataios é
tudo que se opõe a Deus e seus mandamentos: 1Co 3:20 “[...] O Senhor conhece os
pensamentos dos sábios, que são vãos”; 1Pd 1:18 “[...] que fostes resgatados da vossa vã
maneira de viver [...]"; 1Co 15:17 “E, se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé, [...]”.19
No grego, o substantivo feminino mataiotes é compreendido como o que é destituído
de verdade e conveniência; perversidade, depravação; fragilidade20. Em Rm 8:20, Paulo vê a
criação sujeita à vaidade. Em Ef 4:17 “[...] andeis mais como andam também os outros
gentios, na vaidade da sua mente”. Mataiotes é uma característica do pensar pagão. A
humanidade é dada à vaidade e nega honra a Deus, Mc 7:7 Em vão, porém, me honram, [...]21.
O significado mais usado, e traduzido para a língua portuguesa, para a palavra grega
mataiotes é “vaidade”: 2Pd 2:18 “Porque, falando coisas mui arrogantes de vaidades, [...].”.

15
Língua da versão popular da Bíblia a partir do ano 400, denominada Vulgata.
16
BIBLE, 2003. s/n.
17
TIEDTKE, 2000. p.2585.
18
Versão grega do Antigo Testamento.
19
TIEDTKE, 2000. p.2586.
20
BIBLE, 2003. s/n.
21
TIEDTKE, 2000. p.2585
12

A presença de mataiotes no Novo Testamento está estreitamente ligada à rejeição da


humanidade ao plano de salvação. A mente vaidosa está obscurecida, separada de Deus e a
maneira vã de viver é resgatada por Cristo. Sendo assim, associar “vaidade”, mataiotes, a um
comportamento que distancia o ser humano de Deus é um passo natural para a construção de
um significado moral e religioso do vocábulo. O ser humano vaidoso não se submete ao plano
de salvação proposto por Deus. Contudo, deve-se refletir sobre o uso de mataiotes no Antigo
Testamento na língua hebraica e no grego da Septuaginta.
A língua de origem do Antigo Testamento era o hebraico, língua semítica. A forma de
pensar e ver as relações entre Deus e a humanidade eram diferentes sob ponto de vista desse
povo. Várias palavras em hebraico foram traduzidas para mataiotes. Para se entender o que é
“vaidade” no texto em hebraico, é recomendável examinar algumas palavras e verificar sua
relação com o vocábulo em questão.

1.3 A palavra “vaidade” no texto hebraico


Das palavras traduzidas do texto hebraico para mataiotes e, posteriormente, para
vanitas, duas serão estudadas em especial: shãw e hebel. A primeira, por ter relação direta
com a palavra “vaidade”, e a segunda, devido a sua presença em Eclesiastes. As demais não
são relevantes para este estudo.
A palavra hebraica shãw pode ser traduzida por vacuidade, vaidade e falsidade. Esse
substantivo aparece 52 vezes no Antigo Testamento, com maior freqüência nos Salmos 15
vezes, Ezequiel oito vezes, Jó seis vezes e Jeremias cinco vezes, apenas na expressão
adverbial lashshãw, “em vão”, “inutilmente”, “à toa”, e sempre antes do verbo. O uso mais
familiar de shãw se encontra no terceiro mandamento, “não tomarás o nome do Senhor teu
Deus em vão” (Ex 20:7; Dt 5:11). O vocábulo designa tudo àquilo que é impalpável, irreal e
sem valor, quer na esfera material quer na moral. É, por conseguinte, uma palavra que designa
ídolos (da mesma maneira como hebel, “vaidade”, também é uma designação de ídolos, sem
valor)22.
O que chama a atenção na palavra shãw é a sua ausência no texto de Eclesiastes. Shãw
está associada a tomar o nome de Deus em vão, ou seja, uma gravíssima ofensa, um pecado.
Neste ponto shãw se aproxima de mataiotes devido à sua aplicação teológica. Assim, o que é
falso e ocupa o lugar de Deus, os ídolos, também são vaidades.

22
HARRIS, 1998. p.336.
13

Tem-se, agora, uma vertente semítica na construção de “vaidade”. Porém, o escritor de


23
Eclesiastes faz a opção por hebel e não por shãw. A partir dessa observação, será visto como
algumas versões, especialmente em português, do texto hebraico de Eclesiastes traduzem
hebel e a contribuição dessas para o significado de “vaidade”.

1.4 Hebel nas traduções das Bíblias católicas e protestantes


Como se viu até o momento, a palavra hebraica shãw não é encontrada em Eclesiastes.
Entretanto, as traduções em língua portuguesa, mais utilizadas por católicos e protestantes,
traduzem hebel por vaidade. Antes de se avaliar a razão pelo qual se associou hebel a
“vaidade”, apresenta-se um resumo das ocorrências da tradução de hebel para vaidade nestas
versões.
A palavra hebraica hebel significa inicialmente: vapor, sopro. O substantivo ocorre 71
vezes no Antigo Testamento e encontra-se 36 vezes no Eclesiastes, em que aparece pelo
menos uma vez nos 12 capítulos, exceto no capítulo 1023. Entretanto, não há consenso quanto
ao número de vezes em que a palavra aparece no texto bíblico. Ravasi dá alguns exemplos
desta discordância, citando que segundo Albertz, o termo aparece 41 vezes; segundo Bonora
23 vezes; segundo Festorazzi, 37 vezes. Particularmente, Ravasi considera que hebel “ressoa”
38 vezes em Eclesiastes24.
Nas traduções protestantes mais utilizadas do livro de Eclesiastes na língua
portuguesa, a palavra hebel é traduzida por “vaidade”. As versões Almeida Corrigida e Fiel
(ACF), Bíblia Almeida em Português (BRP), Almeida Revista e Corrigida (ARC) e Almeida
Revista e Atualizada (ARA) utilizam a palavra “vaidade” 81 vezes no Antigo Testamento e
28 vezes em Eclesiastes. As versões católicas em português, como a Bíblia de Jerusalém (BJ)
e Bíblia Ave Maria (BAM) também optam pelo vocábulo “vaidade” no livro de Eclesiastes.
A Nova versão Internacional (NVI), versão protestante abandona o vocábulo
“vaidade” e utiliza palavras e expressões como: inutilidade; inútil; “não faz sentido”; absurdo;
tolice; passageiro. A Bíblia Edição Pastoral (BPL), versão católica adota as palavras:
fugacidade; fugaz; desilusão.
A multiplicidade de sentidos não ocorre apenas nos textos em português. Ravasi cita
que algumas traduções modernas empenham-se em conservar o sentido “metafísico” do
vocábulo hebel, com as seguintes palavras: absurdo (Fox); caducidade, inutilidade, fumo,
sopro, contra-senso, zero (Ginsberg); nada (Ceonetti, Steinmann, Galling). Salienta ainda, que

23
RAVASI, 1993. p.16.
24
Ibidem. p.17.
14

na língua italiana há correlação simbólico-ideológica baseada na raiz de “fumo”: fumoso,


fumegante. Entretanto, considera que a palavra “vazio” seria um meio termo para a tradução
de hebel para o idioma italiano25.
No texto da Vulgata Latina, a palavra vanitas é a tradução para as palavras gregas
mataiotes e mataios, que foram utilizadas como significados de hebel, quando da tradução do
texto hebraico para a Septuaginta. Vanitas aparece no Antigo Testamento da Vulgata 22 vezes
e 17 vezes em Eclesiastes. No texto hebraico,26 a palavra hebel aparece 89 vezes e 38 vezes
em Eclesiastes.
A versão inglesa King James usa a palavra vanity (vaidade), utilizada 86 vezes no
Antigo Testamento e 28 vezes em Eclesiastes. O vocábulo ocorre 86 vezes, distribuídos da
seguinte forma: 68 vezes no singular, cinco vezes no plural, oito vezes como nome próprio (o
filho de Eva) e cinco vezes na forma verbal denotativa27 (habal: agir de maneira vã, tornar-se
vão). A versão New International Version (1984) substitui vanity (vaidade) por meaningless
(sem sentido, inexpressivo), ocorrendo 35 vezes.
Abaixo, segue comparativos sobre a incidência da palavra vaidade e correlatas nos
capítulos de Eclesiastes em algumas versões.
ARA ARC BRP
Cap. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 11 12
vv 2-14 1-11-15-17-19- 19 4-7-8- 10 2-9-11- 6-15 10-14 9 8-10 8
21-23-26 16 12
Hebraico - (hábël)
Cap. 1 2 3 4 5 6 7 8 11 12
vv 2-14 1-11-15-17-19- 19 4-7-8- 9 2-9-11 6 10-14 8-10 8
21-23-26 16
Hebraico – (heºbel)
Cap. 1 2 4 6 8
vv 14 11-17-21-23-26 4-7-8- 2-9 14
16
VUL

25
RAVASI, 1993. p.17.
26
Texto consultado (Bible Works 6.0) BHS Hebrew OT
27
GUTIÉRREZ, 1996. p.34.
15

Cap. 1 2 4 5 6 7 8 11 12
vv 2-14 1-15-21-23-26 4-8-16 9 2-9 7 10-14 8-10 8

Observa-se que as versões mais recentes abandonaram a palavra “vaidade” na tradução


de hebel. Para se prosseguir na investigação de hebel, estudar-se-a o sentido do vocábulo no
texto hebraico para se entender a razão de tal mudança.

1.5 O sentido de hebel na Tanak 28


O significado básico de hebel é: vapor, respiração, vento, sopro. Este significado é
ilustrado em Is 57:13, "Levá-los-á o vento (rûah): um sopro (hebel) os arrebatará a todos”, e
Pv 21:6, "Obter tesouros com língua mentirosa é um sopro fugidio (hebel nidd)". O nome
próprio, Abel, o segundo filho de Adão, também é escrito como hebel. Abel é citado dentro
em Gn 4 como um fato sem explicação.
Há três contextos diferentes para a utilização da palavra hebel. O primeiro designa
falsos deuses, ídolos - Dt 32:21 “[...] com aquilo que não é Deus; com as suas vaidades me
provocaram à ira [...]”; Jr 2:5 “[...] andando após a vaidade, e tornando-se levianos?"; Sl
31:6,7 “Odeio aqueles que se entregam as vaidades enganosas”; O segundo, quando
representa os sentimentos individuais: Is 49:4 “onde o servo, Israel diz: Debalde tenho
trabalhado (rîq), inútil (tôhû) e vãmente (hebel) gastei minhas forças”. O terceiro grupo
encontra-se no livro de Eclesiastes, num total de 36 citações que assumem um sentido
especial 29.
Aproximadamente um terço das citações de hebel na Tanak encontram-se em
Eclesiastes. Este agrupamento em especial é o objeto de pesquisa deste trabalho. O vocábulo
toma uma importância no livro, pois se comporta como uma síntese do pensamento do autor.
Assim, hebel em Eclesiastes soa de forma diferente do restante da Tanak. Portanto, deve-se
aprofundar o sentido de hebel em Eclesiastes.

1.6 O sentido de hebel em Eclesiastes


Hebel é o conceito por excelência do livro de Eclesiastes30. Poucas são as passagens
do Antigo Testamento que mantêm o sentido primário de hebel (vento, sopro, brisa, vapor).

28
Tanak é a palavra formada pelas letras das três partes que compõem a Bíblia Hebraica: Torá (cinco livros da
Lei), Neviim (Profetas) e Ketuvim (escritos).
29
HARRIS, 1998. p.336.
30
FESTORAZZI, 1993. p.213.
16

As línguas semíticas guardam entre si um significado comum: hebraico tardio (sopro quente,
vapor, fumo, hálito); siríaco (pó); árabe (sopro, fumo, vento); egípcio tardio (vento); mandeu
(hálito)31.
Lindez32 vê como natural o deslizamento do significado da palavra (evolução
semântica) em uma língua falada, como era o hebraico. Assim, hebel caminha do concreto
(sopro, brisa) para o abstrato (efêmero). Abandonando o significado primitivo, o termo hebel
é conduzido para o campo simbólico em uma esfera derivada da significação33. No contexto
do livro, hebel, também se torna o estandarte de uma corrente teológica contrária às receitas
de felicidade oferecidas pela sabedoria tradicional de Israel34.
Hebel está associado à amal “fatigar” ou a yitrôn, “ganho”, demonstrando a
inconsistência dos resultados da obra humana35. A reflexão sobre o vazio, na expressão de
hebel, remete a palavra para a esfera filosófica. Hebel qualifica a realidade das coisas em si
mesma 36. É um absurdo, hebel, a pretensão de se chegar ao conhecimento. O cotidiano, sem
um sentido lógico, conduz o ser humano a um vazio, hebel, a uma decepção, hebel. Assim, o
sentido de hebel é exclusivamente existencial37.
Em Eclesiastes, hebel transcende sua significação. As ações humanas “debaixo do sol”
não fazem sentido. O escritor do Eclesiastes vê sua religião secularizada38, os
empreendimentos ocorrem como fim em si mesmo. Diferente do profeta Amós, que se
indigna com o povo de Judá por vender “o justo por dinheiro e o necessitado por um par de
sandálias” (Am 2:6) e de Habacuque, que espera por uma intervenção divina, uma vez que “os
olhos do Senhor são puros e não podem contemplar a opressão” (Hb 1:13), o escritor, como
sábio e mestre, encerra toda existência e o trabalho humano sob o manto da nulidade. Por que
explorar? Por que ser explorado? Por que se prender ao efêmero? Por que se enfadar? Em Mt
6:34, Jesus recomenda não se inquietar: “basta a cada dia o seu mal”. Antes dessa
recomendação (Mt 6:28-29), cita a glória de Salomão, não como modelo de sucesso que os
fiéis a Yahweh deveriam seguir, mas, como algo inferior à fragilíssima beleza dos lírios dos
campos. De certa forma, os apontamentos do Eclesiastes continuaram ressoando na sociedade
judaica sob o domínio romano no início do primeiro século da era cristã.

31
RAVASI, 1993. p.17.
32
LINDEZ, 1999. p.432.
33
Ibidem. p.433.
34
GUTIÉRREZ, 1996. p.41.
35
RAVASI, 1993. p.19.
36
LINDEZ, 1999. p.434.
37
Ibidem. p.435.
38
HENDRY, 1990. p.657
17

O escritor do Eclesiastes não questiona Deus e não convoca o povo ao arrependimento


ou aos sacrifícios legais, mas observa que os valores de sua sociedade são ilusórios,
passageiros e que não contribuem em nada para o significado de sua existência. O escritor
abre, pois, diálogo com a Sabedoria.
18

2 HEBEL EM ECLESIASTES
O livro de Eclesiastes concentra a maior presença da palavra hebraica hebel no texto
hebraico do Antigo Testamento. Sendo assim, é necessário o conhecimento prévio da sua
autoria, de seu contexto histórico, social e teológico para situar hebel no pensamento hebraico
e obter a significação correta da palavra. Após esta incursão, pode-se avaliar a relação
existente entre hebel e “vaidade”.

2.1 Datação e Autoria de Eclesiastes


A datação do Eclesiastes está diretamente ligada à sua autoria. Para aqueles que
defendem a autoria salomônica39, a data provável de composição40 seria de 971 a.C a 931 a.C.
Os teólogos que não consideram a autoria tradicional propõem uma data posterior.
Festorazzi41 situa a composição do texto entre 320 a.C. a 190 a.C; Fernandez42 apresenta a
possibilidade de 298 a.C. a 275 a.C. ou 219 a.C. a 200 a.C; Fischer43 data o livro num período
semelhante ao de Fernandez, entre 300 a.C. e 200 a.C.
A autoria de Eclesiastes, por Salomão é fundamentada nos versos 1:1 “Palavra do
Pregador, filho de Davi, rei em Jerusalém” e 1:12 “Eu, o Pregador, fui rei sobre Israel em
Jerusalém” e a citação do 1:16 “[...] e sobrepujei em sabedoria a todos os que houve antes de
mim em Jerusalém; [...]”44. Halley considera que o tom melancólico do livro de Eclesiastes é
fruto da velhice de Salomão, dando a impressão que ele não era um homem feliz45.
Em 1Rs 11:4-40 tem-se um breve relato da velhice de Salomão: “Porque sucedeu que,
no tempo da velhice de Salomão, suas mulheres lhe perverteram o coração para seguir outros
deuses; [...], Pelo que disse o Senhor a Salomão: Visto que houve isso em ti, que não
guardaste o meu concerto e os meus estatutos que te mandei, certamente, rasgarei de ti este
reino e o darei a teu servo. [...] Pelo que Salomão procurou matar Jeroboão [...]”. Neste texto
Salomão intenta contra a vida daquele que o Senhor havia escolhido para reinar em seu lugar,
após sua morte, mas, o personagem Salomão em sua velhice, no livro dos Reis, age
radicalmente de modo diferente do “Salomão” de Eclesiastes: Ec 12:13-4 “De tudo o que se
tem ouvido, o fim é: Teme a Deus e guarda os seus mandamentos; porque este é o dever de
todo homem. Porque Deus há de trazer a juízo toda obra e até tudo o que está encoberto, quer

39
HALLEY, 1993. p.248.
40
NELSON, 2003. p.98.
41
FESTORAZZI, 1993. p.207.
42
FERNÁNDEZ, 1990. p.107.
43
FISCHER, 1999. p.273.
44
BÍBLIA, 1995.
45
HALLEY, 1993. p.248.
19

seja bom, quer seja mau”. Sobre a relação de Salomão e Jeroboão, há uma citação em Ec 4.13
que parece lembrar esse conflito: “Melhor é o jovem pobre e sábio do que o rei velho e
insensato, que se não deixa mais admoestar”.
Outro fato a considerar é que, no livro de Eclesiastes, não há nenhum destaque para a
obra, à qual o nome de Salomão é associado46. A construção do Templo de Jerusalém não
serve de lembrança ou orgulho, em sua contabilidade final em Eclesiastes.
Fischer cogita que o verso 1.1 possa ser uma adição futura47. O aramaísmo e os termos
persas presentes em Ec 2:5 (parDës - Ct 4:13 e Ne 2:8) e Ec 12:11 (ásuPPôt – Ne 12:25 e 1Cr
26:15-17) apontam para um período pós-exílico48. Frye alega que era uma prática primitiva da
literatura de “ocultismo”, religiosa, atribuir a uma figura lendária a revelação inicial de um
segredo. De modo que a citação “eu pregador era Rei em Jerusalém” encontra-se próxima da
região da fantasia. O pseudônimo torna-se um instrumento de legitimação do segredo ou
conhecimento revelado49.
Outro aspecto importante é que o texto de Eclesiastes põe em discussão a prosperidade
e o sucesso intelectual de Salomão. A imagem do rei bem sucedido é questionada e seus
valores colocados à prova. Assim, a citação de seu nome soa mais como uma ironia50 ao
personagem, do que um fato histórico. Denominarem o autor de Eclesiastes a partir deste
ponto de Coélet.
A palavra Coélet51 designa um cargo, assim como o de Esdras e Neemias, referindo à
ação de reunir uma assembléia e lhe dirigir um discurso. Coélet comporta-se como um mestre
experiente que procura refletir com a platéia presente, ou discípulos, as suas reflexões.
Diante das proposições apresentadas optou-se pela composição pós-exílica, uma vez
que a autoria tradicional deixa lacunas para a compreensão do personagem Coélet. Adotar-se-
a o período de 250 a 300 a.C, sob o domínio dos Ptolomeus, para a composição do livro. A
partir destas proposições, será avaliado o ambiente histórico e social e as contribuições desse
contexto para o pensamento do Coélet.

46
GALAZZI, 2000. p.66.
47
FISCHER, 1999. p.274.
48
KLEIN, 1997. p.60.
49
FRYE, 2004. p.242-243.
50
GALAZZI, 2000. p.65.
51
Esta palavra também é grafada como Qohélet que significa homem da assembléia, o que reúne, em grego
ekklesia. Portanto, Coélet, Qohélet e Eclesiastes possuem o mesmo significado. A tradição cristã associou
ekklesisates a “alguém da Igreja”, e assim, algumas versões traduziram Qohélet como pregador.
20

2.2 Ambiente histórico social


O fundo histórico, a partir da proposição de um Coélet do pós-exílio, situa-se no ano
de 301 a.C sob o domínio dos Ptolomeus. Após o governo dos persas em 445 a.C, os gregos,
através de Alexandre, dominam o antigo império persa. Em 323 a.C, em decorrência de sua
morte, a Palestina é destinada ao general Seleuco e, 22 anos depois, passada ao domínio do
Ptolomeus52. Sob este governo, a tributação sobre a agricultura da região elevou-se,
sobrecarregando o trabalho dos camponeses. Os desconcertantes ritmos de produção impostos
pelos Ptolomeus colocaram em questionamento o valor do trabalho nesta comunidade53.
O Estado tributário, implementado pelos conquistadores, transformou Judá em uma
província. O sistema opressor exigia maior empenho produtivo dos trabalhadores, não para o
sustento do povo, mas para a manutenção de um império. O trabalho deixava de ser um
direito do indivíduo, para tornar-se um “dever” que na verdade encobria um regime de
escravidão para o povo judeu54.
A teologia da retribuição55, em voga no período ptolomaico, gerava falsa esperança de
recompensa e responsabilizava exclusivamente o indivíduo pelo sucesso de seu trabalho.
Porém, por mais que os camponeses trabalhassem, a tributação de impostos consumia o
esforço empenhado.
O Estado era governado pelo Sumo Sacerdote, proveniente da família de Tobias, e fiel
aos Ptolomeus56. Aos olhos dos necessitados da sociedade judaica, a associação entre a classe
sacerdotal e os dominadores gregos, a assimilação da cultura deste povo57 e os impostos
cobrados, não correspondiam à justiça divina, ensinada pela sabedoria tradicional. Em Ec
7:15, estes questionamentos tomaram forma nas palavras de Coélet, “[...] há justo que perece
na sua justiça, e há ímpio que prolonga os seus dias na sua maldade”.
O quadro apresentado fornece alguns subsídios para supor o estado emocional e
espiritual do público de Coélet. Ele percebe que a elite goza de prazeres superficiais que
estimulam a competição “Ec 4:4 Então, vi que todo trabalho e toda destreza em obras provêm
da inveja do homem contra o seu próximo [...]”; “Ec 5:9 O proveito da terra é para todos; até
o rei se serve do campo” e a falta de solidariedade para com os pobres; “Ec 4:1 Vi ainda todas

52
KLEIN, 1997. p.60.
53
TAMEZ, 1995. p.55.
54
Ibidem. p.55.
55
FERNÁNDEZ, 1990. p.112.
56
Ibidem. p.106.
57
Ibidem. p.107
21

as opressões que se fazem debaixo do sol: vi as lágrimas dos que foram oprimidos, sem que
ninguém os consolasse [...]”.
Ao observar essas questões, Coélet inicia diálogo com a sabedoria tradicional,
procurando rever os temas teológicos que norteiam o dia a dia do seu povo. Esses temas serão
tratados para elucidar a instrumentalização de hebel dentro do mundo de Coélet.
2.3 Temas teológicos
Pode se pensar que o propósito de Eclesiastes seja demonstrar a tese de que “tudo é
vaidade”58. Porém, a sabedoria tradicional ensinava ao povo que uma vida virtuosa traria
recompensas materiais e emocionais em detrimento dos injustos e maus59. O livro de
Provérbios representava bem a teologia da retribuição: escolhas e atitudes sábias produzem
bons resultados. Diante desta posição, Eclesiastes faz a opção de subverter a mensagem de
Provérbios60.
Coélet se inquieta pelo enrijecimento e os excessos da aplicação da causalidade da
retribuição, em especial, oriundos do livro de Provérbios, em clara oposição ao cotidiano
observado e vivido pelo povo judeu sob o domínio grego. O simplismo adotado pela
sabedoria tradicional, onde via a prosperidade como uma evidência da graça divina, era
utilizado como um mecanismo opressor para garantir a passividade e o empenho na produção
pelos trabalhadores judeus61.
O sentido da vida para Coélet é algo complexo62. As incongruências encontradas não
abalam sua fé, mas o deixam perdido. O trabalho é visto por Coélet como um pedaço de
felicidade: 2:24 “Não há nada melhor para o homem do que comer e beber, e fazer com que
sua alma goze do bem do seu trabalho. [...]”. A vida humana, o sofrimento, a dor, o trabalho,
o bom nome, os filhos, a herança, a relação com Deus e a morte passam a ser avaliados por
63
Coélet. O método hermenêutico de Coélet é da “subversão dos princípios” utilizados que
não expressavam o cotidiano. Coélet, ao dizer: 9:3 “Este é o mal que há entre tudo quanto se
faz debaixo do sol; a todos sucede o mesmo; [...]” revela a falta de qualquer consistência
aparente na justiça sugerida pela teologia da retribuição 64.
Não se pode esquecer que o princípio da retribuição coletiva prometida a Israel não é
invalidada por Coélet “Dt 7:12 Será, pois, que, se ouvindo estes juízos, os guardardes e

58
NELSON, 2003. p.159.
59
FISCHER, 1999. p.275.
60
MILES, 1997. p.396.
61
TAMEZ, 1995. p.55.
62
LINDEZ, 1999. p.446.
63
GASS, 1996. p.24.
64
FISCHER, 1999. p.278.
22

cumprirdes, o SENHOR teu Deus te guardará a aliança e a misericórdia que jurou a teus
pais”, mas sua aplicação irrestrita ao destino individual; e “Pv 24:12 [...] Não o saberá aquele
que atenta para a tua alma? Não dará ele ao homem conforme a sua obra?”. Para Coélet, o ser
humano deve aceitar o que lhe ocorre sem vincular às ações às recompensas para o indivíduo,
como em “Ec 7:14 No dia da prosperidade goza do bem, mas no dia da adversidade considera;
porque também Deus fez a este em oposição àquele, [...]”. Ecoa assim, a citação de Jó 41:11 e
40:8 “quem primeiro me deu, para que eu haja de retribuir- lhe? Pois o que está debaixo de
todos os céus é meu.”, “Porventura, também farás tu vão o meu juízo ou me condenarás, para
te justificares?”. O retribuir e o tempo da retribuição não estão sob o domínio do ser humano,
mas, são prerrogativas de Deus que não permite juízo sobre tais coisas “Jó 40:2 Porventura o
contender contra o Todo-Poderoso é sabedoria? [...]”.
Estes temas estão distribuídos no livro de Eclesiastes, no qual Coélet exercita sua
retórica. Em seguida, será vista a estrutura geral do livro e suas implicações para a
compreensão do seu discurso.

2.4 Estrutura
A estrutura literária do livro é complexa. Há ditos de sabedoria, seções reflexivas e
meditativas. Um terço do mesmo é poesia, mas com passagens narrativas. De uma forma
superficial pode se dividir o livro em três partes65: a tese de que tudo é vaidade (1.1-11); a
prova de que tudo é vaidade (1.12-6.12); o conselho para viver com a vaidade (7.1-12.14).
Halley também divide o livro em três partes66. Porém, agrupa os textos de forma
diferente: tudo é vaidade (1-4); provérbios vários (5-10); a resposta de Salomão (11-12).
Scofield concorda com a divisão em três partes, mas, altera os enunciados67: a experiência do
pregador com a vaidade das coisas terrenas (1-4); exortação à luz desta experiência (5-10); a
conclusão do assunto (11-12).
Fischer divide o livro em quatro partes68: reflexões sobre a vida (1,1-3,15);
observações sobre temas enigmáticos (3,16-11,8); o jovem e seu destino (11,9-12,8); o
epílogo do redator (12,9-14). Hendry considera que o livro desafia qualquer análise lógica,
não permitindo assim nenhum esboço de conteúdo69.

65
NELSON, 2003. p. 159.
66
HALLEY, 1993. p. 248.
67
BÍBLIA, 1987, p. 662.
68
FISCHER, 1999. p. 274.
69
HENDRY, 1990. p. 659.
23

De modo geral, o livro procura refletir sobre o que o Coélet está indagando; ou seja, o
sentido da vida e a retribuição dos atos humanos. Assim, a estrutura do mesmo se baseia na
exposição, reflexão e conclusão do problema exposto: a impossibilidade da rígida aplicação
do princípio da retribuição individual como justificativa para o sucesso ou fracasso do ser
humano no transcorrer de sua breve existência.
Festorazzi admite haver unidade na autoria do livro, mesmo que não ocorra tal unidade
em sua estrutura. A melhor solução seria deixar o problema em aberto, chegando ao máximo
ao seguinte guia: pensamentos expressos; reflexões múltiplas sobre o objeto; re-exposição dos
pensamentos, como num procedimento espiral (tipo A B A’)70.
Logo, a divisão ternária torna-se plausível, mesmo tratando de uma obra complexa,
como o Eclesiastes: exposição dos argumentos (1.1-11); reflexão (1.12-6.12); conclusão (7.1-
12.14). A separação entre os versículos para cada parte é flexível cabendo maleabilidade
conforme a versão adotada e da precisão desejada.
Adotar-se-a proposição de Festorazzi, pressupondo que Coélet, enquanto mestre insta
seus discípulos a avaliarem os temas levantados através do discurso. Os argumentos são
apresentados a partir de presunções acordadas entre o público e a sabedoria tradicional. Esses
argumentos, que parecem lógicos, ao serem contrapostos à realidade se contradizem e perdem
sua validade. Assim, Coélet desperta em seus ouvintes a necessidade da revisão do
argumento. Veja-se o exemplo em Ec 2:14-15: Argumento: “O sábio tem olhos abertos o
insensato caminha nas trevas”; Contradição: “... compreendi que ambos terão a mesma sorte”;
Revisão do argumento: “... para que então tornei-me sábio”.
Festorazzi destaca para o uso de palavras recorrentes, em especial hebel, como
característica do livro.
Agora, deve-se aprofundar um pouco mais sobre a relação do ser humano com Deus,
sob a óptica de Coélet, e como hebel é usado nesse diálogo.

2.5 Hebel e o conhecimento de Deus e do ser humano


Em Eclesiastes, o nome Yahweh não é empregado, e sim, Elohim (42 vezes)71. O texto
não registra o falar de Deus ao ser humano como na formula profética “assim diz o Senhor”
ou discurso direto. As citações encontradas limitam-se a falar sobre Deus. Em Ec 5:1-7, Deus
é retratado como um ser distante e impessoal. Os muitos sonhos da humanidade diante dele
não passam de hebel, “absurdo”. Pois os sonhos geram desejos e os desejos concebem a

70
FESTORAZZI, 1993. p. 208.
71
RAURELL, 1992. p.322.
24

expectação de retribuição. Entre Deus e o ser humano há uma separação, o hebel


(inconsistência) 72. De modo geral para Coélet, Deus, não é investigável; é desconhecido pela
revelação e pela razão. Porém, temer a Deus é uma recomendação incondicional. Sem essa
relação, tudo é ilusão, obra inútil.73
O distanciamento entre Deus e a humanidade proposto por Coélet lembra a sabedoria
tradicional, representada nas palavras de Elifaz no livro de Jó (4:17 “Seria porventura o
homem mais justo do que Deus? Seria porventura o homem mais puro do que o seu
Criador?”). A distância moral entre Yahweh e o ser humano é tão grande que este último
jamais poderá se justificar [...]74.
As ações dos homens e mulheres são reduzidas a um “vazio”. A sabedoria, o dinheiro,
o prazer, o trabalho, a inveja, a justiça e a injustiça, ou seja, toda a existência humana está sob
a égide da nulidade. “Vazio/vaidade das vaidades/ vazio”, um “imenso vazio” sem escapatória
nem saída, um “infinito nada”75.
Para Coélet, desfrutar o bem tem como origem Deus. Homens e mulheres possuem
desejo ardente de alcançar as coisas que encontram-se em derredor. Porém, a alegria do
desfrutar é heleq, “porção”, “quinhão”, proveniente da ação divina. Ora, o ser humano não
consegue se realizar, caso não tenha recebido sua “porção”, e essa não procede do esforço ou
do desejo humano. O que resta então? Esta pergunta pode ser respondida pela citação de Jó
42:8 “[...] para que eu não vos trate conforme a vossa loucura, porque não falaste de mim o
que era reto [...]”. No livro de Jó, os seus amigos retratavam um “deus” despenseiro
comandado pelo ser humano. Ou seja, o humano manobrando o divino. Oliveira chega a
nomear esta visão distorcida de Deus de “ídolo”, um “deus” manipulado pela religião secular.
O ídolo não é nada mais do que a projeção das vaidades do ser humano 76.
A sociedade judaica presumia um “deus causal”77, ou seja, a vinculação da posse de
bens à religião como sinal da aprovação de Deus. Coélet exaure este argumento no transcorrer
de Eclesiastes, apresentando a insuficiência deste “deus” para a relação com o ser humano. O
“deus” impessoal retratado por Coélet é fruto desta visão reduzida. Em Jó 11:7, o amigo
Zofar, ao repreender Jó, afirma que não seria possível ao ser humano alcançar os caminhos de
Deus. Assim, para os homens e mulheres da sociedade de Coélet, o distanciamento desse

72
RAURELL, 1992. p.323.
73
LINDEZ, 1999. p. 447.
74
OLIVEIRA, 2006. p. 36.
75
RAVASI, 1993. p. 20.
76
OLIVEIRA, 2006. p. 49.
77
Ibidem. p. 9.
25

“deus” em suas relações tornava-se aceitável. Porém, no final do livro (Ec 12:13), Coélet
apresenta uma alternativa: teme a Deus, pois ele julgará todas as coisas. Mesmo não
compreendendo as dificuldades que o cercam, Coélet deposita esperança na ação e presença
de Deus. Coélet utiliza-se de hebel para inserir todos os sonhos e ações humanas em um
“vazio” insustentável. Criando então a necessidade de uma releitura da teologia vigente.
Viu-se até o momento que hebel transita todo o tempo no âmbito existencial, não
havendo carga moral nessa palavra, o que não ocorre com o vocábulo “vaidade” utilizado em
algumas traduções. A seguir, tratar-se-a desse distanciamento de significados.
2.6 Hebel e a ética
Sabe-se que a palavra grega mataiotes contribuiu para a construção do conceito ético e
moral de “vaidade”. Os gregos utilizavam esta palavra em um contexto teatral.
Nas instituições mencionadas temos já todos os componentes de
visão do mundo profundo e pessimista e com eles, ao mesmo tempo,
a doutrina da tragédia que está nos mistérios. O conhecimento
fundamental do mal, a arte como alegre esperança de que o exílio da
individuação pode ser rompido, como o pressentimento de unidade
restaurada78.

Na antiga sociedade grega, a Tragédia79 era um gênero teatral através do qual os


cidadãos observavam, aprendiam e interferiam80, sobre questões do indivíduo e da polis81.
Nesse cenário de interatividade entre o público e os atores, nasciam às reflexões sobre o
sofrimento humano e os desígnios inelutáveis do destino da vontade humana. Nesse contexto,
florescia a palavra mataiotes em um conflito entre o mito e a razão. Não se avançará no
conceito de ética grega, por não ser objeto deste trabalho, apenas será ressaltado que ética
para o grego está relacionada com a polis, ou seja, entende-se por ética o comportamento do
indivíduo em relação aos acordos estabelecidos entre o indivíduo e a polis. Para fins desta
pesquisa, ater-se-á apenas aos princípios cristãos sobre a ética.
A característica marcante do cristianismo sobre a ética e a moral é a virtude que se
define por nossa relação com Deus, sendo que a relação com o outro é dependente da relação
anterior; a vontade está pervertida pelo pecado82 sendo necessário o auxílio divino para se
tornar moral, entendendo-se por moral, a idéia do dever através da revelação da lei divina. O
cristianismo acrescentou ainda que o dever não está relacionado apenas às ações visíveis, mas
também, intenções invisíveis, os sentimentos83.

78
NIETZCHE, 1999. p.32.
79
Em 6 a.C.
80
A platéia interpelava os atores, cantando.
81
Cidade-Estado.
82
CHAUI, 2002. p.343.
83
Ibidem. p.344.
26

Como se viu anteriormente, em Eclesiastes, hebel não aponta para uma esfera ética e
84
moral . A neutralidade do vocábulo é necessária para a compreensão da mensagem de
Eclesiastes. A raiz moralizante do termo é encontrada na versão grega do Antigo
Testamento85. A Septuaginta traduz hebel para mataiotes, mataios, alterando o sentido de
“absurdo”, “efêmero” para “pecaminoso”. A partir desta leitura, Eclesiastes passa a tratar da
insuficiência moral do ser humano.
Assim, a Septuaginta traz para a leitura de Eclesiastes o juízo ético sobre a maldade. A
Vulgata segue a linha ética da Septuaginta e utiliza a palavra vanitas, correlata de mataiotes.
Alguns exegetas fundamentam a doutrina cristã sobre o “desprezo do mundo” a partir do Ec
1:2. Mas é importante ressaltar que a citação vanitas vanitatum et ommia vanitas – “vaidades
das vaidades tudo é vaidade”, está longe de ser uma implicação moral para o contexto de
Eclesiastes. A tradução alemã de Lutero segue a influência da Vulgata ao traduzir hebel para
eitel (vão)86. Assim, teólogos católicos e protestantes dão continuidade ao significado ético de
hebel em detrimento do sentido existencial proposto em Eclesiastes.
O sentido moral ao Eclesiastes se estabelece na opção por mataiotes, termo presente
nas tragédias gregas. Quando a Igreja Cristã traduz mataiotes para vanitas, acentua-se o
verniz moralizante. No Novo Testamento, o vocábulo está associado à arrogância e à
presunção da humanidade frente ao Criador. Agostinho afirmava que a vaidade opunha-se à
verdade, assim como ao efêmero ao duradouro, o nada ao ser87. A palavra vaidade se distancia
de hebel, principalmente, quando subtrai de sua essência a idéia de nulidade, da incapacidade
do ser de compreender o que lhe cerca.
Além do significado moral de mataiotes, há também a questão da interpretação do
Antigo Testamento, como um todo, no período pós-apostólico. O valor do Antigo
Testamento, para alguns cristãos, estava no testemunho do que fora prometido e cumprido no
Novo Testamento ou do que iria se cumprir na vida da Igreja. Não se consideravam as
condições e as particularidades em que cada texto que compunha o Antigo Testamento foi
escrito88 e Eclesiastes não fugiu a este princípio de interpretação. Assim, o sentido de
mataiotes, como degeneração do comportamento humano em relação a Deus, presente no
Novo Testamento, foi “transplantado” para o vocábulo hebel, no ato de sua tradução, uma

84
LINDEZ, 1999. p.435.
85
Ibidem. p.436.
86
LINDEZ, 1999. p.436.
87
Ibidem. p.436..
88
DYCK, 2001. p.41.
27

vez, que sob essa ótica, o Antigo Testamento tinha apenas a função de suporte para as
verdades do Novo Testamento.
O Eclesiastes é profundamente alterado quando hebel é traduzido para “vaidade”,
tradução de mataiotes. O texto perde sua clareza suscitando interpretações equivocadas como
será visto a seguir.

2.7 Hebel e “vaidade”


A adoção da palavra “vaidade” como tradução hebel impõe dificuldades na
compreensão de alguns trechos de Eclesiastes. Utilizar-se-a versões da Bíblia de Jerusalém
(BJ) e Nova Versão Internacional para apresentar três exemplos sobre essa dificuldade na
interpretação de Eclesiastes a partir do vocábulo “vaidade”.
Ec 2:15 (BJ) “[...] a sorte do insensato será também a minha; para
que então me tornei sábio? [...] Isso também é vaidade”; (NVI) “[...]
o que acontece ao tolo também me acontecerá. Que proveito eu tive
em ser sábio? [...] Isso não faz o menor sentido”.

Ec 2:21 (BJ) “Há quem trabalhe com sabedoria, conhecimento e


sucesso, e deixe sua porção a outro que não trabalhou. Isso também
é vaidade e grande desgraça”; (NVI) “Pois o homem pode realizar
seu trabalho com sabedoria e habilidade, mas terá que deixar tudo o
que possui como herança para alguém que não se esforçou por
aquilo. Isso também é um absurdo e uma grande injustiça”.

Ec 3:19 (BJ) “Pois a sorte do homem e a do animal é idêntica: como


morre um, assim morre o outro, e ambos têm o mesmo alento; o
homem não leva vantagem sobre o animal, porque tudo é vaidade”;
(NVI) “O destino do homem é o mesmo do animal; o mesmo destino
os aguarda. Assim como morre um, também o outro. Todos têm o
mesmo fôlego de vida; o homem não tem vantagem alguma sobre o
animal. Nada faz sentido”.

Nos textos anteriores, a palavra “vaidade” é substituída pela expressão ”não faz o
menor sentido” e pela palavra “absurdo”. O texto da Nova Versão Internacional procura
reconstruir o sentido existencial de hebel. A Bíblia de Jerusalém adiciona informações nos
rodapés de sua edição para auxiliar o leitor na elucidação do texto. Entretanto, sem este
auxílio, o entendimento dos textos anteriores torna-se difícil, utilizando-se apenas o
significado geral de “vaidade”. Assim, traduções que adotem o vocábulo “vaidade” sem
comentários e informações adicionais colaboram para o desvirtuamento do sentido do texto de
Eclesiastes.
28

2.8 “Vaidade”, uma tradução inadequada de hebel


Após esta primeira discussão é possível verificar que a palavra “vaidade” não é a
melhor opção para o vocábulo hebel. “Vaidade” está carregada de conceitos morais, éticos e
religiosos devido à sua origem em mataiotes. A palavra foi utilizada pelos cristãos no Antigo
Testamento, hebel, da mesma forma que no Novo Testamento, mataiotes, sem levar em conta
as particularidades do ambiente em que estavam inseridas. Não foram considerados os
aspectos históricos, sociais e teológicos de hebel, na sociedade pós-exílica.
O cerne do livro de Eclesiastes é a discussão sobre a teologia da retribuição como a
forma correta e aplicável na relação do indivíduo com Deus. Essa discussão fica ofuscada
pelo matiz moral cristã, na adoção de “vaidade”, para a tradução de hebel.
Por tradição e opção teológica tem-se mantido a palavra “vaidade” no livro do
Eclesiastes. Entretanto, se deve conscientizar que sua utilização, sem as devidas observações,
contribui para o distanciamento do leitor da Bíblia do livro de Eclesiastes, devido à
dificuldade de compreensão. Também, deve-se ressaltar que o vocábulo pode levar o leitor a
um julgamento ou a uma aplicação indevida do texto, em razão da deformidade de
significados que a palavra “vaidade” provoca.
Hebel e “vaidade” estão distantes enquanto significados teológicos, mas, se
aproximam em razão de toda a migração semântica provocada pela tradução de pelo menos
quatro línguas: hebraico, grego, latim e o português. Torna-se, então, necessário cuidado na
interpretação e no estudo do livro de Eclesiastes quando utilizamos hebel ou “vaidade”.
29

3 CONCEITO DE VAIDADE NA MÚSICA TUDO É VAIDADE


Ao se ouvir a canção Tudo é vaidade, percebe-se que o seu compositor se apropriou de
expressões típicas do livro de Eclesiastes: Tudo é vaidade, “correndo atrás do vento” e
“vaidade”. Estas expressões convivem harmoniosamente com os ditos populares “Dinheiro,
Saúde e Felicidade” e “marcha ré”. Acrescente-se ainda, uma frase da música “Palácios” do
compositor Bracanot e ter-se-a a canção Tudo é vaidade. Utilizando a intertextualidade, o
compositor mescla o texto bíblico, ditos populares, uma frase “emprestada” e reflexões sobre
o quotidiano da Igreja dando forma a um alerta, inteligente e atualizado acerca da
secularização da Igreja.
A mensagem do Eclesiastes não coadunava com o pensamento e a teologia do seu
tempo, pois apresentava aos seus ouvintes a inconsistência da existência humana. A canção
Tudo é vaidade nos remete a uma reflexão sobre os rumos que a fé cristã tem adotado no
século XX e XXI. Assim como Eclesiastes, a expressão “a morte se esconde atrás dos
templos”, produz uma sensação desagradável ao ouvinte. Seria esta expressão verdadeira?
Para responder essa pergunta, e verificar as relações com o livro de Eclesiastes, esta canção
será examinada a seguir com mais cuidado.

3.1 Compositor – Biografia


A letra e a melodia da música Tudo é vaidade foram compostas por João Alexandre
Silveira, nascido em Campinas, São Paulo, em 29/09/1964. Intérprete, compositor, arranjador
e instrumentista, João Alexandre89 atuou na década de 80 do século passado, com o grupo
Pescador90, no Long Play “Contraste” no estilo do grupo vocal “Boca Livre”91.
Posteriormente, participou do grupo Ministério de Louvor e Adoração (MILAD). Produziu e
arranjou músicas para produtoras evangélicas.
Como arranjador e produtor, seu trabalho é reconhecido por músicos do segmento
evangélico e também da Música Popular Brasileira (MPB). Em parceria com Luciano Garruti
escreveu o livreto Músico, Profissão ou Ministério, direcionado a líderes e músicos
evangélicos, abordando o papel do músico no mercado de trabalho e na Igreja. Atualmente,
João Alexandre é membro da Primeira Igreja Presbiteriana Independente de Campinas92.

89
SILVEIRA, 2006. s/n.
90
Grupo vocal e instrumental evangélico formado na década de 80, do século passado, por Davi Kerr, João
Alexandre, Luciano Garruti, Rogério L. Boccato e Rosa M. Gomes.
91
Grupo vocal e instrumental formado em 1978 por Maurício Maestro, Zé Renato, Cláudio Nucci e David Tygel.
Cf. dicionariompb.
92
AGITO, 2006. s/n.
30

Tudo é Vaidade
1 Vaidade no comprimento da saia, no cumprimento da Lei.
2 Vaidade exigindo prosperidade, por ser o filho do Rei.
3 Vaidade se achando a Igreja da História, vaidade Pentecostal.
4 Vivendo e correndo atrás do vento, Tudo é Vaidade!

5 Vaidade juntando a fé e a vergonha, chamando todos de irmãos.


6 Vaidade de quem esconde a Verdade, por ter um povo nas mãos
7 Vaidade buscando Deus em si mesmo, querendo fugir da Cruz
8 Não crendo e sofrendo, perdendo tempo, Tudo é Vaidade!

9 Falsos chamados, apostolados, do lado oposto da fé.


10 Dinheiro, saúde, felicidade... Aquele que tem contra aquele que é
11 Rádios, TV’s, auditórios lotados, ouvindo o Evangelho da
marcha ré.
12 A morte se esconde atrás dos templos. Tudo é Vaidade!

13 Aonde está a honra dos orgulhosos, a sabedoria mora com gente


humilde ... Liberdade93.

3.2 Análise musical


A melodia da canção Tudo é vaidade é composta no modo de Lá mixolídio94. Sua
duração é três minutos e dezesseis segundos (03 min.16 seg.). O compasso utilizado é o
quaternário. A forma musical adotada para a melodia é a binária (duas partes): a parte “A” é
repetida duas vezes, dos versos um ao quatro e cinco a oito com a alternância de texto; a parte
“B” inicia no verso nove e termina no verso doze. O compositor adiciona um trecho da
melodia de Pedro Braconot para finalizar sua composição.
A linha melódica desta canção é funcional, servindo de apoio ao canto do texto,
subordinada à métrica das palavras. Mantendo uma nota por sílaba95, a melodia prioriza a
clareza e a compreensão do texto pelo ouvinte. O acompanhamento da melodia, na gravação,
96
é feito apenas por um violão. Outro aspecto presente nesta canção é o uso de síncopes ,
próprias de composições de músicas populares brasileiras.
Como o objeto deste trabalho não é a análise musical profunda da melodia, e, sim, do
seu texto, não se estenderá este tópico. Porém, para aqueles que o desejarem, encontrarão a
transcrição desta melodia no anexo.

93
Trecho da música Palácios, adaptação bíblica de Pedro Braconot Machado, gravada pelo grupo Rebanhão.
94
O conjunto de notas utilizadas na composição não pertence às tonalidades de Lá maior ou Lá menor.
95
Exceto alguns ornamentos (notas com o objetivo de embelezar a melodia) utilizados pelo intérprete.
96
É um som articulado sobre o tempo ou parte fraca que produz o deslocamento das acentuações naturais das
notas.
31

3.3 Análise geral do texto


O texto é construído sob uma métrica de versos de 18 sílabas, seguidos de um verso de
16 sílabas. O excerto de Braconot possui métrica de 20 sílabas. Esta regularidade proporciona
um ritmo agradável para os versos desta canção.
O compositor explora as significações das palavras e figuras de linguagem no decorrer
do texto. Seguem alguns exemplos: Na construção da frase “comprimento da saia, no
cumprimento da Lei” ele se utiliza da paronímia97, produzindo assim, continuidade sonora no
verso; na expressão “o filho do Rei” e “marcha ré” há metáforas presentes, e em “juntando a
fé a vergonha”, encontra-se paradoxo. A palavra “Vaidade” transita entre alguns significados:
vanglória, futilidade e absurdo.
O sentido deste texto é construído sobre a seguinte oposição: “Valores da Igreja”
versus “sabedoria mora com gente humilde”, esta expressão funciona como uma antítese de
todo o texto. Os “Valores da Igreja” são antecipadamente reduzidos à nulidade pela palavra
“Vaidade”. Sem a expressão “sabedoria mora com gente humilde” o texto Tudo é vaidade
soaria como um lamento cético sobre o caminhar da Igreja brasileira. A Igreja, como sujeito
do discurso, assume posturas que contrariam a sabedoria dos humildes: “exigir por ser”; “se
achar”; “juntar o que não se pode”; “esconder o que não se deve”; “buscar, fugindo”; “ter é
não querer ser”; “ouvir e regredir”. Da categoria de “filhos do Rei” e “Igreja da História”, o
sujeito “Igreja” é reduzido àqueles que ouvem uma espécie de anti-evangelho. A vida só é
possível quando se ouve o verdadeiro evangelho Jo 3:16 “Para que todo aquele que nele crê
não pereça, mas tenha a vida eterna”. Quanto ao anti-evangelho, o prêmio é a morte.

3.4 Análise teológica do texto


Os versos um e três retratam a posição adotada pelas igrejas pentecostais: “Vaidade no
comprimento da saia, no cumprimento da lei”, “Vaidade se achando a Igreja da História,
vaidade Pentecostal”. O movimento pentecostal iniciou-se no Brasil em 1910 com as Igrejas
Assembléia de Deus em Belém do Pará, e com a Congregação Cristã do Brasil na cidade de
São Paulo em 191198. A interpretação da doutrina dos dons do Espírito Santo e o moralismo
rigorista são suas características principais. O movimento, devido à sua postura anti-
ecumênica, reduziu o diálogo com as igrejas históricas99. O compositor interpreta que tais
posturas tornaram-se “objetos de vanglória” dessas instituições.

97
Palavras de significados diferentes, mas com som e escrita semelhantes.
98
OLIVEIRA, 2006. p. 49.
99
REILY, 1982. p. 379.
32

O verso dois é uma crítica à teologia da prosperidade, presentes nas igrejas neo-
pentecostais, advinda da teologia da retribuição: “Vaidade exigindo prosperidade por ser o
filho do Rei”. O comportamento desses cristãos lembra a personagem da parábola do filho
pródigo: Lc 15:12 “E o mais moço deles disse ao pai: Pai, dá-me a parte da fazenda que me
pertence. E ele repartiu por eles a fazenda”.
Estas igrejas iniciaram suas atividades nas décadas de 50 e 60, a partir do movimento
de cura divina, trazido por missionários norte-americanos. Com o crescimento deste
movimento, ocorreram cisões nas primeiras igrejas pentecostais, surgindo as neopentecostais
como Igreja Evangélica Pentecostal Deus é Amor, em 1961 e a Igreja Universal do Reino de
Deus (IURD)100.
A teologia da retribuição firma-se na lógica mecanicista de causa e efeito, em que as
ações do mundo humano são prontamente respondidas pela intervenção do sagrado101. A
teologia da prosperidade apoia-se no sucesso, na saúde física e emocional e na posse de bens
como resultados visíveis e comprobatórios de uma fé viva em Deus102. A frase “Vivendo e
correndo atrás do vento” demonstra a inutilidade dessas opções. A corrida pelas “bênçãos”
acaba não levando a lugar algum. Apropriando-se da expressão Tudo é vaidade, o compositor
denuncia esses comportamentos.
Os versos cinco, “Vaidade juntando a fé e vergonha, chamando todos de irmãos”, seis
“Vaidade de quem esconde a Verdade, por ter o povo nas mãos” e, sete, “Vaidade buscando
Deus em si mesmo, querendo fugir da Cruz” chamam a atenção para os líderes e membros
que não assumem os valores cristãos, que os diferenciariam da sociedade. Tendo o sucesso
pessoal como a base do relacionamento com Deus, a teologia da prosperidade não lida com a
formação do caráter, a construção ética da responsabilidade pelo outro ou com a pedagogia da
esperança103. Assim, expressão Tudo é vaidade, no verso oito, assume o significado de
futilidade.
O verso nove, “Falsos, chamados, apostolados, do lado oposto da fé”, denuncia os
pregadores do anti-evangelho. O verso dez, “Dinheiro, saúde, felicidade... Aquele que tem
contra aquele que é”, e, o onze, “Rádios, TV`s, auditórios lotados, ouvindo o Evangelho da
marcha ré” retratam os líderes de igrejas que fazem a opção por um evangelho que atraia
número cada vez maior de fiéis, não pela mensagem da cruz ou pelos valores cristãos, mas
pela oferta de uma prosperidade financeira imediata e leviana, através da mídia e do

100
OLIVEIRA, 2006. p. 47.
101
Ibidem. p. 14.
102
Ibidem. p. 44.
103
Ibidem. p. 44.
33

simbolismo104. Ante este quadro, ocorre, então, o que se denomina de deslocamento da


esperança escatológica para o presente105. Ou seja, o que notoriamente era esperado para o
porvir, pela Igreja de Cristo de acordo com Ap 21:4 “E Deus limpará de seus olhos toda a
lágrima; e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor; porque já as primeiras
coisas são passadas” deve ser desfrutado imediatamente. Gondim considera que o crescimento
de algumas igrejas deve-se mais a fenômenos sociais do que a uma ação legítima do Espírito
Santo106. Para estas igrejas, a fé já está morta. Afinal, o anti-evangelho só pode produzir o
oposto da vida, ou seja, a morte. Neste momento, a expressão Tudo é vaidade assume o
sentido de loucura, absurdo.
O compositor encerra a música utilizando um trecho de uma canção de Braconot
“Aonde está à honra dos orgulhosos, a sabedoria mora com gente humilde... Liberdade”. Este
trecho confronta as instituições que se encontram na contramão do evangelho. “A sabedoria
mora com gente humilde”, esta frase se harmoniza com Lc 1:52, “Depôs dos tronos os
poderosos, E elevou os humildes” e Rm 12:16 “Sedes unânimes entre vós; não ambicioneis
coisas altas, mas acomodai-vos às humildes; não sejais sábios em vós mesmos”.
Assim, Tudo é vaidade é uma reflexão sobre a opção de um segmento da Igreja
brasileira por uma teologia que privilegia o “externo”, o “palpável” e o “imediato”. Tal
escolha distancia as comunidades cristãs evangélicas da proposta salvífica do evangelho.

104
OLIVEIRA, 2006. p.144.
105
Ibidem. p.55.
106
RODRIGUES, 2000. p.19.
34

4 COÉLET E JOÃO ALEXANDRE


O uso recorrente da palavra “vaidade”, nas expressões “tudo é vaidade” e “correr atrás
do vento” presentes na canção do compositor João Alexandre e no Eclesiastes suscita
comparação entre estes textos.
Ricouer considera que um texto possui significado em si mesmo, concebido de modo
dinâmico pela direção do pensamento aberta pelo texto107. De acordo com essa afirmação, é
possível iniciar a análise e propor algumas respostas às perguntas: O que é religião para
Coélet e João Alexandre, segundo os textos avaliados? O compositor se apropriou das
expressões de Coélet ou assimilou o seu método de exposição? A partir da canção de João
Alexandre é possível atualizar a leitura de Eclesiastes? A resposta para tais perguntas se dará
apenas pelo exame desses textos108.

4.1 A religião segundo Coélet e João Alexandre


Em Ec 5:1-7, Coélet trata da religiosidade de seu povo.
Guarda o teu pé, quando entrares na casa de Deus; porque chegar-se
para ouvir é melhor do que oferecer sacrifícios [...]. Não te precipites
com a tua boca, nem o teu coração se apresse a pronunciar palavra
alguma diante de Deus; [...] Porque, da muita ocupação vêm os
sonhos, e a voz do tolo da multidão das palavras. Quando a Deus
fizeres algum voto, não tardes em cumpri-lo; [...] o que votares,
paga-o. Melhor é que não votes do que votares e não cumprires. Não
consintas que a tua boca faça pecar a tua carne, [...] Porque, como na
multidão dos sonhos há vaidades, assim também nas muitas
palavras; mas tu teme a Deus.

No texto acima, pode-se extrair alguns princípios que Coélet considera importante
para a relação do seu povo com Deus: guarda o teu pé; ouvir é melhor que sacrificar; não se
precipite e fale moderadamente; ao prometer, cumpra; muitos sonhos (projetos, desejos)
levam ao “vazio”; teme a Deus. A religião, para Coélet, não se baseia apenas no ritual de
sacrifícios. Sua mensagem encontra-se em conformidade com os profetas: Mq 6:7 “Agradar-
se-a o Senhor de milhares de carneiros, ou de dez mil ribeiros de azeite? [...]”, Am 5:22 “E
ainda que me ofereçais holocaustos, ofertas de alimentos, não me agradarei delas [...]” e Os
6:6 “Porque eu quero a misericórdia, e não o sacrifício; e o conhecimento de Deus, mais do
que os holocaustos”. Coélet entende que as más intenções e a falta de temor do povo
invalidavam os holocaustos. Em Mt 5:24, Jesus declara que uma oferta só poderia ser
apresentada se primeiro, o ofertante reconcilia-se com o irmão ofendido “Deixa ali diante do

107
RICOEUR, 2000. p.24.
108
O Compositor não foi consultado sobre os comentários e conclusões deste trabalho.
35

altar a tua oferta, e vai reconciliar-te primeiro com teu irmão e, depois, vem e apresenta a tua
oferta”. Quanto ao juramento, adverte: Mt 5:34 e 37 “Eu, porém, vos digo que de maneira
nenhuma jureis; nem pelo céu, porque é o trono de Deus; [...] Seja, porém, o vosso falar: Sim,
sim; Não, não; porque o que passa disto é de procedência maligna”. O ato, em si, não tem
valor quando não há coração contrito. O texto de Tg 4:3 declara que o ser humano não sabe
pedir: “Pedis, e não recebeis, porque pedis mal, para o gastardes em vossos deleites”. Os
muitos projetos e sonhos do ser humano o impulsionam a “correr atrás do vento”, a buscar o
vazio. A frase “teme a Deus” é a síntese da verdadeira religião para Coélet. Sua crença está
apoiada nos escritos dos profetas e posteriormente ratificada no Novo Testamento.
Na canção Tudo é vaidade, João Alexandre considera que os usos e costumes, a busca
desenfreada pela prosperidade, a falta de identidade cristã, as lideranças egocêntricas, as
fórmulas de felicidade e os movimentos de crescimento da Igreja desconectados do evangelho
não representam um cristianismo legítimo. O contexto religioso retratado por João Alexandre
apresenta cristãos preocupados com o externo, o aparente e que buscam a Deus para atender
seus próprios interesses.
Como foi visto, a sociedade de Coélet se distanciava de Deus, através do legalismo e
da visão equivocada da retribuição divina. Os cristãos, descritos por João Alexandre,
assemelham-se a tal sociedade, por alterarem os valores que deveriam guiá-los à relação
permanente com Deus. Coélet e João Alexandre denunciam pessoas, que mesmo inseridas em
um contexto religioso encontram-se afastadas de Deus. Os ritos, por serem palpáveis e
visíveis, substituem o “temor do Senhor”. A religião secularizada distancia o ser humano de
Deus e seus frutos são a hipocrisia e a ilusão de manipular o divino.

4.1.1 Distanciamentos de Coélet e João Alexandre


A canção Tudo é vaidade se atém a discutir os valores da Igreja cristã, prendendo-se às
questões religiosas. Coélet vai além da religião formal. Ao encerrar todas as obras “debaixo
do sol” como hebel, nulidade, Coélet expande esse conceito à existência humana. Os fatos que
impulsionam o sucesso e o fracasso das pessoas, suas relações com a justiça, seus deveres
com o outro e as razões de seu empenho são inquiridos, assim como o coração daquele que se
dirige ao templo. Coélet não restringe Deus ao templo. Ele observa os juízos divinos em todas
as ações e atitudes de homens e mulheres.
36

Os discursos de sabedoria não ensinam como evitar o sofrimento, mas, ensinam como
sofrê-lo, colocando o sofrimento em um contexto significativo109. Coélet após investigar as
obras humanas não apresenta forma de evitar o sofrimento e o cansaço, mas aponta o “temor
do Senhor” como a âncora para suportar os reveses da existência humana.
Tudo é vaidade indica a sabedoria, proveniente da humildade, como a resposta aos
desvios denunciados. No Novo Testamento, sabedoria é dom concedido por Deus aos fiéis
que lhe pedem, Tg 1:5, 3:17.
E, se algum de vós tem falta de sabedoria, peça-a a Deus, que a
todos dá liberalmente [...]. Mas a sabedoria que do alto vem é,
primeiramente pura, depois pacífica, moderada, tratável, cheia de
misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade, e sem hipocrisia.

A sabedoria descrita em Tiago contradiz as ações e valores citados em Tudo é vaidade.


O texto de Coélet e de João Alexandre se aproxima quando denunciam o desvirtuamento de
valores que ancoram a relação de homens e mulheres com Deus, mas, se distanciam na
abrangência dessa abordagem. Coélet trata da sociedade de seu tempo e João Alexandre
retrata o perfil de algumas comunidades cristãs.

4.2 “Vaidade” para Coélet e João Alexandre


No decorrer da canção Tudo é vaidade, a palavra “vaidade” migra de significados. O
deslocamento semântico inicia-se com o sentido de vanglória, em seguida, presunção e,
finalmente, loucura ou absurdo. A presença da palavra “vaidade” nos oito primeiros versos
confere-lhes o efeito de ostinato110 ritmico-melódico, dentro da alternância de significados.
Em Eclesiastes hebel é emblemático, assume a significação de “vazio”, “absurdo”
permanecendo e ecoando este significado durante toda a exposição do texto, pois, ao final,
tudo se resume ao “vazio”, a inconsistência das ações humanas.
Vaidade, enquanto vanglória e presunção, não está presente em Eclesiastes, mas,
absurdo e loucura encontra espaço nas observações de Coélet. A canção se aproxima de
Eclesiastes na expressão “não crendo e sofrendo, perdendo tempo”. Perder tempo na busca do
que é inconsistente é um tema desenvolvido em Ec 4:8.
Há um que é só, e não tem ninguém, [...] e, contudo não cessa do seu
trabalho, e também seus olhos não se satisfazem com riqueza; [...]
Para quem trabalho eu, [...]? Também isto é vaidade e enfadonha
ocupação.

109
RICOEUR, 2000. p.80.
110
Do italiano “teimoso”. Frase musical persistente, repetida tornando um padrão rítmico.
37

4.3 João Alexandre e as expressões e o método de Coélet


As expressões e o método de Coélet conferem ao Eclesiastes grande complexidade em
sua análise. Williams recomenda procurar metáforas orientadoras e tomar nota quando estas
emergirem como padrão temático111 devido à forma de construção do texto. Líndez não
classifica Coélet entre os afins do espírito grego, mesmo com a presença de elementos da
retórica em sua composição, mas Coélet comporta-se como um observador da realidade
humana112. Raurell destaca que Coélet se utiliza, do que ele denomina, de método da
provocação. Ocorrendo 25 vezes no Eclesiastes113, Coélet problematiza as contradições
enfrentadas pela sociedade de sua época e renuncia à forma exortativa, adotando a imperativa:
andar, comer, beber e gozar. Assim, muitas de suas afirmações são de caráter provocativo-
didático114.
Em Tudo é vaidade, são encontradas expressões características de Eclesiastes.
Entretanto, não se vê o método da provocação, defendido por Raurell. Tudo é vaidade é
expositiva e denunciativa. Porém, o conteúdo teológico da canção se harmoniza com Ec 5:1-
7.

4.4 Atualização da leitura de Eclesiastes a partir de Tudo é vaidade


Devido ao contexto abordado em Tudo é vaidade, é possível afirmar que esta canção é
uma leitura atualizada de Ec 5:1-7. Mosconi entende por hermenêutica115 à atualização da
leitura do texto bíblico116. Esta atualização deve seguir alguns critérios para se caracterizar
como hermenêutica adequada e consistente.
A hermenêutica de Ec 5:1-7, presente em Tudo é vaidade, leva em consideração a
realidade interpelada117. O principal aspecto, identificado por João Alexandre, é a mudança
dos valores cristãos, a fuga da cruz. O texto de Ec 5:1-7 revela a inutilidade dos ritos ante a
secularização da religião. Tudo é vaidade, iluminada118 por essa revelação, apresenta a
inutilidade das ações de cristãos que procuram “Deus em si mesmo”. Frente a esses fatos,
Tudo é vaidade propõe uma “conversão existencial”119, ou seja, o retorno à “sabedoria que

111
WILLIAMS, 1997. p.299.
112
LINDEZ, 1999. p.437.
113
RAURELL, 1992. p.315.
114
Ibidem. p.319.
115
O termo hermenêutica provém do verbo grego hermēneuein e significa: declarar, anunciar, interpretar,
esclarecer e traduzir e é utilizado aqui no sentido de prática interpretativa.
116
MOSCONI, 1997. p.108.
117
Ibidem. p.147.
118
Ibidem. p.151.
119
Ibidem. p.152
38

mora com gente humilde”. O fim da atualização dessa leitura conduz, ao que Mosconi
denomina de conversão ética120. Assim, o ouvinte é convidado a uma nova prática, uma práxis
cristã.
Tudo é vaidade atende aos quesitos enunciados por Mosconi: levar em conta a
realidade, acolher a palavra de Deus, a conversão existencial e a conversão ética. Logo, Tudo
é vaidade cumpre seu papel hermenêutico expandindo e atualizando a mensagem de Coélet.
Como foi visto, a religião para Coélet e João Alexandre está distante do formalismo. O
ato de servir a Deus não pode ser avaliado pelas ações superficiais e aparentes do ser humano.
É esperado algo mais desta relação como em Mt 5:20 “Porque vos digo que, se a vossa justiça
não exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus”. O
formalismo e a secularização não permitem o religare.
As expressões de Coélet se misturam ao método de exposição. Tudo é vaidade mesmo
não se apropriando do método, expressa os valores de Ec 5:1-7, além de fazer uma releitura e
uma aplicação para o cotidiano da Igreja.

120
MOSCONI, 1997. p.154.
39

CONCLUSÃO

A relevância desta pesquisa justifica-se pelo fato da interpretação do texto bíblico,


antes delegada aos líderes eclesiásticos, também ser exercida por compositores e intérpretes
cristãos. Cabe ao teólogo atenção quanto às similaridades e as diferenças entre sua
interpretação e as interpretações do texto bíblico contidas nas canções ouvidas pela Igreja.
O objetivo desta pesquisa era verificar a relação dos textos de Eclesiastes e da canção
Tudo é vaidade. A linha condutora se baseou na compreensão do vocábulo “vaidade” e sua
aplicação em Eclesiastes. Foi observado que o sentido de hebel em Eclesiastes é existencial, o
que difere em parte da proposta teológica de Tudo é vaidade. Porém, quando Eclesiastes
tratava da religião de seu povo, Tudo é vaidade se aproxima e torna-se uma leitura atualizada.
Viu-se nos capítulos anteriores que o vocábulo “vaidade”, presente no livro de
Eclesiastes, é resultado do deslocamento de significações do hebraico, grego e latim,
proveniente da tradução de hebel. No decorrer deste processo agregaram-se sentidos que
contribuíram para sua formação. Entretanto, tais agregações distorceram e dificultaram a
compreensão do texto de Eclesiastes. A palavra “vaidade” não é a melhor tradução de hebel,
pois insere um conceito moral, que não está presente em Eclesiastes e ofusca a discussão
sobre a relação do indivíduo com Deus.
A composição Tudo é vaidade, como exemplo de hermenêutica a partir de
composições musicais, denuncia a troca de valores ético-religiosos por parte de segmentos da
Igreja protestante brasileira. Utilizando-se das expressões de Eclesiastes, João Alexandre
envia um alerta a essa Igreja.
Em Ec 5:1-7 vimos que o culto sem o temor do Senhor é nulo, não passando de uma
religião formal e secular. Ocorre nesse trecho então, a aproximação de Eclesiastes e da canção
Tudo é vaidade. O ambiente religioso, descrito em Eclesiastes, assemelha-se as ações
cotidianas de segmentos da Igreja protestante brasileira, abordadas em Tudo é vaidade.
Devido às limitações deste trabalho não foi possível avaliar todos os temas teológicos
presentes em Eclesiastes como a expressão “debaixo do sol”, as reflexões sobre a morte e os
provérbios121 de Coélet. Para se compreender o mundo de Coélet é necessário abordagem de
todos estes aspectos. Também não foi possível um olhar mais profundo sobre a hinologia
praticada na Igreja protestante e suas conseqüências na interpretação do texto bíblico e a
história da arte no processo interpretativo das Escrituras.

121
WILLIANS, 1997. p. 299.
40

Muitos caminhos se descortinam. Através de CD’s, da Internet e das emissoras de


rádio e TV, mensagens provenientes de canções evangélicas chegam aos lares cristãos. O
desafio dos teólogos é: avaliar, orientar, aprender e corrigir tais interpretações validando-as
junto a Igreja. Prosseguir no estudo das relações entre as composições musicais e a
hermenêutica é desafiador, envolvente e proveitoso para a saúde espiritual da Igreja.

Tu, porém, permanece naquilo que aprendeste, e de que


foste inteirado, sabendo de quem o tens aprendido, e que
desde a tua meninice sabes as sagradas Escrituras, que
podem fazer-te sábio para a salvação, pela fé que há em
Cristo Jesus. 2Tm 3:14-15
41

ANEXO
42

BIBLIOGRAFIA

AGITO Gospel. Disponível em:


<http://www.wgo.com.br/~juniorns/reportagens/entrevistas/joao_alexandre_aleluia/joao_al...
> Acesso em: 13 dez. 2006.

BARROS, Diana Luz Pessoa. Teoria Semiótica do Texto. São Paulo: Ática, 2002.

BÍBLIA. Português. A Bíblia Sagrada. Edição Revista e Atualizada. São Paulo: Imprensa
Batista Regular, 1987.

BÍBLIA. Português. A Bíblia Sagrada. Edição Corrigida e Revisada Fiel. São Paulo:
Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil, 1995.

BIBLE. Bible Works 6.0.2003. CD-ROM.

CASTRO, Padre Juarez de. Pecados Capitais. Disponível em:


<http://www.padrejuarez.com.br/temas_pecados_capitais_defincao.htm> Acesso em: 05 jan.
2007.

CATECISMO da Igreja Católica – Compêndio. Disponível em:


<http://www.vatican.va/archive/compendium_ccc/documents/archive_2005_compendium-
ccc_po.html#top> Acesso em: 17. jan. 2007.

CHAUI, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2002.

CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico Nova Fronteira da Língua portuguesa.
2.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.

DIC Prático Michaelis. São Paulo: DTS Software Brasil, 1998. CD-ROM.

DICIONARIOMPB. Boca Livre. Disponível em:


<http://www.dicionariompb.com.br/verbete.asp?tabela=T_FORM_E&nome=Boca+Livre>
Acesso em: 26 dez. 2006.

DYCK, Elmer. O cânon como contexto para interpretação. In: PETERSON, Eugene et al.
Ouvindo a Deus: Uma abordagem multidisciplinar da leitura a Bíblia. São Paulo: Shedd
Publicações, 2001.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio básico da Língua Portuguesa.


Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.

FERNÁNDEZ, Victor M. El valor de la vida presente em Qohelet. Revista Bíblica 52, Nueva
Epoca, n.38, 1990. p. 99–113.

FESTORAZZI, Franco. Jó e Coélet: crise da sabedoria. In: FABRIS, Rinaldo (org.)


Problemas e Perspectivas das Ciências Bíblicas. São Paulo: Loyola, 1993.

FISCHER, James A. Eclesiastes. in: BERGANT, Diane; KARRIS, Robert J. (org).


Comentário Bíblico. 2. ed. São Paulo: Loyola, 1999. v.2.
43

FRYE, Northrop. O código dos códigos: A Bíblia e a literatura. São Paulo: Boitempo, 2004.

GASS, Ildo Bohn. O trabalho como ideal: o projeto de Eclesiastes. Estudos Bíblicos, n 49,
Petrópolis: Vozes, 1996. p. 22–27.

GALAZZI, Ana Maria; GALAZZI, Sandro. Coélet e a ironia – uma forma de sabedoria e
resistência. Estudos Bíblicos, n. 68, Petrópolis: Vozes, 2000. p. 63–70.

GRANDE dicionário. Grande dicionário Larousse cultural Língua Portuguesa. São Paulo:
Nova Cultural, 1999.

GUTIÉRREZ, Jorge Luís Rodrigues. A lei, a fadiga e o vazio no livro de Eclesiastes. Estudos
Bíblicos, n. 51, Petrópolis: Vozes, 1996. p. 32 - 43.

HARRIS, R. Laird; ARCHER, Jr. Gleason; WALTKE Bruce K. Dicionário internacional de


teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1998.

HALLEY, Henry H. Manual Bíblico: Um comentário abreviado da Bíblia. São Paulo: Vida
Nova, 1993.

HENDRY, G. S. Eclesiastes ou pregador. In: DAVIDSON F. O novo comentário da Bíblia.


São Paulo: Vida Nova, 1990.

HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss Língua Portuguesa. Rio
de Janeiro: Objetiva, 2001.

LAUAND, Jean. S. Tomás de Aquino e os Pecados Capitais. Disponível em:


<http://www.hottopos.com/notland10/jean.htm> Acesso em: 05 jan. 207.

LINDEZ, José Vilchez. Eclesiastes ou Qohélet. São Paulo: Paulus, 1999.

MILES, Jack. Deus. A Biografia. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.

MOSCONI, Luis. Para uma leitura fiel da Bíblia. São Paulo, 1997.

NELSON, Thomas. Manual Bíblico de mapas e gráficos. São Paulo: Cultura Cristã, 2003.

NIETZCHE, Friedrich. Obras incompletas. Nietzche O nascimento da Tragédia no espírito da


música. Coleção Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1999.

OLIVEIRA, Marcelo Rodrigues de. Retribuição e prosperidade: gênese, percurso histórico e


confronto com a gratuidade. 2006. 148f. Dissertação (Mestrado em Teologia). Faculdade
Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE), Belo Horizonte.

KLEIN, Carlos Jeremias. Coélet e a Felicidade. Estudos Bíblicos, n. 53, Petrópolis, 1997.
p.59– 65.

RAURELL, Frederic. Dimensión ético-pedagógica de provocacion en el Qohélet. Selecciones


de Teologia, 35. 1996. p. 315– 323.
44

RAVASI, Gianfranco. Coélet. São Paulo: Edições Paulinas, 1993.

REILY, Duncan Alexander. História documental do protestantismo no Brasil. São Paulo:


ASTE, 1982.

RICOEUR, Paul. Ensaios sobre a Interpretação Bíblica. São Paulo: Novo Século, 2004.

RODRIGUES, Ricardo Gondim. Orgulho de ser evangélico: por que continuar na Igreja.
Viçosa: Ultimato, 2000.

SARAIVA, F. R. dos Santos. Novissimo diccionario Latino-portuguez: Etymologico,


Prosodico, Historico Geographico, Mythologico. 9. ed. Rio de Janeiro: Garnier, 1927.

SILVEIRA, J. A. Eu Tirza e Felipe. Disponível em: <http:www.


Joãoalexandre.com.br/joao2.htm> Acesso em 03 nov. 2006.

SILVEIRA, João Alexandre. Voz, Violão e algo mais: Tudo é vaidade. São Paulo, 2000. CD-
ROM

TAMEZ, Elsa Luna. La fe em tiempos de sequia mesiánica: para meditar sobre el Eclesiastés.
In: Vida y pensamiento, v. 15, San José, 1995. p. 50–56.

TIEDTKE, Erich. “Mataios” in COENEN, Lothar. BROWN, Colin. Dicionário Internacional


de Teologia do Novo Testamento. 2. ed. São Paulo: Edições Vida Nova, 2000.

WILLIANS, James G. Texto de Provérbios e Eclesiastes. In: ALTER, Robert; KERMODE,


Frank. Guia Literário da Bíblia. São Paulo: UNESP, 1997.

Potrebbero piacerti anche