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Canto I Conto d José Luis Peixoto ‘As armas e 0s bardes assinalados, etc? Calma, calma. Mais devagar. Sem tempo, a ideias nao querem aparecer. De certeza absoluta que o poeta conhecia esta verdade simples. As pala- vas do seu. transportamn muito tempo, muita histéria ce muitas histérias, Talves fosse por isso que o poeta se dava com gente entendida no tamanho do tempo: reise Imagine-se. acrevo sobre aquilo que 0 poeta escreveu e, ao fazé-lo, escrevo sobre um ascunto de completa diferenga, outro assunto mesma. Se as sao um reflexo, as minhas sio reflexo de um reflexo ea sua imprecisao é garantida, ‘Talvez por isso, creio-me capaz de pedir inspiragdo com a mesma forca as ninfas do Tejo. Imagino-as diferentes, aposto, Dou-lhes rostos diferentes, outras caras, outros descaramentos, mas rogo-Thes com 0 ‘mesmo fervor pela mesma habilidade grandfloqua e corrente Nao estou ainda no passado, estou na crueza deste aqui. Tudo é& concreto & minha volta. Enquanto que a voz do poeta se fixou na solene perfeicao decassilébica, a minha voz gasta-se na indecisio da garganta, cespécie de adolescéncia perpétua, mudanca ridicula de voz, gravee aguda, ‘grave e cana rachada ‘Nao procuro desculpas, . Procuro adjectivos. Na minha condigio, sigo o poeta. Iré sempre faltar-me sé-lo. Entre mim e ele, a distancia. , no entanto, por vezes e talvex por acidente, também nos aproxi- ‘Nada é apenas uma coisa, nem sequer o nimero um, o canto um, a estancia um. As armas e os bares assinalados, take dois. ‘Tagides do Tejo, ninfas da ninfetice total, apesar de mais velhas, ‘mais madras, emprestema-me ainda umm resto do vosso ninfetismo para espalhar um pouco mais, mesmo que nao seja por toda a parte, os feitos daqueles portugueses que navegaram por oceanos inéditos e, também, o valor daqueles reis desse mesmo Portugal, qne.o fizeram sinénimo de f€ eo esticaram pelo mundo. E que, pelo menos, nao se fiquea pensar que T'aprobana énome de avé antiga: Dona Taprobana, Ti Maria Taprobana. Nao. Antes que ‘sejam sugeridos outros delirios, é importante que fique assente: Tapro- bana era o antigo nome da ilhia de Ceilao, metaforicamente signifi- ‘cava o fim do mundo. Para explicago mais detalhada, é favor consultar internet. ‘Aqueles de quem o poema épico fala, aqueles que espero ser capaz de referir também nas linhas que se seguem, passaram ainda além da ‘Taprobana, Se apenas mostrasse modéstia, a realidade seria desproporcional. Hoje, ao escrever estas palavras, ha uma colecgao de assuntos que ‘domino com mais seguranca do que o préprio poeta. Tenho a vantagem do 6 -revo sobre aquilo que o poeta esereveu e, ao fazé-lo, escrevo sobre um assunto de completa diferenga, outro assunto mesmo. tempo que passou. Esse é 0 caso das referéncias a Dom Sebastiao (Lisboa, 20 de Janeiro de 1554 - Alcacer-Quibir, 4 de Agosto de 1578). [Nao possuo os detalhes do seu tltimo dia, mas avalio que a dedicatéria do poeta, VErSOS © VERSOS, se revelou exagerada em muitos dos atributos que Ihe reconhece. A confessa incapacidade de canté-lo atra~ vés da sua poesia inflagto do monarca e deficit do poeta Nos jomais de hoje, jase sabe o resultado dos arremedos do rei. Qentu- siasmo de sua majestade trouxe uma dinastia de magoa. Nesse conhe- ‘imento, ndo posso garantir que o poeta continuasse a dedicar-Ihe uma obra tao importante. Ou talves sim. Ou talvez nao houvesse outro nos séculos deste pais ‘que mais 0 merecesse. Creio que era um dia normal para os euses. 0 Olimpo estava pleno de luz, mas qual era a sua forma? Talvez ‘os deuses se movessem apenas na uz, talvez o chao fosse uma espécie de neblina luminosa, Nesse caso, ébem provavel que o Olimpo fosse o lugar dos sonhos. Tanto dos nocturnos, como das ihisdes em vila. Apesar da sua originalidade, esse também é um lugar dos mamiferos humanos. ‘Sem psicologia, a biologia é botanica. Imagino Japiter de barba, cabelo de caraccis largos, tronco nu. Imagino ACO coma cara limpa, coroa de parras e cachos de uvas, corpo redondo ¢ flcido. As naus da armada de Vasco da Gama ndo eram pequenas. Mas 0 mar era ‘imenso, mas o céu era infinito. Imagino V En U8 com feigdes miidas, tio linda, o tom certo de pai- dez,cabelos longos e brilhantes. Imagino Miavte com mésculos eficazes e rostoligeiramente triste. ‘Como numa reunigo de condominio ou num conselho de ministros, LJapiter langou-se num longo discurso que jé trazia preparado de casa Percebia-se que tinha gosto em ouvir-se a si préprio. Nel, elogiou os mavegadores portugueses, dando aprego aos seus trabalhos, & sia sobrevivencia, defendendo a sua defesa, protegendo a sua protecsa0. aco, brio, tinha uma perspectiva diferente prontaa ser comunicada. Proprietario de uma certa fama no oriente, temia que os portugueses 20 chegarem i pudessem roubar-Iha, deixando-Ihe apenas o amargo esque- cimento, Cabe a cada um cuidar daquilo que é seu. Bxaltado, Baco 2° COM a defesa dos portugueses, desprotegeu a sua protecrto, ‘Chegou entio a vez de Venus, essa menina. Com vor delicada, véu ao vento, afirmou que os lusitanos portugueses lusiadas Ihe faziam lembrar os seus gentis romanos. Falantes de uma lingua rente ao latim, levariam o amor para onde quer que chegassem, Ela mesma, ‘envolta em deticadeza, garantiria essa nobreza de sentimentos. Por uma questio de tom, seria muito custoso a um brutamontes da cestirpe de Baco contradizer uma donzela tdo vaporosa. Mais dificil ainda quando Marte, incentivado por um amor antigo, fez 0 céu tremer com ‘uma pancada do seu bastio. Levantando a viseira do elmo, exclamou ppalavras jas, vor grossa, concordando com Venus e encorajando Jupiter 8 a nio desistir das suas primeiras intencGes. Esse recuo seria uma mos~ ta de fragilidade. Ao mesmo tempo, as razoes de Baco pareceramThe suspeitas, o préprio Baco pareceu-Ihe suspeito, Resultado final: 3-1 ‘Sem apito, Jipiter apitou o final da partida. Sem martelo, pumba, dedlarou encerrada a reuniao. ‘ag niauis da armada de Vasco da Gama nfo eram pequenas ‘Mas o,mar era imenso, mas océu era infin Eniveo mar eo céu, aarmada de Vasco da Gama era mints- ‘aula, menor do que graos de pélen em Maio. E, mesmo assim, lutava om as forcas do mar e do céu,tentava e conseguia domélas. No inte tor de cada barco, sob as ordens do forte Capito, bragos que foram meninos em terra e que se tornaram homens no mar. ‘Todos contavam com todos. ‘Jétinham passado o Cabo Passo, quandoavistaram algumas thas, Desde els, apartr da sua cor, lancaram-se batts estreitoserépidos. ‘As cabecas dos portugueses tinham perguntas redondas acerca desses desconhecidos. Quando se apraximaram, a moda acostura: vestiam panos {de algodio colordos, uns cingidos a cintura, outros sobracados airosos 0 capitio Vasco, ot ocapitso Gama, como se preferir, clei:xou-o8 subir abordo da sua nau e serviu-lhes vinho. Accitaram «¢, muito provavelmente, lamberam os labios. q Bebendo, comendo falando érabe ao mesmo tempo, 0s convidados perguntaram aos portugueses quem eram e para onde iam. Orgulhosos, responderam que eram do ocidente e que iam para o oriente. Bexplicaram-se: Fomos do hemisfério norte ao hemisfério sul, contor- inamos todo o continente africano, Pelo nosso rei lancémo-nos a0 ma. Por ele, seriamos capazes de entrar no inferno. Desde sua ordem, pro- curamos a india E quiseramn saber quem erarn aqucles que bebiam oct vinho ¢comiam © seu alimento. E perguntaram se podiam dar-Ihes direcgdes acerca do melhor caminho para a India. Pouco ajudaram. Também era estrangeiros por ali. Na cultura, no sangue e, mesmo, na religido, que é uma forma nao-liquida de sangue. Bram muculmanos. Viviam naquela ilha, escala necesséria aos viajan- tes, mas nfo eram naturais dela Chamava-se Ilha de Mocambique. Propuseram aos portugueses que se encontrassem com o regente da itha, Seria conveniente eco ‘um piloto que os auxiliasse pelo resto de mar que tinham 3 frente. ‘No dia seguinte, muito bem disposto, depois de um sono descansado, ‘Vasco da Gama recebeu o Xeque da Ilha de Mocambique. Uns e outros estavam curiosos acerca das diferencas de costumes. ‘O xeque pediu para ver os livros religiosos eas armas. Seria inteligente que encontrassem ali 16 No interior de cada barco, ~ sob as ordens do forte capitdo, bragos que foram meninos em terra e que se tornaram homens no mar. 0 capitio portugués respondew-lhe que tinha os liveos do seu deus gravados na alma e nao lhe escondeu as armas, mostrou-lhas todas. (0 xeque disfarcou, mas nfo gostou nem dos livros invisiveis, sem ‘peso, nem das armas de ferro grosso, toneladas opacas. E, mais ou menos, disseram 0 seguinte: Vasco da Gama: Cedes-me, por favor, um piloto que me possa conduzir a india? Xeque daha de Mogambique: Sim, claro. (A pensar: Se pudesse, com ‘mais gosto te dava amorte) “Mais ou menos foi isto. CO xeque gostava pouco de cristaos. A maioria das coisas de que ndo gostava eram-lhe mais agradaveis do que cristios. Na realidade, no gostava mesmo nada de cristaos. Apés despedidas de afecto fingidis- simo, voltou de batel para a ilha. No Olimpo, como se visse televisao, Baco assistia a estas cenas. {i Baco, Baco, Bac. Utilizando algum meio de transporte divino, desceu sobre a Africae transformou-se em humano, mais coneretamente num velho mouro, muito conhecido em Mocambique e de boas confiangas com 0 xeque. ‘Assim, com esse rosto, envenenou ainda mais o espirito do xeque, contando-Ihes que os portugueses saquearam todos os lugares por onde passaram, incendisrios, sanguinarios, sem dé de mulheres oude criangas. A Vasco da Gama e todos os seus homens chegaram ao largo de Mombaga. Depois de atracarem, o mar ficou tranquilo. Disse-the que o capitdo viria buscar agua e que essa seria. a sua des- calpa. Sugeriucthe entéo que o xeque Ihe enviasse um piloto que sabo- tasse os portugueses, que os fizesse perder-se ou morrer. Baco era mau mesmo mau? Sim, Baco era mesmo mau. Quando Vasco da Gama foi buscar 4gua, como previsto por Baco (mau), hhavia mouros escondidos e armou-se um conflito, com vantagem para 05 portugueses. © xeque, finginde-se arrependido, propos paz e ofereceu um piloto ‘como sinal de boa vontade. Boa vontade? Nada disso, ma vontade. Esse piloto levava as ordens sugeridas por Baco, Por isso, tentou guiar a armada até uma ilha de mugulmanos, onde sabia que haveria guerra a sério. 1, desde um lugar de claridade, assistindo a esta maldade, Vents contrariou o plano de Baco, que tinha influenciado oxeque, que tinha influenciado o piloto. Sem grande esforco, com tanta beleza no poderia esforcar-se demasiado, Vénus soprou ventos contrérios que impediram a aproximagao a ilha O piloto nao desistiu eindicou-lhes outrailha, também com muguil- ‘manos desejosos de briga. Vénus néo desistiue, evitando males maio- es, voltou a soprar fininho. 4a Vasco da Gama e todos os seus homens chegaram a0 largo de Mombaga. Depoisde atracarem, o mar ficou tranquilo, Havia também calma nos gestos do capitéo portugués, que esperava encontrar cristao por ali. De novo, desde as ilhas, mais um cardume de batéis. Traziam novas do reique, antes, tinha sido visitado por Baco, distarcardo outra: vez de mouro. Tratavam-se de noticias de amizade, mas logo foi desmascarada a hipocrisia dessas intenBes. 0 poeta queixa-se: ai, ai ai. E queixa-se mais um bocadinho: ai, ui, ai-ai Hi perigos em terra, hé perigos no mar e até o céu junta toda a sua forca apenas com sentido de destruir o esforco de seres inocentes. Ai, ai, Ai, ui, ai-ai. ‘José Luts Peixoto

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