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TEORIA DEMOCRATICA E DELIBERACAO PUBLICA LEONARDO AVRITZER ‘A teoria democritica, de Rousseau até os nossos dias, tem tido uma relagdo histérica circular com o conceito de deliberagio (Manin, 1987). Alguns autores tém utilizado 0 termo com o significado de um processo no qual um ou mais agentes avaliam as razdes envolvidas em um determinada questo (Habermas, 1994; Cohen,1989); outros autores uti- lizam 0 termo tendo em vista o momento no qual 0 processo de tomada de decisio ocorre (Rousseat,!968; Schumpeter, 1942; Rawis,1971). Na ver- dade, Bernard Manin nao chega a apontar para o fato de que o termo deli- beragio, na sua origem etimoldgica, permite os dois significados: deliberar pode tanto significar “ponderar, refletit” quanto “decidir, resolver.”! (Hollanda, 1975). A teoria democratica, adotando implicitamente a distingdo eti- mol6gica apontada acima, tem tratado a relagao entre a praitica democréti- ca € 0 processo deliberativo de duas formas distintas. Por um lado, autores classicos como Jean Jacques Rousseau claramente privilegiaram 0 aspecto decisério, no interior do processo deliberativo, ao tratar do processo de for- magao da vontade geral. Para Rousseau, “Quando uma lei € proposta na assembléia popular, o que é per- guntado a eles [os representantes] nao tanto se eles aprovam ' Vale a pena notar que a dualidade de significados do termo deliberacdo perpassa as Ifnguas latinas © est também presente na lingua inglesa. O diciondrio Webster nos oferece os seguintes significados para o termos deliberation: “careful thought and weighting of consid- eration” € “to determine or resolve.” 26 LUA NOVA N* 49 — 2000 ou rejeitam a proposig&o, mas sim se ela esta de acordo com a vontade geral, que também € a deles. Toda pessoa ao votar dé a sua opinido a respeito dessa questo ¢ a vontade geral é entio deduzida da contagem dos votos. Portanto, quando uma opiniaio contréria a minha prevalece, isso apenas prova que eu estava equivocado ¢ que aquilo que eu supus ser a vontade geral néio 0 era.”(Rousseau, 1968: livro TV, caput 2). Rousseau, ao identificar 0 processo de formagdo da vontade geral com o processo de aferigao da vontade da maioria, propde uma con- cepgaio de democracia baseada nos seguintes elementos: a decis’io como 0 elemento central do processo deliberativo; a idéia de que, uma vez aferida a vontade da maioria, a posi¢do perdedora nada mais representa do que um erro. Essa posicao, que foi hegeménica no interior da teoria democritica por quase 200 anos, tem dado lugar a uma concepgao alternativa, que uti- liza 0 segundo significado etimoldgico do conceito de deliberagio, qual seja, a idéia de um processo de discussio e avaliaco no qual os diferentes aspectos de uma determinada proposta so pesados. Desde os anos 70 tem surgido no interior da teoria democratica contempordnea uma tendéncia a reavaliar 0 peso do elemento argumenta- tivo no interior do processo deliberativo. Tal processo tem diversas ori- gens, a mais importante delas sendo 0 questionamento da centralidade do momento decisério no processo deliberative. Autores como Touraine, Habermas, Cohen, Melucci e Bohman, que propuseram ou teorias dos movimentos sociais ou teorias da estera publica, chamaram a atengo para a centralidade do momento argumentative, momento esse entendido como um “...intercdmbio de razGes feito em ptiblico” (Cohen, 1997:73). Autores que trabatham com a questo da identidade (Melucci, 1996; Young, 1996) também chamaram a atencdo para a centralidade do processo argumentati- vo no momento do reconhecimento da validade de uma identidade alterna- tiva, Melucei, por exemplo, chama a atengiio no processo de construgio de novas identidades para 0 seu” carter interativo através do qual diferentes individuos ou grupos definem o significado das suas ages.” (Melucci,1996:67) Por fim, um conjunto de experiéncias administrativas (Santos,1998; Abers,1998; Avritzer, 2000; Fung,2000) tem colocado em cheque os principais elementos de uma concepeao decisionistica de deli- beraciio, em particular a idéia defendida a partir de Weber (1919) de que as formas complexas de administragao podem prescindir de elementos parti- cipativos e argumentativos. ‘TEORIA DEMOCRATICA E DELIBERAGAO PUBLICA 2 Esse artigo tem como objetivo caracterizar a passagem no inte- rior da teoria democritica de um conceito decisionistico de deliberacio para um conceito argumentativo de deliberagdo. O nosso argumento ser desenvolvido em trés partes: em uma primeira parte caracterizaremos a concepgo de deliberacZio que se tornou dominante na teoria demoeritiea do século XX. Iremos denomind-la_concepgdo decisionistica de delibe- taco, uma concepcaio que tem as suas origens em Rousseau e que € uti- lizada por todos os autores que pertencem ao assim chamado elitismo democratico.2 Em uma segunda parte, mostraremos a origem da crise de um conceito decisionistico de deliberagao. Iremos mostrar a dualidade da utilizagdo do conceito de deliberagio na obra de John Rawis, especial- mente na sua Uma teoria da justiga. Iremos ainda, na segunda segio desse artigo, mostrar como Rawls e Habermas consolidam um uso alternativo do conceito de deliberagio, uso esse que €, entao, teorizado por Cohen (1987). Na terceira parte desse artigo iremos relacionar 0 coneeito de deliberagao que surge das obras de Rawls, Habermas e Cohen com algumas experi cias empfricas, colocando-nos a questdio de quais seriam os féruns da democracia deliberativa. DE WEBER A DOWNS: O MODELO DECISIONISTICO A primeira metade do século XX foi um momento de crise pro- funda da democracia. Max Weber foi 0 tesrico social cuja obra melhor expressou 0 ceticismo de inicio do século em relagdo A democracia. Weber antecipou, na sua obra, duas questes que se tornariam, ao longo da primeira metade do século XX, elementos de uma concepgio decisionisti ca de deliberacdo: 0 primeiro desses elementos seria o ceticismo em relagdo a debates envolvendo tradigdes culturais distintas; 0 segundo seria 2 Entendemos por elitismo democritico todas as concepgées de democracia que operam com dois elementos: a redugio do conceito de soberania ao processo eleitoral e a justificagao da racionalidade politica enquanto decorrente da presenca de elites politicas ao afvel de gover no, Tal concepeio teria a sua origem em Max Weber (1919), teria 0 seu momento te6rico prin- cipal em Schumpeter (1942) e teria como seus principais representantes contemporfineos ‘Anthony Downs, Giovanni Sartori Norberto Bobbio. Para uma caracterizagao do elitismo democratico vide (Bachrach, 987). Para uma critica vide Avritzer, 1996. 28 LUA NOVA N° 49 — 2000 a percepeio de que a complexidade administrativa seria contradit6ria tanto com a participagéo quanto com a argumentag4o. No que diz respeito ao primeiro desses elementos, Weber percebeu corretamente jé no inicio do século uma tendéncia a pluralizagao cultural. Para ele, as divergéncias cul- turais — que ele percebia como externas ao Estado nacional? - colocavam um problema central para a democracia. Como resolver divergéncias em casos nos quais ndo seria possivel optar cientificamente por uma cultura em relagdo 4 outra? No seu ensaio “Ciéncia como Vocagiio” esse elemento adquire centralidade analitica. Para Weber, “as esferas de valor do mundo estao em conflito irre- concilidvel entre si.” (Weber, 1946:176). Para ele, as divergéncias culturais s6 poderiam ser solucionadas cientificamente. No entanto, Weber sustenta que a ciéncia ndo se presta a esse papel. “Todos esses casos [de conflito entre as diferentes ordens valorativas] séo os mais elementares na luta que os deuses das varias ordens e valores se estéo empenhando, Nao sei como podemos decidir cientificamente o valor da cultura francesa € alema. Pois.aqui, tam- bém, deuses diferentes lutam entre si agora e em todos os tempos.” A colocagao weberiana acerca da impossibilidade de resolugao de conflitos culturais na modernidade tem profundas implicagées politicas, embora 0 autor nao as tenha sacado. Caberd a Joseph Schumpeter fornecer a resposta definitiva do elitismo democratico a essa questo. Para ele, nao € possivel determinar aquilo que seria o bem comum pelo motivo funda- mental de que “para diferentes individuos e grupos 0 bem comum pode significar coisas diferentes”. Tais diferengas nao podem ser resolvidas racionalmente porque “nossas concepges sobre o que € a vida e a sociedade se localizam além do alcance da mera I6gica”(Schumpeter, 1942:251). A solugdo schumpeteriana, que € conseqiiéncia do mesmo con- flito apontado por Weber, foi a de deixar as questées culturais ¢ as con- cepgées da boa vida de fora da politica democratica. Nesse sentido, o pro- 3 Esse constitui um aspecto importante de mudanga no final do século XX em relagiio ao seu inicio, No comeco do século, o problema da diversidade cuitural era tratado, tal como fica claro na obra de Weber, como o problema do conflito valorativo entre culturas ligadas. a tradigBes nacionais. No final do século, pensamos em tipos diferentes de contlitos culturais aque ocorrem no interior de estados nacionais poliginicos, isso €, de paises habitados simul- taneamente por mais de um grupo étnico como resultado ou da conquista (Canada) ou da transteréncia maciga de membros de outras etnias para o estado nacional (Estados Unidos ¢ Brasil). Vide Kymlicka, 1995. Nesses casos, o problema da deliberagao argumentativa sobre © status da minoria torna-se ainda mais premente ‘TEORIA DEMOCRATICA E DELIBERAGAO PUBLICA 29 blema da diferenga nao ir4 encontrar, na teoria democritica da primeira parte do século XX, uma soluco no campo da argumentagao. A concepsio decisionistica de deliberagiio propde uma forma de decisiio que, suposta- mente, prescinde dessa dimensio. Max Weber introduziu, ainda, um segundo campo de questiona- mentos com profunda repercussdo sobre o conceito de deliberagio, ao questionar os fundamentos da soberania popular, em especial, sua utilidade no campo da administragao. Weber, em polémica implicita com Marx, utilizar 0 conceito de separagao entre trabalhadores e meios de produgiio para propor um conceito de complexidade administrativa no qual a parti- cipagdo popular somente poderia se constituir em obstéculo. Para Weber, “a separacdo dos trabalhadores dos meios materiais de produgiio, destrui- gio, administraco, pesquisa académica e finangas em geral, constitui a base comum do Estado moderno nas suas esteras politica, cultural e mili- tar, assim como da economia capitalista privada. Em ambos os casos a capacidade de dispor sobre esses meios est4 nas maos de um poder ao qual 0 aparato burocratico... obedece diretamente ou esti disponivel em caso de necessidade... O progresso na diregtio de um Estado burocratico capaz. de administrar e julgar de acordo com o direito racional ¢ regulatério esta- belecido torna-o muito similar & empresa capitalista moderna. A empresa capitalista moderna se assenta basicamente no cdlculo e pressupde um sis- tema administrativo e legal cujo funcionamento pode ser racionalmente antecipado...” (Weber, 1919 [1968]:1394) A colocagiio de Weber possui dois elementos igualmente anti- argumentativos. O primeiro esté ligado ao problema da complexidade administrativa. Para Weber, diferentemente de Marx, o problema central na desapropriagao do saber e do controle sobre os aparatos administrativos, militares, académicos e de outra natureza € um problema relacionado a racionalidade administrativa, que para ele estava ligada, fundamental- mente, & capacidade dos atores sociais de buscarem fins de forma metédi- ca e sistematica (Kronman, 1983:131). Portanto, para Weber, a argumen- taco ou a participagdo seriam completamente contraproducentes, no sen: tido de produzirem resultados ou mais racionais ou mais eficientes. Weber nfo se coloca, em nenhum momento, alguns problemas que se tornartio mais aparentes na segunda metade do século, tais como a flexibilidade dos desenhos administrativos, os limites da racionalidade centralizadora e a possibilidade de que o acesso & informagdo seja limitado por parte dos aparatos burocraticos (Fung, 2000). Voltaremos a essas questées na segun- dae na terceira partes deste artigo. 30 LUA NOVA N? 49 — 2000 O ceticismo em relagiio as formas argumentativas de delibe- rago, que tem sua origem em Weber, ird se acentuar ao longo da primeira metade do século XX, na medida em que a democracia como forma de organizacio politica entra em crise na Europa. Esse processo ter como conseqiiéncia tornar os Estados Unidos 0 centro da politica democratica Dois autores serdo centrais na teorizagio dessa transigdo, Joseph Schumpeter e Anthony Downs. Em ambos os casos as suas formulagées visando a reconstrugdo da teoria democrdtica irdo implicar a acentuagao dos elementos anti-deliberativos. Joseph Schumpeter pode ser considerado 0 autor de transigiio entre 0 cendrio europe e norte-americano no que diz respeito a teoria democratica. Dois elementos do decisionismo deliberativo serdo reforga- dos pelas formulacdes schumpeterianas: a tejeigio de formas piiblicas de discussio e argumentagio e a identificagdo das préticas decisérias com 0 processo de escolha de governantes. Schumpeter ir avaliar os potenciais argumentativos da demo- cracia no marco de uma anélise da sociedade de massas. O autor de Capitalismo, socialismo e democracia, na sua tentativa de reconstruir a democracia com base em uma concepsiio restrita de soberania, iré descartar 6s elementos argumentativos da democracia, Para ele, tais elementos foram desaparecendo no século XX em virtude de dois processos: a integragiio do homem comum a politica e 0 desenvolvimento dos meios de comunicagio de massas. Ambos os processos teriam contribufdo para que os processos argumentativos deixassem de ter centralidade na democracia, Schumpeter critica a idéia de que a vontade dos individuos exista como algo ordenado Para ele, tais vontades no passariam de “impulsos vagos operando em relacio a slogans disponiveis ¢ impressdes falsas.” (Schumpeter, 1942:253) Desse modo, o papel do processo argumentativo na formagao da vontade geral no seria para Schumpeter nada mais do que uma ficg4o. Sua proposta 6 inverter a relagao entre soberania € governo, ao propor uma doutrina na qual a populagao, ao invés de “escolher representantes que expressem as suas opinides”, passe a “escolher os individuos que estariam tomando as decisées.” (Schumpeter, 1942:269). Nesse sentido, a deliberagao democrati- a se reduziria unicamente & escolha de representantes através do voto. Anthony Downs, apesar de menos seduzido pela teoria da sociedade de massa do que Schumpeter, iré fornecer um formato final 2 teoria acima descrita, ao supor que os individuos nas sociedades democraticas possuem duas qualidades que os definiriam como racionais a capacidade de formar um ranking de preferéncias e de relacionar as ‘TEORIA DEMOCRATICA E DELIBERAGAO PUBLICA 31 preferéncias por eles detidas com as propostas politicas feitas na sociedade pelas elites polfticas (Downs, 1956). Com a formulag&o de Downs chega ao final o desmonte da forma argumentativa no interior da teoria democratica, na medida em que ele anula o dltimo aspecto argumentativo da teoria democrdtica, qual seja, a suposigio de que os individuos discutem e argu- mentam sobre as suas preferéncias. Mais uma vez, o elemento argumenta- tivo do processo deliberativo é substituido por um elemento decisionistico: © voto de acordo com uma preferéncia individual e pré-formada. E possivel, portanto, afirmar que a teoria democratica que se tornou hegeménica na primeira metade do século XX possui trés ele- mentos decision‘sticos e anti-argumentativos: 1) O primeiro desses ele- mentos consiste na nogio de que as diferengas culturais nfio podem ser resolvidas por meio da argumentagdo. Consequentemente, a tinica forma de se fazer politica democratica seria deixando tais diferengas de lado. Desse modo, a argumentagao de uma condigao pluralista seria deixada de fora da politica, 2) O segundo elemento no processo de afirmagiio de uma concepgio decisionistica de democracia esta relacionado A defesa de uma inter-relagdo estreita entre administragdo nao participativa e preservagio da complexidade. De acordo com tal concepgao, é a redugdo das deman- das ¢ a capacidade da burocracia de segui-las racionalmente que deter- mina a eficiéncia, Mais uma vez, o processo de argumentagio e troca de informagao intrinseco as formas participativas de administragao € exclut- do do campo da politica. 3) O terceiro elemento da afirmagio de uma concepcio decisionistica de deliberagio € a idgia de que o processo eleitoral consiste na aferigéo de preferéncias individuais pré-formadas. Para autores como Downs e Elster “os agentes sociais sio dotados de preferéncias que séio dadas ¢ que, provavelmente, néio sio sujeitas a mudangas no curso do processo politico”(Elster, 1988:105). Mais uma vez, 0 elemento argumentativo da discussdo democratica da diferenga de interesses e/ou valores € negado. No entanto, o fato interessante em relagdo A teoria democrdtica do final do século XX € como todos os tré elementos aq ados de uma concepgio decisionistica de delibe- ragio irdo entrar em crise profunda. DA DECISAO A ARGUMENTACAO © consenso que se formou na teoria democrética da primeira metade do século XX perdeu o seu vigor a partir dos anos 70. Dois autores 32 LUA NOVA N° 49 — 2000 desempenharam um papel central no esgargamento do consenso anti-argu- mentativo: John Rawls e Jurgen Habermas. Nessa segdo desse artigo, ana- lisaremos a forma como ambos os autores recuperaram uma dimensio de debate piiblico nas suas prineipais obras. John Rawls é, certamente, um autor de transigdo entre uma con- cepgiio decisionistica de deliberagiio e uma concepgao argumentativa, na medida em que, em algumas das suas obras, especialmente em sua Una teoria da justiga, ele opera com um consenso decisionistico (ainda que nio sem algumas contradigées) e, em outras, ele supde que as diferengas cul- turais so parte de uma condigao de pluralismo que supde a argumentagaio ea deliberacio. Na sua Uma teoria da justiga, ao se indagar acerca das condigdes do processo deliberativo na assim chamada posigao original, Rawls faz a seguinte afirmagao: “Parece claro que uma vez que as diferengas entre as partes na posicao original so por elas desconhecidas, que cada pessoa sendo igualmente racional e igualmente posicionada é convencida pelos mesmos argumentos. Assim, ndo podemos entender a escolha feita na posicao original como representando 0 ponto de vista de uma pessoa escolhida a0 acaso. Se cada uma delas apés uma reflexdio adequada prefere uma concepgao de justiga em relaco a outra, entao todos eles irdo preferir uma mesma posigdo ¢ um acordo unanime poderd ser alcangado.” (Rawls, 1971:139). A concepgiio defendida por Rawls acerca da deliberagdo é uma concepgiio decisionfstica baseada na subestimagao da diferenga e da necessidade de se argumentar sobre ela. A operacao rawlsiana consiste em reconhecer as diferengas entre os individuos na medida em que o autor reconhece que eles “discordam sobre os termos basicos da sua associagéo” (Rawls, 1971:5) e, ao mesmo tempo, supor que tais diferengas podem ser suspensas no momento da discussio na posigdo original acerca de uma concepgio de justiga. Nao seria, no entanto, justo com Rawls limitar a sua concepgao de deliberagiio & passagem citada. Se, na passagem citada, 0 elemento deliberativo € estritamente individual e decisionistico, na passagem da Uma teoria da justiga reservada & discussio sobre a forma de exercicio do poder da maioria podemos perceber uma concepgao diferente, que expres- sa um certo distanciamento de Rousseau e da sua idéia acerca da corregiio da opinitio da maioria. “Nada garante a idéia de que a vontade da maioria estd sempre correta. Na realidade, as concepgdes de justiga tradicionais nao mantiveram essa doutrina, ao sustentarem que o desfecho do processo de votagdo esta sempre sujeito a prinefpios politicos. Ainda que em determi- ‘TEORIA DEMOCRATICA £ DELIBERAGAO PUBLICA 3 nadas circunstancias seja justificado que a maioria... detenha o direito constitucional de legislar, isso nao significa que as leis promulgadas sejam justas.”(Rawls, 1971:356). Assim, Rawls transita entre duas concepgées de deliberagio ja na sua Uma teoria da justiga, Por um lado, 0 consenso formado na posigio original é muito semelhante a concepgaio de maioria de Rousseau, ainda que seja utilizada apenas como elemento hipotético. Por outro, no momen- to em que a capacidade da maioria de decidir & posta em questo, Rawls néio advoga a justeza da opinido da maioria e defende a perspectiva de que “a troca de opinides com os outros questiona a nossa parcialidade e amplia a nossa perspectiva.”(Rawls, 197 1:358) Os quase 20 anos que separam a teoria da justiga de O liberalis- mo politico implicaram uma mudanga de posigao, cujo significado para a teoria rawlsiana foi de fundamental importincia. A teoria rawlsiana passa de uma posigZo de acordo com a qual o grande conflito societério € 0 conflito de interesses entre individuos iguais para a suposigao de que o problema cen- tral das sociedades contemporineas € o da diferenga de concepgdes entre os individuos acerca dos seus valores ¢ concepgées morais. Para Rawls, “as doutrinas religiosas e filos6ficas expressam vis6es do mundo e das nossas vidas uns com 0s outros ~ individual e coletivamente. Nossos pontos de vista individuais ¢ associativos, nossas afinidades intelectuais ¢ lagos afetivos sio, em uma sociedade livre, muito diversos para permitir que as doutrinas {abrangentes] sirvam como base para um acordo politico razoavel ¢ duradouro. As diferentes concepgdes do mundo podem ser elaboradas razoavelmente de diferentes pontos de vista e a diversidade advém em parte das nossas perspectivas distintas. “(Rawls, 1993:58). A afirmacao de Rawls em relagiio ao problema da diferenga em O liberalismo politico introduz um aspecto novo em relagaio a Uma teoria da justiga, Bnquanto, em Uma teoria da justiga, Rawls assume que os indi- viduos tém “um sentido do seu proprio valor"e sao “mutuamente desin- teressados” em relagdo aos demais individuos (p.144), 0 Rawls de O libe- ralismo politico entende que as concepgdes abrangentes implicam cont! tos de valores. Nao é possfvel subestimar o impacto dessa reformulagio para 0 conceito de deliberagdo argumentativa, Para Rawls, os individuos que adotam concepgdes abrangentes do hem sabem o que distingue as suas concepgées das outras e por que as concepgées por eles adotadas dao pri- mazia a certos valores (Rawls,1993:59).Nesse sentido, as concepgdes abrangentes esto em conflito, e € necessério saber como resolvé-lo para adotar uma concepgio de justiga. 34 LUA NOVA N49 — 2000 A solugiio que Rawls dé a esse problema em 0 liberalismo politi- co nfio chega a ser totalmente deliberativa. Ele tenta separar as razées ptibli- cas das razdes privadas, para, a0 mesmo tempo, reconhecer que existe um conflito de doutrinas mas tentar salvar o seu prinefpio de justiga desse con- flito. “Nem todas as razSes sio piiblicas uma vez que existem as raz6es niio piiblicas das igrejas, das universidades ¢ das muitas associagdes da sociedade civil... A razio publica é uma caracterfstica de uma populagiio democratic 6a razio dos seus cidadiios, daqueles que partilham o status igual da cidada- nia. O objeto (subject) da sua razio € 0 bem do piiblico, aquilo que uma con- cepgao politica de justiga requer das estruturas basicas das instituigdes, dos fins ¢ das causas que essas devem servir, "(Rawls, 1993:213). Nao € dificil perceber que existe uma contradigio permeando a forma como Rawls percebe a relagéio entre pluralismo e razio publica, Essa contradigao esté ligada ao fato do conceito de pluralismo envolver a presenga de doutrinas abrangentes que esto em conflito, doutrinas essas que, por suposto, se posicionam em relagdo a questées éticas e morais. Se, por um lado, Rawls reconhece que a presenga dessas doutrinas cumpre um papel central em uma sociedade pluralista, por outro, ao afirmar que as razSes que essas doutrinas professam sio privadas e que é possfvel prescindir deias ao formar uma teoria da justiga, Rawls deixa de perceber que o debate entre razdes privadas tem conseqiléncias na formagao de uma raziio piblica.4 A contradigao acima tem implicagdes imediatas em relagdo a0 problema deliberativo. Como atirmamos aci na Uma teoria da justiga hd uma dualidade entre a forma como os individuos chegam a um consenso na posigao original — através da redugio das diferengas — e a forma como o prinefpio da maioria é postulado, Em 0 liberalismo politico tal dualidade nao poderia persistir, uma vez. que Rawls de saida postula a presenga de concepgies éticas que dificilmente deixariam de influenciar, na posi¢éo original, 0 consenso em torno de uma teoria da justiga. Como seria possivel, entdo conciliar pluralismo e deliberagiio? A resposta que Rawls nos oferece em O liberalismo politico para essa questo € a idéia do consenso sobreposto, isto é, de uma situagiio na qual “a concepgao politica 4 Varios exemplos apontam nessa diregdo, entre eles 0 debate sobre 0 aborto nos Estados Unidos. De um lado desse debate, encontram-se concepedes abrangentes sobre o que é a vida que tém uma fundamentagao religiosa. De outro tado, encontram-se concepgées seculares sobre 2 astonomia individual. Nao € possivel resolver esse debate sem eolocar em contacto as duas concepgdes que 6, justamente, o que Rawls pretende evitar ‘TEORIA DEMOCRATICA E DELIBERAGAO PUBLICA 35 de justica que regula as instituigdes basicas da sociedade € endossada por cada uma das principais doutrinas, religiosas, filosdficas e morais que devem perdurar em uma sociedade de uma geragiio para outra.” (Rawls, 1985). A resposta rawlsiana contintia sustentando uma dualidade em relagiio A deliberacdo e pode ser interpretada de duas maneiras. Na sua primeira versio, haveria um encaixe concordante (concordant fit) entre as diversas concepgdes, 0 que implicaria que 0 processo deliberative suposto por Rawls, apesar de envolver elementos argumentativos, néo os pressu- poria plenamente na operacionalizagiio da sua teoria, Para Rawls, a racionalidade deliberativa constituiria 0 resultado de uma reflexiio indivi dual, Ela seria 0 resultado de um plano cujo desfecho suporia “uma reflexio cuidadosa na qual o agente tenha revisto a luz de todos os fatos relevantes, como ele gostaria de implementd-los e, desse modo, decidir um certo curso para a sua ago”. (Rawls,1971:417). Ao nivel da sociedade haveria um concordant fit entre esses processos. Essa concepgiio rompe com 0 elemento decisionistico da deliberagdo mas supde uma concepgiio deliberativa e argumentativa minima, uma vez que 0 processo de formagao de preferéncias continuaria sendo estritamente individual. Hi, no entanto, uma segunda maneira de conceber os elementos deliberativos na teoria rawlsiana e, nesse caso, o autor romperia muito mais profundamente com uma concep¢ao decisionistica da deliberaciio. Rawls romperia com os pressupostos da concepgao decisionistica de deliberacio na medida em que, ao supor que os individuos no tenham uma concepgiio de preferéncia pré-estabelecida, ele reconheceria que existem “discordin- cias razodveis entre individuos razodveis"(Rawls, 1993:55) c que tais dis- cordancias cumprem o papel de “balancear os diversos fins.” Essa segun- da concepgao, levada ao limite, suporia, como bem apontou Joshua Cohen, que “os procedimentos argumentativos devem eles mesmos se tornar o foco de uma sociedade governada por um consenso sobreposto.” (Cohen, 1993:279). Tal idéia, no entanto, exigiria algo que nés ndo encontramos em 5 A posigdo de Rawls accrea da institueionalizagdo da razio publica é uma posigdio que no contempla plenamente a necessidade de fruns para a argumentagio publica, Para Ralws, a razio piblica se aplica “... aos Foruns oficiais e, portanto, aos legisladores quando eles falam ra tibuna do_parlamento, e para 0 executivo nos seus atos pliblicos e pronunciamentos. Ela também se aplica a0 Judicidrio e, acima de tudo, & Suprema Corte, em uma democracia que exercite a revisio judicial.” (Rawls, 1993:216). E bastante claro que, para Rawls, a raziio iiblica ndo se exercita em fbruns nao estatai 36 LUA NOVA N° 49 — 2000 Rawls, que seria uma teori 5 quais a deliberagdo argu- meniativa teria lugar em uma sociedade demoerética. Para discutir 0 que poderiam ser os foruns argumentativos, vamos analisar uma segunda tra- digdio de teoria social que rompeu com o decisionismo e trabalha com a idéia de argumentacio, a tradig&o habermasiana. Jurgen Habermas € um autor cuja obra, apesar de suas variagdes em termos de elaboragdes conceituais, sempre esteve vinculada a uma ten- tativa de reintroduzir uma forma de debate argumentativo na aniilise do politico. A forma como o autor operacionalizou tal intengiio variou ao longo da sua obra. A primeira obra de impacto escrita por Habermas, A Transfor- magdo Estrutural da Esfera Piiblica, € uma obra na qual Habermas demonstra uma preocupagao com a formagao de uma esfera para a argu- mentagio. Para ele, 0 processo histérico que levou a ascensdio da burgue- sia permiti o estabelecimento de uma nova forma de relagiio com 0 poder. A publicidade emerge historicamente como o resultado do processo no qual os individuos demandam dos governantes justificagaio moral dos seus atos em pablico. Assim, 0 conceito de esfera piiblica tem, desde a sua origem, algumas das suas caracteristicas centrais ligadas ao debate democratico contempordneo: a primeira delas é a idéia de um espaco para a interagao face-a-face diferenciado do Estado. Nesse espago, os individuos interagem uns com os outros, debatem as decisées tomadas pela autoridade politica, debatem 0 contetido moral das diferentes relacdes existentes a0 nivel da sociedade e apresentam demandas em relacao ao Estado. Os individuos no interior de uma esfera pablica democratica discutem e deliberam sobre questdes politicas, adotam estratégias para tornar a autoridade politica sen- sivel tis suas deliberagdes. Nesse sentido, o conceito de publicidade estabe- lece uma dinamica no interior da politica que nao € movida nem por inte- resses particularistas nem pela tentativa de concentrar poder com o objeti- vo de dominar outros individuos. Pelo contrdrio, a idéia aqui presente é de que 0 uso publico da razfio estabelece uma relacio entre participagiio e argumentacao pablica. “A paridade sob a qual a autoridade do melhor argu- mento pode prevalecer contra a hierarquia social ¢ no final se tornar vito- riosa significou, no pensamento daquele momento, a paridade da condig’io humana comum.” (Habermas, 1989:36). Tal colocagio significa uma rup- tura pelo jovem Habermas com as formulagdes de Rousseau acerca da deliberagdo. Para Habermas, existe uma dimensio argumentativa no inte da relaciio Estado/sociedade que est além do processo de formagiio da ‘TEORIA DEMOCRATICA E DELIBERAGAO PUBLICA 37 vontade geral. Tal formulagdo faz com que a opinitio dos indivfduos nesse processo argumentativo nao possa ser reduzida A vontade da maioria, como quer Rousseau, ou & representatividade de um sé individuo na posigdo original, como quer Rawls. E preciso que esse individuo expresse as suas opinides em um processo de debate e argumentagio. Nesse sentido, é pos- sivel afirmar que, desde os seus primeiros momentos, a teoria haber- masiana trabalha com um elemento de deliberagéio argumentativa. Sc a posicao habermasiana em relago A argumentagio implica uma ruptura radical com o deliberacionismo decisionfstico de Rousseau, essa ruptura precisa, no entanto, ser pensada em termos de uma mediagiio. Acstrutura circular do argumento tedrico da Transformagdo Estrutural da Esfera Publica, de acordo com o qual a formagio dessa esfera segue-sc a sua decadéncia, nos deixa sem saber se os elementos de argumentagio deliberativa dos piiblicos do século XVIII poderiam ainda ser encontrados nas sociedades contemporaneas. Com efeito, a seciio final da obra é dedi- cada a uma andlise da sociedade de massas que diminui se nao anula os elc- mentos acima mencionados. “Um conceito de opinido pdblica historica- mente significativo, capaz de contemplar os requisitos de um Estado cons- titucional de bem estar social e que seja, ao mesmo tempo, claro do ponto de vista tedrico e empiricamente identificavel tem de ser ancorado unica- mente no desenvolvimento e na transformagao estrutural da prépria esfera pablica, © conflito entre as duas formas de publicidade que hoje em dia caracterizam a esfera ptiblica politica deve ser tomado a sério... As opinides nao piblicas protiferam em ntimero e a opinidio publica tornou-se de fato uma ficgaio."(Habermas, 1962:244). A colocagio habermasiana mostra os problemas envolvidos na recuperagiio dos conceitos de argumentagdo e deliberagiio. Na sua primeira formulagiio o autor nao consegue fundamentar 0 conceito de argumentagao na estrutura das sociedades contempordneas. Nesse sentido, a sua aniilise final s6 se distinguiria da de Rousseau ou de Schumpeter na tentativa nor- mativa de identificar 0 processo de deliberagio decisionistica enquanto uma distorgdo de um ideal e de uma pratica distintas, A obra habermasiana tem diversos momentos e 0 seu segundo momento importante ocorre no final dos anos 70 ¢ comego dos anos 80, onde ocorrer4 a tentativa de inserir a idéia de um consenso discursivo em uma teoria da reflexividade da ago social. A Teoria da Agdo Comunicativa é a obra onde esse empreendimento é construfdo do ponto de vista te6rico. Duas dimensdes sio centrais a esse empreendimento: a construgdo de um conceito de mundo social reflexivamente adquirido ¢ a idéia de uma forma 38 LUA NOVA N° 49 — 2000 de agdo que seja intersubjetiva e voltada para um consenso comunicativo. Habermas ird buscar em Popper a idéia de um mundo social reflexivo, ten- tando portanto, propor a idéia da construgdo da ordem social através da partilha de significados: “A definigio de uma situagio estabelece uma ordem [social]. Através dela participantes em um processo de comunicagio atribuem os vatios elementos de uma situagao de agdo a cada um dos trés mundos [0 objetivo, 0 social e 0 subjetivo] e, desse modo, incorporam a de ago atual no seu mundo da vida pré-interpretado. A definigaio da situagiio por uma outra parte que diverge da definig%io de um de nés, coloca um problema de tipo peculiar, pois, em um processo cooperative de interpretagio ninguém possui o monopélio da interpretagzo correta.” (Habermas, 1984:1:100). A colocagao habermasiana representa uma tentativa sociolégica de reincorporar a argumentagdo no mundo social. A dindmica dessa tenta- tiva € supor a presenga de um mundo com pré-interpretagdes distintas e propor uma solugao para o problema sociolégico da produgao da ordem (Parsons, 1938) que envolva o consenso argumentativo das partes sobre as caracteristicas da ordem social em disputa. Tal forma de agdo, que Habermas denomina comunicativa, teria as seguintes caracteristicas: 0 seu meio € a utilizagio pragmética da linguagem; cla envolveria orientagbes em relagiio ao mundo; cla seria teleolégica; ¢ implicaria assumir carac- teristicas reflexivas em relagtio ao mundo. (Habermas, 1984:1:98). Desse modo, Habermas da um passo além de Rousseau ¢ da sua obra anterior. Ele supe que as formas de argumentagao sao préprias ao mundo social e, por- tanto, continuam tendo presenga plena nas sociedades contempordneas. Ao mesmo tempo, ele admite interpretagées diversas de diferentes situagdes, nfo podendo, portanto, supor, tal como Rousseau, que aqueles que divergem da vontade da maioria estao errados. Habermas tampouco pode partilhar 0 pressuposto de Rawls, de que bastaria supor uma posigio de nitagiio de informagao para que os individuos cheguem a determinados consensos. Pelo contrério, o problema habermasiano seré 0 de que as difc- rengas de perspectiva e orientagao sio suficientes para gerar polémicas em relagdo 4 normas. Seria, no entanto, possivel transferir essa idéia de argu- mentagao propria da Sociologia interpretativa para o campo da politica? E essa tentativa que aproximou Habermas da discussio acerca da democra- cia deliberativa. Permitam-me analisar tal aproximagdo em detalhes. A partir da publicagio da Teoria da Agdo Comunicativa, Habermas comega um processo de aplicagdo da sua concepgao de teoria do discurso A politica contemporanea. Ele ir operacionalizar tal aplicagio TEORIA DEMOCRATICA E DELIBERACAO PUBLICA 39 através da percep¢do de que o problema da legitimidade na politica nao estd ligado apenas, tal como supds Rousseau, ao problema da expressiio da vontade da maioria no processo de formagdo da vontade geral, mas tam- bém estaria ligada a um processo de deliberagao coletiva que contasse com a participago racional de todos os individuos possivelmente interessados ou afetados por decisdes politicas. A elaboragio dessa posigiio leva Habermas & elaborago do assim chamado princfpio D: “Somente sio vé- lidas aquelas normas-agdes com as quais todas as pessoas possivelmente afetadas possam concordar como participantes de um discurso racional (Habermas, 1995:107).6 Duas caracteristicas do principio D merecem ser destacadas para 08 objetivos da nossa discusstio sobre deliberaciio. O primeiro deles € que existe uma mudanga na concepgdo de maioria e de forma de decisiio em relagdo as concepgdes defendidas por Rousseau e pelo assim chamado eli- tismo democritico. O principio (D) nao envolve a aferigdo de vontades ¢ sim uma discussio racional entre individuos iguais fazendo uso das suas razdes. Nesse sentido, nao é a contagem de votos 0 que muda a relagio entre maioria e minoria. Nao € suficientemente legitimo dizer & minoria que ela possui menos votos. O que € preciso 6 chegar a uma posiga racional no debate politico que a satisfaga. Em segundo lugar, existe uma mudanga no conceito de prefe- réncia. Mais uma vez, diferentemente do assim chamado elitismo democritico com a sua concepgao de preferéncias dadas e aferidas no proceso eleitoral, a teoria habermasiana do discurso sustenta a concep¢iio de que “a politica deliberativa deve ser concebida como uma sindrome que depende de uma rede de processos de barganha regulados de forma justa e de varias formas de argumentagio, incluindo discursos pragmaticos, éticos e morais, cada um deles apoiado em diferentes pressupostos ¢ procedi- 6 Esta além dos objetivos desse artigo fazer uma avatingdo minuciosa das mudangas no princfpio D e sua relagao com o assim chamado prinefpio (U). Vale a pena, no entanto, fazer algumas observagées. Nas suas primeiras formulagées acerca da chamada ética do discurso, Habermas defendeu a idgia de que a validade das normas depende da aceitagio por todos aqueles afetados das suas consequencias e dos efeitos secundatios (side effects) produzidos ou antecipados pel sua observancia, (Habermas,1990:65), uma formulagio que supée um principio de validade universal. Tal formulac3o foi criticada por alguns dos colaboradores mais préximos de Habermas, entre eles Benhabib Cooke, Ambas argumentam que o prine’- pio (U) € muito contrafatual ¢ muito indeterminado. Ambas também sustentam que o princt pio (D) se basta (Cooke,1994:152-3), posigdio que estamos assumindo nesse artigo. 40 LUA NOVA N° 49 — 2000 mentos comunicativos.”(Habermas, 1994:5-6). ‘A concepgio habermasiana de discurso racional resgata a dimensao argumentativa do discurso na medida em que ela rejeita dois pressupostos: o pressuposto de que a vontade da maioria, ou a homogenei- dade da comunidade ética pode se auto-legitimar na politica moderna e 0 pressuposto de que é possfvel barganhar em torno de interesses pré-esta- belecidos. A essas duas concepgdes, Habermas opde uma terceira, que € baseada na idéia de deliberagdo argumentativa. Essa concepgo passa a atribuir & esfera piiblica o papel de se tornar o local de uma deliberagio comunicativa na qual as diferentes concepgdes morais ¢ as diferentes iden- tidades culturais se colocariam em contato, gerando uma rede de procedi- mentos comunicativos que, na concepgio do autor de Entre Fatos ¢ Normas se aproximaria da realizagao do prinefpio (D). De acordo com essa concepgio a deliberacdio democritica envolveria “uma soberania popular procedimentalizada e um sistema politico ligados a redes periféricas de uma esfera piblica politica. "(Habermas, 1994:7) A questo que se coloca para a concepgiio habermasiana de democracia deliberativa € como se daria a relagio entre essa rede de deli- berago piiblica e os sistemas politico e administrativo e, portanto, como pensar a forma institucional desses arranjos deliberativos. Habermas, no seu livro Entre Fatos e Normas, trabalha a questao da relagio entre este piiblica e arranjos administrativos. Seu pressuposto € de que “nos limites da esfera piiblica ou ao menos de uma esfera publica liberal, os atores podem adquirir somente influéncia mas néo podem adquirir poder politi- co... A influéncia publica é transformada em poder administrativo somente depois que ela passa pelos filtros dos procedimentos institucionalizados da formagdio democratica da opinido e da vontade politica e se transforma, por meio dos debates parlamentares, em uma forma legitima de legislagio.” (Habermas, 1995:371). A formulagio habermasiana exclui, portanto, a pos- sibilidade de arranjos deliberativos no nivel ptiblico. Para Habermas, a opiniao piiblica € informal e deve manter-se informal. Existe, portanto, uma contradigdo perpassando a forma como o conceito de deliberagao argumentativa € recuperado por Habermas. Por um lado, ele funda todo o proceso de legitimagdo dos sistemas politicos contempordineos, na medi- da em que o poder das estruturas administrativas no é capaz de gerar legi- timidade. Por outro, ele no € capaz de produzir arranjos institucionais, porque a sua forma nao supde nada mais que a influéncia em relagio ao sis- tema politico. Com Habermas, fecha-se uma circularidade no conceito de ‘TEORIA DEMOCRATICA E DELIBERAGAO PUBLICA 4) deliberagio. Tal circularidade se inicia com Rousseau, quando ele postula a idéia de deliberagao enquanto decisio. A concepgiio rousseauniana € apropriada pela teoria do elitismo democritico, que faz a tentativa mais radical de excluir os elementos argumentativos do conceito de deliber- agio. A partir de Rawls, 0 conceito de deliberaciio argumentativa vai sendo recuperado e, em Habermas, ele encontra a sua formulagio mais completa. No entanto, Habermas comete 0 equivoco oposto ao de Rousseau da teoria da escolha racional: ele se desobriga de pensar os elementos institucionais e/ou decisérios do conceito de deliberagao argu- mentativa e, com isso, deixa de dar formato institucional ao que podemos denominar democracia deliberativa. Na segio conclusiva desse trabalho remos abordar os elementos de uma proposta de. institucionalizagio piiblica da deliberagao, proposta essa que implicard em apontar qua 08 seus mecanismos e os seus féruns. is so OS FORUNS E OS MECANISMOS Joshua Cohen e James Bohman trabalham o problema da delibe- ragio na interseco entre as obras de Habermas e de Rawis. Cohen foi o primeiro autor a sacar conclusdes institucionais da intengZo rawlsiana ¢ habermasiana de recuperar elementos argumentativos na forma como eles concebem a deliberagio, Para ele, “porque os membros de uma associagio democrética consideram os procedimentos deliberativos como a fonte da legitimidade, ... eles preferem instituigdes nas quais as conexdes entre deli- beracio ¢ resultados sejam mais evidentes do que instituigdes nas quais tais conexdes sejam menos claras.” (Cohen, 1989:73). Ou seja, Cohen transforma © proceso de discussio argumentativa proposto por Rawls ¢ Habermas em um processo de deliberagiio institucional. Tal fato tem conseqiiéncias impor- tantes para a obra de Rawls, especialmente em relagdo & idéia de pluralismo razodvel, Para Cohen, o pluralismo razodvel implica a tentativa de propor um procedimento capaz_ de conduzir a decisdes politicas em situagdes nas quais a pluralidade de valores e concepgdes morais aparece como dada. Cohen define os procedimentos da democracia deliberativa da seguinte forma: “Nesses procedimentos os participantes tratam uns aos outros como iguais; eles tem a intencio de defender e de criticar instituigdes e programas em ter- mos que os outros teriam razdo para aceitar, dado que o fato do pluralismo supde que o outro € razodvel. Os individuos esto preparados para cooperar de acordo com 0s resultados dessa discussao tratando tais resultados como 42 LUA NOVA N° 49 — 2000 dotados de autoridade.” (Cohen, 1997:413). A tentativa de Cohen é, portanto, a de transformar 0 consenso rawlsiano que, como mostramos acima, € um consenso sobreposto € hipotético, em uma forma de operagdo das instituigdes politicas. Em uma situago de pluralismo, os individuos apresentam razdes e se, de fato, 6 possivel supor que os diferentes valores sao todos eles razoaveis e parti- Iham elementos comuns, € também licito supor que esses individuos serio capazes de chegar a algum tipo de acordo. No entanto, diferentemente de Habermas, Cohen supée que pode haver decisées que no ocorram por consenso ¢ que, ainda assim, sejam legitimas. “Mesmo quando existe dis- cordancia ¢ a decisao é tomada pela regra da maioria... a decisdo da maio- tia iré contar como uma razio para aceitar a decisio como legitima."(Cohen, 1997414). O argumento utilizado por Cohen é de que, se 0 processo de decisio, ainda que por maioria, for um processo inclusivo e baseado na troca de razdes, tal processo ser aceito pela minoria enquanto legftimo. Seria possfvel, no entanto, aproximar tal concepgaio, que tem um fundo eminentemente rawlsiano, da concep¢aio habermasiana de delibe- taco? E essa empreitada que se propés recentemente James Bohman. Bohman, em seu livro Public Deliberation, parte da concepgio habermasiana do consenso. Para Bohman, “a deliberagio publica [é] um processo dialdgico de troca de razdes com o objetivo de solucionar situa- Ges probleméticas que néo encontrariam resolugdo sem a coordenag’ cooperagiio entre as pessoas."(Bohman, 1996:27). Bohman faz uma tentati- va de integrar elementos dialégicos com uma concepgio de razio ptiblica €, ao mesmo tempo, de integrar os ptiblicos informais com algum elemen- to capaz de institucionalizar a deliberagdo publica. Para Bohman, a publi- cidade opera em diversos niveis: ela cria um espago social para a delibe- ragdo, ela governa os processos de deliberagio ¢ as razdes produzidas por ele. (Bohman, 1996:37). Bohman vai além de Habermas, na medida em que critica os limites da influéncia do piblico no sistema politico: a deliberag’io ocorre na medida em que os participantes em atividades conjuntas reco- nhecem que eles influenciaram e contribufram para que certos desfechos ocorressem. Certos tipos de influéncia nao sio suficientes para induzir a cooperacio. “ O didlogo deliberative serviria para minimizar essa forma de influéncia endégena e no publica e substitui-la pela influéneia das con- tribuigdes de um debate piblico em andamento.” (Bohman, 1996:33). A colocagdo de Bohman exerce, em relacio 3 teoria habermasiana, um papel semelhante aquele desempenhado por Cohen em relagio as formulagdes de Rawls: ele transforma a influéncia quase ficticia dos publicos no sistema ‘TEORIA DEMOCRATICA E DELIBERAGAO PUBLICA 43 politico em uma influéncia real. Nesse sentido, & possfvel pensar em um proceso puiblico de institucionalizagao da democracia deliberativa. No entanto, a pergunta que fica é: qual seria a forma e quais seriam os locais, da institucionalizagao da deliberagio publica? ‘A nosso ver, 0 local da democracia deliberativa deve ser os foruns entre o Estado e sociedade que tem surgido em paises tio diferentes quanto o Brasil, a India e os Estados Unidos. Esses fSruns seriam, no caso brasileiro, os conselhos e o orgamento participative (Abers, 1998; Santos, 1998; Avritzer,2000), no caso da {ndia, os Panchaiats (Isaac,2000) € no caso dos Estados Unidos, os arranjos deliberativos que articulam as politicas ambientais (Sabel,1999). Todos eles partilham trés caracteristi centrais para que a argumentagao deliberativa ocorra. A primeira dessas caracterfsticas € que todos esses casos impli- cam a cessiio de um espago decisério por parte do Estado em favor de uma forma ampliada e publica de participagiio. Apesar de participagiio e deli- beragiio nao serem sindnimos, parece interessante 0 fato de todos os arran- jos deliberativos se constituirem em formas ampliadas de participagio. A ampliagaio da participagiio parece, nesse caso, contribuir para a argumen- tagio. Em primeiro lugar, porque os atores trazem para os arranjos partici- pativos razées anteriormente nao contempladas pelas decisdes estatais. Nesse sentido, nao existem dividas de que muitos dos arranjos delibera- tivos, especialmente aqueles que lidam com decisdes sobre questées mate- riais, como € caso do orgamento participativo no Brasil, trabalham funda- mentalmente com a argumentagdo em torno de interesses distintos. O que 0 torna mais democraticos que os arranjos estatais baseados na aferigio de interesses, via formagdo de maiorias eleitorais, é a presenga permanente de um espago para a manifestagdo de interesses minoritérios ou para a justiti- cagio de uma ago estatal em favor de um interesse determinado. Nesse sentido, tanto a preocupagio rawlsiana quanto a preocupacao_haber- masiana parecem estar contempladas, na medida em que se substitui a per- cepgtio da falta da legitimidade do processo de agregagio de maiorias por um formato institucional no qual maiorias ¢ minorias, ou interesses sim- plesmente distintos, podem argumentar sobre as suas posigdes, algo que a teoria demoerdtica convencional julgava desnecessério. O segundo elemento relevante dos arranjos deliberativos é a forma como eles tratam a informagdo detida pelos atores sociais. Os arran- jjos deliberativos sio locais nos quais a informagao relevante para uma deliberagiio de governo é ou tornada publica, como é 0 caso das caréncias no orcamento participativo, (Avritzer, 2000) ou € socializada, caso dos 44 LUA NOVA N° 49 — 2000 arranjos ambientalistas nos Estados Unidos (Sabel,1999). Em ambos os casos, a forma de lidar com a informagao nos arranjos deliberativos é dife- rente da forma como se lida com a informagao nos arranjos decisionisticos Os arranjos decisionisticos supdem, seguindo a concep¢iio weberiana sobre a complexidade administrativa, no existirem maiores problemas envolvi- dos na tomada de decisao pelos aparatos administrativos. Nesse caso, as informagdes detidas pela buroeracia nfo necessitariam nem serem pablicas e nem serem partilhadas com os atores. Os novos arranjos deliberativos sc baseiam em duas mudangas em relago a essa concepcao de informaciio. A primeira € que o Estado, assim como 0 mercado, possui informagdes incompletas para a tomada de decisdes e que, portanto, é preciso que os atores sociais tragam informagées para que a deliberagdo contemple ple- namente os problemas politicos envolvides. Em segundo lugar, tais infor mages tém que ser partilhadas e discutidas, isso é, os arranjos delibera- tivos presumem que as informagées ou solugdes mais adequadas nao sito a priori detidas por nenhum dos atores e necessitam serem construfdas cole- tivamente. Existe um terceiro elemento que é préprio das formas deliberali- vas, que € a possibilidade de testar miltiplas experiéncias. Mais uma vez, vale a pena discutir 0 problema envolvido aqui com relagio & tradigiio do elitismo democratico e sua concepgio de monismo institucional, Na medida em que 0 clitismo democritico sustenta que todos os individuos tem um ranking de preferéncias dado e que as formas da. institucionalidade democritica sio fixas, ele supde que qualquer modificagdo experimental rompe com elementos de complexidade ou de racionalidade no interior do que se poderia denominar de subsistema politico, No entanto, os chamados arranjos deliberativos trabalham com a idgia de que a inovagao institucional depende da capacidade de experimentar e partilhar resultados. De acordo com essa concepgiio, a racionalidade ou a eficiéncia é gerada de forma descentralizada e a posteriori por miiltiplos experimentos. Nesse sentido, 0 elemento central dos arranjos deliberativos passa a ser a sua diversidade e ndo a sua unidade. Podemos, mais uma vez, observar tal elemento em ope- ragdo nas diversas experiéncias de deliberagiio argumentativa acima men- cionadas nas quais 0 elemento central passa a ser a possibilidade da variagao e nao da repetigdo institucional. Os arranjos deliberativos, nos casos do orga mento participative no Brasil ou dos planos de conservagio ambiental nos Estados Unidos, sao conhecidos cxatamente pela sua capacidade de variagao, variagiio essa partilhada pelos atores em piiblico. Se pensarmos as caracteristicas dos arranjos deliberativos argu ‘TEORIA DEMOCRATICA E DELIBERAGAO PUBLICA, 45 mentativos, podemos perceber que eles envolvem duas circularidades rela- cionadas no somente & oposiciio entre argumentagiio e decisio, mas rela- cionadas também a uma segunda tensio entre pluralismo cultural ¢ expe- rimentagdo administrativa. Na introdugao e na primeira segdo desse artigo, procuramos mostrar que quanto mais se fortaleceu na modernidade oci- dental a nogao da homogeneidade cultural mais também se supds que a varianga administrativa no fazia sentido. Rousseau, Max Weber e Schumpeter siio paradigmiticos a esse respeito. Todos eles partilham a idéia de que a democracia deve supor um nivel de homogeneidade cultural © moral capaz de evitar conflitos permanentes e sociedades parciais (Bohman, 1996:71). Os arranjos deliberativos argumentativos assumem justamente a hipétese contraria, isso é, que passamos a viver em sociedades que adquiriram um tal nivel de pluralismo de interesses, valores ¢ con- cepgGes morais que o surgimento de sociedades parciais ja é uma realidade. O problema da teoria democrdtica torna-se, desse modo, distinto: ela pre- cisa procurar incentivar formas de socializagiio da informagao ¢ formas de experimentagio que permitam o acomodamento da diferenga em novos arranjos administrativos. Esses arranjos necessariamente precisam ocorrer, como bem apontam Habermas e Bohman, fora do campo do Estado, em um espago cedido capaz de dar aos processo argumentativos a flexibilidade que eles requerem. No entanto, os seus resultados, como bem aponta Cohen, tem de ser capazes de vincular atores de forma tal que os resulta- dos das suas discussdes gerem instituigdes capazes de acomodar 0 novo pluralismo proprio as sociedades democrdticas do século XXI. LEONARDO AVRITZER € professor do Departamento de Ciéncia Polftica da UFMG REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ABBERS, R. (1998). “From clientelism to cooperation: local government, participatory pol- icy, and civic organizing in Porto Alegre, Brazil.” Pofiries and Society: 311-537. AVRITZER, Leonardo. 1996. A moralidade da democracia, $80 Paulo, PerspectivaJUFMG AVRITZER, L.. (2000). “Sociedade civil, espago pailico e poder local: uma andlise do orgit- mento pasticipativo em Belo Horizonte ¢ Porto Alegre.” Manuscrito. BACHRACH, P. (1967). 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Democracy and Difference: Princeton:Princeton University Press. rom Max 238 LUA NOVA N* 50 — 2000 TEORIA DEMOCRATICA E DELIBERAGAO PUBLICA LEONARDO AVRITZER A questo da deliberagio na teoria democrética é examinada mediante confronto entre dois modelos de deliberagio: 0 decisionista ¢ 0 argumentativo, A questo subjacente & a de onde e por que mecanismos se dé a deliberagao. Palavras-chave: deliberagio piblica; teoria democritica DEMOCRATIC THEORY AND PUBLIC DELIBERATION The question about deliberation in democratic theory is examined through the opposition between two models of deliberation: the decisionist and the argumentative. The underlying question concerns where and through which mechanisms does deliberation occur. Keywords: public deliberation; democratic theory

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