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A noite de Natal. Em meu País, agora Este ar frio que vem dos montes
O que não vai até romper o dia, a aurora! Traz consigo um eco de toadas distantes
As mesas de jantar na cidade e na aldeia Canção de pastores que sabe a rosmaninho
À luz das velas, ou à luz de uma candeia, [e a silva brava;
Entre risadas de crianças e cristais Cantigas ao relento
(de que me chegam até mim só ais, só ais!). No silêncio das noites consteladas
Dois milhões de almas e outros tantos corações,
Pondo de parte ódios, torturas, aflições, Vozes ao longe
Que o mel suaviza e faz adormecer o vinho: Há quantos séculos despertando o negrume do tempo
São todas em redor de uma toalha de linho!
António Nobre Luar de sonho
Que banhasse no misticismo da sua claridade
O coração dos homens simples.
Armando Côrtes-Rodrigues
NATAL
NATAL DE 1971
Ninguém o viu nascer.
Natal de quê? De quem? Mas todos acreditam
Daqueles que o não têm? Que nasceu.
Dos que não são cristãos? É um menino e é Deus.
Ou de quem traz às costas Na Páscoa vai morrer, já homem,
as cinzas de milhões? Porque entretanto cresceu
Natal de paz agora E recebeu
nesta terra de sangue? A missão singular
Natal de liberdade De carregar a cruz da nossa redenção.
num mundo de oprimidos? Agora, nos cueiros da imaginação,
Natal de uma justiça Sorri apenas
roubada sempre a todos? A quem vem,
Natal se ser-se igual Enquanto a Mãe,
em ser-se concebido, Também
em de um ventre nascer-se Imaginada,
em por de amor sofrer-se Com ele ao colo,
em de morte morrer-se, Se enternece
e de ser-se esquecido? E enternece
Natal de caridade, Os corações,
quando a fome ainda mata? Cúmplice do milagre, que acontece
Natal de qual esperança Todos os anos e em todas as nações.
num mundo todo bombas?
Natal de honesta fé, Miguel Torga
com gente que é traição,
vil ódio, mesquinhez,
e até Natal de amor?
Natal de quê? De quem?
Daqueles que o não têm,
ou dos que olhando ao longe
sonham de humana vida
um mundo que não há?
O dos que se torturam
e torturados são
na crença de que os homens
devem estender-se a mão?
Jorge de Sena
NATAL DOS POBRES NATIVIDADE
Quando a mulher adormeceu Arde no coração da noite
naquela noite de Natal, A ritual fogueira que anuncia
o homem foi, pé ante pé, O eterno milagre
pôr um sapato (dela, não seu) Do nascimento.
com um embrulho de jornal Batida pelo vento,
na lareirinha da chaminé. Que da cinza das brasas faz semente,
É um sol sem firmamento,
Um casal pobre... um ano mau... Directamente
Era um pedaço de bacalhau. Aceso
E preso
Ora alta noite, pela janela, À terra
com fome e frio, entrou um gato Por mãos humanas.
que, no escuro, cheirando aquela De raízes profanas,
comida boa no sapato, Lume de vida a bafejar a vida,
rasgou o embrulho, comeu, comeu O seu calor aquece
e, quente e farto, adormeceu. A única certeza que merece
Ser aquecida...
De manhã cedo, ela acordou, Miguel Torga
foi à cozinha e viu o gatinho
adormecido no seu sapato.
Voltando ao quarto, feliz, falou
para o seu homem: – Meu amorzinho,
como soubeste que eu queria um gato?
Leonel Neves
CANTIGA
Branca estais e colorada
Virgem sagrada!
Em Belém, vila do amor,
Da rosa nasceu a flor;
Virgem sagrada!
Em Belém, vila do amor,
Nasceu a rosa do rosal;
Virgem sagrada!
Da rosa nasceu a flor,
Pera nosso Salvador;
Virgem sagrada!
Nasceu a rosa do rosal,
Deus e homem natural,
Virgem sagrada!
Gil Vicente