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Começara cedo, logo no seu baile de finalistas.

Tinha então dezasseis anos e frequentava o último ano do Curso Geral de


Electricidade. Nem tinha pensado ir ao baile: não sabia dançar, não tinha fato, já
então não era dado a festas. Uma colega do Curso Comercial, cujo nome esquecera há
décadas, miudita, desengraçada, sardas e óculos, mas informal e vivaça, sempre de
calças de ganga, pouco usual naqueles tempos, admirou-se: — Não vais? Porquê?

Não sabia dançar. — Não é problema... Eu ensino-te...

A ideia entusiasmou-o. Embora a colega, mais ossos que carne, não fosse bem o seu
género, a crise da adolescência não contemporizava com esquisitices, como
lembravam os testículos sempre doridos, clamando por alívio satisfatório. Por
isso, como perdigueiro que aventa caça sem a avistar, seguiu o seu instinto, e sem
hesitações perseguiu a oportunidade inesperada.

Tinha imaginado o baile como os da aldeia, em que os rapazes se encontravam com as


raparigas para conversar, dançar, esfregar como quem não quer a coisa, se o olhar
vigilante e crítico de mães, tias e vizinhas o permitisse, pelo que nem lhe
ocorreu que precisava de indumentária adequada ao evento. É certo que tomou banho,
engraxou os sapatos, apinocou-se no fato de todas as cerimónias, que tanto servia
para casamentos como para funerais, para as festas da aldeia como para os exames
na escola.

Logo à entrada, apercebeu-se da asneira: rapazes e raparigas resplandeciam na


roupa nova, certamente acabada de estrear. Elas, muito mais altas e esbeltas,
fosse dos compridos vestidos brancos, fosse dos saltos altos que se vislumbravam
quando as saias subiam ligeiramente, esvoaçavam airosas, a felicidade estampada
nos rostos, o olhar embevecido e terno fixo nos olhos do par, num amplexo sensual
estimulado pelo Je t'aime... moi non plus que jorrava das potentes colunas de som
e penetrava até às partes íntimas, provocando aqui e ali, contou-se depois, algum
descontrole, compreensível tendo em conta a idade e a frustração sexual daqueles
tempos.

Nas mesas, pais e mães deleitavam-se com o voltear dos jovens, cumprimentavam
amigos e conhecidos, elogiavam mutuamente a elegância e a beleza das filhas, o
garbo dos filhos, a educação de uns e de outros; às vezes levantavam-se e roubavam
por momentos a filha aos braços ansiosos do namorado; rodopiavam então garbosos ao
ritmo da música naquele mar de gente enlaçada, tudo tão bem posto, todos tão
felizes, todos tão orgulhosos uns dos outros, orgulhosos da sua escola, orgulhosos
da festa primorosa,

— Que diabo faço eu aqui?

Devia ficar, deslocado como um peixe fora de água, ou partir, dizendo adeus aos
cinquenta escudos da entrada? Esperara que houvesse pouca gente, a colega ansiosa
aguardando a sua chegada para ser sua mestra privativa de dança e, quem sabe, lá
mais para a calada da noite, com o ambiente propício, talvez houvesse mais alguma
coisa...

Pegaram-lhe no braço: — Que bom, sempre vieste!

Olhou e teve dificuldade em reconhecer a colega do quarto ano. Como uma rapariga
muda do dia para a noite, o patinho feio era uma moça lindíssima, nada de óculos,
a maria-rapaz das calças de ganga trazia agora, também ela, um longo vestido
creme; enquanto procurava algo apropriado para dizer, logo um latagão de papillon,
reluzente de brilhantina, a levou para outra dança. A cena repetiu-se, eles quase
faziam bicha, às tantas teve oportunidade de lhe perguntar — Sempre me ensinas a
dançar? e ela pegou-lhe no braço, levou-o bem para o meio. — Não te preocupes,
deixa-te levar pela música que eu conduzo-te, e quando começava a apanhar o ritmo
e a saborear a dança, as colunas de som calaram-se momentaneamente e logo outros
pretendentes lhe roubaram o par.

Não, ali não era o seu lugar: após várias tampas de colegas, que certamente não
queriam ser vistas dançando com um troca-tintas tão mal aperaltado ou receavam
perder dança com príncipe encantado por estarem ocupadas com sapos, deitou um
último olhar ao baile e saiu, magicando nas justificações que teria de dar aos
colegas de quarto (— Grande parvo, havia de ser eu, se uma miúda me
convidasse...).

Fechava os olhos e apenas via moças lindas esvoaçando nos braços dos galãs (de
onde tinham saído tantos? e tanta brilhantina?) ao ritmo de uma valsa ou de um
tango, ora dengosas, olhando-os como actrizes de cinema, ora saltitando
freneticamente ao ritmo do Rockn'Roll, Have you ever seen the rain? ... Onde
estavam as feministas, as maria-rapaz ou até mesmo as sisudas, aquelas que nem
respondiam a um cumprimento de colegas, se no baile apenas vira ninfas da noite?

Na segunda-feira encontrá-las-ia,

— Gostaste do baile? Que foi feito de ti, que não te voltei a ver? Procurei-te em
vão..., mentiriam simpaticamente.

Sob a crua luz do dia, seriam novamente gatas-borralheiras: nos intervalos,


troçariam dos professores, discutiriam com os colegas livros e discos, o feminismo
emergente, a moda dos hot pants, por vezes até mesmo política, sempre à socapa, em
tom conspiratório, todos sabemos que a Pide está em todo o lado, não lhe faltam
informadores, de onde menos se espera é que eles saem.

(...)

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