hotine. 3 é mais do que terra/Jornal Meio Norte (27/03 - Miguel Rossetto, ministro do Desenvolvimento Agrério ‘A democratizagao do acesso a terra € apenas 0 primeiro passo para a construcéo de uma nova realidade fundidria para o Brasil. Compreender 0 enorme potencial econémico, social € ambiental da agricultura de cunho familiar é mais do que jogar milhares de familias sobre um pedago de terra e abandoné-las & propria sorte. E preciso quebrar o histérico paradigma do Estado brasileiro de que politica fundidria se encerra com a obtencao da terra © Programa Nacional de Crédito Fundiério que estamos lancando no préximo dia 27, no Rio Grande do Norte, busca justamente superar o conceito tradicional das politicas fundidrias. ‘Ao contrério do antigo Banco da Terra, que atuava mais como uma imobilidria de terras, 0 Crédito Fundiério é um programa estruturante, com alto controle social e complementar a reforma agréria (© Programa integra 0 novo Plano Nacional de Reforma Agraria (PNRA), lancado pelo presidente Luis Inacio Lula da Silva no final de 2003 - esse o mais ousado plano fundisrio j& langado no Pais. Tem como pressuposto a estruturacao de agricultores em éreas nao Passiveis de desapropriacdo para a reforma agréria. A Constituigo Federal nao permite a desapropriacdo de iméveis inferiores a 15 médulos fiscais. Isso compreende um universo de mais de 40 milhées de hectares que esto ociosos e que no podem ser desapropriados para a reforma agraria. Ignorar esse estoque de terras inaceitavel diante de uma nacao que urge por trabalho, renda e qualidade de vida. Mais do que financiar a compra da terra, 0 Crédito Fundidrio prevé recursos para a estruturacdo e consolidacao produtiva das familias beneficiadas. E direcionado a trés Publicos distintos. Agricultores que vivem nas regiées mais empobrecidas, em especial 0 Semi-drido nordestino, jovens agricultores, de 18 a 24 anos, que pretendem continuar a trabalhar na terra e que atuaro como agentes multiplicadores de novas tecnologias nas suas regiées. Também serdo atendidos aqueles agricultores mais estruturados que pretendem investir e até aumentar sua propriedade. Nos dois primeiros casos, os recursos Para infra-estrutura basica e produtiva nao sao reembolsdveis. © Crédito Fundirio também apresenta uma série de vantagens operacionais, como a reducao de mais de 30% no custo do financiamento em relacdo ao Banco da Terra. O bGnus de adimpléncia (desconto para pagamento em dia) varia de 15% até 40% sobre os juros e o principal. Ha ainda um bénus adicional de 10% para os agricultores que comprarem a terra com valor abaixo do preco de mercado. © Brasil é um dos poucos paises do mundo que tem no campo a oportunidade de gerar milhSes de empregos e renda com a producdo de alimentos sauddveis para 0 seu povo. & esse contexto que 0 Crédito Fundidrio se soma como um instrumento fundamental para a construcdo de uma nacéo com soberania alimentar, justiga social e dignidade para seu povo.AGRONEGOCIO VERSUS REFORMA AGRARIA “Placido Junior {6,822 caracteres sem espago} ‘Ao que parece, 0 governo elegeu 0 agro-hidronegé cio como modelo para o campo brasileiro, em detrimento da reforma agréria e da agricultura camponesa. Ao priorizar 0 agronegécio para exportagdo, com incentivos & ‘monocultura da soja, @ expanstio da pecudria e ao aumento do cultivo de cana-de-agticar para a produgo de alcool combustivel, © governo contribui para intensificar a concentragao fundidria e deixa milhares de familias @ espera de um pedago de terra O ano de 2007 foi pior do governo Lula em relagao as desapropriagdes de terras. Nao atingiu sequer suas proprias metas de assentar 100 mil familias. Os 204,5 mil hectares de terras desapropriadas em 2007 sdo suficientes Para assentar somente cerca de 6.000 familias. Por outro lado, ha cerca de 200 mil familias acampadas, segundo dados dos movimentos sociais do campo. Para justificar os nimeros irrisérios de hectares de terra desapropriados, 0 Ministro do Desenvolvimento Agrario, Guilherme Cassel, utiliza dois argumentos. O primeiro diz respeito a no atualizagao dos indices de produtividades. "Esse € 0 principal motivo. Por isso a gente est4 comprando mais terras, por isso a gente esta forgando acordos de terras antigas, e isso encarece’, afirma o Ministro. © segundo argumento seria a prioridade com a “qualidade” dos assentamentos, "Nao estamos ‘interessados em quantidade e, sim, em qualidade. Por isso assentamos bem menos em 2007" (Folha Online 7/1/08). ‘Apesar dos indices de produtividade utiizados pelo INCRA estarem defasados e os movimentos sociais reivindicarem sua atualizagao, esta medida por si sé no resolveria o problema da concentrago de terra, Na verdade, © Ministro Cassel tenta mascarar a falta de vontade politica do governo para fazer a reforma agraria e a subordinagso de nossa agricultura ao agro-hidronegé cio e as empresas transnacionais. O proprio Governo Federal tem se omitido nna reviséo dos Indices de produtividade, que aguarda a assinatura do Presidente ha mais de um ano. Areforma agraria pouco avangou durante o govemo Lula, tanto em tamanho quanto em qualidade. Os ntimeros © 0 modelo agricola pouco mudaram em relagdo aos governos anteriores. Ao fim da era de FHC os dados confimavam que a reforma agréria ainda precisava ser implantada em todo o Pals. De fato, em toda a historia do Incra, o nimero de desapropriagdes e de familias assentadas era minimo, diante das populagées de cada estado e da quantidade de mao de obra desempregada ou expulsa do campo Compra de terras versus desapropriago Dados do proprio incra revelam que 0 Brasil tem aproximadamente 130 milhées de hectares de terras improdutivas, ¢ 200 milhes de hectares de terras devolutas, que deveriam ser destinados para g reforma agraria. Para cumprir a meta de assentar 100 mil familias em 2007, 0 govemo Lula néo precisaria comprar.um, palmo de terra. O problema é que estas terras esto sendo disputadas pelo agro-hidronego cio, agora com a ‘demanda adicional das empresas de agrocombustiveis. © governo abriu mao do principal instrumento utiizado para a realizago da reforma agraria, que é a desaproptiagdo de terras e ignorou 0 descumprimento da fungao social da propriedade. Este 6 um dos instrumentos que punem o latifindio improdutivo ou que descumpre leis trabalhistas e ambientais. Por outro lado, acompra de terras revela a cumplicidade do governo com o latifindio concentrador de terras e de renda ‘Além de premiar o fatifndio, a medida de compra de terras custa mais caro aos cofres piblicos. O custo de assentar uma familia através do instrumento da desapropriagdo € de cerca de R$ 39.200,00. A aquisi¢g0 de terras via a compra direta custa em média R $ 65.600,00. O Ministério do Desenvolvimento Agrério (MDA) gastou ‘em 2007 0 equivalent a 1,4 bilh3o em compra de terras—1 bilhdo a mais do que em 2006 (Correio Brasiliense, 1101/2008),O falso dilema da qualidade versus quantidade Nao ha dividas que 0 volume de recursos destinados a areas de assentamentos ccresceu nos uitimos anos. No entanto, esse fato nao pode servir de argumento para uma ‘meta nao cumprida em relagdo & reforma agraiia. Além disso, 0 argumento da prioridade com a “qualidade” dos assentamentos néo € verdadeiro. De acordo com Jodo Pedro ‘Stédile, da coordenagao nacional do MST, “Das familias assentadas, apenas 10% tiveram aacesso ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). Temos mais de 40 projetos no Programa Nacional de Educacao na Reforma Agraria (Pronera) esperando recursos. E a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que tinha o melhor programa de compra antecipada, teve as atividades praticamente paralisadas em 2007" © agricultor Joao Elias, do assentamento Santa Helena | na Paraiba, explica que, “a dificuldade no € s6 minha como de todos os assentados. Aqui mesmo esta virando ‘um campo de plantagao de cana. O governo abandonou, o Banco do Nordeste vetou, no quer dar mais crédito pro agricultor. Nunca tivemos assisténcia técnica. Mas 0 que queremos 6 que o governo dé assisténcia pra plantar lavoura, porque foi desapropriada a terra pra plantar cultura, 0 milho, 0 feijao, 0 inhame, mandioca. Assim 0 trabalhador do campo ia viver melhor. Nao ia precisar de usina, no ia precisar plantar cana." Esta situagdo se repete em assentamentos de varias regides do pais. Os orcamentos das superintendéncias regionais do Incra permanecem estagnados € insignificantes. Sao irris6rios os investimentos na infra-estrutura dos assentamentos, tanto na dimensao social, como na produtiva, A Assisténcia técnica ndo melhorou nada, Na verdade, 0s investimentos na “qualidade’, de que fala 0 Ministro, ainda nao foram. feitos na reforma agréiria brasileira Enquanto so derramados ios de dinheiro nos mares de cana-de-agticar, a ‘eforma agraria anda a passos de tartaruga. Como alerta D. Tomaz Balduino, conselheiro da CPT, “E preciso ver nossa realidade, conseguir respostas a partir dos anseios das massas brasileiras, O neoliberalismo é predador, devastador. Pode ser que favorega as minorias ricas e © mundo europeu, mas aqui tem aumentado a disparidade, a desigualdade.” Enquanto nao realizamos a reforma agréria, continuamos no topo da lista dos paises com maior concentragao de terras do mundo. Segundo dados do INCRA, os iméveis classifiaados como grandes propriedades representam 1,6% do total, mas ocupam 43,7% das terras brasileiras, Em contrapartida, os iméveis clasificados como pequenas propriedades representam 85,2% e ocupam 20,1% da Area total Diante deste contexto, os movimentos sociais seguem denunciando © modelo agricola que concentra terra e renda e destr6i o meio ambiente. Ao mesmo tempo, lutam Pela defesa da agricultura camponesa e peta democratizagao da terra e suas riquezas, ara acabar com a fome, que ainda atinge milhdes de brasileiros. O futuro digno que queremos no campo e nas cidades depende da ampliagao da lula para afimar a soberania alimentar, a reforma agraria e a sustentabilidade em contraposi¢S0 a0 modelo agroexportador. * Placido Junior é da Comiss&0 Pastoral da Terra — CPT - PE {2} Comentiros:< [2] Comentire: