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Tempus fugit...

Eu tinha medo de dormir na casa de meu av. Era um sobrado colonial, longos corredores, portas grossas e pesadas que rangiam, vidros coloridos nos caixilhos das janelas, ptios calados com pedras antigas... De dia, tudo era luminoso. Mas, quando vinha a noite e as luzes apagavam, tudo mergulhava no sono: pessoas, paredes, espaos. Menos o relgio... De dia, ele estava l tambm. S que era diferente. Manso, tocando o carrilho a cada quarto de hora, ignorado pelas pessoas, absorvidas por suas rotinas. Acho que era porque durante o dia ele dormia. Seu pndulo regular era seu corao que batia, seu ressonar, e sua msica eram seus sonhos, iguais aos de todos os outros relgios. De noite, ao contrrio, quando todos dormiam, ele acordava, e comeava a contar estrias. S muito mais tarde vim a entender o que ele dizia: Tempus fugit... Todas aquelas horas vividas e morridas estavam guardadas. De noite, quando todos dormiam, elas saam. O passado s sai quando o silncio grande. Tempus fugit. O relgio toca de novo. Mais um quarto de hora. Mais uma hora no quarto, sem dormir... Sentia que o relgio me chamava para seu tempo, o tempo da vida que passou, por isto meu medo. Tenho saudades dele. Por sua tranqila honestidade, repetindo sempre, incansvel, Tempus fugit. Ainda comprarei um outro que diga a mesma coisa. Relgio que no se parea com este meu, no meu pulso, que marca a hora sem dizer nada, que no tem estria para contar. Meu relgio s me diz uma coisa: o quanto devo correr, para no me atrasar. Com ele, sinto-me tolo como o Coelho da estria da Alice, que olhava para seu relgio, corria esbaforido, e dizia: Estou atrasado, estou atrasado... No curioso que o grande evento que marca a passagem do ano seja uma corrida, corrida de S. Silvestre? Correr para aonde? Passagem de ano o velho relgio que toca o seu carrilho. O sol e as estrelas entoam a melodia eterna: Tempus fugit. porque temos medo da verdade que s aparece no silncio solitrio da noite, reunimo-nos para espantar o terror, e abafamos o rudo tranqilo do pndulo com enormes gritos. Contra a musica suave de nossa verdade, o barulho dos rojes... Pela manh, seremos, de novo, o tolo Coelho de Alice: Estou atrasado, estou atrasado... Mas o relgio no desiste. Continuar a nos chamar sabedoria: Quem sabe que o tempo est fugindo descobre, subitamente, a beleza nica do momento que nunca mais ser...

Lcio Ricardo Magalhes

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