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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoríam)
APRESENTAQÁO
DA EDIpÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanca a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanca e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
'.■" visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenca católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.
Eis o que neste site Pergunte e
Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
_ vista cristáo a fim de que as dúvidas se
X dissipem e a vivencia católica se fortaleca
" no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabal no assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.
Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.
Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicacáo.
A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaga
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
ANO XXXIV

SETEMBRO

1993

SUMARIO
<

Palávra Eficaz e Penetrante


, o»

i o A morte e o além: como entendé-los?


Vi
UJ
"Um judeu original. Repensando o Jesús Histórico" por J.P. IV
a

I
Castigo até a terceira e quarta geracáo? y.

UJ A B íbl ia das Testemu nhas de Jeová

Associacao de Telespectadores e Radiouvintes


RGUNTE E RESPONDEREMOS SETEMBRO 1993
Publicado mensal N9 376

etor-Responsável SUMAR 10
Esteva o Bettertcourt QSB
Autor e Redator de toda a materia Palavra Eficaz e Penetrante 385
Dublicada neste periódico
Questao delicada:

ítor-Adm in istrador: A morte e o além: como entendé-los? . . 386


3. Hildebrando P. Martins OSB Um livro cn'tico:
"Um judeu original. Repensando o Jesús
ninistracáo e distribuicao:
Histórico" por J.P. Meier 406
Edicoes "Lumen Christi"
íua Dom Gerardo, 40 — 5? andar — sala 501 Textos bíblicos em aprofundamento:
Tel.: (021) 291-7122 Castigo ató a terceira e quarta geracao?.. 421
:ax (021) 263-5679
Traducao do Novo Mundo:
A Biblia das Testemunhas de Jeová. . . . 428
lereco para correspondencia:
Ed. "Lumen Christi" Associacao de Telespectadores a
;a¡xa Postal 2666 Radiouvintes 434
íep 20001-970 - Rio de Janeiro - RJ

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GRÁFICOS £ EDITORES S.A.
Telí.: 1021) 273-3498 / 273-9447

NO PRÓXIMO NÚMERO:
Novos Movimentos Religiosos. - "Jesús dentro do Judaismo" (J. Charles-
rth). — Ainda os Judeus Messiánicos. — A Privatizacao da Fé. — Abstinencia de
ne: por qué? — A Ester¡l¡zacá*o das Pessoas Deficientes. — Aids e Castidade. —
lem e o Mal: Maniqueísmo?

COM APROVAQAO ECLESIÁSTICA


4SSINATURA ANUAL (12 números) CR$ 850,00 - n° avulso ou atrasado CR$ 85,00

O pagamento podará será sua escolha: v

. Enviar EM CARTA cheque nominal ao Mosteiro de Sao Bento, cruzado, anotando no


verso: "VÁLIDO SOMENTE PARA DEPÓSITO na conta do favorecido" e, onde consta
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to do Rio de Janeiro, enviando a seguir xerox da guia de depósito para nosso controle.

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Sendo novo Assinante, é favor enviar carta com nome e endereco legíveis.
Sendo renovacao, anotar no VP nome e endereco em que está recebendo a Revista.
PALAVRA EFICAZ E PENETRANTE. . .
(Hb4,12)

O mes de setembro é o mes da Biblia,... da Biblia que, de um lado, é


tao recomendada pela Igreja e, de outro lado, táo difícil e ardua a muitos
leitores.
Porque tao recomendada?
- Porque a Biblia está em íntima relacá*o com o misterio da Encarna-
cá*o ou do Verbo feito carne, que é o misterio central do Cristianismo (cf.
Jo 1,14). Já antes que o Verbo de Deus se fizesse carne do homem, Ele se
fez palavra do homem, entrando no linguajar pobre e rude dos antigos ori
entáis. Tal é o valor da Escritura Sagrada: é a palavra humana assumida pe
lo próprio Deus para exprimir o plano salvífíco do Senhor. Assím entendi
da, a Biblia é um sacramental, ou seja, urna mensagem que santifica o lei
tor nao apenas na medida do que ele entende, mas também, e principal
mente, na medida da fé e do amor com que ele lé; esse sacramental nos
poe em comunhao com o próprio Deus, preparando e continuando a co
munhao que se dá no sacramento da Eucaristía. Toda palavra é um miste
rio, porque implica um pouco da vida e da riqueza de quem fala: quem
muito lé as obras de determinado escritor, poe-se a comungar com o modo
de pensar e amar desse autor. Conseqüentemente, quem lé assiduamente a
Palavra de Deus, ná*o pode deixar de entrar em comunhao com o pensa-
mentó e o amor do próprio Deus.
Por que entáo essa Palavra é tao difícil para muitos leitores?
- Porque ela participa das notas da Encarnacao do Verbo. Quem via
Jesús caminhando pelas estradas da Palestina, sentindo cansaco, fome e se
de..., quem o viu dilacerado pelos maus tratos da sua Paixao..., devia ter
dificuldade para penetrar no misterio desse Divino Mestre, tao desfigurado
pelo elemento humano que Ele assumira e que O cercava. — Assim tam
bém é a Palavra de Deus: revestida de roupagem humana, arcaica e, além
do mais, dilacerada por copistas, tradutores, fragilidade de papiros e perga-
minhos, essa Palavra pode parecer insignificante ou desprezível aos olhos
do leitor despreparado. Todavía quem aceita considerá-la de mais perto,
recolocando-a em seu ambiente de origem e procurando entendé-la segun
do o Espirito que a inspirou, descobre nela um alimento precioso para o
seu percurso de peregrino. É pela experiencia que se comprova a teoría.
Comece o leitor pelos Evangelhos; depois de lidos e retidos, passe aos Atos
e as epístolas dos Apostólos; tendo compreendido um pouco do Novo Tes
tamento, sentirá a necessidade de conhecer o Antigo Testamento, pois o
Novo está latente no Antigo, como o Antigo está patente no Novo.
0 Verbo feito carne na plenitude dos tempos, o Verbo feíto palavra
humana para o anunciar e comentar, o Verbo feito Pao consagrado, eis
tres dons insopatáveis que o Paí oferece a todo cristao. Feliz é quem os
reconhece! B,g^o" *jl'cA
E.B.
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS"

ANO XXXIV - N? 376 - Setembro de 1993

Questáo delicada:

AMORTE EOALÉM:
COMO ENTENDÉ-LOS?

A questao dos últimos fins é muito atual e complexa, pois sobre ela
se projetam diversas correntes do pensamento moderno. Ademáis é de im
portancia capital, pois o fim ou o ponto de chegada é que dita as etapas da
caminhada de alguém. Por isto a Comissao Teológica Internacional elabo-
rou a respe¡to um documento que apresenta a doutrina católica, tendo em
vista a problemática contemporánea. Publicamos, a seguir, as suas linhas-
mestras, considerando que o mes de novembro se abre com a Solenidade
de Todos os Santos (19/11) e a Comemoracao de Todos os Fiéis Defun-
tos(2/11).

O TEXTO

INTRODUQÁO: PERPLEXIDADE FRENTE A MORTE

"Se é só para esta vida que temos colocado nossa esperanca em Cris
to, somos os mais dignos de lástima dentre todos os homens" (1Cor 15,
19). Sem tal esperanca seria impossível levar urna vida crista.

Todavia, o mundo contemporáneo p5e numerosas insi'dias á esperan


ca crista. Ele é, de fato, fortemente marcado pelo secularismo, "que con
siste em urna visao autonómica do homem e do mundo, que prescinde da
dimensao do misterio, antes a descura e a nega. Esse imanentismo é urna re-
ducao da visao integral do homem".4 O secularismo constituí quase urna
atmosfera, no interior da qual vivem muiti'ssimos crístaos do nosso tempo.

4 Sínodo dos B/'spos 1985, ReíaqSo final II A,l.

386
A MORTE E O ALÉM

Somente com grande dificuldade eles podem libertar-se do seu influxo.


Por isso nao é de se admirar que também entre alguns cristaos surjam per-
plexidades acerca da esperanca escatológica. Freqüentemente consideram
com angustia a morte futura; afligem-se ná*o só "com o pensamento do
avizinhar-se da dor e da dissolucao do corpo, mas também, e mesmo mais
ainda, pelo temor de que tudo acabe para sempre".5 Em todos os tempos
da historia os cristaos foram expostos ás tentacoes da dúvida. Mas, em
nossos tempos, as ansiedades de mu ¡tos cristaos parecern mostrar um en-
fraquecimento da esperanca.

Como "a fé é o fundamento das coisas que se esperam e a prova da-


quelas que nao se véem" (Hb 11,1), será oportuno ter presentes com
rnaior constancia as verdades da fé que se referem ao destino futuro. Pro
curaremos reuni-las em urna sintese, colocando sobretudo em evidencia
aqueles aspectos que podem proporcionar diretamente urna resposta ás an
siedades contemporáneas. A fé assim amparará a esperanga.

A ESPERANZA CRISTA DA RESSURREICÁO

1. A Ressurreicao de Cristo e a nossa

.... "Cristo ressuscitou dos mortos, primicias daqueles que estao


mortos" (1Cor 15,20). Esse modo de falar mostra que o fato da ressurrei-
gao de Cristo nao é algo de fechado em si mesmo, mas se estenderá um dia
aqueles que sao de Cristo. Visto ser a nossa ressurreica*o futura a extensao
da mesma ressurreipao de Cristo aos homens, compreende-se bem que a
ressurreicao do Senhor é o modelo da nossa ressurreicao. A ressurreicao de
Cristo é também a causa de nossa ressurreicao futura, "porque, a morte
tendo vindo por um homem, é por um homem também que vem a ressur
reipao dos mortos" (1Cor 15,21). Por meio do nascimento batismal da
Igreja e do Espirito Santo, ressuscit amos sacramental mente em Cristo res-
suscitado (cf. Cl 2,12). A ressurreiccío daqueles que sao de Cristo, deve ser
considerada como o ápice do misterio já iniciado no Batismo. Poressa ra
zio ela se apresenta como a comunháo suprema com Cristo e com os ir-
maos e também como o objeto mais alto da esperanga: "E estaremos para
sempre com o Senhor" (1Ts 4, 17; "estaremos" no plural!). Portante a
ressurreicao final gloriosa será a comunháo perfeitissima, também corpo
ral, entre aqueles que sSo de Cristo, já ressuscitados, e o Senhor glorioso.
De tudo isso se vé que a ressurreigao do Senhor é como o espaco de nossa
futura ressurreicá*o gloriosa e que a nossa própria futura ressurreicao é in
terpretada como um acontecimento eclesial.

5 Concilio do Vaticano II, Gaudium et Spes n? 18.

387 .
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

Por causa dessa nossa fe*, como Paulo no Areópago, também os cris
taos do nosso tempo, quando proclamam a ressurreícao dos mortos, sSo
objeto de mofa (cf. At 17,32). A situacao atual sobre esse ponto nao ó di
ferente daquela que Orígenes dese revía no seu tempo: "Além disso, o mis
terio da ressurreigao, já que nao é compreendido, tornou-se objeto de crí
ticas zombeteiras da parte dos infléis"".

A profissao da ressurreicao, desde os tempos patrísticos, é formulada


de modo muito realista. Parece que a fórmula "ressurre¡cá*o da carne" te-
nha entrado no Símbolo romano antígo, e depois dele em mu ¡tos outros,
para evitar urna ¡nterpretacao espiritualista da ressurreicáo, a qual porin-
fluxo gnóstico atraía alguns cristaos. No Concilio de Toledo XI (675) vem
exposta a doutrina de modo reflexo: rejeita-se a opiniao de que a ressurrei
cao se realize "em urna carne aérea ou em urna outra qualquer"; a fé se re
fere á ressurreicao "nesta (carne) em que vivemos, subsistimos e nos mo
vemos"; esta confissao tem presente o "modelo a nos oferecido em Cristo
nossa Cabeca (nosso Chefe)".16 Essa última alusao a Cristo ressuscita-
do mostra que o realismo é mantido de modo que nao exclua a trans-
formacao dos corpos que vivem na térra, em corpos gloriosos. Mas um
corpo etéreo, que seria urna criacao nova, nao correspondería a realidade
da ressurreicao de Cristo e introduziria com isso um elemento mítico

2. A Parusia de Cristo, nossa ressurreicao

2.1. No Novo Testamento é atribuido á ressurreicao dos mortos um


momento temporal determinado. Paulo, depois de ter enunciado que a res
surreicáo dos mortos realizar-se-á por Cristo e em Cristo, acrescenta: "cada
um, porém, na sua ordem: primeiro Cristo, que é a primicia; depois, quan
do de sua vinda, aqueles que estao em Cristo" (1Cor 15,23: en té parousía
autou). É indicado um acontecimento concreto como momento da ressur
reicao dos mortos. A palavra grega parousia significa a segunda vinda, aín
da futura, do Senhor na gloria, diversa da primeira vinda: em humíldade:
a manifestarlo da gloria (cf. Tt 2,13) e a manifestado da parusia (cf. 2Ts
2,8) se referem á mesma vinda. O mesmo acontecimento é expresso no
Evangelho de Joao (6,54) com as palavras "no último día" (cf. também
Jo 6,39-40)

Os teólogos que propoem a ressurreicao na morte, querem suprimir a


existencia, depois da morte, de "urna alma separada", que consideram um

13 Orígenes, Contra Celsum 1,7 (GCS 2,60). 2


16 Denzinger - Sch'ónmetzer, Enchiridion ... 540

388
AMORTEEOALÉM

residuo do platonismo. É muito compreensível o temor que move os teó


logos favoráveis á ressurreicao na morte: o platonismo seria um gravísimo
desvio da fé crista". Segundo esta, de fato, o corpo nao é um cárcere, do
qual é necessário libertar a alma.

Nao faltam teólogos, favoráveis á teoría da ressurreicao na morte, que


procuraram a solucao naquilo que se chama o atemporalismo: afirmando
que depois da morte nao pode existir mais o tempo de nenhum modo, re-
conhecem que as mortes dos homens sao sucessivas, enquanto sao conside
radas deste mundo; mas tém para si que sao simultáneas as suas ressurrei-
coes na vida depois da morte, na qual nao se conheceria nenhum a especie
de tempo. Essa tentativa de atemporalismo, pela qual coincidirían! as mor
tes individuáis sucessivas e a ressurreicao coletiva, implica recorrer a urna
filosofía do tempo estranha ao pensamento bíblico. O modo de se expri
mir do Novo Testamento sobre as almas dos mártires nao parece subtraí-
las nem de toda a realidade da sucessao nem de toda a percepcao da suces
sao (cf. Ap 6,9-11). De modo semelhante, se nao houvesse nenhuma
especie de tempo depois da morte, nem mesmo um meramente análogo ao
terreno, nao se compreenderia fácilmente por que Paulo, aos Tessaloni-
censes que o ¡nterrogavam sobre a sorte dos mortos, fale da sua ressurrei
cao com fórmulas ao futuro (anastésontai) (cf. 1Ts 4,13-18)

3. A comunháo com Cristo logo depois da morte, segundo o Novo Tes


tamento

3.1 Os primeiros cristaos experimentaran! o fato de que alguns dos


seus foram levados pela morte antes da parusia. Pois que estavam preocu
pados com sua sorte (1Ts 4,13), Paulo os consola recordando-Ihes a dou-
trína da ressurreicao futura dos fiéis defuntos: "Os mortos que estao em
Cristo ressuscitarao em primeiro lugar" (1Ts 4,16). Essa persu asa o da fé
deixava aberta outras questSes que logo surgiram; por exemplo: em que
estado, entretanto, se achavam tais defuntos? Para esse problema nao foi
necessário elaborar urna resposta completamente nova, porque em toda a
tradicao bíblica se encontravam elementos para resolvé-la. O povo de Is
rael, desde as prime iras fases de sua historia que nos sao conhecidas, pen-
sava que algo dos homens subsistisse depois da morte. Esse pensamento
emerge na mais antiga representacao daquilo que era chamado o cheol.

3.2. A antiga concepcá*o hebraica do cheol, na sua primeira fase de


evolucao, era muito imperfeita. Imaginava-se que, em contraposicá"o ao
céu, ele estivesse debaixo da térra. Daqui se formou a expressao "descer

389
6 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

ao cheol (Gn 37, 35; SI 55, 16 etc.). Aqueles que habitam nele sSo cha
mados refaim. Essa palavra hebraica na*o possui singular: isso parece indi
car que nao se prestava atencáo á sua vida individual. Ná*o louvam a Deus
e estío separados dele. Todos, como urna massa anónima, tém a mesma
sorte. Nesse sentido a persistencia depois da morte que se Ihes atribuí,
nao inclui ainda a idéia de retribuicao.

3.3. Simultáneamente a essa represéntamelo comecou a aparecer a


crenca no fato de que a onipoténcia de Deus pode libertar alguém do
cheol (ISm 2,6; Am 9,2 etc.). Por me ¡o dessa fé, prepara-se a idéia da res-
surre ¡gao dos mortos, expressa em Dn 12,2 e em Is 26,19 e que no tempo
de Jesús prevalece amplamente entre os hebreus, com a conhecida exceclo
dos saduceus (cf. Me 12,18).

A fé na ressurreica*o introduz urna evolugao no modo de compreen-


der o cheol. O cheol já nao se concebe mais como um domicilio comum
dos mortos, porém como dividido em dois seto res, dos quais um é desti
nado aos justos e o outro aos impíos

3.4. No Novo Testamento, ensína-se urna sobrevivencia ¡mediatamen


te depois da morte que nao coincide com a ressurreicao, a qual, certa-
mente, no Novo Testamento jamáis se poe em conexao com a morte. é
necessário acrescentar que, enquanto se afirma essa sobrevivencia, se sali-
enta, como idéia central, a comunhao com Cristo.

Assim Jesús crucificado promete ao bom ladrao: "Em verdade


(amén) eu te digo, desde hoje estarás comigo no paraíso" (Le 23,43). O
paraíso é um termo técnico hebraico, que corresponde á expressao Gan
Edén. Mas ¡sso se afirma sem ulterior descripao: a idéia fundamental é que
Jesús quer acolher o bom ladrao em comunhao consigo ¡mediatamente de
pois da morte. Estévao durante o apedrejamento manifesta a mesma espe
ranza; ñas palavras: "Ah! disse ele, eu vejo os céus abertos e o Filho do
homem de pé á direita de Deus" (At 7,56), juntamente com a sua última
oracao: "Senhor Jesús, acolhe meu espirito" (At 7,59), afirma que espera
ser acolhido ¡mediatamente por Jesús na sua comunhao.

EmJo 14,1-3 Jesús falaaosseusdiscípulosdasmuitasmoradasqueexis-


tem na casa do Pai. "Quando eu tiver ido e vos tiver preparado um lugar,
voltarei para tomar-vos comigo, a fim de que lá onde eu estou, estejais vos
tambérn" (v.3). Sem dúvida, estas palavras se referem ao tempo da morte
dos discípulos, e nao á parusia, a qual no Evangelho de Joao passa para se
gundo plano (enquanto nao é assim na primeira carta de Joao). Novamen-
te a ¡déia de comunhao com Cristo é central. Ele é nao so "o caminho

390
A MORTE E O ALÉM

(mas também) a verdade e a vida" (Jo 14,6). É necessário notar a seme-


Ihanca verbal entre monai (moradas) e menein (permanecer). Jesús, refe-
rindo-se á vida terrena, nos exorta: "Permanecei em mim, como eu em
vos" (Jo 15,4), "permanecei em meu amor" (v.9). Já sobre a térra "se al-
guém me ama, guardará minha palavra e meu Pai o amará e nos viremos a
ele e fa remos nele nossa morada (monén)" (Jo 14,23). Essa "morada", que
é comunhao, torna-se mais intensa depois da morte.

3.5. Paulo merece especial atencao. Sobre o estado intermedio, o seu


trecho principal é Fl 1,21-24: "Para mim a vida é Cristo e morrer represen
ta um lucro. Mas, se a vida neste corpo me permitir ainda um frutuoso tra-
balho, hesito em fazer urna escolha. Sinto-me pressionado nessa alternati
va: de urna parte, eu tenho o desejo de me ir e de estar com Cristo, o que
seria muito mais preferível; de outra parte, permanecer na carne é mais
necessário para o vosso bem". No versículo 21 "a vida" ("o viver", to zén)
é sujeito e "Cristo" é predicado. Assim se acentúa sempre a idéia de co
munhao com Cristo, a qual, iniciada na térra, é proclamada como o único
objeto de esperanca na situacao depois da morte: "estar com Cristo"
(v.23). A comunhao depois da morte torna-se mais intensa e, por isso, é
desejável o estado depois da morte.

Na mesma carta aos Fil¡penses, na qual expoe o motivo pelo qual se


pode desejar o estado intermedio, fala, com grande alegría, da esperanca
da pa rusia do Sen no r, "o qual transfigurará o nosso corpo de miseria para
conformá-lo ao seu corpo de gloria" (Fl 3,21). Por isso, o estado interme
dio é concebido como transitorio, sem dúvida desejável pela uniao que im
plica com Cristo, de modo que a ressurreicao dos corpos permaneca sem
pre a esperanca suprema: "é necessário, com efeito, que este ser corruptí-
vel (istoé.ocorpo) revista a incorruptibilidade, que este ser mortal revista
a ¡mortalidade" (1Cor 15,53).

4. A realidade da ressurreicao no contexto teológico atual

4.1. Compreende-se fácilmente que, partindo dessa dupla linha dou-


trinal do Novo Testamento, toda a tradicSo crista, sem exceccies de grande
importancia, tenha concebido, quase até aos nossos dias, o objeto da espe
ranca escato lógica como constituido de urna dupla fase. Ela afirma que,
entre a morte do homem e o fim do mundo, subsiste um elemento cons
ciente do homem, que designa com o nome de "alma" (psyché), usado
também pela Sagrada Escritura (cf. Sb 3,1; Mt 10,28) e queja na morte é
merecedora de retribuicáo. Na parusia do Senhor, que se dará no fim da
historia, se espera a ressurreicáfo bem-aventurada "daqueles que forem de

391
8 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

Cristo" (1Cor 15,23). De entao em diante cometa a glorificarlo eterna de


todo homem já ressuscitado. A sobrevivencia da alma consciente, previa á
ressurreicao, preserva a continuidade e identidade da subsistencia entre o
homem que vive e o homem que ressurgirá, enquanto gracas a ela o ho
mem concreto jamáis cessa totalmente de existir.

4.2. Como excecSes contrarias a essa tradicao, podem-se recordar al-


guns cristaos do segundo sáculo, os quais, sob o influxo dos gnósticos, se
opunham á "salvacáo da carne", denominando ressurreicao a pura sobre
vivencia da alma dotada de certa corporeidade. Outra excecao é o "tnetop-
siquismo" de Taciano e de alguns hereges árabes, os quais pensavam que o
homem morresse totalmente de modo que nem a alma sobreviveria. A res
surreicao final era concebida como urna nova criacao do homem morto.

Depois desses, até quase aos nossos tempos, nao houve praticamente
nenhuma excecao sobre esse tema. Martinho Lutero nao constituí urna ex
cecao, urna vez que admite a dupla fase escatológica. Segundo ele, a morte
é "a separacao da alma e do corpo"; ele afirma que as almassobrevivem en
tre a morte e a ressurreicao final, embora tenha expresso dúvidas sobre o
modo de conceber o estado em que as almas se acham entre a morte e a
ressurreipao: algumas vezes admite que possivelmente no céu os santos re-
zem por nos; outras vezes, ao invés, pensou que almas se acham em um
estado de sonó. Nao negou jamáis, por isso mesmo, o estado intermedio;
apenas o interpretou de modo diverso da fé católica.46 A ortodoxia lutera
na conservou a dupla fase, abandonando a idéia do sonó das almas.

4.3. A negacáo da dupla fase comecou a propagar-se pela primeira vez


no sáculo XX. A nova tendencia apareceu em alguns teólogos evangélicos
e, certamente, na forma da morte total (Ganztod, como o antigo "tnetop-
siquismo") e de urna ressurreicao no fim dos tempos, entendida como cria-
cao a partir do nada. As razSes, que evocavam, eram prevalentemente con-
fessionais: o homem nao poderia apresentar nada de próprio em face de
Deus, nao só as obras, mas nem mesmo a própria imortalidade natural da

46 Cf. BENEDICTUS XII, Const. Benedictas Deus (DENZ-SCH'ÓNM.


1.000), onde se afirma que as almas dos santos, "¡mediatamente depois da
morte" e "antes da ressurreicSo dos seus corpos e do¡uizo universal", ve-
rao e vém a divina esséncia com urna visSo intuitiva e também "facial",
sem mediacao de nenhuma criatura que tenha a funcao de objeto visto,
mas pelo fato de que a esséncia divina se Ihes mostra abertamente,claramente;
que, assim vendo, as almas dos que safram deste mundo gozam da mesma
esséncia (divina) e que, por causa dessa visSo e gozo, sio verdadeiramente
bem-aventurados e possuem urna vida e um repouso eterno".

392
AMORTEEOALÉM

alma; observar-se-ia a seriedade da morte so mente se visasse a todo o ho


mem e nao só ao corpo; já que a morte é a pena do pecado e todo homem
é pecador, o homem todo deve ser atingido pela morte, sem que se julgue
que a alma, na qual se acha a raiz do pecado, venha a ser libertada na mor
te. Pouco a pouco, quase de modo programático, comecou a ser proposto
um novo esquema escatológico: sonriente a ressurreicao em lugar da ¡mor
tal idade e da ressurreicáo.

Essa tendencia apresentava muiti'ssimas dificuldades: se todo o ho


mem desaparece na morte, Deus poderia criar um homem completamente
igual áquele; mas, se entre os dois nao há nenhuma continuidade existen-
cial, o segundo homem nao pode ser o mesmo que o prímeiro. Por isso se
elaboraram novas teorías que afirmam a ressurreipao na morte, para que
nao exista um espago vazio entre a morte e a parusia. Deve-se confessar
que dessa maneira e ¡ntroduzido um tema desconhecido no Novo Testa
mento, urna vez que no Novo Testamento se fala sempre da ressurreicao
na parusia e jamáis na morte do homem.

Quando a nova tendencia comecou a se introduzir por alguns teólo


gos católicos, a Santa Sé, por urna carta enviada a todos os bispos,45 consi
dero u a mesma dissonante do legítimo pluralismo teológico.

4.5. Na historia desse problema se propos mais tarde umoutro modo de


argumentara favor da fase única. Objeta-se que o esquema da dupla fase ter-
se-ia originado de umacontaminacao (influxo) produzidapelo helenismo. A
única idéia bíblica seria a da ressurreigSb; ao contrario, a i mortal idade da
alma derivaría da filosofía grega. Por conseqüéncia, propoe-se purificar a
estatologia crista de todo acréscimo do helenismo.

Deve-se reconhecer que a idéia da ressurreicao é um tanto recente na


Sagrada Escritura (Dn 12,1-3 é o primeiro texto indiscutível quanto ao as-
sunto). A mais antiga concepcao dos hebreus afirmava, antes, a persisten
cia das sombras dos homens que tinham vivido (refaim) em um lugar co-
mum dos mortos (cheol), diferente dos sepulcros. Esse modo de pensaré
bastante semelhante ao modo como Homero falava das almas (psychai) no
averno (hades). Tal paralelismo entre a cultura hebraica e a grega, que exis
te também em outras épocas, faz duvidar da sua su posta oposicao mutua.
Na antiguidade, ao longo de todas as margens do mar Mediterráneo, as
semelhancas culturáis e os influxos recíprocos foram muito maioresdoque

4Í CONGREGAQÁO PARA A DOUTRINA DA FÉ.ep. Recentioresepis-


coporum Synodi (17 de maio 1979), A AS 71 (1979) 939-943.

393
JO "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

freqüentemente se pensa, sem que constituam um fenómeno posterior á


Sagrada Escritura e contaminador de sua mensagem. Por outra parte, nao
se pode supor que somente as categorías hebraicas tenham sido instrumen
to da revelacao divina. Deus falou "muitas vezes e de muitas maneiras"
(Hb 1,1). Nao se pode pensar que os livros da Sagrada Escritura, nosquais
a inspiracao se exprime com palavras e conceitos culturáis gregos, tenham,
por isso, uma autoridade menor do que a dos que foram escritos em he
braico ou aramaico. Enfim, nao é possível falarde mentalidade hebraica e
grega como se se tratasse de unidades simples. As concepcSes escatológicas
imperfeitas dos patriarcas foram aos poucos aperfeicoadas pelas revelacoes
posteriores. De sua parte, a filosofía grega ná*o se reduz ao platonismo ou
ao neoplatonismo. Isso nao pode ser esquecido, visto terem existido mui-
tos contatos dos Padres nSo só com o platonismo medio, mas também
com o estoicismo

5. O homem chamado á ressurreicáo

5.1. O Concilio Vaticano ensina: "Na unidade de corpo e alma, o ho


mem, por sua própria condigao corporal, sintetiza em si os elementos do
mundo material, que por meio dele assim atingem sua plenitudee levantam
a voz para louvar livremente o Criador (...). O homem na verdade nao se
engaña quando se reconhece superior aos elementos materiais, e nao se
considera somente uma partícula da natureza ou um elemento anónimo
da cidade humana. Com efeito, por sua vida interior, o homem excede a
universalidade das coisas. Ele penetra nesta intimidade profunda quando
se volta ao seu coracao, onde o espera Deus, que perscruta os coracSes, e
onde ele pessoalmente sob os olhares de Deus decide a sua própria sorte.
Deste modo, reconhecendo ter uma alma espiritual e ¡mortal, longe de tor-
nar-se joguete de uma criacao imaginaria provocada somente pelas condí-
coes físicas e sociais exteriores, o homem, ao contrario, toca a verdade
mais profunda da realidade das coisas."51

Essa antropología torna possível a escato logia, já citada, da dupla fa


se. Posto que essa antropología crista incluí uma dualidade de elementos
(o esquema "corpo-alma"), que se podem separar de modo que.um deles
("a alma espiritual e ¡mortal") subsista e sobreviva separado, foi ás vezes
acusada de dualismo platónico. A palavra "dualismo" se pode entender de
varias maneiras. Por isso, quando se fala de antropología crista, é melhor
usar o termo "dualidade". Doutra parte, visto que na Tradicao crista o es
tado de sobrevivencia da alma depois da morte na*o é definitivo nem onto-
logicamente último, mas "intermedio" e transitorio, e, por fim, ordenado

51 Gaudium et Spes, n. 14.

394
AMORTEEOALÉM 1t

á ressurreipao, a antropología crista* tem características de todo próprias e


é diferente da conhecida antropología dos platónicos.

5.2. Além disso nao se pode confundir a antropología crista com o


dualismo platónico, pois na antropología crista o homem nao é somente a
alma, sendo o corpo ná*o mais que um caree re detestavel. 0 cristao nao se
envergonha do corpo como faz Plotino. A esperanca da ressurreipao sería
um absurdo para os platónicos, porque nao se pode por a esperanca em
um retorno ao cárcere. A esperanpa crista da ressurreipao, ao contrario,
ocupa um posto central no Novo Testamento. Em conseqüéncía, com tal
espe ranga a teología crista primitiva considerava a alma separada um
"meio homem" e daí deduzía que era conveniente que depois seguisse a
ressurreipao: "Sería indigno de Deus levar á salvacáo um meio-homem"."
Santo Agostinho exprime bem o pensamento comum dos Padres, quando
escreve acerca da alma separada: "É inerente á alma urna especie de anseío
natural de governar o corpo ... enquanto nSo se reunir com o corpo, de
modo que aquele seu anseio fique satisfeito em governar o corpo".57

5.3. A antropología de dualidade se acha em Mt 10,28: "Nao temáis


aqueles que matam o corpo, mas nao podem matar a alma. Temei antes
Aquele, que pode precipitar a alma e o corpo na geena". Este logion (sen-
tenca), entendido á luz da antropología e da escatologia daquele tempo,
nos ensina que é um fato querido por Deus que a alma sobreviva depois da
morte terrena até que na ressurreicao se reúna, de novo, ao corpo. Nao é
de se maravilhar que o Senhor tenha pronunciado essas palavras por oca-
siao de um ensinamento sobre o martirio. A historia bíblica mostraque o
martirio, na verdade, constituí também o momento privilegiado no qual
se iluminam com a luz da fé tanto a criacao feita por Deus, quanto a futu
ra ressurreicao escatológica e a promessa da vida eterna (cf. 2Me 7,9.11.
14.22-23.28 e 36).

Também no Livro da Sabedoria a revelacáo da escatologia das almas


se acha em um contexto no qual se fala daqueles que "aos olhos dos ho-
mens sofreram castigos" (Sb 3,4); se, "aos olhos dos insensatos estao mor-
tos, e seu desenlace é julgado como urna desgrapa" (Sb 3,2), "as almas dos
justos, ao invés, estao ñas maos de Deus" (Sb 3,1)

5.4. Aceitando fielmente as palavras do Senhor em Mt 10,28, "a Igre


ja afirma a continuidade e a sobrevivencia, depois da morte, de um ele
mento espiritual dotado de consciéncia e de vontade, de forma que subsis-

" Tertulianas,, De resurrectione mortuorum 34,3'(CCL 2J964).


" S. Augustinus, De Genesi ad litteram 12,35 (CSEL. 28/1,432-433).

395
]2 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

ta o mesmo "eu" humano, embora Ihe falte o complemento do seu cor


po".58 Essa afirmacao se baseia sobre a dualidade característica da antro
pología crista

6. A Morte Crista

6.1. A concepcao antropológica característicamente crista oferece um


modo concreto de compreender o sentido da morte. Como na antropolo
gía crista o corpo nao é um cárcere, do qual o encarcerado deseja fugir,
nem um vestido que se possa tirar fácilmente, a morte considerada natural
mente nao é para o homem uma coisa desejável nem um acontecimento
que o homem possa enfrentar com ánimo tranquilo, sem que tenha de su
perar previamente a repugnancia natural. Ninguém deve envergonhar-se
dos sentimentos de natural aversao que experimenta em face da morte,
pois o próprio Jesús quis sofré-los diañte da própria morte e Paulo confes-
sa havé-los tido: "Ná*o desejamos ser despojados, mas revestidos de uma
veste nova" (2Cor 5,4). A morte cinde o homem intrínsecamente. Mais
aínda: já que a pessoa humana nao é somente a alma, mas alma e corpo es-
sencialmente unidos, a morte golpeia a pessoa.

O absurdo da morte aparece mais claro se consideramos que na or-


dem histórica ela existe contra a vontade de Deus (cf. Sb 1, 13-14; 2,
23-24}: porque "o homem teria sido subtraído á morte corporal, se ná*o
tivesse pecado." A morte é aceita com certo sentimento de penitencia
da parte do cristao que tem diante dos olhos as palavras de Paulo: "O sa
lario do pecado é a morte, enquanto o dom de Deus é a vida eterna em
Cristo Jesús, nosso Senhor" (Rm 6,23).

É também natural que o cristao sofra por causa das pessoas que ama.
"Jesús pós-se a chorar" (Jo 11,35) pelo seu amigo Lázaro, que estava mor-
to. Também nos podemos e devemos chorar os nossos amigos mortos.

6.2. A repugnancia que o homem experimenta em face da morte e a


possibilidade de superar tal repugnancia revelam uma atitude típicamente
humana, completamente diversa da de qualquer animal. Dessa maneira a
morte é uma ocasiao na qual o homem pode e deve mostrar-se como ho
mem. O crist2o pode, além disso, superar o temor da morte, apoiando-se
em outros motivos.

59 CongregagSo para a Doutrina da Fé, ep. Recent¡ores Episcoporum Sy-


nodi n? 3, AAS 71 (1979) 941.

65 CONCÍLIO VATICANO II, Gaudium et Spes, n. 18.

396
A MORTE E O ALÉM 13

A fé e a esperanea nos mostram urna outra face da morte. Jesús assu-


me o medo da morte á luz da vontade do Pai (cf. Me 14,36). Ele morre pa
ra "libertar aqueles que, pelo medo da morte, estavam, toda a vida, sujei-
tos a urna verdadeira escravidao" (Hb 2,15). E por isso que já Paulo pode
ter o desejo de partir para estar com Cristo; essa comunháo com Cristo de-
pois da morte é considerada por Paulo, em comparacáo com o estado da
vida presente, como algo que "seria, e de muito, prefen'vel" (cf. Fl 1,23).
A vantagem desta vida consiste no fato de que "habitamos no corpo" e
assim temos a nossa plena realidade existencial; mas em relacao á plena co
munháo depois da morte "estamos em exilio longe do Sen no r" (2Cor 5,6).
Se bem que com a morte saiamos deste corpo e nos vejamos assim priva
dos de nossa plenitude existencial, aceitamo-la de bom grado; mais ainda
poderemos desejar, quando ela acontecer, "ir habitar junto do Senhor"
(2Cor 5,8). Esse desejo de comunháo com Cristo, depois da morte, que
pode coexistir com o temor natural da morte, aparece mais vezes na tradi-
cao espiritual da Igreja, sobretudo nos santos, e deve ser entendido no seu
verdadeiro sentido. Quando este desejo chega ao ponto de louvar a Deus
pela morte, tal louvor nao se baseia sobre urna valorizacao positiva do mes-
mo estado no qual a alma está sem o corpo, porém sobre a espe ranea de
possuir o Senhor mediante a morte. A morte é considerada, entao, como
porta que conduz á comunháo com Cristo e nao como libertadora da alma
nos confrontos de um corpo que se constituiría um ónus para ela.

Também a dor e a doenca, que sao um inicio da morte, devem ser as-
sumidas pelos cristaos de modo novo. Já em si mesmas sao suportadas com
mal-estar, mas ainda mais enquanto sinais do progredir da dissolucao do
corpo. Entao, com a aceitacá"o da dor e da doenca, permitidas por Deus,
tornamo-nos participantes da Paixao de Cristo, e, oferecendo-as, nos uni
mos ao ato com o qual o Senhor ofereceu a própria vidaao Pai para a salvacao
do mundo. Cada um de nos deve afirmar como Paulo ¡"Completo na minha
carne o que falta aos sofrimentos de Cristo, a favor do seu corpo, que é
a Igreja" (Cl 1,24). Por meio da associacao á Paixao do Senhor, somos
conduzidos a possuir a gloria de Cristo ressuscitado: "levando sempre e
por toda a parte em nosso corpo os sofrimentos de morte de Jesús, a fim
de que a vida mesma de Jesús seja manifestada em nosso corpo" (2Cor
4, 10). v-

6.3. Esse aspecto positivo da morte se alcanca só através do modo de


morrer que o Novo Testamento denomina "morte no Senhor": "Bem-
aventurados os mortos que doravante morrem no Senhor" (Ap 14,13).
Essa "morte no Senhor" é desejável enquanto nos conduz á beatitude e é
preparada por urna vida santa;

397
14 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

é participacSo no misterio pascal de Cristo. Os sacramentos nos dispSem


para tal morte. O batismo, noqual morremos misticamenteparao pecado,
nos consagra pela participacSo na ressurreicSo do Senhor (cf. Rm 6,
3-7). Quando recebe a Eucaristía, que ó medicina de ¡mortalidade, ocris-
tao recebe a garantía de participar na ressurre¡cá*o de Cristo.

6.4. Cedo surgiram — e certamente sob o influxo da fé na ressurrei-


cao dos mortos — os usos cristaos de sepultar os cadáveres dos fiéis. O
modo de falar, expresso na palavra "cemitério" (em grego koimétórion,
dormitorio) ou "deposicao" (em latim depositio direito, de Cristo, de re
cuperar o corpo do crístao, em oposicfo á "doacao"), pressup6e essa

Por muito tempo ficou proibída a cremacao dos cadáveres, porque


históricamente era tida em conexá"o com a mentalidade neoplatónica, a
qual pela cremacao visava á destruicao do corpo, a fim de que a alma se
libertasse totalmente do seu cárcere (em tempos mais recentes implicava
urna posicao materialista ou agnóstica). A Igreja agora nao a proíbe "a
menos que seja escolhida por motivos contrarios á doutrina crista".78
Deve-se cuidar para que a atual difusao da cremacáfo, também entre os ca
tólicos, nao obscureca de alguma maneira sua cometa compreensao da res-
surreicáo da carne.

7. O "consorcio vital" de todos os membros da Igreja em Cristo

7.1. A eclesiologia da comunháb, que é muito característica do Con


cilio Vaticano II, ensina que a comunháo dos santos, ou seja, a uniao dos
irmaos em Cristo, a qual consiste nos vínculos de caridade, nao se ínter-
rompe com a morte, mas, antes, é consolidada pela comunícacao dos bens
espirituais, segundo a fé perene da Igreja. A fé dá aos cristaos que vivem
sobre a térra, a possibilidade de comunicar em Cristo com as próprias pes-
soas caras já arrebatadas pela morte. Essa comunícacao se dá por meio de
diversas formas de oracao

Ademáis, a Igreja nos exorta comempenhoa invocá-los humildemente


e a recorrer ás suas oracSes, ao seu poder e ajuda para obter beneficios de
Oeus, por meio de seu Filho Jesús Cristo, Nosso Senhor, que é o único Re
dentor e Salvador. Essa invocacao dos santos é um ato pelo qual o fiel se
recomenda confiadamente á sua caridade. Sendo Deus a fonte da qual
se difunde toda a caridade (cf. Rm 5,5), a invocacáo dos Santos é reconhe-

78 CIC 1176,3.

398
AMORTEEOALÉM ' 15

cimento de Deus como fundamento supremo da caridade dos Santos, e


tende, como último término, a Deus.

7.2. A idéia da evocacao dos espfritos é completamente diferente do


conceito de ¡nvocacao. O Concilio Vaticano II, ao recomendar a invoca-
cao das almas dos bem-aventurados, recordou também os principáis docu
mentos provindos do magisterio da Igreja "contra qualquer forma de evo-
cacao dos esp fritos".86 Essa constante pro ib ¡cao tem origem bíblica, já no
Antigo Testamento (Dt 18, 10-14; cf. também Ex 22,17; Lv 19,31; 20,
6.27). é muito conhecida a narracao da evocacáfo do espirito de Samuel
da parte de Saúl (1Sm 28,3-25), á qual a Sagrada Escritura atribuí a rejei-
cao, ademáis também a morte, de Saúl: "Assim Saúl morreu por causa da
sua infidelidade ao Senhor, porque nao Ihe escutou a palavrae porque ti-
nha evocado um espirito para consultá-lo. Nao tinha consultado o Senhor;
por isso o Senhor fé-lo morrer e transferiu o reino para Davi, filhode Jes-
sé" (1Cr 10,13-14). Os apostólos mantém essa pro ib i pao no Novo Testa
mento, recusam todas as artes mágicas (At 13,6.12; 16,16-18; 19,11-20).

No Concilio Vaticano II, a Comissao Doutrinat explicou o que se en-


tende com a palavra "evocacao": seria qualquer método "por meio do
qual se procura, com técnicas humanas, urna común ¡cacao sensível com os
espfritos ou as almas separadas para obter noticias e diversos auxilios".87
Esse conjunto de técnicas se costuma designar geralmente pelo nome de
"espiritismo". Com freqüéncia — como refere a resposta citada — preten-
de-se, com a evocacao dos espiritos, obter noticias ocultas. Nesse campo,
os fiéis devem dirigir-se aquilo que Deus revelou: "Tém Moisés e os Profe
tas; escutem-nos" (Le 16,29). Urna curiosídade ulterior sobre coisas depois
da morte é tolice e, por isso, é rejeitada.

Nao faltam, hoje, seitas que rejeitam a invocacáo dos Santos, como é
praticada pelos católicos, baseando-se na proibicao bíblica: desse modo
nao a distinguem da evocacao dos espiritos. De nossa parte, ao exortarmos
os fiéis a invocar os Santos, devemos ensiná-los a invocá-los de modo a nao
oferecer ás seitas ocasiao para tal confusao.

7.3. Relativamente ás almas dos defuntos que, depois da morte, tém


necessidade aínda de purificado, "a Igreja eré que recebem alivio median
te os sufragios dos fiéis vivos, como o Sacrificio da Missa, as oracoes, as es-

86 Concilio Vaticano II. Lumen Gentium, n. 49.


87 Ad caput Vil de Ecclesia, ad modum 35, in Acta Synodalia 5/8, 144.

399
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

molas e outras práticas de piedade, que os fiéis costumam oferecer pelos


outros fiéis, segundo as disposicSes da Igreja".89

8. Purificacao da alma para o encontró com Cristo glorioso

8.1. Quando o magisterio da Igreja afirma que as almas dos santos


¡mediatamente depois da morte gozam da visao beatífica de Deus e da
comunháo perfeita com Cristo, pressupSe sempre que se trate das almas
que se acham purificadas.91

A Igreja confessa que qualquer mácula é impedimento para o encon


tró íntimo com Deus e com Cristo. Este principio é entendido nao so a
propósito das máculas que rompem e destroem a amizade com Deus e que,
por isso, se permanecem na morte, tornam o encontró com Deus definiti
vamente impossível (pecados mortais), mas também a propósito das faltas
que obscurecem essa amizade e que devem ser previamente purificadas,
para que tal encontró seja possível. A elas pertencem os assím chamados
"pecados quotidianos" ou veníais e as conseqüéncias dos pecados, as quais
podem também permanecer no homem justificado depois da remissao da
culpa, pela qual se excluia pena eterna. 0 sacramento da Uncao dos Enfer
mos tem como fim a purificacao dos resquicios dos pecados antes da mor
te. Só se nos tornamos conformes a Cristo, podemos estar em comunháo
com Deus (cf. Rm 8,29).

Por isso somos incitados á purificacao. Até aquele que se lavou, deve
liberar-se do pó dos pés (cf. Jo 13, 10). Para aqueles que nao se purifica-
ram suficientemente sobre a térra com a penitencia, a Igreja eré que existe
um estado de purificacSo depois da morte, ou seja, urna purificacao prece
dente á visao de Deus. Visto tal purificacao acontecer depois da morte e
antes da ressurreicao final, esse estado pertence ao estado escato lógico in
termedio; mais aínda, a existencia desse estado mostra a existencia de urna
escatologia intermedia.

A fé da Igreja'acerca desse estado implícitamente se exprimía já ñas


oracoes pelos defuntos, das quais existem numerosos testemunhos muito
amigos ñas catacumbas e que, por fim, se baseiam sobre o testemunho de
2Mc 12,46. Nessas oracSes se pressupSe que os defuntos possam ser ajuda-
dos para conseguir a sua purificacao pelas oracSes dos fiéis. A teología re
lativa a esse estado comecou a se desenvolver no século Illa propósito da-
queles que foram readmitidos em paz com a Igreja sem ter cumprido a pe
nitencia completa antes de sua morte.

89 Concilium Florentinum, Decretum prograecis, in DENZ.SCHÓNM.


1.314.
91 Benedictos XII Const. Benedictus Deus, in DENZ.-SCHÓNM. 1.000.

400
AMORTEEOALÉM 17

É absolutamente necessário conservar a prática da oracSo pelos de-


funtos. Nela se contém urna profíssSo de fé na existencia desse estado de
purificacao. Tal é o sentido da liturgia exequial, que nao deve ser obscure
cido: o homem justificado pode ter necessidade de urna ulterior purifica-
gao

8.2. A Igreja eré que existe um estado de condenacao definitivo para


aqueles que morrem afetados de pecado grave. Nao se deve absolutamente
entender o estado de puríficacá"o para o encontró com Deus, de modo
muito semelhante ao da condenacao, como se a diferenca entre as duas
consistisse so no fato de que urna seria eterna e a outra temporaria; a puri
ficacao depois da morte é totalmente diferente do castigo dos condenados.
Na realidade um estado cujo centro é o amor e o outro cujo centro é o
odio, nao podem ser postos em comparacáfo. O justificado vive no amor de
Cristo. O seu amor torna-se mais consciente com a morte. O amor que vé
retardada a posse da pessoa amada, sofre e com ador se purifica. Slo Joao
da Cruz explica que o Espirito Santo, como "chama viva de amor", puri
fica a alma, para que chegue ao amor perfeito de Deus, tanto aqui na térra
como depois da morte, se fosse necessário. Nesse sentido estabelece certo
paralelismo entre a purificacao que acontece ñas assim chamadas "no¡tes",
e a purificacao passiva do purgatorio.

9. Irrepetibilidade e unicidade da vida humana. Os problemas da reen


carnacao

9.1. Com a palavra reencarriacao (ou também com outras equivalen


tes, como os termos gregos metempsychósis ou ¡ metensdmatosis) é deno
minada urna doutrina a qual sustenta que a alma humana depois da morte
assume outro corpo e, assim, se encarna de novo. Trata-se de urna concep-
cao nascida no paganismo, a qual, por contradizer completamente á Sagra
da Escritura e á Tradicao da Igreja, foi sempre rechacada pela fé e pela teo
logía crista.

A "reencarnacao" se difunde, hoje, largamente no mundo, também


no ocidental, e entre muitíssimosque se dizem cristaos. Numerosos meios
de común ¡cacao de massa a promovem. Além disso, dia-a-dia, torna-se
mais forte o influxo das religiSes e das filosofías orientáis que sustentam a
reencarnaca*o; parece favorecer tal influxo o aumento de urna mentalidade
sincretista. A fácil idade com que muitos aceitam a reencarnacao, talvez se
deva a urna reacio espontánea e instintiva contra o crescimento do mate
rialismo. No modo de pensar de muitos homens de nosso tempo, esta vida
terrena é sentida como muito breve para que se. possam realizar todas as
virtualidades de um homem ou para que possam ser superadas ou corrigi-
das as faltas cometidas nela.

401
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

A fé católica tem urna resposta plenamente satisfatória a esse modo


de pensar. É verdade que a vida é muito breve para que possam ser supera
das ou corrigidas as faltas nela cometidas; mas a purif¡cacao escatológica
será perfeita. Nem mesmo é possfvel realizar todas as virtualidades de um
homem no tempo tao breve de urna so vida terrena; mas a ressurreicao fi
nal na gloria conduzirá o homem a um estado que supera todos os seus
desejos.

9.2. Sendo, aqui, impossível expor detalladamente todos os aspectos


pelos quais os diferentes reencarnacionistas expoem o seu sistema, a ten
dencia ao reencarnaciónismo que prevalece, hoje, no mundo ocidental,
pode ser reduzida sintéticamente a quatro pontos:

9.2.1. As existencias terrenas sao muitas. A nossa vida atual nao é


nem a nossa primeira existencia corporal nem será a última. Já vivemos
antes e viveremos ainda repetidamente em corpos materiais sempre novos.

9.2.2. Há urna lei na natureza que impele a um continuo progresso


até chegar á perfeicao. Essa mesma lei conduz as almas a vidas sempre no
vas e nao permite retorno, nem mesmo urna parada definitiva. A fortiori, é
excluido um estado definitivo de condenacáo sem fim. Depois de muitos
ou poucos sáculos, todos chegarao á perfeicao final de um puro espirito
(negacao do inferno).

. 9.2.3. A meta final se alcanca pelos próprios méritos; em cada nova


existencia a alma progride em proporcáo aos próprios esforcos. Todo o
mal cometido será reparado com expíacdes pessoais, que o próprio espiri
to padece em encarnacoes novas e dif icéis (negacao da redencao).

9.2.4. Na proporcáo em que a alma progride em direcao á perfeicáo


final, assumirá ñas suas novas encarnacoes um corpo cada vez menos ma
terial. Em tal sentido, a alma tem urna tendencia para urna definitiva inde
pendencia do corpo. Por essa via a alma chegará a um estado definitivo,
no qual finalmente vivera sempre libertada do corpo e independente da
materia {negacao da ressurreicao).

9.3. Esses quatro elementos que constituem a antropología reencar-


nacionista, contradizem as afirmacoes centráis da revelacao crista. Nao é
preciso insistir ulteriormente sobre sua disseme I nanea nos confrontos com
a antropologia característicamente crista. O cristianismo defende urna
dualidade; a reencarnacao, um dualismo, no qual o corpo é um mero ins
trumento da alma, que é abandonado depois de cada existencia terrena,
para tomar outro totalmente diverso. No campo escatológico, o reencarna-
cionismo recusa a possibilidade de urna condenacáo eterna e a idéia da
ressurreicao da carne.

402
AMORTEEOALÉM 19

Mas o seu erro principal consiste na negapáo da soteriologia crista. A


alma se salva por meio do seu próprio esforco. Portanto, sustenta uma so
teriologia auto-redentora, absolutamente oposta á doutrina da salvacio
rtétero-redentora crista. Se se suprime a héteroredencao, nao se pode mais
falar de Cristo Redentor. O núcleo da soteriologia do Novo Testamento es
tá contido nestas palavras: "Tal foi o beneplácito de sua livre vontade, pa
ra o louvor de gloria de sua grapa, que nos gratificou no seu Filho bem-
amado. Nele temos a redencao pelo seu sangue, a remissao dos pecados se
gundo as riquezas de sua grapa" (Ef 1,6-8). Sobre esse ponto central está
de pé ou caí toda a doutrina sobre a Igreja, sobre os sacramentos e a grapa.
é evidente, assim, a gravidade das doutrinas implicadas nesse problema e
se compreende por que o magisterio da Igreja tenha refutado tal sistema
com o nome de teosofismo.

Em referencia ao ponto específico, afirmado pelos reencarnaeionis-


tas, da repetibilidade da vida humana, é conhecida a afirmapao da Carta
aos Hebreus 9,27: "É ¿stabelecido que os homens morram uma só vez,
após o que vem o juízo". 0 Concilio Vaticano II citava esse texto para en-
sinarque o curso de nossa vida é único.110

10. A grandeza do projeto divino e a seriedade da vida humana

10.1 Na unicidade da vida humana é que se vé claramente a sua serie


dade: a vida humana nao se pode repetir. Sendo a vida terrena a estrada
para as realidades escatológicas, o modo como procederemos nela tem
conseqüéncias irrevogáveis. Por isso esta nossa vida corporal conduz a um
destino eterno

10.3. Jesús, ao revelar-nos os segredos do Pai, deseja tornar-nos seus


amigos (cf. Jo 15,15). Mas nenhuma amizade pode ser imposta. A amiza-
de, como também a adopáo, sao oferecidas para serem livremente aceitas
ou recusadas. A felicidade do céu é a consumapáo da amizade oferecida
gratuitamente por Cristo e livremente aceita pelo homem. "Estar com
Cristo" (Fl 1,23} na condipao de amigo constituí a esséncia da eterna bem-
aventuranpa celeste (cf. 2Cor 5,6-8; 1Ts 4,17). O tema da visao de Deus
"face a face" (1Cor 13,12; cf. Uo 3,2) deve entender-se como expressao
de amizade íntima (cf. já no Ex 33,11: "O Senhor falava com Moisés face
a face, como um homem fala com um seu amigo").

Essa amizade consumada, livremente aceita, implica a possíbílidade


existencial da recusa. Tudo aquilo que se aceita livremente, pode ser recu
sado livremente. Quem escolhe assim a recusa, "ná"o terá parte no reino de

110 Cf. Concilio Vaticano II, Lumen Gentium, n. 48.

403
20 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993 __

Cristo e de Deus" (Ef 5,5). A condenacSo eterna tem a sua origem na livre
recusa, até ao fim, do Amor e da Piedade de Deus. A I groja eré que esse es
tado consiste na privacao da visao de Deus e na repercussao eterna dessa
pena em todo o próprio ser. Essa doutrina de fé mostra tanto a importan
cia da capacidade humana de recusar Deus livremente como a gravidade
dessa livre recusa. Enquanto o cristao permanece nesta vida, sabe que está
colocado sob o juízo futuro de Cristo: "Devemos todos, portante, compa
recer diante do tribunal de Cristo, para que cada um reencontré o que ti-
ver feito enquanto estava no corpo, tanto de bem como de mal" (2Cor5,
10). Sonriente diante de Cristo e por meio da luz por ele comunicada tor-
nar-se-á inteligível o misterio de iniqüidade que existe nos pecados que
cometemos. Por meio do pecado grave o homem, no seu modo de agir,
chega a considerar Deus como inimigo da própria criatura e, antes de tudo,
como inimigo do homem, como fonte de perigo e de ameaca para o ho
mem.

Já que o curso de nossa vida terrena é único (Hb 9,27) e já que nele
nos sao oferecidas gratuitamente a amizade e a adocao divinas com o peri
go de perdé-las mediante o pecado, revela-se, claramente, a seriedade desta
vida; de fato, as decisoes que nela se tomam, tém conseqüéncias eternas. O
Senhor pos diante de nos "o caminho da vida e o caminho da morte" (Jr
21,8). Embora nos convide, por meio da graca preveniente e adjuvante,
para o caminho da vida, podemos escolher um dos dois. Depois da escolha,
Deus respeita seriamente a nossa liberdade, todavía sem cessar, aqui na tér
ra, de oferecer a sua graca salvífica também aqueles que estao separados
dele. Na realidade é necessário dizer que Deus respeita aquilo que qu¡se
rnos fazer livremente de nos mesmos, tanto aceitando a graca como a re
cusando. Nesse sentido, compreende-se que tanto a salvacao como a con-
denacao comecam aqui na térra, na medida em que o homem, com suas
decisSes moráis, livremente se abre ou se fecha para Deus. De outra
parte, torna-se claramente manifesta a grandeza da liberdade humana e da
responsabilidade que se deriva déla.

Todo teólogo é bem consciente das dificuldades que o homem, tanto


do nosso tempo como de qualquer outro tempo da historia, experimenta
para aceitar a doutrina do Novo Testamento sobre o inferno. Por isso, de-
ve-se recomendar muito ter um ánimo aberto para a sobria doutrina do
Evangelho tanto para expó-la como para cré-la. Contentes de tal sobrieda-
de, devemos evitar a tentativa de determinar, de modo concreto, as vias
por meio das quais podem ser conciliadas a infinita bondade de Deus e a
verdadeira liberdade humana. A Igreja toma a serio a liberdade humana e a
misericordia divina, que concedeu ao homem a liberdade como condicao
para obter a salvacao. Quando a Igreja reza pela salvacao de todos, na reali
dade está rezando pela salvacSo de todos os homens que vivem. Deus"quer
que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verda-

404
A MORTE E O ALÉM 21

de" (1Tm 2,4). A Igreja sempre acreditou que essa vontade universal salví-
fica de Deus tem, de fato, urna grande eficacia. Jamáis a Igreja ratificou a
condénselo de alguma pessoa em concreto. Mas, sendo o inferno urna ver-
dadeira possibilidade real para cada homem, nao é lícito — se bem que no-
je o esquecam muitas vezes na pregacao durante as exequias — pressupor
urna especie de automatismo da salvacao. Por isso, em relacao a essa dou-
trina, é absolutamente necessário fazermos nossas as palavrasde Paulo: "O'
abismo da riqueza, da sabedoria e da ciencia de Deus! Quá*o insondáveis
sao os seus decretos e incompreensíveis os seus caminhos!" (Rm 11,33).

10.4. A vida terrena, para os reencarnacionistas, parece müito breve


para poder ser única. Por tal razáo pensam na sua reiterabilidade. O cris-
tao deve ser consciente da brevidade desta vida terrena, que muito bem
sabe ser única. Já que "todos sem excecao faltamos em muitas coisas"
(Tg 3,2) e o pecado tem sido freqüente em toda nossa vida passada, é ne
cessário que, "aproveitando bem o tempo presente" (Ef 5,16) e rejeitando
"todo fardo e o pecado que nos enreda, corramos com constancia na corri
da que nos é proposta, fixando nossos olhos no autor da nossa fé, Jesús,
para que a leve á perfeic§o" (Hb 12, 1-2). "Nos nao temos aqui no mundo
cidade permanente, mas procuramos aquela do futuro" (Hb 13,14). Assim
o cristao, como estrangeiro e peregrino (cf. 1Pd 2,11), se esforca por al-
cancar a patria com urna vida santa (Hb 11,14), na qual estará sempre com
oSenhor(cf. 1Ts4,17).

11. "Lex orandi - Lex credendi"

11.1. É um principio teológico "que a lei da oracao estabeleca a lei


da fé". Podemos e devemos procurar e encontrar na liturgia a fé da Igreja .

Permita-se-nos, agora, no fim desta exposicao, citar, como si'ntese


doutrinal conclusiva, o parágrafo com que iniciárnosos Praenotanda (Pre-
missas) ao Rito das Exequias, onde aparece perfeitamente o espirito da no
va liturgia romana:

"A Igreja celebra com profunda esperanca o misterio pascal de Cristo


ñas exequias de seus filhos, para que eles, incorporados pelo Batismo
a Cristo mono e ressuscitado, passem com ele da morte á vida. Suas
almas devem ser purificadas para serem recebidas no céu entre os san
tos eleitos; seus corpos esperam a feliz vinda de Cristo e a ressurrei-
cao dos mortos. Por isso a santa Mae-lgreja oferece o sacrificio euca-
rístico, memorial da Páscoa de Cristo, e eleva a Deus suas oracoes e

(continua na 3a capa)

405
Um livro crítico:

"UMJUDEU ORIGINAL.
REPENSANDO O JESÚS HISTÓRICO

por John P. Meier

Em síntese: John Meier tenta submeter as páginas dos Evangelhos a


um exame crítico para averiguar o que nelas há de histórico e nao históri
co. As conclusoes desta tarefa sao vagas: o autor, em cada capítulo, cita
opinioes de estudiosos que vSo da categórica afirmacSo da historicidade é
peremptória negacáo; Meier entao verifica que os traeos analisados nSo
podem ser nem comprovados como verídicos nem refutados como falsos.

A leitura do livro é cansativa por causa do grande elenco de sentencas


hipotéticas que propoe sem chegar a claros resultados. Ademáis a obra é
falha, pois nao leva em conta a estima que os Apostólos dedicavam a Paia
vra (Logos), em oposicao aos mitos e estórias ficticias queja em sua época
se disseminavam; cf. Um 1,4; 4,17; 2Tm 4,4; Tt 1,14; havia vigilancia pa
ra que nao se deteriorasse a auténtica mensagem do Senhor Jesús (cf. Gl
1,8s).

Meier se dedica a urna tarefa fadada á frustracSo, como ele mesmo


reconhece, nao somente pela falta de documentacao necessária para diri
mir dúvidas e avaliar hipóteses, mas também porque se debruca sobre o
texto do Evangelho apenas, sem levar em conta a Paiavra oral que bercou e
acompanha o texto escrito dos Evangelhos através dos séculos: o texto
assim considerado nao se explica por si mesmo; antes, torna-se letra inerte,
que cada pesquisador interpreta a seu modo, inspirado por grande dose de
subjetivismo.

O livro de Meier se presta a /anear confusSo, pois é fonte de relativis


mo e certo ceticismo, que nio tém propósito quando se trata dos Evange
lhos. Estes sao avallados como documentos históricos e fidedignos por crí
ticos abalizados e bem fundamentados.

* * *

John Meier é sacerdote católico, professorda cadeira de Novo Testa


mento na Universidade Católica da América em Washington, D.C. Já foi

406
"UM JUDEU ORIGINAL. REPENSANDO JESÚS..." 23

presidente da Associacao Bíblica Católica, como também editor geral do


Catholic Biblical Quarterly.

Pretende estudar os Evangelhos, abstraindo dos criterios da fé, a fim


de tentar depreender o que um judeu, um agnóstico e um cristao conclui-
riam em consenso unánime se estudassem os Evangelhos conjuntamente. O
título do livro já exprime essa ¡ntencao, pois, segundo John Meier, Jesús,
visto aos olhos da razao apenas, foi um homem rejeitado pelos fariseus,
que obtiveram sua condenacao á morte.1

Examinemos o conteúdo do livro para poder tecer-lhe alguns comen


tarios.

1. A PREMISSA BÁSICA: JESÚS REAL E JESÚS HISTÓRICO

O autor baseia sua obra sobre a distingao entre o Jesús real e o Jesús
da historia. 0 Jesús real seria aquele que de fato viveu como viveu na Pa
lestina do inicio da nossa era. John Meier julga que este é inatingível, pois
os documentos que a ele se referem em nossos dias (os Evangelhos) terao
sido acrescidos de concepcSes da Igreja nascente, que ornamentaram a fi
gura real de Jesús. Conseqüentemente, diz Meier, só temos o Jesús históri
co ou aquele que o Novo Testamento nos dá a conhecer: seria o Jesús
construido pela fé dos antigos cristaos na base da imagem do Jesús que
Ihes foi apregoada.

Posto isto, o autor tenciona analisar minuciosamente os Evangelhos


para tentar discernir neles o que possa ter sido acrescentado pelas primei-
ras geracoes cristas ao Jesús real, a fim de chegar tao perto quanto possí-
vel do Jesús real.

"O Jesús histórico nSo é o Jesús real, e vice-versa. O Jesús histórico


pode-nos proporcionar fragmentos do individuo real, e nada mais. Assim
as duas expressdes 'Jesús real' e 'Jesús histórico' sao relativamente distin
tas, embora alguns teólogos, como Hans Küng, tendam a confundi-las"
(p. 35).

A nomenclatura adotada por J. Meier nao é clara, pois o que é histó


rico é real, é algo de ocorrido. A imprecisao se evidencia, por exemplo,

1 John Meier, Um Judeu Marginal. Repensando o Jesús Histórico. — Ed.


Imago, Rio de Janeiro 1992, 160 x 230 mm, 483 pp.
O autor está para publicar em 1994 um segundo volume, que conti
nuará a obra aqui apresentada.

407
24 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

á p. 178 do livro de Meier: para dizer que o apelativo Abba (meu Pai que
rido) saiu dos labios de Jesús, o autor diz que procede do Jesús histórico.

Para realizar seu propósito de averiguar o que, nos Evangelhos, possa


ser atribuido a Jesús mesmo e nao aos cristaos de outrora, o autor estipula
ce rtos criterios (aceitos e reconhecidos por outros pesquisado res), que pas-
samos a elencar:

2. OS CRITERIOS DE AUTENTICIDADE

Eis a tabela proposta por Meier, segundo a nomenclatura por ele ado
tada:

2.1. Criterios primarios

1) Criterio do constrangimento ou da contradice»

Consideram-se auténticos os atos e os dizeres de Jesús que teriam


constrangido ou criado dificuldades para a Igreja primitiva. A tendencia
dos primeiros cristaos seria a de eliminar tudo o que parecesse diminuir ou
rebaixar Jesús, em vez de imaginar e criar tais episodios.

. Como exemplos, apontam-se:

a) o Batismo de Jesús, que parece tornar Jesús inferior a Joao Ba


tista; este pregava o Batismo de arrependimento para a remissao dos peca
dos. Ver Me 1,4-11; Mt 3,13-17; Le 3,19-22;

b) Jesús parece ignorar o dia e a hora do juízo final; ver Me 13, 32;
Mt 24, 36. "É bastante improvável que a Igreja se tivesse dado ao trabalho
de inventar uma frase que enfatizava a ignorancia do seu Senhor ressuscita-
do"(p. 171)';

c) Em Me 3,21 Jesús é tido como "louco" pelos seus familiares;

d) J. Meier menciona aínda a traipSo de Judas (Mt 26, 47-56; Me 14,


43-52; Le 22, 47-53; Jo 18, 2-11), a negacSo de Pedro (Mt 26, 69-75 e pa
ralelos), o brado de Jesús na Cruz (Me 15, 34, citando o SI 22, 1).

1 Na verdade, Jesús nao ¡gnorava a data do fuízo final, pois isto deporta
contra a sua qualidade de Deus Filho e Messias. Todavía nSo estava no ám
bito de sua missio de Messias e Mestre revelar aos homens tal data.

408
"UM JUDEU ORIGINAL. REPENSANDO JESÚS..." 2£

2) Criterio da descontinuidade

Também dito "criterio da originalidade ou da dissimilaridade", afir


ma ser auténticos os atos e os dizeres de Jesús que nao podem ser origina
rios do judaismo de seu tempo nem da Igreja primitiva. Assim, porexem-
plo, a peremptória proibicao do divorcio (Me 10,2-12 e paralelos), a recusa
do juramento (Mt 5, 34-37), a recomendacáo da justica nova e interioriza
da, que ultrapassaria a dos judeus, levando a imitar o Pai Celeste (Mt
5,17-48).

3) Criterio da múltipla confirmacao

Admite como auténticos os dizeres e feitos de Jesús atestadosemmais


de urna fonte independente. Assim Jesús proclamou o "reino de Deusou
dos céus" conforme Marcos, Mateus, Lucas, Joao e Paulo. Esta mesma ex-
pressao é encontrada em diversos géneros literarios (parábolas bem-aven-
tu raneas, preces, narrativas de milagres...). Além disto, registram-se como
elementos amplamente documentados

- as curas praticadas por Jesús,


- a especial atenga o aos proscritos da sociedade, especialmente aos
pecadores e publícanos (coletores de impostos),
- a énfase sobre o mandamento do amor; cf. Jo 13, 34s;
- a recomendacáo do perdao em número indefinido de vezes; cf. Mt
18, 21s;
- a nova compreensao do preceito do sábado; cf. Me 2, 27s;
- urna ética radical, que chega a pedir o abandono de tudo para se
guir Jesús; cf. Le 9, 57-62;
- os dizeres relativos ao Filho do Homem, expressao típica de Jesús;
cf. Me 10,45;
- o "Amém, amém... (em verdade, em verdade...) eu vos digo"; cf.
Mt 24, 34; 25, 12;
- a consagracao do pao e do vinho na última ceia: Mt 26, 26-29; Me
14, 22-25; 1Cor 11, 23-26; cf. Jo 6,51-58;
-a proibicao do divorcio: Me 10,11s; Le 16, 18; 1Cor7, 10s;
- a expulsao dos vendilh5es do Templo: Me 11,15-19; Jo 2,14-22;
- as altercacoes com os fariseus; cf. Mt 22, 15-22.34-40.41-46.

Ver J. Meier, ob. cit., p. 191, nota 31.

4) O criterio da coeréncia

Segundo este criterio, as palavras e acoes de Jesús que se enquadram


bem dentro de dados firmemente estabelecidos tém probabilidade de ser

409
26 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

históricos. Assim seriam os debates de Jesús com os fariseus, as palavras


relativas ao advento do Reino de Deus; cf. ob. cit., p. 178.

5) O criterio da rejeicao e da execucao

Este criterio leva em conta o fato de que Jesús sofreu um fim violen
to ñas míos de autoridades judias e romanas. Conseqüentemente afirma
serem auténticos todos os ditos e feitos de Jesús que expliquem por que
foi Ele condenado á morte como "Reí dos Judeus". Jesús devia perturbar
e incomodar (sadiamente) os maioraisda térra; por conseguinte, sao histó
ricos todos os dizeres de Jesús que tenham suscitado o mal-estar e a repre
salia das autoridades. "Um Jesús cujos atos e palavras nao tivessem provo
cado antagonismo entre as pessoas, especialmente os poderosos, nao é o
Jesús histórico" (p. 180).

2.2. Criterios Secundarios

1) Criterio dos trapos de aramaico

Todas as vezes que se encontrem, na versao grega das palavras de


Jesús, traeos de vocabulario, sintaxe, ritmo e rima aramaicos, pode-se ter
a certeza da autenticidade de tais dizeres. Este criterio se apoiaem dados
filológicos elaborados por especialistas em aramaico, como Joachim Jere
mías, Matthew Black, Geza Vermes e Joseph Fitzmyer.

John Meier julga que este criterio só pode ser válido se for corrobora
do por outros criterios, já que cristaos de li'ngua aramaica podem ter for
jado sentencas que eles atribuiram a Jesús, quando nao eram se nao a ex-
pressao do pensamento das comunidades nascentes.

2) O criterio da ambientacao

Segundo este referencial, "tém boa possibilidade de ser auténticas as


palavras de Jesús que referem costumes concretos, crencas, procedimentos
judiciais, práticas comerciáis e agrícolas ou condicSes sociais e políticas da
Palestina do sáculo I" (p. 182).

3) O criterio da vivacidade da narracao

"Ñas narrativas dos Evangelhos, a vivacidade e as minucias concretas —


especialmente quando essas minucias nao slo relevantes para o ponto prin
cipal da historia — por vezes sao tomadas como indicadores de um relato
feito por testemunha ocular" (pp. 182s).

410
"UM JUDEU ORIGINAL. REPENSANDO JESÚS..." 27

4) O criterio das tendencias do desenvolvimento da Tradie» Sinó-


tica

Os criterios sup6em que a mensagem dos Evangelhos Sinóticos (Mt


Me e Le) tenha sido formulada primeiramente por Marcos; Mateus assumiu
e desenvolveu-a (acrescentando-lhe nomes próprios, transformando o dis
curso indireto em discurso direto, eliminando palavras e construedes ara-
maicas, tornando os pormenores mais concretos...). S. Lucas teria desen
volvido aínda mais essa tradicáto...

Por conseguinte, julgam os mesmos críticos que, abstraindo dos pre


tensos retoques feitos por Mt e Le, se poderia chegar a forma originaria
da narrativa evangélica.

5) O criterio da suposicáo histórica

Este criterio afirma que se deve dar crédito aos relatos dos Evange
lhos até haver provas de que sao global ou parcialmente falsos... Nao toca
aos adeptos da veracidade provar a fidelidade histórica dos Evangelhos,
mas compete aos que a negam, aduzir provas em contrario. "Este criterio
pode cortar o nó górdio nos casos em que os argumentos sao extremamen
te equilibrados e onde o resultado final .parece ser a dúvida permanente"
(p. 185).

6) O principio da "razao suficiente"

É de notar que John Meier cita ainda outro criterio que ele mesmo
nao valoriza. É proposto por estudiosos católicos como Rene Latourellee
Lambiasi: é o criterio da explicacáfo necessária. Afirma que o fato históri
co "Jesús Cristo e suas conseqüéncias através dos sáculos" nao se explica
se nao se admite em Jesús uma grandeza de personal idade, manifestada em
palavras e acoes marcantes ou mesmo extraordinarias; em conseqüéncia, o
que os Evangelhos narram de belo e impressionante a respe ito de Jesús,
nao deve ser descartado fácilmente; caso seja eliminado, a figura de Jesús
se torna tao pobre e limitada que nao se explica a projecao de sua obra
através dos sáculos. Parece, pois, que a própria filosofía concorre para exi
gir uma "razao suficiente" para o fenómeno "Jesús Cristo e o Cristianis
mo".

John Meier julga que tal criterio á válido para valorizar a vida de Je
sús em sua globalidade, n§o, porém, as suas apees ou as suas palavras em
particular. Ao que se pode observar que a globalidade da vida de Jesús
consta de fatos e dizeres singulares; quem solapa estes, solapa a figura de
Jesús e torna inexplicável o fenómeno "Cristianismo".

411
28 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

3. OS RESULTADOS DO EXAMECRITICO

3.1. Consideracoes Gerais

Os criterios estipulados por J. Meier (criterios, alias, que outros estu


diosos, também entre os católicos, aceitam) levam a atribuir alto grau de
credibilidade ao texto dos Evangelhos; abarcam varias facetas dos mesmos
e se completam mutuamente. Nao obstante, Meier nao se contenta com
tal averiguapio. Deseja examinar as sentencas e os feitos de Jesús em sí
mesmos com olhos críticos, procurando discernir, a partir de considera
coes lingüísticas, o que possa corresponder á realidade e o que provenha
das concepcoes dos antigos cristaos.

Quem lé o livro de Meier, redigido segundo esta intencSo, encontra-se


diante de um tecido de hipóteses, proposicoes condicionáis, sentacas va
gamente afirmativas e negativas..., que deixam o leitor perplexo. A conclu-
sao da leitura dessa obra seria: os Evangelhos nao sao lendas, mas grande
parte do que eles referem nao pode ser nem comprovado como verdadei-
ro nem refutado como falso. Meier cita grande número de autores que de-
senvolveram (como ele) a crítica dos Evangelhos; ora num terreno tao
complexo e, ao mesmo tempo, tao desprovido de documentacao, compre-
ende-se que haja "tantas sentencas quantas cabecas" (quot capita, tot sen-
sus); para cada ponto investigado, Meier pode arrolar colegas que afirmam
a veracidade dos textos respectivos e outros que a negam1. Emconse-
qüéncia, a leitura do livro se torna árida e pesada; para cada Sim e cada
Nao há um Mas, que faz o raciocinio voltar á estaca zero e leva a nao con
cluir coisa alguma. Vé-se, pois, que nesse setorde investigacoes reina forte
dose de subjetivismo motivado pelas premissas filosóficas pessoais do pes-
quisador. Cada qual diz Sim ou Nao, nao porque seja impelido pela eviden
cia da verdade que descobriu, mas porque prefere dar mais peso e énfase a
tal premissa (A) que outros estudiosos desvalorizam em favor de outra pre-
missa (B). Isto torna muito relativo o livro de J. Meier; nao apresenta urna

' O autor revela o seu ceticismo quando escreve é p. 13:


"Do Jesús revolucionario e violento ao Jesús mago e folgazao, do
fanático apocalíptico ao mestre de sabedoría ou filósofo cínico e indife-
ferente á escatologia, qualquer situacSo que se possa conceber, qualquer
teoría extrema que se possa imaginar, já foram há muito propostas, com
as posicdes antagónicas anulándose mutuamente e com os erros do passa-
do sendo repetidos por novos escritores afoitos. Num certo sentido, exis-
tem tantos 'livros sobre Jesús'que daríam para tres vidas, e um budista pe
cador poderla muito bem ser condenado a passar as próximas tres reencar-
nacdes fendo-os todos".

412
"UM JUDEU ORIGINAL. REPENSANDO JESÚS..." 29

tese clara e definida, mas um cipoal de sentengas que, em varios casos, pa-
recem anular-se mutuamente.

Passemos a enunciar alguns exemplos de tal procedimento literario:

3.2. Alguns traeos concretos

3.2.1. O Nasc¡mentó de Jesús em Belém

Depois de muito discutir o lugar do nascimento de Jesús, o autor


concluí:

"Um judeu chamado Yeshua (=Jesús) nasceu, talvez em Belém da Ju-


déia, porém mais provavelmente em Nazaré da Galiléia - de qualquer
forma numa pequeña cidade em algum ponto dentro dos limites do reino
de Herodes" (p. 229).

0 final "de qualquer forma..." da proposicáo ácima relativiza qual


quer tomada de posicao diante da questao. Assemelha-se é expressao po
pular: "N.N. nao é nem pro nem contra, muito pelo contrario...".1

Á p. 212 Meier nega o recenseamento ocorrido "enquanto Quirino era


governador da Siria" (Le 2,1 s), alegando ná"o haver documentacao para o
afirmar. — Ora em PR 370/1993, pp. 134-140 citam-se numerosos docu
mentos da antigüidade que esclarecem o texto de S. Lucas, mostrando que
o Evangelista nao inventou. Além do mais, veja-se na "Bfolia de Jerusa-
lém" a nota s ao texto de Le 2,2.

3.2.2. O Nascimento Virginal de Jesús

O autor reconhece que o nascimento virginal de Jesús é claramente


professado em Mt 1-2 e Le 1-2 (cf. p. 230). Verifica, porém, que nao há
provas disto no plano experimental ou fisiológico. — Nao há dúvida, tra-
ta-se de um fato que nao pode ser empíricamente comprovado, mas que
nem por isto deixa de merecer crédito, dado o testemunho dos evangelis-

1 A p. 346, Meier diz sem mais que Jesús nasceu em Nazaré. £, porém,
curioso o fato de que nao se refere á arqueología, que aponía o lugar do
nascimento em Belém.
Ap.40J temos de novo a incerta noticia:
"Jesús de Nazaré nasceu — mais provavelmente em Nazaré, e nSo em
Belém — por volta de 7 ou 6 a.C, alguns anos antes da morte do Reí Hero
des, o Grande (4 a.C.)"

413
30 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

tas e da mais antiga Tradicao. O autor John Meier cita á p.245, nota 81,
o tato seguinte:

No Talmud judaico do século I d.C. Jesús é chamado Ben Panthera


ou Ben Pantere; ora, segundo alguns estudiosos, o Ben hebraico traduz o
hyiós grego (filho) e Panthera ou Pantere seria a deformacao do grego
Parthénou. Donde se concluiría que os rabinos chamavam Jesús Ben
Panthera, traduzindo e deformando em hebraico a fórmula grega hyiós
parthénou, filho da Virgem. Estaría assim testemunhado o fato de que
Jesús, desde o inicio da era crista, era dito em grego "o filho da Virgem";
para zombar dele, os rabinos pronunciavam Ben Panthera; no século II
Panthera foi tido por Celso, filósofo grego, como nome de um soldado ro
mano, com o qual María teria caído em adulterio! Afirmacao imaginosa e
gratuita:

Vale a pena transcrever o texto da p. 222, em que Meier confessa o


caráter relativo de sua investigacao:

"O resultado final dessa investigacao deve continuar pobre e decep


cionante, tanto para os defensores como para os adversarios da doutrína
da concepcao virginal. Considerada isoladamente, a pesquisa histórico-crí-
tica simpiesmente nao tem acesso ás fontes e aos instrumentos que levem
a urna decisao final sobre a historicidade da concepcao virginal, conforme
narrada por Mateus e Lucas. A aceitacao ou rejeicao da doutrína será gran
demente influenciada pelos pressupostos filosóficos e teológicos de cada
um, assim como pelo valor que se dá aos ensinamentos da Igreja. Aínda
urna vez, devemos nos lembrar das limitacoes inerentes á crítica histórica:
tratase de um instrumento útil, contanto que nao esperemos demais déla"

3.2.3. Os "irmaos" de Jesús

Meier passa em revista diversos textos do Novo Testamento relativos


aos "irmaos" de Jesús; chama, porém, a atencáo o fato de que nao cita
nem

Jo 19,25-27: Jesús, ao morrer, entrega sua Mae a Joao, filho de Zebe-


deu e Salomé, e nao a um "¡rmao" seu, nem cita

Le 2,41-52: Jesús, aos doze anos, parece ser o filho único da sua fa
milia. Se teve irmaos após os doze anos, estes eram doze ou treze anos
mais jovens; nunca teriam exercido a autoridade arrogante sobre Jesús que
os "irmlos" querem exercer em

Jo 7,2-8: numa familia judaica, o i rmao mais velho (doze anos mais
i/elho) era seriamente respeitado!

414
"UM JUDEU ORIGINAL. REPENSANDO JESÚS..."

Após examinar os textos bfolíeos e os da Tradicao dos primeiros


sáculos, Meier concluí:

"É evidente que todos esses argumentos, mesmo quando considera


dos ¡untos, nao garanten» certeza absoluta numa questao onde as provas
sao tao escassas" (p. 327).

De novo o autor fica "na coluna do me ¡o". Ver ainda p. 358 a nota
45, onde Meier observa:

"Nao sou contra o ponto de vista de Joseph A. Fitzmyer, que, após


examinar os problemas de adelphós no Novo Testamento, concluí que a
idéia de os irmSos de Jesús serem parentes ou familiares no sentido mais
ampio 'certamente nSo deve ser excluida'".

3.2.4. A Infancia de Jesús (Mt 1-2 e Le 1-2)

O autor julga que ha divergencias ou contradicoes entre Mt 1-2 e


Le 1-2 (pp. 210s). Tais divergencias sao aparentes e nao reais, como bem
demonstram os críticos que aprofundam esses relatos. Sabem que Mt 1-2 e
Le 1-2 pertencem ao género literario midraxe; este nao é lenda nem mito,
mas é a na iracao da historia sob a luz da fé, pondo em evidencia o sentido
teológico ou religioso dos eventos narrados.

Ao explanar as supostas divergencias entre Mt 1-2 e Le 1-2, recorren-


do a distincoes lingüísticas sutis e rebuscadas, Meier reflete:

"É bem verdade que alguns dos atritos entre Mt 1-2 e Le 1-2 pode-
riam ser harmonizados com um pouco de habilidade: em Mateus apenas
José recebe do anjo o anuncio da concepcao virginal de Jesús; em Lucas,
naturalmente, é María que ouve a revelacao. No fundo, nenhum dos rela
tos contradiz o outro, e os dois poderiam ser combinados — como de fato
foram em descricoes cristas posteriores" (p. 21 1).

"Na verdade, alguns pontos de concordancia sSo em geral aceitos pe


los pesquisadores como históricos" (p. 214).

A leitura atenta da obra de Meier bem manifesta como tal autor e ou-
tros críticos lidam com preconceitos... e preconceitos muito frágeis. Com
efeito; pelo fato de que em Mateus é José quem recebe o anuncio da con-
ceicao virginal de Jesús, nao seria possível que Maria tambérn receba tal
anuncio? Nao seria mesmo normal e necessário que tanto José como Ma
ria fossem a respeito informados?

415
32 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

3.2.5. Jesús casado?

O autor levanta tal questao e dedica quatorze páginas a discutí-la co


mo se houvesse ampio material e farta documentacao sobre o assunto; cita
diversos autores que se debrucaram sobre a perguntae finalmente concluí:

"Resumindo. nio podemos ter certeza absoluta se Jesús fot casado


ou nao. Mas os varios contextos, próximos e remotos, tanto no Novo Tes
tamento como no judaismo, nos levam á posicao deque ele se manteveceli-
batário, em termos religiosos, como a hipótese mais provável. O total si
lencio sobre esposa e filhos em contextos onde figuram seus varios paren-
tes, pode muito bem indicar que ele nunca se casou" (p. 341).

Pode-se dizer que o autor nao precisava de gastar tanto papel e apli
car tanto tempo ao estudo de urna questao para a qual a resposta negativa
parece evidente desde o inicio. Quem jamáis soube alguma coisa sobre "a
esposa e os filhos de Jesús"? Quais os seus hipotéticos nomes?

3.2.6. Jesús dos doze aos trinta anos

Ao iniciar o estudo desse período da vida de Jesús, Meier observa:

"O motivo pelo qual os autores tanto de Evangelhos da Infancia apó


crifos (como o Evangelho da Infancia de Tomé) como de romances moder
nos se sentiram atraídos pelos chamados 'anos desconhecidos' da vida de
Jesús em Nazaré, é que eles podem dar asas á imaginacao (pia ou impía),
sem ter os fatos para refreá-la. Tudo se presta é grande ficcSo ou é historia
capciosa" (p. 251).

Mais adiante, ao falar do desabrochamento psicológico de Jesús como


homem, acrescenta Meier:

"É impossi'vel, com um hiato de vipte sáculos, tentar colocar Jesús


no divado psiquiatra. £ ai que o estudioso se cala e o romancista faz a fes
ta. Praticamente sem dados para controlar a especulacSo, qualquer cenário
sm particular pode ser desmentido ou provado. O que se pode fazer, é re-
oetir a antiga máxima filosófica: o que se afirma gratuitamente, pode ser
jratuitamente negado" (pp. 252s).

Finalmente o capítulo respectivo encerra suas discussoes com a nota


¡eguinte:

"A despeito da intrigante hipótese segundo a qual Jesús, como mes-


re construtor, teria viajado a muitos e longinquos lugares ou assimilado

416
"UM JUDEU ORIGINAL. REPENSANDO JESÚS..." 33

ai idéias do drama grego no teatro de Séforis, todos os indicios apontam


para urna adolescencia tranquila e urna idade adulta no exercício da car-
pintaría em Nazaré. Por mais exasperante que se/a o silencio dos Evange-
Ihos sobre os 'anos obscuros' de Jesús, a explicacao pode ser simples: nao
aconteceu nada de mais. O rebento do tronco de Davi se desenvolvía lenta
e silenciosamente" (p. 348).

Merece atencao aínda o trecho da pág. 283:

"No final temos que concluir que asprovas esparsas existentes sobre
os anos 'intermediarios' de Jesús apontam numa direcao: Jesús passou
aqueles anos quase tota/mente como cidadao de Nazaré da Galiléia, exer-
cendo o oficio de marceneiro. Experiencias especiáis no campo da educa-
cao ou um emprego que o afastasse por um longo periodo de Nazaré de-
vem continuar sendo meras hipó teses, sem base no texto do Novo Testa
mento".

A propósito dos anos de crescimento humano de Jesús, podemos


aínda acrescentar o seguinte trapo: Meier, na base de considerares diver
sas, julga que Jesús se exprimia em grego:

"É provável que ele usasse um pouco de grego para fíns profissionais
ou para se comunicar com os gentíos, incluindo-se neste caso o diálogo
com Pilatos durante o seu julgamento. No entanto, nem sua ocupacao
como carpinteiro em Nazaré, nem sua /ornada pela Galiléia, restrita a cida-
des e afdeias profundamente judaicas, exigiriam fluencia e uso regular do
grego. Assim nao há motivos para se pensar que Jesús normalmente trans
mitía em grego seus ensinamentos ás multiddes que se reuniam em torno
dele" (p. 265).

A p. 266 lé-se:

"Numa regiao quadríli'ngüe, Jesús pode até ter sido um judeu trilin
güe, mais provavelmente nao seria um mestre trilingüe".

Assim fica esclarecida a dúvida lancada por Virgilio Moretzsohn, ao


citar o livro "Biblia: verdade e ficcao" de Robin Lañe Fox, no jornal "0
Globo" de 7/5/93:

"Pilatos nao sabia hebraico nem aramaico, e é muito improvável que


Jesús fa/asse grego". Pergunta Moretzsohn: "Entao como se entenderam?
Quem falou e quem ouviu o qué? Quem nSo ouviu o qué?".

As questoes lancadas em tom zombeteiro tém sua resposta ñas minu


ciosas pesquisas de John Meier. Mais urna vez percebe-se quanto os críticos

417
34 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

sao preconcebidos e subjetivos em muitos casos: uns afirmam o que outros


negam...

4. CONCLUSAO

A leitura atenta do livro de John Meier sugere tres consideracoes fi


náis:

4.1. Existencialismo

0 autor está impregnado da filosofía existencialista, principalmente


como a conceberam Martín Heidegger e posteriormente Rudolf Bultmann
nos últimos decenios. Segundo Bultmann, a Boa-Nova de Jesús, ao ser en
tregue pelos Apostólos aos habitantes do Imperio Romano, foi adaptada
aos interesses subjetivos desses ouvintes, sofrendo alteracoes tais que hoje
nao conhecemos, o Jesús real, mas apenas o Jesús imaginado pelos modes
tos cristaos dos prime iros decenios.

Esta tese tem sido repetidamente refutada por autores cristaos. Mos-
tram que

a) os Apostólos e demais pregadores do Evangelho faziam questao de


ser meras testemunhas respeitosas do que haviam visto e ouvido; cf.

At 1,21s (a definicio de Apostólo proposta por Pedro antes da elei-


cao de Matías): "É necessárío que, dentre esses homens que nos acompa-
nharam todo o tempo em que o Senhor Jesús viveu em nosso meio, a co-
mecar do batismo de Joao até o dia em que dentre nos foi arrebatado, um
deles se torne conosco testemunha da sua ressurreicao".

At 2,32: "A este Jesús Deus ressuscitou, e disto nos todos somos tes
temunhas".

At 3,15: "Deus o ressuscitou dentre os morios, e disto nos somos tes


temunhas".

At 4,33: "Com grande poder os Apostólos davam o testemunho da


ressurreicao do Senhor, e todos tinham grande aceitacSo".

At 5,31s: "Deus o exa/tou com a sua direita, fazendo-o Chefe e Salva


dor... Nos somos testemunhas destas coisas, nos e o Espirito Santo, que
Deus concedeu aos que /he obedecem".

At 10, 39-42: "Nos somos testemunhas de tudo o que Jesús fez na


regiao dos judeus e em Jerusalém... Mas Deus o ressuscitou ao terceiro dia

418
"UM JUDEU ORIGINAL. REPENSANDO JESÚS..." 35

e concedeu-lhe que se tornasse visível nao a todo o povo, mas as testemu-


nhas anteriormente designadas por Deus, isto é, a nos, que comemos e be
bemos com ele, após sua ressurreicao dentre os monos".

Verainda At 13,31; 22,15; Le 12; 24,47s; 2Pd 1,16; Gl 1,8s...

Sao Paulo tinha tanta consciéncia disto que ese revi a em Gl 1,8s:

"Se alguém — ainda que nos mesmos ou um anjo do céu — vos anun
ciar um evange/ho diferente do que vos anunciamos, se/a anatema'. Como
já vo-lo dissemos, volto a dizé-lo agora: se alguém vos anunciar um evan
ge/ho diferente do que recebestes, se/a anatema'."

0 que nao corresponde á historia, foi pela Igreja relegado para a lite
ratura apócrifa, da qual há muitos "Evangelhos e Epístolas".

4.2. Desabrocriamento do grao de mostarda

É certo que o conteúdo das palavras de Jesús, sucintas como eram,


foi aos poucos desabrochando, de modo a mostrar todas as suas implica-
coes. Este desabrochamento, natural a toda sementé, foi ocorrendo sob a
vigilancia dos Apostólos (e a assisténcia do Espirito Santo, como diría a
fé). As epístolas do Novo Testamento evidenciam bem o cuidado que os
Apostólos e os primeiros mestres tinham para nao permitir que o docetis-
mo, as doutrinas de Cerinto, o pré-gnosticismo, o dualismo se infiltrassem
na pregacao crista; ver 1/2Tm, Tt, Jd, 2Pd, 1/2Jo...

Após Páscoa, os Apostólos estavam convictos de que diziam a verda-


de, a tal ponto que d esa fiava m o tribunal dos judeus:

"Julgai se é justo, aos olhos de Deus, obedecer mais a vos do que a


Deus. Pois nao podemos deixar de falar das coisas que vimos e ouvimos"
(At4, 19s).

Nada se podía apontar de fraudulento ou engañoso na pregacao dos


Apostólos, de modo que Gamaliel pode sugerir, referindo-se aos mesmos:

"Se o seu intento ou a sua obra provém dos homens, destnjir-se-á por
si mesma; se vem de Deus, porém, nSo os podereis destruir" (A 15,38s).

4.3. O trabalho de John Meier

J. Meier tencionou examinar trapo por traco da mensagem evangélica


para averiguar o seu grau de historicidade... Ele o fez ciente de que se en-

419
36 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

tregava a um trabalho assaz estéril, já tentado por pesquisadores anteriores


sem conseguirem o fruto almejado. Urna das causas da frustracSo de tais
autores é o fato de nao levarern em conta que o Evangelho escrito é a cris
talizado da pregacao dos Apostólos; em conseqüéncia, só pode ser corne
tamente entendido se lido á luz da TradicSo oral, que bercou e acompanha
o texto escrito através dos sáculos. Quem separa o Evangelho da Palavra
oral que sempre o iluminou e contribuiu para interpretá-lo, arrisca-se a cair
num labirinto de conjeturas,... conjeturas que vao de um extremo ap outro
das possi'veis ¡nterpretacSes, incorrendo em auténticas contradicoes, como
se percebe no livro de J. Meier.

Alias, o próprio Evangelho adverte o leitor de que muitos genuínos


dizeres e feitos de Jesús ficaram fora da redacao escrita — o que obriga o
estudioso sincero a dar atencao ao modo como os cristaos, nos primeiros
sáculos, entendiam os Evangelhos:

Jo 20,30s: "Jesús fez, diante de seus discípulos, muitos outros sinais


ainda, que nao se acham escritos neste livro. Estes, porém, foram escritos
para crerdes que Jesús é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, te-
nhais a vida em seu nome".

Jo 21, 24s: "Este é o discípulo que dá testemunho dessas coisas e foi


quem as escreveu; e sabemos que o seu testemunho é verdadeiro. Há, po
rém, muitas outras coisas que Jesús fez e que, se fossem escritas urna por
urna, creio que o mundo nao poderia conter os livros que se escreveriam".

Em ge ral, o erro do protestantismo e de autores que se deixam influ


enciar por ele, consiste em ¡solar a Biblia do seu be reo e concomitante
oral. O texto sagrado torna-se entao urna letra morta, que cada qual tenta
dissecar a seu modo, sem conseguir resultados satisfatórios; a letra por si
só nao se explica; ela precisa da Palavra viva para falar com toda a sua viva-
cidade. Essa Palavra viva vem ressoando ininterruptamente desde os pri
meiros decenios até hoje na Igreja que Cristo fundou e entregou a Pedro
e seus sucessores.

Eis por que julgamos que o livro de Meier, lido por leitores despre
parados, pode lancar confusio, visto que geralmente concluí em "nem
pro nem contra...", quando poderia e deveria manifestar ao leitor outros
enfoques mais positivos e construtivos, como sao os que a Palavra viva da
Tradicao aponta com lucidez, oferecendo o auténtico entendimento dos
Evangelhos.

420
Textos bíblicos em aprofundamento:

CASTIGO ATÉ A
TERCEIRA E QUARTA GERAQÁO?

Em síntese: Os textos do Antigo Testamento que parecem afirmar a


punicao do pecado dos país sobre os seus descendentes, representan) a fase
mais antiga da mentalidade de Israel, mentalidade é qual a pedagogía divi
na se quis adaptar a fim de educar o povo rude. Com o tempo, tal mentali
dade foi corrígida em favor da afirmacao da responsabilidade pessoal: o
i'mpio — e tao somente ele — carrega as conseqüéncias das suas faltas; e, se
ele se converte, é recebido misericordiosamente pelo Senhor Deus.
•k * *

Há quem afirme que Deus castiga o pecado de alguém na sua descen


dencia, ou seja, até a terceira e quarta geracao. Para tanto, baseiam-se em
Ex 20,5s:

"Nao te prostrarás diante desses deuses nao os servirás, porque eu, o


Senhor teu Deus, sou um Deus ciumentó que puno a iniqüidade dos pais
sobre os filhos até a terceira e quarta geracao dos que me odeiam, mas que
também ajo com amor até a milésima geracao para aqueles que me amam e
guardam os meus mandamentos".

Ver também Dt 5,9s; Nm 14,18s.

Em conseqüéncia, há pessoas que julgam estar sofrendo "maldicoes"


por causa de faltas cometidas por seus antepassados. Sem dúvida, tal modo
de pensar gera inseguranga e afligió, pois quem sofre pode supor crimes
fantasiosos cometidos pelos pais, avós e bisavós..., crimes que I he acarreta-
rao tormentos imprevisíveis.

Diante desta interpretacao de textos bíblicos, procuremos examinar


ex ata mente o que diz a Escritura a respeito do assunto.

1. A MENTALIDADE DO CLÁ NA ANTIGÜIDADE

Os antigos povos extra-bíblicos e o próprio povo de Israel (nos ini


cios de sua historia) nao tinham conceito claro de pessoa. Por isso também
nao valorizavam os individuos de um grupo como individuos. Por con se-

421
38 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

guinte, o sujeito portador de responsabilidade moral nao era a pessoa


singular, mas o grupo ou o cía a que pertencia. O bem e o mal que cada in
dividuo praticava, acarretava a respectiva sancáfo para todo o povo. Esta
mentalidade se exprimiu, por exemplo, no caso de Ábralo, que ¡ntercedeu
por Sodoma: o Patriarca nao pediu a Deus que poupasse os justos da cida-
de, mas, sim, que poupasse a cidade em vista dos justos nela existentes; cf.
Gn 18,22s.

Exprimia-se também essa mentalidade nos citados textos de Ex 20,


5s; Dt 5, 9s; Nm 14,18s. Parecía normal que urna cidade ou urna tribo fos-
se castigada como um todo monolítico, incluindo justos e ímpios, como
também parecía natural que a sorte dos filhose de descendentes posterio
res correspondesse á conduta dos país.

2. A RESPONSABILIDADE PESSOAL

Com o tempo, o imperfeito modo de pensar foi sendo corrigido por


obra dos autores sagrados. Na verdade, podia favorecer a hipocrisia: as pes-
soas atingidas por algum mal atribuiam-no ao pecado dos antepassados, e
se isentavam de fazer penitencia, julgando-se vítimas de culpas alheias e
nao res de culpas próprias. Foi o que se deu por ocasiao do exilio de Israel
na Babilonia (587-538 a.C.): os judeus deportados alegavam estar carregan-
do as duras conseqüéncias dos pecados das geracSes anteriores, em vez de
reconhecerem devidamente as suas infidelidades. Ora contra tal atitude in
surgiese, em nome do Senhor, o profeta Ezequiel:

"A palavra do Senhor me foi dirigida nestes termos: Que vem a ser
°ste proverbio que vos usáis na térra de Israel: 'Os país comeram uvas ver
des e os dentes dos filhos ficaram embotados'?

Por minha vida, oráculo do Senhor, nSo repetiréis jamáis este prover
bio em Israel... Aquele que pecar, esse morrerá... Mas, se o impío se con-
'erter de todos os pecados que cometeu e passar a guardar os meus estatu-
os e a praticar o direito e a fustica, certamente vivera; ele nao morrerá.
Venhum dos crimes que praticou, será lembrado. Vivera como resultado
la justica que passou a praticar" (Ez 18,1-4.21s).

O profeta Jeremías, que acompanhou os judeus por ocasiao da guerra


le Nabucodonosor contra Jerusalém, dizia a mesma coisa:

"Nesses dias já nao se dirá: 'Os país comeram uvas verdes, e os dentes
'os filhos ficaram embotados'. Mas cada um morrerá por sua própria falta.
~odo homem que tenha comido uvas verdes, terá seus dentes embotados".

422
CASTIGO ATÉ A TERCEIRA E QUARTA GERAQÁO? 39

Estes textos valorizam devidamente a pessoa e a responsabilidade


individual, mostrando que cada um colhe o que semeou. Pode alguém ser
descendente de grandes pecadores; isto nao afeta o seu relacionamento
com Deus; receberá a sorte correlativa á sua conduta pessoa I.

A pedagogia divina, tao característica do Antigo Testamento, quis


adaptar-se ao modo de pensar e falar dos educadores amigos, chamando a
atencao para a responsabilidade coletiva ou para a solidariedade que existe
naturalmente entre os membros de um cía. Este linguajar podia calar fun
do na mente dos israelitas mais antigos; todavía foi sendo substituido por
um tipo de discurso mais elevado e condizente com a mentalidade mais
aprimorada do povo de Israel "adulto", é assim que a "Biblia de Jerusa-
lém" formula a nova concepcá*o:

"A salvagao de um homem ou a sua perda nao depende dos seus ante-
passados, nem dos seus próximos nem sequer do seu próprio passado. Só
as disposigoes atuais do cora$So entram em linha de conta diante de
lahweh" (nota úaEz 14,12).

Esta doutrina persiste até hoje no povo de Deus cristao. Serve de


referencial para a orientacao de vida de cada membro da comunidade
crista.

Verdade é que, a pos o exilio, aflorou claramente em Israel o princi


pio da expiacao pelos pecados alheios. O inocente poderia sofrer para re
parar as faltas do próximo; isto, porém, nao seria urna lei geral, mas se ve
rificaría tao somente em casos ¡solados ou em figuras de escol; tal foi, sem
dúvída, o caso do Servidor de Javé (o Messias), que, sem ter pecado, to-
mou sobre si os pecados dos homens e voluntariamente sofreu a sancao a
eles devida, a fim de obter para sua gente a graca e a misericordia de Deus;
cf. Is 52,13-53,12 (o quarto cántico do Servidor de Javé).

3. E O PECADO ORIGINAL?

O conceito de pecado original, por vezes desfigurado como é, parece


alimentar a ¡mpressao de que as geracdes posteriores podem sofrer maldi-
cSes por causa do mau procedimento de seus antepassados. Daí a necessi-
dade de se esclarecer tal conceito.

1) Antes do mais, distingam-se pecado original originante e pecado


original originado. Somente o primeiro pode ser tido como pecado pro-
priamente dito; é a falta cometida pelos primeiros pais em conhecimento
de causa e vontade deliberada. Nao há pecado propriamente dito sem a
participacao consciente e voluntaria do sujeito.

423
40 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993 ._

O pecado original originado é o que se atribuí aos descendentes dos


primeiros pais. Está claro que nao é pecado propriamente dito, porque a
enanca que vem ao mundo nao é capazde algum ato consciente e livre. S6
impropriamente pode-se-lhe atribuir o pecado.

2) Pergunta-se entao: em que consiste o pecado original originado, se


nao é pecado propriamente dito?

- Nao se trata de maldicao de Deus, que quer castigar os filhospor


causa dos pais.

0 pecado original originado consiste na ausencia da graca santificante


e dos dons especiáis que os primeiros pais receberam de Deus e deviam ter
guardado, a fim de os transmitir á sua descendencia. Essaausénciaéocasiao
de que as tendencias naturais da pessoa venham á tona desregradamente,
pois Ihe faltam os dons que Ihe proporcionariam harmonia e coeréncia. Tal
carencia nao se deve a um designio punitivo de Deus, mas ao simples fato
da solidariedade natural que existe entre os homens. Com efeito; toda
crianpa nasce dentro de urna familia e um povo, comosquaisé solidaria,
herdando as prendas e as deficiencias naturaisque os genitores Ihe podem
transmitir; assim quem nasce nos Estados Unidos da América, nasce em
condicoes diferentes de quem nasce na Somalia; há ai dois tipos de solida
riedade. Ora a solidariedade mais profunda que alguém possa ter, é a que
se refere aos primeiros pais; por conseguinte, se estes perderám os dons
origináis, os seus descendentes so podem nascer privados de tais dons;1
3ssa privacao explica a desordem de apetites naturais existente em todo
-lomem e vem a ser urna deformidade em comparacao com o modelo ori
ginal. Nao é necessário que Deus decrete alguma maldicá*o sobre o género
lumano descendente dos primeiros pecadores.

Para ilustrar esta afirmacao, pode-se ainda mencionar o fato de que


ima enanca descendente de pais alcoólatras carrega, sem culpa própria
mas por efeito de solidariedade natural), as conseqüéncias do alcoolismo.
'aralelamente, os filhos de um pai que numa noite gaste todos os seus
>ens em cassino, amanhecem pobres e sujeitos a sancBes, embora nao te-
iham cometido falta alguma; nao há como evitar a natural solidariedade

Tais dons eram:


— a grapa santificante ou a fiiiacSo divina sobrenatural;
- os dons pretematurais: a capacidade de nSo morrer vioientamen-
e, a impássibilidade, a integridade (ou isencSo de cobica desregrada), a
¡encía moral infusa. Ver a respeito Curso de Sagrada Escritura por Corres-
•ondéncia, 4a. Etapa, Caixa postal 1362,20001 Rio (FU).

424
CASTIGO ATÉ A TERCEIRA E QUARTA GERAQÁO? 41

ou comunháo que une os homens entre si tanto no plano vertical como


no horizontal.

4. CONCLUSÁO

Pode-se crer que estas considerares sejam aptas a dissipar os mal


entendidos ocorrentes em certos grupos católicos; valem-se de Ex 20,5s e
Dt 5,9s, esquecendo que tais textos representam uma fase ultrapassadado
pensamento de Israel; por isto nao podem ser tomadas como paradigmas,
mas devem ceder as afirmacoes de Ez 18,2; Jr 31,29, que realcam a res-
ponsabilidade individual.

* * *

(contmuapao da pág. 434)

abuso. E o uso é normal, quando compatível com a finalidade do que se


usa. Noticiar o abuso é diferente de promové-lo ou de praticá-lo. Pior é
apresentar o abuso como se ele fosse o normal, o corrente, o desejável,
o imitável. Os abusos que os programadores de TV vém cometendo com os
"Calígula", "Adoradores do Diabo" e novelas como "De Corpo e Alma",
serao os maiores responsáveis por uma eventual volta á censura odiosa.

A idéia da formacáo de uma Associacáo de Telespectadores e Radiou-


vintes (ATR) torna necessário que a intencao de aderir seja expressa. A in-
dicacao do telefone e enderepo visa a facilitar o contato com os que dése-
jarem que o bom senso venha a prevalecer nos meios de comunicacao.

Atenciosamente

JOSÉ CARLOS GRAQA WAGNER

A quem estiver interessado em aderir ao projeto, o Dr. Grapa Wagner


pede o obsequio de indicar nome, enderepo e profissao á direcao seguinte:
Alameda Canuri 72, Sao Paulo (SP), CEP 04061-030, Fax 544.2244,
Fone 575-5545.

* * *

Em vista das objecoes levantadas por protestantes e Testemunhas de


Jeová contra a doutrina católica, muito recomendamos os livros do Pe.
Egionor Cunha: "Imagens e Santos", "A Senhora Contestada", "A Santí
sima Trindade", "Biblia, Sangue e Medicina", "O Inferno", "A Cruz e as
Cruzes". Editora Ave María, Rúa Martím Francisco 656, 01226-000 Sao
Paulo (SP).

425
Traducao do Novo Mundo:

A BIBLIA DAS
TESTEMUNHAS DE JEOVÁ

Em símese: A Biblia das Testemunhas de Jeová, dita 'Traducao do


Novo Mundo", aprésente distorcdes do texto sagrado devidas á intengSo,
dos tradutores, de adaptar o texto bíblico ás concepcoes religiosas das Tes
temunhas. Verificase também certa oscifacao na maneira de verter certas
oassagens, explicável pela inseguranca das Testemunhas na formu/acao de
sua mensagem.

* • *

As Testemunhas de Jeová (TJs) constituern um grupo religioso deri


vado do Adventismo protestante. Seu fundador, Charles Russell,em 1874
predizia para 1914 a vinda de Cristo acompanhado dos patriarcas Abraáo
Isaque, Jaco e dos profetas da fé... Como nada ocorreu naquele ano, os
sucessivos presidentes da Sociedade Torre de Vigia (Testemunhas de Jeo-
t/á) foram adiando a data da segunda vinda de Jesús; a última foi o ano de
1975, no qual também nada se verificou dopredito. Atualmente abstém-se
de "profecías" em tal sentido.

O conjunto de doutrinas das Testemunhas tem oscilado, embora o


*orpo Governante se diga inspirado por Jeová para transmitir a verdade.
Em conseqüéncia, o próprio texto da Biblia utilizado pelas TJs, ou seja, a
raducao "do Novo Mundo", tem sofrido retoques. Os tradutores toma-
am a liberdade de alterar o sentido dos origináis, a fim de os adaptar a seu
nodo de pensar. É o que torna a Biblia das Testemunhas tendenciosa e
iouco fidedigna, por mais que se aprésente, em folha de rosto, como "tra-
lucao... mediante consulta constante ao antigo texto hebraico, aramaico
• grego".
Ñas páginas seguintes, poremos em evidencia algumas passagens em
iue o texto é deturpado para corresponder ao corpo de doutrinas das TJs.

1. OS VERSÍCULOS DISTORCIDOS

1.1. Evangelho de Joáo 1,1

0 texto original grego é assim cornetamente traduzido para o portu-


ués tanto por católicos como por protestantes:

426
A Bl'BLIA DAS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ 43

"No principio era o Verbo (Logos), e o Verbo (Logos) estava com


Deus, e O Verbo {Logos) era Deus".

Na Traduca"o do Novo Mundo (TNM) lé-se:

"No principio era a Palavra, e a Palavra estava com o Deus, e a


Palavra era [um] Deus".

Chama-nos a atencao o final: a Palavra era [um] Deus". Que signifi-


cam os colchetes? — A explicarlo se encontra no final da TNM (edicáo
de 1986), onde se acha a tabela dos Livros da Biblia; ai está dito:

"{ ] os colchetes encerram palavras inseridas para completar o sen


tido em portugués".

Isto quer dizer que os tradutores acrescentaram ao texto original pa


lavras que Ihes pareciam esclarecer a Biblia á luz das suas premissas doutri-
nárias.

E qual é a premissa doutrinária subjacente ao acréscimo de um em


Jo 1,1?

As TJs dizem que Jesús é apenas urna criatura, a primeira criatura de


Jeová. é o que se lé, por exemplo, no livro das TJs para enancas "Meu Li-
vro de Historias Bíblicas":

"O primeiro an/o feito por Deus foi muito especial. Foi o prímeiro
Filho de Deus, e ele trabalhou depois com o Pai. Ajudou a Deus a fazer
todas as OUTRAS COISAS, o sol, a lúa, asestrelas e também nossa térra".

A afirnrcacao de que Jesús era um anjo ou um deus com d minúsculo


nao so mente destoa de vinte sáculos de Tradicao crista, mas pode sugerir
politeísmo; deus com d minúsculo so ocorre na mitología dos antigos
povos.

Curioso, porém, é o fato de que em Jo 20,28 a profissao de Tomé


nSo foi alterada. Lé-se na TNM: "Meu Senhor e meu Deus! "e nao "Meu
Senhor e meu (um) deus!", pois seria demasiado aberrante esta segunda
fórmula.

Por causa de tal premissa, outro texto sofre enxerto:

1.2. Colossenses 1,16s; ver Joáo 1,3

Eis o que se lé ñas traducdes católicas e protestantes de Cl 1,16s:

"Nele foram criadas todas as coisas nos céus e na térra, as visiveis e


as invisiveis: Tronos, Soberanías, Principados, Autoridades, tudo foi criado
por ele e para ele. Ele é antes de tudo e tudo nele subsiste".

427
44 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

A TNM apresenta o seguinte texto:

"Mediante ele foram criadas todas as [outras] coisas nos céus e na


térra, as coisas visíveis e as coisas invisíveis, quer sejam tronos, quer senho-
ríos, quer governos, quer autoridades. Todas as [outras] coisas foram cria
das por intermedio dele e para ele. Também ele é antes de todas as [ou
tras] coisas e todas as [outras] coisas vieram a existir por meio dele".

Quatro vezes é acrescentada ao texto original a palavra "outras" para


significar que o Verbo ou a Palavra de Jo 1,1 foi criado, criado em pri
me i ro lugar.

Em Jo 1,3 lé-se comumente:

"Tudo foi feito por ele (o Logos) e sem ele nada foi feito do que foi
feito".

A TNM propoe:

"Todas as coisas vieram á existencia por meio dele, e á parte dele


nem mesmo urna so coisa veio á existencia".

A TNM evita a palavra "criar"; por isto nao há o acréscimo "todas as


[outras] coisas". Contribuir para que "venham h existencia" é menos forte
do que criar. Eis por que nao se fez o enxerto, que enfatizaria ser Jesús a
primeira criatura.

1.3. Mateus4,1-3

EmMt 4,1-3 a TNM reza:

"Jesús foi entáo conduzido pelo espirito ao ermo, para ser tentado
pelo Diabo... Veio também o Tentador e disse-lhe: 'Se tu és filho de Deus,
dize a estas pedras que se transformen! em paes".

Note-se que o espirito (a terceira Pessoa da SS. Trindade) é apreseñ


ado com e minúsculo, o filho de Deus com f minúsculo, ao passo que o
Diabo e o Tentador com D e T maiúsculo. Parece quemáis honra merece o
Oiabo e Tentador do que o Espirito Santo e o Filho de Deus.

1.4. Tito 2,13; 2 Pedro 1,1

1. Ñas traducoes protestantes e católicas lé-se em Tt 2,13:

"Aguardemos ... a manifestacao da gloria do nosso Grande Deus e


Salvador Cristo Jesús".

428
A BI'BLIA DAS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ 45

Visto que este texto, bem traduzido como está, professa a Divindade
de Jesús Cristo, as TJs acrescentam-lhe uma partícula que dissipa a afirma-
cao:

"Aguardamos a gloriosa manifestacao do grande Deus e [do] Salva


dor de nos, Jesús Cristo".

Assim o "grande Deus" nao é Jesús Cristo. O texto das TJs professa
haver o Grande Deus (Jeová) e o Salvador Jesús Cristo. Tal distincao des-
toa de quanto se lé em outros textos da TNM, que se referem á manifesta-
cao de Nosso Senhor Jesús Cristo. Assim:

2Tm 1,10 (TNM): "Agora se tornou claramente evidente pela Mani


festacao de nosso Salvador, Jesús Cristo, que aboliu a morte, mas lancou
luz sobre a vida e a incorrupcao por intermedio das boas novas".

1Tm 6,4 (TNM): "Para que observes o mandamento dum modo ima
culado e irrepreensível, até a manifestacao de Nosso Senhor Jesús Cristo".

2Tm 4,8 (TNM): "Doravante me está reservada a coroa da justica,


que o Senhor, justo juiz, me dará como recompensa naquele dia, contudo
nao somente a mim, mas também a todos os que amaram a sua manifes
tacao".

2Ts 2,8 (TNM): "Entao, deveras, será revelado aquele que é contra a
lei, a quem o Senhor Jesús Cristo eliminará com o espirito de sua boca e
reduzirá a nada pela manifestacao de sua presenca".

Vé-se que o Apostólo nao atribuí uma manifestacao (epipháneia) pro-


pria a Jeová, mas, ao falarde manifestacoes (<epháneia),associa-as sempre
a Jesús Cristo, que em Tt 2,13 é dito "o Grande Deus e Salvador".

2. Algo se semelhante se dá em 2Pd 1,1.

2Pd 1,1 (ñas clássicas traducoes): "Simao Pedro, servo e apostólo de


Jesús Cristo, aos que receberam, pela justica de nosso Deus e Salvador
Jesús Cristo, uma fe" de valor igual á nossa".

As Teste mu n has assim traduzem 2Pd 1,1:

"Simao Pedro, escravo e apostólo de Jesús Cristo, aos que obtiveram


uma fé tida por igual privilegio como a nossa, pela justica de nosso Deus e
do Salvador Jesús Cristo".

Mais uma vez Deus e Jesús Cristo sao considerados como personagens
distintos um do outro.

429
46 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1893

Todavia na epístola a Tito (TNM), se lé:

1,3: "IMosso Salvador, Deus"

1,4: "Cristo Jesús, nosso Salvador"

2,10: "Nosso Salvador, Deus"

3,6: "Jesús Cristo, nosso Salvador".

Donde se vé que o Salvador é tido como Deus e como Jesús Cristo no


próprio texto das TJs.

1.6. Hebreus1,6

Assim se lé ñas clássicas traducoes:

"Ao introduzir o Primogénito no mundo, diz novamente: 'Adorem-


no todos os anjos de Deus' ".

A traducáo do Novo Mundo, porém, propde:

"Ao trazer novamente o seu primogénito á térra habitada, ele diz:


'E todos os anjos de Deus Ihe prestem homenagem' ".

Evita-se a palavra adorar, que significa a reverencia devida a Deus só.


Como Jesús Cristo é tido qual criatura, as TJs Ihe atríbuem homenagem,
e nao adoracao.

Todavia o Verbo grego proskynéo, traduzido por "prestar homena


gem" em Hb 1,6, é traduzido por adorar na TNM, se dirigido a Jeová e
nao a Jesús Cristo. Assim em

Mt 4,10: "Vai-te, Satanás, porque está escrito: 'Ao Senhor (Jeová)


teu Deus adorarás e só a ele servirás' ".

Ap 22,9: "Adora a Deus".

Quando o verbo se dirige a Jesús Cristo, é traduzido por "prestar


lomenagem":

Mt 2,2: Os magos disseram a Herodes: "Viemos prestar-lhe hornería-


jem (proskynein)".

Mt 28,17: "Quando os apostólos viram Jesús, prestaram-lhe homena


gem (prosekynesan)."

é, porém, digno de atencfo o fato de que a TNM editada em 1967


(anteriormente á versSo revisada em 1977) dízia:

430
ABI'BUADASTESTEMUNHASDEJEOVÁ 47

"Ao trazer novamente o seu primogénito á térra habitada, ele diz:


'E todos os anjos de Deus o adorem'".

Em 1977 tal versao foi trocada pela atual, onde se lé "prestem ho-
menagem".

Alias, a Biblia das Testemunhas de Jeová tem historia complexa. Foi


lancada em seis volumes, pela primeira vez, entre 1950 e 1960. Em 1963
foi publicada urna nova traducSo do Novo Testamento apenas. Em 1967,
saiu a Biblia inteira em traducSfo portuguesa revista. Em 1977 nova edicao
revisada foi dada ao público. Em 1986 outra edicto revista veio a lume.
Donde se vé quá*o instável é o corpo doutrinário das TJs.

1.7. Cruz = Estaca de Tortura

As TJs nao usam a palavra Cruz, pois Ihes lembra um símbolo que
eles térn como pagao. Por isto, sempre que staurós ocorre no texto grego,
em vez de verter, como classicamente se faz, por cruz, usam o vocábulo
estaca. Para tanto alegam que o termo staurós originariamente designava
um poste ou urna estaca reta ou um pedaco de ripa em que algo podia ser
pendurado. Todavía nao levam em conta que já antesde Cristo essa estaca era
acrescida de urna trave horizontal, donde pendiam os supl¡ciados; os roma-
"nos fizerarn chegar á Palestina nos tempos de Alexandre Janeu (67 a.C),
rei de Judá, impregnado de cultura helenística, o uso de cruz como ins
trumento de condenacao.

Mais: já que estaca é palavra um tanto genérica, a TNM acrescenta-lhe


o aposto de tortura. Donde se lé em

Mt 27,40: "Se tu és filho de Deus, desee da estaca de tortura".

Gl 5,14: "Que nunca ocorra que eu me jacte, exceto da estaca de tor


tura de nosso Senhor Jesús Cristo".

Cl 1,20: "Reconciliar novamente todas as (outras) coisas consigo


mesmo... por intermedio do sanguequeelederramouna estaca de tortura".

Realmente é preciso ser muito avesso aos usos cristaos para sustentar
tal e tais outras traducoes.

Outros casos se poderiam aínda aduzir para evidenciar as peculiarida


des anómalas da TNM. É de crer, porém, que o que foi até aquí apresenta-
do é suficientemente eloqüente.

3. CONCLUINDO...

Ao TJs jugam ter descoberto o Cristianismo no sáculo passado me


diante Charles Russell. Afastando-se de toda a Tradicao crista, léem a Bí-

431
48 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 376/1993

blia sem referencia á Tradicáo oral, comparando texto com texto — o que
dá margem a arbitrariedades, como tém sucedido nos decenios da existen
cia das TJs. é de crer que novas alteracSes na Biblia e na mensagem das
TJs ocorram. O fato é que tal denominacao já nao é crista, pois nega a SS.
Trindade e a Divindade de Jesús Cristo. Alias, as denominacSes protestan
tes recentes, cedendo cada vez mais ao subjetivismo, se perdem em teorías
esdrúxulas, sempre mais distantes das fontes do Cristianismo, por mais
que Ihes queiram ser fiéis. A Biblia, desarraigada da Palavra oral, que a ber-
cou e acompanha, pode ser distorcida em varias direcoes, sem que os leito-
res tenham criterios para julgar tais aberracoes. O recurso á Tradicáo oral
ilumina auténticamente o sentido das Escrituras Sagradas.

A propósito ver "Por que nao sou Testemunha de Jeová?", publica-


gao da Escola "Mater Ecclesiae", Caixa postal 1362, 20001-970, Rio (RJ).

ASSOCIAQÁO DE
TELESPECTADORES E RADIOUVINTES
O Or. José Carlos Grapa Wagner é advogado tributarista de Sao Pau
lo, Homem de Visao de 1986, que vem militando últimamente em prol da
Ética nos meios de común ¡cacao social. Obteve o cancelamento de progra
mas pornográficos ou violentos, como sao os filmes "A Última Tentacao
de Cristo" na TV Bandeirantes, "Calígula" na redeOM e "Adoradores do
Diabo" na rede Globo. A respeito do primeiro destes filmes declarou: "So
se faz ficcao com personagens ficticios".

Para dar maior eficacia á sua campanha de recuperacao dos mfdia, o


Dr. Graca Wagner deseja fundar urna Associacáo de interessados. O seu
propósito torna-se público mediante a carta abaixo:

Sao Paulo, 7 de junho de 1993


Prezados Senhores,

O intuito, ao enviar o material anexo, é de acordar o Brasil do silen


cio em relacab aos abusos da Televisao.

Históricamente, o abuso de um direito tem levado, por ser mais fácil


i opcao por solucoes extremadas, á eliminacáo do uso normal desse mes-
no direito. O que se deve proteger, é o uso; o que se deve combater, é o

(continua na pág. 425)

432
(continuagao da p. 405):

sufragios pela salvagao de seus morios, para que, pela comunhao exis
tente entre os membros de Cristo, o que para uns serve de sufragio, a
outros sirva de consolo e esperanza.

O texto da Comissao Teológica Internacional, longo e denso como é,


pode ser resumido nos seguintes pontos:

1) A morte é a separacao de corpo e alma. Esta, sendo espiritual, é


¡mortal porsua própria natureza. Cf. § 5.1-4.

2) A recomposicáo do ser humano ou a ressurreicao dos corpos se da


rá no fim dos ternpos, quando Cristo fizer sua parusia ou seu retorno co
mo Juiz de todos os homens. Cf. § 2.1.

3} Entre a morte do individuo e a consumacao da historia, cada alma,


mesmo sem corpo, colhe os frutos do que semeou nesta térra: o céu, o
purgatorio (eventual preparacao para a visao beatífica no céu) ou o in
ferno. Cf. §§ 4.3; 4.5; 10,1-4.

4) A alma humana, ao deixar o corpo e o tempo, nao entra no regí-


me da eternidade (que é exclusiva de Deus, o único Ser que nao teve co-
meco e nao terá fim), mas no regime do evo, próprio de quem teve come-
co, mas nao terá fim. Cf §§ 2,1; 4.1-5.

PARA AS MISSAS DE DEFUNTOS:

2 novos textos: para Missas de 7^ e 309 día.

1. MISSA DA ESPERANCA (4 págs.) em 2 cores


com a II Oracáo Eucarfstica
2. MISSA DA RESSURREICÁO (4 págs.> em 2 cores
com a III Oracáo Eucarística

contendo as aclamacóes constantes da nova


edicáo do Missal Romano
Com descontó especial para quantidade.

Edupóes "Lumen Christi"


Mosteiro de Sfio Bento

RENOVÉ. QUANTO ANTES,


SUA ASSINATURA PARA 1993
CR$ 850,00
Em Comemoragao do IV Centenario de sua Fundacao

408 páginas {30 x 23) de urna obra ricamente policromada


Texto histórico documentado por D. Mateus Rocha OSB

É a crónica corrida e compacta da construcao do Mosteiro, da sua


igreja e das obras de arte nele comidas. Resume as mais diversas contri-
buicoes que, durante séculos. formaram o patrimonio da Ordem Benediti
na na provincia do Rio de Janeiro.

Palavras do renomado arquiteto Lucio Costa:

"Esse mosteiro — este monumento — é. sem dúvida, a áncora da ci


dade do Rio de Janeiro. — Em boa hora o intelectual e fotógrafo Humber
to Moraes Franceschi que já nos deu a obra-prima "O Oficio da Prata",
resolveu fazer, com o pleno apoio do engenheiro-Abade D. Inácio Barbosa
Accioly (falecido a 26 de maio de 1992) - ¡mpecável dono da casa - este
definitivo inventario visual, velho sonho de 0. Clemente da Silva Nigra."
De D. Abade Inácio Barbosa Accioly:

"Hoje o Mosteiro é realmente a áncora da cidade do Rio de Janeiro,


é igualmente foco-de luz ardente que, sem qualquer ostentacao ilumina to
dos aqueles que aquí vivem, que aquí vém louvar o Senhor, ou que aqui
encontram alimento para a chama misteriosa de sua fé - pois o Mosteiro
nao é um simples monumento ou um museu, mas urna casa viva a irradiar
a presenca de Deus."

Da metma obra. 41bum com 110 pags. 130 x 23) sorrmnte sobro a IGREJA OE SAO
BENTO, emS volume* separadornas Ifnguas ponuguesa.\espanhola, francesa, inglesa
ealemS.

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