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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LIME

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizacáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESENTAQÁO
DA EDigÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenga católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortalega
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabalho assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.

A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaga


depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
responderemos
< SUMARIO

h-

< "Nec Laudibus Nec Timore"

^ Os Meios de Comunicacao Social: Influencia e Responsabilidades


O
H "Sintese de Religiao Crista"

uj "O Espirito e o Feminino. A Mariologia de L. Boff"

O "Por que Deixamos a Batiría"

"Béncaos Papáis Produzem Maldicoes?"

** A Restauracao do Domingo Cristao

^ Livros em Estante
_j

O
oc .
a. ■ .

ANO XXIX - MAIO - 1988


PERGUNTE E RESPONDEREMOS MAIO-1988
Puhjicapao mensal N? 312

'retor-Responsável: SUMARIO
Estéváo Bettencourt OSB
Autor e Redator de toda a materia
"NEC LAUDIBUS NEC TIMORE" 193
A "escola paralela":
publicada neste periódico
OS ME I OS DE COMÚN I CACAO
retor-Administrador: SOCIAL: INFLUENCIA E RESPON
SABILIDADES ... 194
D. Hildebrando P. Martins OSB Urna tentativa de
"SINTESE DE RELIGIÁO CRISTA" . . 207
Jministracáo e distribuidlo: Ecos de um livro candente -
Edicóes Lumen Christi "O ESPI'RITO E 0 FEMININO A
Dom Gerardo, 40 - 5" andar, S/501 MARIOLOGIA DE L. BOFF" ....... 214
Tel.: (021) 291-7122 Um livro polémico-
Caixa Postal 2666 "PORQUEDEIXAMOSA
20001 - Rio de Janeiro-RJ BATINA" 228
Fatos históricos?
"BÉNCÁOS PAPÁIS PRODUZEM
MALDigOES"? 232
Urna alerta pastoral:
"MARQUES-SARAJVA" A RESTAURACÁO DO DOMINGO
aUfcos c cenotes s.a. CRISTAO 236
lili.: <021)27>«4M - 271-9447
LIVROS EM ESTANTE 238

3INATURA:Cz$ 1.000,00
NO PRÓXIMO NÚMERO
mero avulso: Cz$ 100,00
313-junho-1988
amento (áescolha):

O Culto das Imagens (Joao Paulo II). - "Re-


VALE POSTAL á Agencia Central dos
ligioes, Seitas e Heresias" (J. Cabral). - So-
Córrelos do Rio de Janeiro.
mente a Escritura? - É nociva a castidade?
CHEQUE BANCÁRIO. -A Fecundacaoartificial "Gift".
>Jo Banco do Brasil, para crédito na Con-
:a Corrente n?0031, 304-1 em nome do
Vlosteirode S. Bentodo Rio de Janeiro, pa-
lável na Agencia da Praca Mauá (n90435). COM APROVAgAO ECLESIÁSTICA

RENOVÉ QUANTO ANTES COMUNIQUE-NOS QUALQUER


A SUA ASSINATURA MUDANQA DE ENDEREQO
M
Laudibus Nec Timore
Sobre o túmulo do grande Bispo von Gallen, de Münster (Alemanha),
acham-se os dizeres que exprimem um dos traaos de sua personalidade: Nec
laudibus nec timore, nao fo¡ movido nem pelo desejo de louvores nem pelo
medo de ser zombeteado e perseguido. Com efeito, durante os anos do regí-
me nacional-socialista (1933-1945), aquele prelado soube resistir heroica
mente aos erros e ás invectivas da ideologia, mantendo intrépidamente
a profissáo de fé católica, apesar dos ataques que sofría. Alias, nao foi o úni
co prelado a se distinguir pela coragem e lealdade.
Tais homens deixam aos pósteros um testemunho eloqüente; "defun-
tos, ainda falam" (cf. Hb 11,4). Sao os grandes heróis que nossa época pre
cisa de considerar.

Sim. O auténtico servidor é aquele que nao procura satisfazer aos seus
interesses particulares, mas leva em conta a verdade como tal e o bem co-
mum, aos quais deseja atender á custa do sacrificio de si mesmo, se necessá-
rio. Pratica incondicional mente o cumprimento dos deveres, sabendo que
nisto existe urna nobreza que nenhuma lisonja alcanpa e nenhuma censura
extingue. Há na fidelidade firme um discurso mais persuasivo do que belas
palavras vazias.

Aqueles que nao tém fé, de¡xam-se impressionar por tal testemunho,
pois véem que ainda existe o HOMEM-PALAVRA em nossos dias, aquele
que nao se degrada por causa de situapdes passageiras. Quanto aos que tém
fé, percebem no HOMEM-PALAVRA o reflexo do Cristo Jesús. Os amigos
doutores da Igreja sempre exaltaram a figura do cristao, e especialmente a
do pastor, intrépido. Assim, por exemplo, escreve S. Gregorio Magno (1604):
"Nao diga o pastor o que deve calar, nem cale o que deve dfzer. Pois,
da mesma form.i que urna palavra inconsiderada arrasta ao erro, o silencio
inoportuno deixa no erro aqueles a quem poderia instruir. Muitas veres pas
tores imprudentes, temendo perderás boas grecas dos homens, tém medo de
falar abertamente: e. segundo a palavra da Verdade, absolutamente nao
guardam o rebanho com solicitude de pastor, mas, por se esconderem no si
tando, agem como mercenarios que fogem do lobo. — O Senhor, pelo Pro-
feta, repreende estes tais, dizendo: 'Caes mudos que nao conseguem ladrar'
(is56,10)"iRegra Pastoral2,4J.
Felizes aqueles que vivem em tempos como os nossos, tempos nos
quais cada um é chamado a tomar posicao clara: por Cristo ou contra Cris
to. Sao tempos em que ninguém se pode deixar ficar amorfo ou mediocre
sem ser tragado pelas ondas dos "modismos"! "Nem pelos louvoures, nem
pelo temor", mas pelo amor heroico a Cristo, á S. Igreja e á Verdade.. .
Tal é o programa de vida do genuino cristao.

1 Nem pelos louvores nem pelo temor. E.B.

193
"PEROUNTE E RESPONDEREMOS"
Ano XXIX - N? 312 - Maio.de 1988

A "Escola paralela":

Os meios de Comunicado
Social: Influencia
e Responsabilidades...

Em síntese: O livro de Alfredo Casado sobre "Os Meios de Comuni


cacao Social" chama a atencao para a rapidez dos progressos da técnica em
materia de comunicacao social e para as vultosas conseqüéncias que este fato
tem acarretado para os individuos e a sociedade. Os meios de comunicacao
social, além da sua acao abena ou explícita, nao raro direcionada neste ou
naque/e sentido, exercem muitas vezas urna acao subliminar; esta é progra
mada de modo a penetrar diretamente no subconsciente das pessoas e indu-
zi-las a pensar ou agir de tal ou tal modo, sem que os usuarios o percebam.
Grupos políticos, ideológicos e económicos utilizam tal recurso para persua
dir e alidar as massas.

Ora tao vasta influencia dos meios de comunicacao social tem inci
dencias éticas. Requer-se honestidade e objetividade, assim como respeitoá
liberdade alheia, da parte dos comunicadores; da parte dos usuarios, deseja-
se senso crítico, capaz de discernir distorcoes ou desvíos. Aos genitores no
lar, aos educadores na escola, aos catequistas e sacerdotes na Igreja toca o
dever de formar a consciéncia crítica dos pequeños, dos jovens e dos adul
tos, a fim de que saibam desvencilhar-se dos perigos de manipulacao ao usa-
rem os meios de comunicacao social; estes, alias, considerados em si, sao pre
ciosa conquista da técnica humana. Ao Estado toca, outrossim, estabelecer
normas referentes ás comunicacoes sociais, a fim de garantir o uso constru-
tivo dos mesmos e defender de agressoes sorrateiras os seus usuarios.

194
MEIOS DE COMUNICACÁO SOCIAL

Nao há quem nao reconheca o enorme poder dos meios de comunica-


pao social (MCS) como radio, televisao, cinema, imprensa escrita... na for-
macao de mentalidades. Embora seu alcance seja vultoso, parece nao haver
nos usuarios consciéncia suficientemente esclarecida a respeito. Entre os es-
tudos últimamente publicados sobre o assunto, está o de Alfredo Casado:
"Os Meios de Comunicarlo Social e sua Influencia sobre o Individuo e a So-
ciedade"1. Visto que o autor aborda a temática com sabedoria, passamos a
apresentar urna símese de tal obra.

1. A rápida evolucao da técnica

Nos últimos oitenta anos o número de descobertas científicas e de


realizacoes técnicas vem crescendo em progressao hipergeométrica, isto é, de
modo mais rápido que a progressáo aritmética, a geométrica e até a expo
nencial. 0 seu volume equivale ao de todas as invencoes obtidas desde o
inicio da humanidade até o principio do sáculo XX. Atualmente convivem
muito mais cientistas e pesquisadores do que quantos existiram desde o
surto do homem sobre a Térra até o fim do sáculo XIX. Limitando-nos ao
setor das común i capóes sociais, registramos em 1901 a primeira transmissao
de telegrafía sem fio entre dois continentes (Europa e América do Norte);
em 1936, o ini'cio dos programas regulares de televisao; em 1962, a trans
missao de imagens entre Estados Unidos e Europa através do primeiro
satélite artificial (Telstar); em 1986, o primeiro videotelefone instalado na
cidade de Biarritz (Franca) para todos os seus habitantes... Podemos
acrescentar que sao mais de duzentas as aplicacoes de descobertas científicas
ao setor das comunicacóes sociais nos últimos cinco anos.

Tais avancos modificaram profundamente o tipo de conduta do ho


mem. Com efeito; em apenas 86 anos duplicou-se a expectativa de vida do
homem (era de 36 anos no inicio do sáculo; em 1986, pode atingir os 70 ou
80 anos). Realizaram-se grandes progressos no combate as doencas. Os paí
ses mais desenvolvidos debelaram o analfabetismo e diversificaran! a sua
cultura. Aumentou-se o número de horas de lazer, para as quais se criaram
novas formas de ocupacáo {viagens, torneios esportivos, temporadas artísti
cas... ). Doutro lado, porém, a instalacao de máquinas velozes e precisas
suscitou o desem prego de muitos e muitos operarios. O traba I no hoje requer
geralmente mao de obra especializada. É ¡nteressante notar a seguinte evolu
cao no tipo de trabalho na Europa durante o secuto XX:

' Ed. Cidade Nova, Rúa Ce/. Paulino Carlos 29,04006 Sao Paulo fSP), 110
x 185mm,92pp.

195
"PER6UNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

Populapao que trabalha em 1900 1986


a) agricultura, pecuaria, pesca, minas 55% 17%
b) industria (movéis, automóveis, fibras,
material de construcáo, produtos alimen
ticios, transíormagio de metáis...) 34% 36%
c) correios, telefone, transportes em geral,
hotel aria, informapóes e relacoes huma
nas, serví pos do lazer 11% 47%

Em 1900, 66% da populapao vivía no campo, em pequeñas aldeias e


vilas. Em 1986, 43%da populacao das nacoes desenvolvidas vivem em cida-
des de pelo menos 50.000 habitantes.

Desapareceu, em grande parte, o trabalho na pequeña propriedade


familiar relativamente satisfatório; e multiplicou-se o número de trabalha-
dores por conta de terceiros e assalariados. O trabalho é assim considerado,
nao raro, como penoso e sufocador, a tal ponto que o trabalhador julga viver
a sua verdadeira vida ñas horas Hvres, ñas quais ele desfruta da familia, do di-
vertimento ou realiza algum servico de dedicapao ao próximo por ideáis re
ligiosos.

£ precisamente neste contexto do lazer que se coloca a acao influente


dos meios de comunicapao social.

2. A influencia dos MCS

Outrora a falta de comunicapao retardava o progresso da civilizapao.


Basta lembrar que já em 1221 os chineses criaram os tipos movéis para im
primir; todavia no Ocidente esta arte ficou ignorada até que Joao Gutem-
berg a concebeu em meados do sáculo XV. Algo de análogo aconteceu com
a descoberta da pólvora, que s6 chegou as nacóes da Europa no sáculo XIII,
depois de muíto conhecida e utilizada no Oriente.

Hoje em dia, porém, todo evento importante ocorrido em qualquer


parte do mundo é quase ¡mediatamente conhecido em todos os recantos da
Térra. As noticias viajam com a velocidade da luz ou das ondas hertzianas.
As grandes Agendas Internacíonais de Noticias dispoem de milhares de jor-
nalistas espalhados em todos os países.

Há também as transmiss5es instantáneas de ocorréncias que se devem


aos sistemas eletrdnicos de comunicaclo: assim, por exemplo, as competí-

196
MEIOS DE COMUNICACÁO SOCIAL

cóes esportivas e os festivais artísticos internadonais sao contemplados si


multáneamente via satélite por telespectadores do mundo inteiro; a Assem-
bléia de Oracao pela Paz promovida pelo Papa Joao Paulo 11 em Assis (1986)
com representantes das grandes religioes foi acompanhada por milhoes de
telespectadores - crentes e nao crentes - dos cinco continentes. Os encon-
tros entre Reagan e Gorbachev em Genebra e em Washington foram apresen-
tados durante o almoco ou o jantar em todos os lares de boa parte do mun
do no mesmo dia.

A rapidez e a profusao de imagens e noticias assim transmitidas, além


de apresentar suas enormes vantagens, pois unificam o mundo e favorecem a
solidariedade, acarretam seus inconvenientes, que, embora serios, sao pouco
considerados pelos usuarios. Procuremos catalogá-los:

2.1. Sobrecarga de noticias e saturacao

As noticias sao transmitidas em tal quantidade e velocidade que mui-


tas vezes nao há tempo para a ref lexáo pessoal sobre as mesmas. O ouvinte
ou telespectador nao tem de ¡mediato um criterio pessoal para interpretar e
assimilar o que Ihe é transmitido; por isto tende a cair na passividade, que
ocasiona a saturacao. - Alias, este é um fenómeno cada vez mais freqüente
em nossos dias: multiplicam-se os campos do saber a tal ponto que, para nao
ficar na superficialidade, o estudioso deve limitar sempre mais o setor de sua
atencao; "saberá cada vez mais de cada vez menos - ou saberá quase tudo
de quase nada".

2.2 Criterios de transmissáo e recepcao

A profusao de noticias é tal que tanto o transmissor como o receptor


as devem selecionar. Pergunta o transmissor: "Que porei no ar?" E o recep
tor: "Que emissora contactare!?".

Ora o transmissor muitas vezes depende do IBOPE ou de fins comer


ciáis; tende a se ¡nteressar por ¡nformacóes de caráter espetacular, raro, sen
sacional, influente em determinada direcao ou de maior rentabilidade finan-
ceira, mesmo quando tais noticias nao sao as mais aptas a produzir solidarie
dade e senso ético entre os homens.

As pessoas que selecionam as noticias a ser transmitidas, possuem for-


ca de influencia quase ilimitada, de tal modo que a imprensa escrita chegou
a ser chamada "o quarto poder" de urna nacáo. Mais forte aínda é a acáo
da televisao. Ora todo este poder é colocado freqüentemente a servíco quase
exclusivo de interesses lucrativos, comerciáis ou mesmo... político-partida
rios e ideológicos...

197
6 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

Quanto ao receptor, é propenso a dar atengao apenas ás noticias e


¡rrtagens que correspondem ás suas categorías filosóficas pessoais1.

O que importa, porém, é chamar a atencao para a responsabilidade da-


queles comunicadores que utilizam os MCS em sentido unilateral ou distor
cido, violando o direito do público a ser informado com objetividade.

A sucessao de noticias sinistras - morte de inocentes por terrorismo,


seqüestros, cifras exageradas de aborto, dissolupáo de familias pelo divorcio,
guerras e guerrilhas, revolucoes armadas... - acaba convencendo as massas
de que no mundo atual é obrigatório conviver com a violencia permanente.
0 aborto e o divorcio seriam realidades indiscuti'veis; os casáis teriam o direi
to de se separar, e as mulheres o de eliminar a vida que está em seu seio.

Os valores moráis sao assim relativizados; seriam questio de cultura,


de preconceitos ou de afinidade étnica. Esjta acáo deletéria faz que muitas
pessoas - principalmente as mais jovens - percam, ou nao cheguem a ter,
urna escala de valores para se orientar. Tornam-se seguidores do comporta-
mentó dos grandes grupos que pensam e decidem por elss; acabam acredi
tando que "6 impossível que a grande maioria se engañe"; tem-se entáo o
"homem-massa", de consciéncia diluida, que se deixa conduzir pelo grupo
despersonalizante; a torrente de noticias, sugestóes e modelos dificulta-lhe a
reflexao objetiva; a voz da consciéncia do usuario é abafada; antes, os infor
mativos levam-no a julgar que tal voz interior é resquicio de épocas que fo-
ram ultrapassadas pela civilizacáo.

2.3. O Consumijmo

Os MCS sao também porta-vozes dos interesses de firmas e empresas


comerciáis.

"Que deve a dona de casa comprar no supermercado? Como deve a


jovem vestír-se nesta ou naquela estacáo? Como e onde o adolescente se há
de divertir? Que brinquedos o papai deve comprar para os filhos? Muitas

1 "Vía de regra, as pessoas aceitam com facilidade aquilo que está de acor-
do com suas opinioes e interesses. O receptor costuma limitar a sua expe
riencia aos objetos e conteúdos que se harmonizam com as suas preferen
cias. ..
F/ca impresso e se memoriza melhor aquilo com que a gente concorda
mentalmente, é esquecido com facilidade aquilo que nSo se coaduna com as
próprias idéias do receptor. Existem mecanismos que favorecem ou tornam
mais difícil a transmissao de urna mensagem e fatores de potenciamento ca-
pazes de incrementar, a sua eficacia na pessoa que recebe a comunicacao"
(pp. 50s).

198
MEIOS DE COMUNICACÁO SOCIAL

outras perguntas como estas já tém sua resposta dada pela propaganda na
sociedade de consumo" (p. 23).

"O homem massificado nao precisa de se preocupar com a maneira de


gastar o seu dinheiro. Os anuncios da televisao indicam-lhe como vestir-se,
pentear-se ou onde passar as ferias. A saúde e a juventude perdida sao recu
peradas com a última meditacao iogue que acaba de chegar do longínquo
Oriente, com regime light com reduzido número de calorías, ou com um
novo sistema de ginástica. Tudo como se anuncia na televisao. Quem nao
segué estas normas é um cafona, desatualizado, vive out e nao in como um
competente e bravo telespectador.

Nao importa se o produto anunciado pela publicidade nao possua ne-


nhuma das qualidades que Ihe sao atribuidas. Importa que seja apresentado
por um ídolo do esporte ou da televisao. Se aquele xampu nao deixa os cá
belos leves e brilhantes ou sottos como o personagem o apresenta, é secun
dario; se o detergente nao tira as mancha* mais encardidas, mais dif icéis, nao
entra em questao. A empregada que os compra, recebe um brinde quando
tem tres cupoes do produto, que devem ser enviados ao endereco indicado
no verso.

A sociedade de consumo já conquistou a enanca, o adolescente, o ho-(


mem e a mulher adulta. E chega a prometer ás pessoas da terceira idade o
retorno aos anos dourados da juventude. Mesmo sabendo que nao se pode
recuperar mais aquela idade, o slogan levou muitas pessoas de cábelos enca
necidos a sonharem...

O consumismo manobrado pela publicidade nao pode regredir. Exis-


tem Agencias que elaboram anuncios publicitarios e, caso nao acontecer um
aumento de vendas até um certo m'vel pré-fixado, devolvem os gastos de
producao do anuncio. Tém certeza de que os resultados serao superiores.

Todo mundo sabe que quem paga o anuncio é o consumidor, através


de um aumento de prego. Mas isso é inevitável, pois vivemos numa sociedade
de consumo. Alguém qualificou a nossa época como sendo a era do consu
mismo por causa dos meios de comunicacao. Entretanto o problema é mais
ampio. As emissoras de radio e televisao sao empresas e como tais necessi-
tam da publicidade para subsistir" (pp. 23s).

2.4. Efeitos a curto, a medio e a longo prazo

É claro que a influencia dos MCS pode encontrar certa resistencia —


consciente ou inconsciente - da parte dos seus usuarios. Da/ distinguírem-se
tres tipos de seus efeitos:

a) Efeitos a curto prazo. No setor do consumo ou da inducao a com


pras, os MCS tém mais pronta eficiencia do que quando se trata de mudar a

199
8 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

mentalidade ou a filosofía dos homens; a moda, as "ondas", os cbstumes


mais recentes sao absorvidos mais fácilmente por estes.

b) Efeitos a medio prazo. Quem respira tranquila e assiduamente os


ares dos MCS, acaba-se situando numa matriz socio-cultural poderosa. Prin
cipalmente os jovens sao presas facéis dos meios, pois ainda nao estáo liga
dos a modelos pró-estabelecidos; o linguajar, o gesticular, os modos de na-
morar, casar e "des-casar", adulterar... apresentados pela televisao vém a ser
escola para os telespectadores inexperientes. Os psicólogos registram o fenó
meno da identificacao, pelo qual o individuo se senté solidario com os per-
sonagens apresentados, por causa de admiracao e simpatía por eles; tende,
pois, a viver inconscientemente os mesmos modos de ser e de agir dos indi
viduos que os MCS exibem; é propenso a repetir na vida real o mundo dos
sonhos contemplados. "Tanto isto é verdade que hoje, além da escola insti
tucional, se pode falar da escola paralela dos meios de comunicacao" (p. 64).

c) Efeitos a longo prazo. Segundo alguns observadores, a génese da


chamada "sociedade de massa" encontra-se nos meios de comunicacao so
cial. Estes ditam o modo de organizacáo, expressao e os criterios para julgar
a realidade material, social e espiritual. É o que explica a enorme difusáo
dos televisores: até nos barracos de favela, onde faltam agua, espapo e higie
ne, encontra-se um aparelho de radio ou de televisao. Os meios áudio-visuais
"geram em muitos urna fé quase sobrenatural no seu poder mágico" (Merton
e Lazarsfield). "A civilízacao industrial, com seu trabalho monótono e sem
criatividade, suscita a fome de evasao, de paraíso de fantasía envolvente.
Donde o poder narcotizante dos meios áudio-visuais" (p. 28).

Estas observacoes se rao ulteriormente aprofundadas.

2.5. Acao subliminar

Os especialistas tém estudado a atuacao subliminar ou inconsciente


dos MCS sobre os seus usuarios. Com efeíto; está comprovado que tais meios
podem atingir d i ret amen te o subconsciente, burlando o consciente e a líber-
dade do receptor; utilizando métodos sofisticados, podem simultáneamente
enviar dupla mensagem: urna, a ser recebida conscientemente pelos sentidos
da visao e da audicao, e outra aparentemente ¡mperceptivel, mas eficaz, des
tinada a alcancar diretamente o inconsciente do individuo. Isto fot averigua
do com certa precisao no cinema mediante a seguinte experiencia:

A fita de um filme normal tem o comprimento aproximado de tres mil


metros, com o tempo de projecáo continua de mais ou menos urna hora e
meia. Atualmente a velocidade da projecáo é de 24 fotogramas por segundo
— o que equivale a meio-metro de fita por segundo. — Ora em determinado
filme foram intercalados isoladamente, a cada cem metros da fita normal,
fotogramas independentes do enredo. Nestes fotogramas estava escrita urna

200
MEIOS DE COMUNICACAO SOCIAL 9

mensagem simples dirigida á percepcáo subliminar, era a mesma em todos os


fotogramas ¡solados, de modo que, reiteradamente, aparecía a mesma frase:
"Tome tal refrigerante, coma pipoca freqüentemente; sao gostosos e fazem
bem á saúde". Durante a projepao do filme, nenhum espectador conseguiu
ler a mensagem subliminar; ninguém percebeu algo de estranho durante a
projecao do filme. Mas averiguouse que a mensagem ocultachegou, de for
ma subliminar, até os espectadores. Sim; em todas as sessoes ñas quais se
exibiu o filme que continha a mensagem subliminar, a venda do refrigerante
recomendado aumentou de 9 5%acima do habitual, e o consumo de pipoca
cresceu em 13%! Todos os espectadores tinham acompanhado o enredo por
eles livremente escolhido, com o mesmo interesse; todavía 9,5% dos mesmos
(aqueles de opcóes menos definidas em materia dj bebidas) deixaram de
comprar o refrigerante habitual e preferíram aquele indicado pela mensagem
do filme, um número maior, ou seja, 13% resolveu comprar pipoca, porque
isto fícara registrado no seu subconsciente sem que o percebessem,
A explicacao psicológica do fenómeno é muito simples. As pessoas de
criterios bem estabelecidos nao mudam fácilmente de conduta por causa de
mensagens subliminares; mas os individuos indecisos ou inconstantes deixam-
se prontamente influenciar pela última mensagem recebida. Sao vftimas de
acao subliminar transmitida a seu subconsciente sem que o possam averiguar.

Eis urna experiencia semelhante realizada em outro setor:

Durante o horario normal de urna Fiagáo, as operarías que trabalha-


vam ñas seccóes menos barulhentas, costumavam ouvir as cancóes de maior
tama no momento. Ora, em algumas fitas foí ¡ntroduzido, mediante proces-
sos requintados, um refrao a ser ouvido periódicamente como mei.sagem
sublíminar: "Quando urna operaría trabalha bem, produz mais e é mais con
dignamente remunerada". As varias canpóes transmitirán! de maneíracons-
tante o mesmo estribilho subliminar durante um mes. - Os efeitos nao tar-
daram: ao fím do mes, verificou-se que o rendimento quantitatívo aumenta
ra 7% A melhora da qualídade da f ¡acao {ausencia de defeitos nos estampa
dos, na textura, etc.) superava, em media, 21% do normal.

Após esta experiencia, passado certo tempo, e com a autorizacáo do


dono da fábrica, fez-se nova experiencia; todavía a mensagem emitida pelo
mesmo processo trazia outro refráo: "Todo operario deve reivindicar com
firmeza os seus direitos para nao ser injustamente explorado". Embora estes
dizeres sejam a expressáo da justica, criaram um clima de inquietacSo tal
que em menos de tres semanas a producao da fiacao baixou de 14% abaixo
do normal e se perdeu a ótima qualidade obtída mediante a mensagem ante
rior.

Estes fatos mostram como é vulnerável a pessoa humana; ela pode ser
sorrateiramente invadida e violentada sem que o saiba e, por ¡sto, sem que

201
10 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

se possa defender. - Passemos agora a algumas ulteriores conclusoes da Psi


cología.

2.6. Dados numéricos

Para se aquilatar melhor a influencia dos MCS, levem-se em conta os


seguintes dados:

Urna boa imagem tem mais eficiencia pedagógica do que dezenas de


palavras. A crianca capta 71% com os olhos (donde a importancia da lingua-
gem pictórica), 16% com a audicao e o restante com os demais sentidos (co
mo o olfato, o paladar, o tato...). Oizem os peritos outrossim que ficam
tmpressos na mente dos adultos apenas 12% daquilo que ouvem, 23% do que
véem, mas 38% do que véem e ouvem simultáneamente. Em virtude da con
vergencia das impressoes, o ser humano guarda melhor o que percebe ao
mesmo tempo por varios sentidos.

A pujanca da te lev ¡sao é tal que, segundo alguns pesquisadores, as


criancas nascidas em 1980 te rao passado, no final do secuto ou vinte anos
mais tarde, a quarta parte de sua vida diante da televisan. Os próprios pais,
ás vezes, estimulam os filhos a procurar tal passa-tempo, porque assim os
pequeninos ficam quietos (em muitos casos, ao menos) e nao perturbam os
mais velhos. Numa pesquisa realizada nos Estados Unidos, 13% das criancas
responderam que, tendo de escolher entre o pai e a TV em casa, optariam
pela TV. Assim se verifica que a TV pode contribuir para desagregar a fami
lia ou dificultar o bom relacionamento entre os membros da mesma; é certo
que em muitos lares os horarios, os costumes e as opinioes sofrem modífi-
cacóes- sucessivas por causa das insinuacoes dos meios de comumeacao de
massa.

Por sua vez, a imprensa escrita tem criado seus grandes "imperios". O
Japao, por exemplo, é o país que possui as maiores tiragens de jornal no
mundo; o recordista é o Asahi Shimbum, com 6.650.000 exemplares em edi-
cáo matutina, e 4.250.000 na edicao vespertina; o segundo é o Yominuri
Shimbum, com 6.550.000 exemplares diarios; o terceiro, o Mainichi Shim
bum. Em patamares semelhantes, encontram-se as grandes organizares jor
nal ís ticas norte-americanas. - A empresa do Asahi Shimbum emprega cerca
de 100.000 funcionarios, enquanto o Washington Post aproximadamente
60.000.

No variegado setor das comunicacoes tém-se formado trustes que pos-


suem diferentes tipos de MCS e se encarregam de toda a producao, distribuí-
cao e propaganda de seus valores. A Companhia de Rupert Murdoch, por
exemplo, possui emissoras de TV nos Estados Unidos da América, na Gra-
Bretanha e na Australia; dispoe também de jomáis nos mesmos pai'ses e
grande sistemado producao e distríbuicáo de filmes e vídeos.

202
MEIOS DE COMUNICAjCÁO SOCIAL

Quem considera o poder de tais grupos, pode perguntar onde fica a in


dependencia de um jornalista, de um diretor artístico de cinema ou de tea
tro ou de um locutor de radio..., que sofrem a ameapa de perda do empre-
go, caso nao se dobrem aos interesses económicos das respectivas firmas ou
ás torcas político-ideológicas?

Estas ponderapóes e noticias sejam base para urna reflexao de ordem


ética.

3. E a Ética?

Como fo¡ observado atrás, a poderosa influencia dos MCS tem inci
dencias sobre a ética. Pergunta-se: até que ponto urna organizacao (Partido
político. Estado, empresa económica ou comercial...) tem o direito de ma
nipular um meio de comunicacao social para influenciar os usuarios, sem
que estes o saibam ou queiram?

Em resposta, distinguiremos diversos aspectos:

1) Nao seria justo condenar os MCS como tais, pois representam valio
sa conquista da humanidade, que pode servir ao bem-estar dos individuos e
das sociedades, amenizando desgrapas e promovendo valores. Tratase de ie-
cursos que, bem aplicados, podem beneficiar grandemente a pessoa humana.
Todavía...

2) As noticias ou ¡nformapóes devem ser, tanto quanto possível, obje


tivas e fiéis á verdade. Este de ver corresponde a um direito que todo homem
tem, de ser devidamente informado ou de viver á luz da verdade.

3) Sabe-se, porém, que nao é fácil formular objetiva e apartidariamen-


te noticias e informapoes; a filosofía de vida de quem transmite, imprime
muí tas vezes um cunho pessoal ou subjetivo aos termos da mensagem, por
mais que o mensageiro se esforcé por nao distorcer. — Daí a necessidade de
que o público seja alertado para o fato e para a necessidade de refletir, em
crítica sadia, sobre quanto Ihe é transmitido.

Esta alerta há de ser praticada ñas familias e ñas escolas; a pais e mes-
tres cabe especial incumbencia neste particular, visto que crianpas, adoles
centes e jovens sao mais sugestionáveis ou menos experientes da complexa
realidade dos MCS.

f=, alias, muito recomendável que as pessoas interessadas escrevam aos


chefes de produpáo de radio, televisSo, revistas, jomáis..., manifestando o
sen desagrado por tal ou tal mensagem despropositada; assim os emissores
poderao sentir mais vivamente a repercussáo negativa de seus produtos e a
ameapa de perda de IBOPE...

203
12 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

Tal gesto, da parte dos usuarios, é muito mais eficaz do que comenta
rios entre pessoas escandalizadas, mas inertes ou inoperosas no caso.

■ Erh suma, é preciso que todo usuario dos MCS saiba que ele corre o
risco, de ser dominado, teleguiado ou mesmo violentado, sem o perceber,
por tais meios; utilize-os, portanto, mas eliminando toda tendencia á passi-
vidade e subserviéncia.

4) Nao é lícito a urna EstacSo emissora transmitir mensagens veladas,


explícitamente preparadas (ver os exemplos dados ás pp. 200s deste fascícu
lo) para que escapem ao controle dos usuarios; visariam a levar ao público a
comprar tais ou tais artigos, freqüentar tais ou tais restaurantes, teatros, ade-
rir a tal ou tal Partido, faccao, grupo ideológico ou, pior, renunciar aos seus
principios moráis e ceder á corrupcao ética. Qualquer interferencia deste ti
po significaría desrespeitar a pessoa humana e submeté-la a urna suave (?) la-
vagerri de cránio, de nocivas conseqüéncias e de péssima qualificapao ética!

5) Visto que a realidade das comunicacoes sociais é altamente delicada


e sedutora, é para desejar que o Estado intervenha com urna legislacao ade-
quada, apta a preservar a liberdade e a identidade dos cidadaos. Mais: essa
regulamentacao deverá ser sustentada por acordos internacionais e por Códi
gos Deontológicos, válidos no mundo inteiro, como sao válidas a Declarapáo
dos Direitos Humanos, a dos Direitos da Crianpa, etc.

Tal deve ser o comportamento do Estado democrático, á diferenca do


Estado totalitario:

"Nao se deve admirar que, num sistema autoritario como o da Rússia,


LSnin respondía ao pedido de Giner de Los Rios por liberdade: 'Para que li
berdade?' Para Lénin, a liberdade de imprensa e outras liberdades sao urna
invencao da burguesía e dos seus sequazes social-democratas para impedir o
socialismo revolucionario.

A imitacao do modelo russo, todos os regimes marxistas do mundo


mantém um rígido controle sobre os meios de comunicacao, a tal ponto de
instaurarse um verdadeiro e auténtico sistema de desinformacao. O sistema
unidirecional de mentali2acao, mediante os meios de comunicacao, é tao
forte nos regimes marxistas que toda tentativa de romper este controle, por
menor que se/a, é considerada um grande delito contra o Estado e o 'bem-
estar cultural do povo'. é o grande pecado de 'colaboracao com o imperalis-
mo capitalista'...

Nao se deve pensar que as ditaduras fascistas de direita tenham sido


menos sensfveis é tendencia monopolizados total. Mussolini teve a coragem
de dizer: 'O jomalismo italiano (da sua época) é livre, porque só serve a urna
causa e a um regime..., porque pode exercer e exerce funcoes de controle,

204
MEIOS DE COMUNICACÁO SOCIAL

de critica e de incremento... A imprensa mais livre do mundo inteiro é a


italiana' (p. 74).

6) A Igreja está consciente da complexa questlo dos MCS; estima-os


e valoriza-os grandemente. Mas nao deixa de apontar as implicacóes éticas
que deles decorrem tanto para os emissores como para os receptores de men-
sagens. A propósito o Concilio do Vaticano II promulgou o Decreto ínter
Mirifica (1963) e a Santa Sé publicou em 1971 a Instrucao Pastoral Commu-
nio et Progressio. Tais sao as palavras simples e claras do documento do Con
cilio:

"Deveres dos usuarios; Estao comprometidos por especiáis obrigacoes


todos os usuarios, isto é, os leitores, os espectadores e os ouvintes que por
urna escolha pessoal e livre recebem as comunicacoes difundidas pelos meios
de comunicacao social. Pois a correta escolha exige que estes prestigiem ple
namente todas aquetas comunicacoes que se destacan) pela perfeicao, a cien
cia e a arte; evt'tem, porém, aquetas que Ihes sao causa ou ocasiao de prej'uí-
zo espiritual ou que, pelo mau exemplo, possam levar outros ao perigo ou
impecam as boas comunicacoes e promovam as más

Para que os usuarios cumpram a lei moral, nao se esquecam de sua


obrigacao de informarse oportunamente acerca das determinacoes baixadas
nesta materia pela competente autoridade e de acaté-las em conformidade
com as normas da reta consciénda; contudo, para que resistam com mais
facilidade a conselhos menos corretos e promovam irrestritamente os bons,
empenhemse com meios adequados em dirigiré formar sua consciéncia.

Deveres dos Jovens e dos Pais. Os usuarios, especialmente os jovens,


cuidem de que no uso destes meios se habituem á moderacao e á disciplina;
esforcem-se outrossim em penetrar com a inteligencia naquilo que viram,
ouviram e feram; conversem com educadores e peritos nestes assuntos e
aprendam a emitir um julgamento correto. Os pais lembrem-se de que é seu
dever vigiar regularmente para que espetáculos, revistas e outras coisas deste
género, desde que lesivos á fé e á Moral, nao entrem na soleira do Lar do
méstico nem os filhos procurem em outros lugares tais coisas.

Deveres dos autores. Quanto ao correto uso dos meios de comunica-


cao social, importante obrigacao moral toca aos jornalistas, escritores, ato
res, teatrólogos, produtores, vendedores, distribuidores, gerentes e patroci
nadores, críticos e outros mais que de alguma forma tomam parte na confec-
cao e transmissao das comunicacoes. Claramente se evidencia, ñas atuais
condicdes humanas, que deveres e quao importantes incumben) a todos es
tes, pois que e/es, informando e matando, podem levar o género humano
para o caminho certo ou para o abismo.

205
14 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

Cabe a eles equilibrar os interesses económicos, políticos e artísticos


de sorte que jamáis se desviem do bem comum...

Sempre se lembrem de que grande parte dos leitores e espectadores é


constituida de jovens que precisam da imprensa e de espetáculos que ofere-
cam honestos divertimentos e arras tem os espíritos para realidades mais su
blimes. Cuidem, além disto, de que as comunicacoes sobre assuntos religio
sos sejam confiadas a pessoas dignas e competentes e sejam executadas com
a devida reverenda" <n° 9-11).

E¡s, em poucas páginas, o conteúdo do livro do Prof. Alfredo Casado:


sucinta, mas clarividente, esta obra pode ajudar muí tos leitores a despertar
da apatia para um uso mais construtivo dos MCS:

"Os receptores devem sacudir a inercia com que recebem as mensa-


gens. Há urna tendencia á passividade (é-nos dado tudo pronto) e á aceitacio
aerifica das mensagens (sao apresen tadas com elegánda, colorido, verossi-
milhanca etc.. .)■
Somente adquirindo urna capaddade adequada de leitura critica e a
consdénda de atender para o poder que os meios possuem, é que se pode
evitar acolher dócilmente a sua doutrina e influencia.

Em conseqüéncia, lamentavelmente devemos concluir que, em geral,


apenas poucas pessoas estao em condicoes de exercer sobre si mesmas o au-
tocontro/e necessárío; poucas estao em condicoes de usar o senso crítico, de
saber avallar as mensagens recebidas para poder enfrentar os Meios de Comu
nicado Social nos seus conteúdos, na apresentacao da vida real e na visao
global de mundo que oferecem" (pp. 65s).

A Trindade como Historia, por Bruno Forte. Traducao do Pe. Alexan-


dre Macintyre S.J. - Bd. Paulinas, Sao Paulo 1987, 130 x 210mm, 212pp.

NSo é fácil escrever sobre a SS. Trindade, tida por vezes como enigma
que nSo interessa á vida do cristSo. Muitos fiéis tSm urna espiritualidade
pouco familiarizada com o misterio da SS. Trindade. Ora o Pe. Bruno Forte,
Professor de Teología na Italia Meridional, nos apresen ta a SS. Trindade co
mo a Biblia a revela, ou seja, em estilo muito vivendai; a Páscoa de Jesús é o
grande momento em que a Trindade se manifesta e comunica aos homens.
Além disto, aborda o aspecto escolástico e as espeeulaedes de teólogos e
pensadores diversos sobre a SS. Trindade, de modo a oferecer urna sintese
muito fiel e valiosa da teología concernente ao misterio de Deus. - 0 livro
servirá tanto para os Seminarios e Cursos de Teología quanto para os leito
res interessados em alimentar a sua vida espiritual.

206
Uma tentativa de

"Súrtese de Religiao Crista"

pelo Pe. Frederico Dattler

Em síntese: O livro do Pe. Dattler incorre na omissao de varios pontos


importantes da fé católica, que ele tenciona expor: ¡ustica original, pecado
dos primeiros país e conseqüéncias, nocao e divisao de pecado, purgatorio,
Missa dominical... Além disto, em pontos de doutrína abordados o autor é
insuficientemente claro, como nos casos do sacramento da Penitencia, da
Escatologia, da antropología teológica... Sao estes traeos que levam a dizer
que tal obra nao expoe adequadamente a doutrína católica. 0 autor tencio
na basear-se em textos bíblicos, que ele interpreta, por vezes, de maneira
muito pessoal, sem levar na devida conta o magisterio da Igre/a.

0 Pe. Frederico Dattler é um estudioso de S. Escritura, autor de varios


11 vi os, entre os quais um compendio que apresenta ao público "um resumo
sistemático" da doutrina da fé1. 0 livro merece comentarios; embora o autor
tenha intencionado fazer "obra razoavelmente completa" (p. 9), a leitura do
seu trabalho suscita muitas ¡nterrogacóes, que, a seguir, vao enunciadas e
consideradas.

OS PONTOS DUVIDOSOS

1. CristSo-católico

Ja o título do livro chama a atencao pela sua índole indefinida. Por


"religiao crista" pode-se entender tanto a católica como a protestante e a
ortodoxa. Á p. 11 o autor fala da "religiao crista" e das "variadas formas de
comunidades cristas", acrescentando: "Para nos em particular, trata-se da
Igreja Católica com sede central no Vaticano chefiada pelo Sumo Pontífice,
que ó o sucessor direto do Apostólo Pedro" (p. 11). Assim a Igreja Católica
torna-se, para Oattler, objeto de uma opcSo que o autor nao justifica...,
opgao que aparentemente poderia ser outra. Ora teria sido necessário pro-

1 Síntese de Religiao Crista. Ed. Vozes. Petrópolis, 1985, 135 x 210mm,


146 pp.

207
16 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

fessar a i'ndote singular da Igreja Católica, como, por exemplo, a enuncia o


Concilio do Vaticano II:

"Esta é a única tgreja de Cristo, que no Símbolo confesarnos una,


santa, católica e apostólica; que nosso Salvador depois da sua ressurreicao
entregou a Pedro para apascentar e confíou a ele e aos demais apostólos para
a propagar e reger (cf. Mt 28,18-20), levantando-a para sempre como coluna
e fundamento da verdade (1Tm 3,15)" (Constituicao Lumen Gentium n° 8,
Unitatis Redintegratio n° 4),

Assim vé-se que o livro comeca um tanto indefinido ou talvez... com


medo de dizer claramente a verdade... — Isto redunda em algo muito im
portante, a saber:

2. Omissoes

A índole vaga do título exprime bem o conteúdo da obra, que, de mo


do geral, se apresenta superficial ou mesmo omissa em pontos importantes;
o autor silencia certos temas de peso, como, por exemplo:

a) a justica original, o pecado dos primeiros pais e o pecado original


ñas criancas. Nem mesmo quando trata do Batismo (pp. 110-114) o autor se
refere explicitamente ao pecado original. Entre os efeitos do Batismo enun
cia "o perdao dos pecados, no adulto, em conseqüéncia do arrependimento,
da profissao de fé em Cristo" (p. 112). Ora a doutrina da elevacao do no-
mem a filiacao divina (ordem sobrenatural) e a queda dos primeiros pais sao
de valor fundamental na mensagem da fé; elas inspiram a antítese paulina
entre o primeiro e o segundo Adao (Rm 5, 12.18; 1Cor 15,21 s), foram obje
to de múltiplas definicdes da parte de Concilios através dos sáculos; e sao
professadas pelos documentos do Concilio do Vaticano II (cf. Lumen Gen
tium 2; Dei Verbum 3; Gaudium et Spes 13, Apostolicam Actuositatem
7...) assim como no Credo do Povo de Oeus redigido por Paulo VI em
1968. Nao há, pois, como omitir este artigo numa sin tese da doutrina cató
lica.

b) a dirtincao dos pecados em graves (moríais) e leves (veniais). Nao


há sequer, no livro, urna definicáo de pecado, tema, hoje em dia, de grande
atualidade catequética, pois muitos perguntam: "Que é o pecado?" O autor
trata das virtudes, sim (pp. 83-96), mas nao do pecado nem dos vicios. Mes
mo ao abordar o sacramento da Penitencia, o livro nao apresenta a noció e
as divisoes de pecado.

c) a obrigacao de Mitsa nos domingos e diaj santos de guarda, reafir-


mada recentemente pelo Código de Oireito Canónico (canon n° 1247), ver
pp. 236s deste fascículo. Também nada se encontra na obra sobre os demais
preceitos da Igreja.

208
"Sl'NTESE DE RELIGIÁO CRISTA" 17

d) a Virgindade perpetua de María ou a questao dos "irmábs de Jesús"


nao é mencionada, embora o autor afirme que María concebeu virginalmente
e nos fale de "María Virgem" (pp. 28s). A pericia exegétíca do Pe. Dattler
nao teria dificuldade para estudar os textos que falam dos "irmSos de Jesús"
e mostrar que eram primos do Senhor, ou seja, filhos de Cleofas, irmao de
Sao José.

e) O purgatorio, estágio postumo (sem fogo), em que o cristáo se li


berta das escorias do pecado com que tenha morrído, exercitando um amor
mais intenso e coerente a Deus e um repudio mais radical ao pecado.

3. Antropología

Ao tratar da origem da especie humana, Oattler é ambiguo. Admite a


evolucao, mas nao a delimita claramente. Eis os seus dizeres:

"Esta criacao (do homem) tornou-se um fato, paulatinamente, dentro


da evolucao (pré-)histórica da especie e se concretiza na geracao dos indivi
duos subseqüentes"... "A criacao da alma intelectual e ¡mortal ¡á está //?•
clufda no ato criador inicial" (p. 24). .

Que signifícam estas afirmacoes? Carecem de nitidez.

Na verdade, deve-se distinguir entre corpo e alma do homem. 0 corpo


pode provir, por evolucao, de materia viva preexistente; mas a alma humana
é criada d i re t amen te por Deus para cada individuo concebido no seio de sua
mSe; corpo e alma tém orjgens distintas, pois aquele é material, ao passo que
esta é espiritual. Ver Pío XII, Encíclica Humani Generis n° 35.

Em relacao com este tema, acha-se o da ressurreicao dos mortos. O


autor parece insinuar que Jesús, como homem, ressuscitou logo após morrer;
terá passado do tempo para a eternidade, onde nao há sucessáo de dias. O
Pe. Dattler, ao falar da ressurreicao dos homens em geral, nao entra na ques
tao do momento em que ela se dará (no fim dos tempos ou logo após a mor-
te?); á p. 40 insinúa que ocorrerá no dia da morte do individuo. — Ora ó
certo que a tese da ressurreicao logo após a morte nao condiz nem com a fi
losofía clássica nem com a doutrina da S. Escritura e da Igreja. Com efeito;
nenhuma criatura passa do tempo para a eternidade; passam todos, sim, da
vida temporal para a vida ¡mortal do álém, vida que nao terá fim, mas nao é
eterna, pois eterno é Deus só ou o Ser que nao teve comeco nem terá fim1.

1 É verdade que Sio Joao fala repetidamente de "vida eterna" (cf. Jo 4,14;
6, 40.51,58; 10, 28; 12,25; 17, 2s...). Todavía o seu modo de exprimirse
nao pretende ser rigorosamente filosófico; tem em vista apenas acentuar a
imortalidade da alma humana.

209
18 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

O ser humano que deixa o tempo, passa a ser regido pelo evo, que é sucessao
de atos de conhecimento e vontade, ¡ndependentes da moldura de dia e noi-
te; cf. PR 260/1982, pp. 42-44.

A p. 63 o autor explica o que seja "eterno", mas omite o ponto ne-


vrálgico que acabamos de assinalar.

4. O Sacramento da Penitencia

O Pe. Dattler parece relativizar a importancia deste sacramento por


varios motivos:

a) afirma que o texto de Jo 20,22s se refere ao Batismo1... Nao ex


plica, porém, por que o assevera, contradizendo ao Concilio de Trento e á
Tradicao crista, que viram ñas palavras de Jesús a fundamentacao do sacra
mento da Penitencia com a confissao dos pecados;

b) Dattler apresenta diversos meios, além do Batismo, para se obter


o perdió dos-pecados (exercício da contricao, da caridade, leitura da Palavra
de Deus...) e, por fim, menciona tambám o sacramento da Penitencia, sem
dizer que é o recurso obrigatório para se obter o perdió dos pecados graves
(cf. Código de Direito Canónico, canon 960), e sem mencionar a prática, tao
recomendada pela Igreja, da confissao de devocao. Assim o leitor pode julgar
que o sacramento é um meio a escolher dentre outros, de acordó com a pre
ferencia do interessado. A doutrina da Igreja sobre a Penitencia sacramental
é deixada de lado ou mesmo mal vista pelo autor, que chega a dizer: "La
mentamos, como desnecessárias, as regulamentacoes burocrático-jurídicas
da misericordia divina na Igreja latina" (p. 117). — Te ría sido importante
expor claramente o pensamento doutrinário e as determinacoes pastorais da
Igreja neste setor (como em todos os outros abordados pelo autor), pois a
doutrina da f&náo pode ser arquitetada e estruturada pelos exegetas bíblicos
apenas segundo o seu bom senso; ela nos é revelada por Jesús Cristo através
da súa S. Igreja.
Á p. 116 tem-se a ¡mpressao de que a fórmula proferida pelo celebran
te no inicio da Missa ("Deus todo-poderoso tenha compaixao de nos...")
tem eficacia para apagar qualquer pecado - o que é falso, pois recai apenas
sobre as faltas leves ou veníais.

5. Divorcio

Dattler observa que, conforme os autores do Novo Testamento, Jesús


rejeita o divorcio {pp. 142s). Mas, ao considerar os textos de Mt 5,31$; 19,9,

1 "Jesús soprou sobre os Apastólos e Ihes disse: 'Recebei o Espirito Santo.


Aqueles a quem perdoardes os pecados, serio perdoados; aqueles aos quais
os retiverdes, serio retidos'" (Jo 20J22s).

210
"Sl'NTESE DE RELIGIÁO CRISTA" 19

nao é bastante claro; teria sido necessário expor os sentidos que a palavra
grega pornáia pode ter, em vez de conceder, como faz Dattler, urna brecha
para o divorcio em caso de adulterio. - A palavra pornéia corresponde pro-
vavelmente ao aramaico zenut, prostituicao ou uniao ilegítima, como se en-
contra nos escritos rabi'nicos; designava toda uniao tornada incestuosa em
virtude de um grau de parentesco proibido pela Lei de Moisés (cf. Lv 18,6-
20).' Tais unioes, contraídas legalmente pelos pagaos ou toleradas pelos
judeus no caso de prosélitos, devem ter criado dificuldades nos ambientes
judaico-cristaos, quando tais pessoas se convertiam. Por isto Sao Mateus in
sinúa em 5,31 e 19,9 a necessidade de se romperem essas un¡6es irregulares,
que nao eram sen So falsos casamentos. - Ver a propósito a nota da Biblia
de Jerusalém ao texto de Mt 19,9.

6. Descida á mansáo dos morios

Dattler julga que a descida á mansáo dos mortos nada mais é do que o
sepultamento de Jesús (cf. pp. 32s). Em conseqüéncia, o Símbolo dos Apos
tólos professaria duas vezes consecutivas que Jesús foi sepultado: "Foi cru
cificado, morto e sepultado, desceu á mansáo dos mortos, ressuscitou ao
terceiro día".

A posicao de Oattler é assaz radical; nada reconhece de específico no


artigo do Credo em pauta. Tal nao é a posiclo da Tradicao crista. Já na dé
cada de 60 a 1Pd 3,18-20 afirmava a descida de Jesús a mansáo dos mortos
em termos que podem ser assim interpretados, segundo bons exegetas: Jesús,
tendo morrido como homem, foi anunciar aos justos do Antigo Testamento
a Boa-Nova da redencio realizada pela Cruz; estes aguardavam a vitória de
Cristo sobre o pecado e a morte para entrar no gozo da bem-aventuranca
celeste (cf. Hb 11,39$; 12,23); ora Jesús Ihes terá comunicado o Evangelho
da salvacáo. - Esta concepcáo aflora de certo modo também em outros
textos bíblicos como: At 2,24.31; Rm 10,7; Ef 4,8s; Hb 13,20.

A Tradicao crista exprimía a mesma crenpa em apócrifos como "Des


cida de Cristo aos Infernos", "Declaracáo de José de Arimatéia", "Evange
lho de Bartolomeu". Está claro que tais escritos sao, em grande parte, fan
tasiosos, mas manifestam a consciéncia que os cristSos tinham de que, entre
a sua morte e a sua ressurreicáo, Jesús terá anunciado aos mortos a derrota
da morte obtida na Cruz (entre outros textos, o de Mt 27,52s pode ser en
tendido neste sentido). O Catecismo Romano, cap. VI (comentario do 5?
artigo do Símbolo dos Apostólos), retoma a clássica doutrina da "descida de
Jesús á mansáo dos mortos".

1 Tratase de prescrícoes minuciosas, que o leitor lera com interesse nos


versículos indicados.

211
20 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

CONCLUSÁO

Nota-se que o Pe. Dattler pouco utilizou os documentos do magis


terio da Igreja para a elaboracao da sua si'ntese: valeu-se, muitas vezes, de
textos bíblicos interpretados de maneira pessoal ou própria, quando haveria
que levar em consideradlo a doutrina da Igreja desenvolvida mediante os
Concilios e declaracoes através dos sáculos.

O Cardeal Joseph Ratzinger, numa famosa conferencia proferida a


respeito de catequese em nossos dias, refere-se precisamente as escolas que
tencionam apresentar a doutrina da fé a partir da Biblia separada do seu am
biente originario e concomitante que é a Palavra oral e viva, transmitida de
geracao em geracao dentro da Igreja. Tal método leva fácilmente ao protes
tantismo ou, melhor, ao esfacelamento da mensagem do Cristianismo, pois
cada intérprete da Biblia, em conseqüéncia, deduzirá do texto sagrado as
"proposicóes" que ele intuir subjetivamente, sem alguma baliza objetiva pa
ra confrontar suas sentencas. Eis as ponderacoes do Sr. Cardeal Ratzinger,
Prefeito da Congregacáo para a Doutrina da Fé:

"Chegamos assim ao ponto central de nosso tema, ao problema do


lugar que ocupam as 'fontes' no processo de transmissao da fé. Com efeito,
urna catequese que explicasse a fé, por assim dizer, diretamente a partir da
Biblia, sem caminhar através do dogma, poderia pretender ser urna cateque
se especialmente derivada das fontes. Mas deu-se um fenómeno curioso. A
impressao de autenticidade, provocada em umprimeiro momento pelo con
tato direto com a Biblia, nao foi duradoura. É certo que no comeco esse
contato com a Biblia infundiu muita fecundidade, beleza e riqueza á trans
missao da fé: sentíase o aroma da térra da Palestina, revivíase o drama
humano no qual nasceu a Biblia; tudo se fez mais concreto, humanamente
mais verdadeiro. No entanto, logo apareceu a ambigüidade do processo que
J.H. Mohler, em seu Einheit in der Kirche, descreveu de maneira clássicahá
cento e dnqüenta anos. O que a Biblia traz de belo, de ¡mediato, de irre-
nundável. Mohler o descreve assim:

'Sem a Escritura, permanecería oculta para nos a forma própria das


palavras de Jesús; nao saberíamos como falava o Filho do Homem, e creio
que nao poderia continuar a viver se já nao O ouvisse falar'.

Mas Mohler sublinba ¡mediatamente a razao pela qual a Escritura nao


pode ser separada da comunidade viva, único lugar no qual a Escritura pode
ser a Escritura. Mohler, com efeito, continua:

'Mas, sem a Tradicao, nao saber íamos quem é que ali falava, nem o que
é que pregava, e a alegria que fluí de seu modo de falar desaparecería no

212
"SINTESE DE RELIGIÁO CRISTA" 21

mesmo instante'1.

O processo que sofre urna catequese que se quer basear apenas no es-
tudo das fontes literarias é descrito também - numa perspectiva totalmen
te diferente-na Geschichte der Leben-JesuForschung de Albert Schweitzen

'É curioso o que sucedeu na investigado sobre a vida de Jesús. Essa


investigacio partiu na busca do Jesús da historia, e creu que poderia voltar
a colocá-lo em nosso tempo tal como era, como Mestre e Salvador. Tal in-
vestigacao desfez os vínculos que, há séculos, o uniam ao ensinamento da
Igreja, e alegrou-se quando sua silhueta voltou a tomar vida e movimento e
ao ver que o Jesús histórico vinha de novo ao seu encontró. Mas eis que, ao
chegar, nao se deteve: passou ao largo do nosso tempo e retornou ao seu'. -

Na realidade, este processo, cuja evolucao teológica Schweitzer pensoü


ter findado há quase um sáculo, repete-se sempre de forma nova e com varia
das modificacoes na teología e na catequese modernas. Isto porque os docu
mentos que se quer ler sem outro intermediario além do pensamento histó
rico, afastaram-se, por isso mesmo, do histórico. Urna exegese em que a Bi
blia nao vive e nao é compreendida noea partir do organismo vivo da Igreja,
tornase necrofilia: monos que enterram outros morios.

Isto se percebe, concretamente, no fato de que, nesta perspectiva, a


Biblia desaparece como Biblia, para nao ser mais que urna colecao de livros
heterogéneos. Daia pergunta: como situarse nessa literatura, e com que cri
terios escolher os textos para construir a catequese? A rapidez com que evo-
luiu o processo se vé, por exemplo, na seguinte proposta, feita recentemente
na Alemanha, através da carta de um leitor a urna revista: imprimir ñas no
vas edicoes da Biblia em tipos pequeños o que está condicionado pelo tem
po e superado e, destacar, ao contrario, o que continua vigente. Mas o que
está vigente? 0 que esté superado? Afina! de contas, decide o gosto de cada
um, e a Biblia seré o instrumento perfeito para dar autoridade a nossos pro-
prios caprichos." :
A metodologia adotada prejudica seriamente o livro de Dattler, que
nao pode ser tido como expressao completa e plenamente fieLdadoutrina

1 J.H. MÓHLER, Die Einheit in der Kirche, edició'J.R. GEISELMANN,


Darmstadt, 1957, p. 54.

213
Ecos de um livro candante:

"O Espirito e o Feminino. A


Mariologia de L. Boff
por J.M. Hennaux S.J.

Em síntese: O teólogo belga Pe. J.M. Hennaux S.J. escreveu urna re-
censao do livro de Leonardo Boff sobre a "Ave-María" (publicado em tra-
ducao francesa). Observa que o teólogo franciscano propde a uniao hipostá-
tica do Espirito Santo com María, á semelhanca do que aconteceu entre o
Verbo de Deus e a humanidade de Jesús; María sería a encarnacao do Espi
rito Santo, como Jesús foi a do Filho de Deus. Ora este paralelismo tem con-
seqüéncias graves para toda a teología trinitaria. Com efeito; Sao Paulo afir
ma que o Pai é o Principio de quem tudo provém. 0 Filho é Aquele por
quem tudo nos provém do Pai; e o Espirito Santo é aquele em quem vive
mos a vida do Pai e do Filho (cf. I Cor 8,6; Rm 11, 36; Ef 1,3-14; 3.20s;
2Cor 13,13). Com outras palavras: o Filho procede do Pai; o Espirito Santo
procede do Pai e do Filho ou pelo Filho (cf. Jo 14,16s.24.26; 15,26; 16,7).
Dai nSo se poder dizer que o Espirito é a Mié Divina de Cristo ou que o Es
pirito se encarna em María.

Vé-se que L Boff faz urna re-leitura da mensagem da fé a partir de


urna premissa de outra ordem ou de ordem social: a emancipacao e a exalta-
cao da mulher. A Teología da Libertacao é aplicada ao caso, e aparece mais
urna vez como teoría sócio-politica que provoca urna re-leitura das verdades
da fé em chavé heterogénea. Isto significa simplesmente a subordinacao da
mensagem crista a principios de índole sócio-politica ou um desvirtuamento
total da revelacao crista. Esta há de ser /ida e estudada na sua objetividade,
sem preocupacoes heterogéneas; as suas conclusoes de ordem ética serio
suficientemente exigentes para provocar a remocao das in/usticas sodaís.

O Pe. J.M. Hennaux S.J. publicou na Nouvelle Revue Théologique n9


109 (1987), pp. 884-895 uma recensao do comentario de Frei Leonardo
Boff sobre a Ave-María em traducao francesa intitulada "Je vous salue,
Mario. L'Esprit et le Féminin" (París, Cerf, 1986). é importante ao público
brasileiro conhecer os termos em que é avaliada a Mariologia do teólogo bra-

214
"O ESPfRITO E O FEMININO" 23

sileiro fora do ambiente latino-americano; urna opiniáo nova, de quem olha


com a presumível objetividade da distancia, pode contribuí'' para ajudar a
reflexáo dos estudiosos no Brasil. Eis por que vem apresentada ñas páginas
seguintes a traducao brasileira do artigo do Pe. Hennaux S.J.; este supoe
certos conhecimentos de teología; por isto nao será de fácil leitura, mas o
seu significado geral será percepti'vel aos leitores de PR, que poderao dispen
sarse de ler as notas de roda-pé.

I. O TEXTO*

"Leonardo Boff consagrou varios escritos á Virgem Maria. Um destes,


o comentario da Ave-María, acaba de ser traduzido para o francés1. Redigido
com fervor e bem documentado, este livro utiliza correntes muito ricas: a
Escritura, a Liturgia, a Patrística (principalmente a oriental), a Teología
Dogmática, a Mística e a devocao popular. A relativa brevidade do livro nao
nos deve engañar. De fato, a partir de urna intuicao profunda e segura - a da
uniao muito especial entre Maria e o Espirito Santo —, o autor desenvolve
proposicoes audaciosas, capazes (segundo ele) de renovar a Mariologia, e que
tocam pontos nevrálgicos do atual debate teológico: o misterio trinitario,
Maria e o Espirito, o feminino de Deus, o feminino do homem, a mulher.
Apresentaremos nossas reflexoes em torno dos temas teológicos que nos pa-
recem mais importantes, mesmo que tenhamos que deixar de lado aspectos
¡nteressantes da obra2.

1. A uniao de Maria e do Espirito Santo

A intuicao mariológica central de L. Boff é a da uniao, absolutamente


única, existente entre Maria e o Espirito Santo3. Maria é a 'contemplada'; á

* As chapóes do livro de L. Boff referem-se á edicao francesa. (Nota do


tradutor).
1 L. Boff. Je vous salue, Marie. L'Esprit et le féminin, traduzido do portu
gués por Christine e Luc Durban, Colecao "Théologies". París, Cerf 1968,
15x24,92pp.
2 Desde que nao naja indicacao contraria, serio do comentador os grifos
ñas frases citadas do livro em foco.
3 Na encíclica Redemptoris Mater, Joio Paulo II comenta a expressao
'cheia de graca' (Le 1,28} á luz das béncaos espirituais com que fomos aben-
coados no céu em Cristo (Ef 1,3): 'No misterio de Cristo, María está presente
desde antes da fundacao do mundo; é ela que o Pai escolheu como Mae de
seu Filho na Encamacao — e, ao mesmo tempo que o Pai, o Filho a esco
lheu, confiando-a desde toda a etemidade ao Espirito de santidade' (nP 8).
No cap. VIII da Lumen Gentium, consagrado á Virgem Maria, o Concilio
do Vaticano II enfatiza mais de urna vez a uniao de Maria com o Espirito

215
24 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

luz de Le 1,35 {'0 Espirito Santo descera sobre ti') e do misterio da Imacu
lada Conceicáo, é preciso dizer que o que define María e faz sua identidade e
seu nome próprio, é o fato de ser 'o templo do Espirito' (p. 36); ela foi
constituida 'templo do Espirito, tabernáculo escatológico e santuario defi
nitivo, táo real e radicalmente que ela se viu um dia a ele unida de modo in-
comparável' (p. 13).

O autor tem consciéncia, neste ponto, de ¡novar, ao menos parcial


mente: 'Defendemos a hipótese (que nao é a doutrina oficial da Igreja) de
que existe urna relacao ontológica entre a pessoa divina do Espirito Santo e
María, de tal modo que esta-se torna realmente (sem metáfora nem eufemis
mo) o templo do Espirito' (p. 36).

Esta relacao ontológica, L. Boff tenta, em varias passagens, descobri-la


melhor e maravilhar-se com ela. Todavía cabe perguntar se ele nao está de-
mais interessado em concebé-la segundo o modelo da Encarnacao e em para
lelismo com ela: 'O Espirito se pneumatizou em María, ¡sto é, tomou forma
humana; ergueu sua Tenda (chekiná) em meio a nos na pessoa de María, co
mo o Filho a ergueu entre nos em Jesús de Nazaré (p. 36); 'María personifi
ca o Espirito Santo' Ip. 39); 'O Espirito... tomou corpo na bem-aventurada
Virgem María' (p. 47); 'Como o Filho, o Espirito parece ter, ele também,
urna missao particular e urna personifícalo plena' (p. 59) 'De certo modo
(L. Boff usa esta expressao entre parénteses), o Espirito se auto-realiza nu-
ma dimensao distinta da dimensáo intratrinitária (uniao do Pai edo Filho),
assumindo como sendo sua a natureza humana de María' (p. 59); 'Existe
urna comunicacao realmente única do próprio Espirito Santo a María, táo
concreta e real quanto a comunicacao do Filho eterno a Jesús de Nazaré.

(continuacao da pág. anterior)

Santo. O Condiio lembra que o Filho de Deus 'tomou carne na Virgem


María por agio do Espirito Santo' (nP 52); ela é 'a Mié do Filho de Deus e,
por conseguinte, a filha predileta do Pai e o santuario do Espirito Santo' (n9
53); 'nada há de estranho... em que se tenha implantado entre os Santos
Padres o costume de chamar a Mié de Deus a Toda Santa, isenta de toda
mancha de pecado, tendo sido plasmada pelo Espirito Santo e formada co
mo nova criatura' (n° 56); 'Deus, querendo que o misterio da salvacao dos
homens só se manifestasse abertamente no momento em que Ele derramaría
o Espirito prometido por Cristo, vemos que os Apostólos, antes do dia de
Pentecostés, perseveravam unánimemente na orafio com algumas muiheres,
entre as quais María, Mié de Jesús, e com seus irmSos, e vemos María impe
trando com suas oracoes o dom do Espirito, que, na Anunciacao, ¡á a reco-
bríra com a sua sombra' (nP 59); 'por sua fé e sua obediencia ela gerou na
térra o Filho do Pai, sem perder a sua virgindade, envolvida pelo Espirito
Santo' (n9 63).

216
"O ESPI'RITO E O FEMININO"

(pp. 67s), finalmente, L Boff objeta o seguinte ao Pe. Manteau-Bonamy:


'Segundo este autor, o Espirito Santo nao assume a carne da Virgem como o
Filho assume a carne de Jesús' (p. 74)4.

Essa concepcáo, que assemelha demais a un i lo de María com o Es


pirito a urna encarnacao do Espirito em Maria, nao é a melhor, eremos, pa
ra explicar a 'relacao ontológica' (plenamente aceitável) existente entre a
Virgem Maria e a Terceira Pessoa. Nao se deveria continuar a dizer com J.
Monchanin5, que o Espirito Santo é 'Sem Forma'? E isto, a fim de que seja
preservado o seu misterio essencialmente multiforme e seja considerado
como totalmente relativo á 'Forma' única da Revelacáo, o Logos. Nao deve
o Espirito Santo ser considerado como 'sem semblante' para quenele veja
mos a luz que nos permite contemplar o semblante do Filho Único? De
resto, se L. Boff tem razao ao considerar Maria como termo de urna missao
do Espirito Santo, o fato de se conceber essa missao em paralelismo cons
tante com a Encarnacao nao equivale a considerá-la como algo de extrínseco
á missao do Verbo e nao intrinseco? Enfim Jesús nao deve ser reconhecido
como o primeiro pneumatóforo na historia da salvacao? E será licito fazer
da Encarnacao, acontedmento único, urna especie da 'analogante' que tenha
seu 'analogado'?

2. Maria á altura de Deus

Conceber a uniao de Maria e do Espirito Santo segundo o modelo da


unilo hipostática suscita um problema, como acabamos de ver. A pneumati-

4 Cf. H.M. Manteau-Bonamy O.P., La Viorge Marie et le Saint-Esprit. París,


LethielleuK 1972, 2a ed., aumentada. Urna das diférenlas entre Manteau-
Bonamy e Boff é esta: ambos véem na Anunciacao urna missao visivel do
Espirito Santo; para o primeiro, essa visibilidade é significada pela 'sombra
da Shekinah' mencionada em Le 1,35;para o segundo, Maria éa visibilidade
mesma do Espirito.
s Em L'lrtde et la Contemplaron fDieu Vivant 3 [1945] 15-49), Jules
Monchanin fala do Espirito nestes termos: 'Pessoa nao circunscrita, que só
aparece através das formas fluidas - o sopro, a agua, o vdo, o fogo, as meta-
morfoses. Pessoa que se percebe nao como o Verbo, mediante o visfvel, mas
mediante os fenómenos espirituais, os carismas e, principalmente, o ágape, a
comunhao dos santos, a misteriosa imanénda de todos em cada um e de ca
da um em todos...' (p. 23s). 'A Trindade se consuma no Espirito, e o Espiri
to se manifesta ao mundo. Toda a sua personalidade vista através da sua epi
fanía é de metamorfose: a espiritualizacao do homem, do universo. As me-
tamorfoses estao centradas pelo Ressuscitado e nele ... O Sem-Forma^tra-
vés-de-Toda-Forma faz resplandecer o Toda-Forma' (p. 27). Pódese reco
mendar também, do mesmo autor, Thóologie et Mystique du Saint-Esprit,
em Dieu Vivant 23 (1953) pp. 71-76.

217
26 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

zapfo do Espirito em María é quase totalmente descrita por L. Boff confor


me o modelo da Encarnapao do Verbo. Há, infelizmente, outros sinats de
que o livro de Boff nao se preserva suficientemente do perigo de fazer de
Maria urna deusa. Por certo, o autor afirma que, tudo o que ele atribuí a
Maria, ela o recebeu por grapa e nao o possui por natureza. Mas o seu modo
de falar nao é plenamente coerente com esta afirmacao.

'A Virgem foi visitada pelo Espirito Santo de maneira táo profunda
e pessoal que isto implica urna real elevacao a altura divina' (pp. 65. 35.
36.69...)' 'Devemos dizer que a pessoa de Maria, assim como as diversas
funcoes ligadas á sua realidade de muiher, se tornam divinas' (p. 68); Maria
'foi criada no Espirito de modo que ela possui com Ele urna eterna conatu-
ralidade' (p. 75); predestinada desde toda a eternidade a ser um só Templo
com o Espirito, 'Maria é nao somente o templo de Deus, mas o Deus do
Templo' (p. 75). Esta parece ser a fórmula consumada para exprimir o mis
terio de Maria, eternamente 'contemplada'. Tal fórmula nao leva em conta a
diferenca ontológica abismal que existe entre Deus e a criatura, diferenca
nao supressa pela divinizagáo, e que o Concilio do Latráo IV (1215) expri
mía nos termos seguintes: 'Entre o Criador e a criatura nao se pode estabe-
lecer urna semelhanca tao grande que ela nao implique urna dissemelhanpa
maior ainda'. Leonardo Boff reflete sobre o plano da causalidade exemplar
de Deus com relagao á criatura (homem, muiher, masculino, feminino), mas
nao leva em conta suficiente o plano da causalidade eficiente58.

3. A natureza e a graca

Quando se fala da divinizapao do ser humano pela grapa do Espirito


Santo, é bom distinguirmos entre existencia e esséncia, entre ato e natureza.
0 ser humano é ontologicamente transformado pela grapa, mas permanece
ser humano. 'A grapa nao extingue a natureza'. A esséncia do homem nao se
torna divina; seu ato e seus atos sao elevados, mas sem perder a sua estrutura
natural6. L. Boff nao faz essas distincóes.

sa Isto quer dizer que as criaturas se aproximan) de Deus grandemente pelo


fato de trazerem a imagem (e a semelhanca) de Deus; tal é o caso do homem
e da muiher. Mas essa proximidade ocorrente pela semelhanca nao nos deve
levar a esquecer que o homem e a muiher sao criados, temporais, limitados,
faUveis,... ao passo que Deus é incriado, eterno, infinitamente perfeito e in-
falível. (Nota do tradutor).

6 O homem justificado participa na natureza divina, mas ele nao muda de


natureza; a sua esséncia nao se torna urna esséncia divina. Persiste a diferen
ca ontológica da qual fala o Concilio do Latrao IV, que acabamos de citar. ■

218
"O ESPIRITO E O FEMININO" 27

Em Cristo as duas naturezas estáo unidas, mas sem confusao. A mesma


regra vale para a Mariologia. Ora aquí L. Boff tende sempre a divinizar a es-
senda de María, isto é, o feminino. Ele o faz, porque quer mostrar que em
María há urna assuncao divina do feminino. Nesse seu livro, com efeito, o
teólogo da libertadlo quer trabalhar em pro I da libertacao da mulher. "Co
mo o masculino em Jesús é divinizado pelo Filho, o feminino em María é di
vinizado pelo Espi'rito Santo' (p. 14); María 'pertence ao primeiro designio
do Misterio, que deseja divinizar o feminino mediante a assuncáo divina do
feminino pelo Espirito Santo' (p. 70); 'confirmamos a hipótese segundo a
qual María foi assumida pelo Espirito Santo, a fim de divinizar o feminino'
(p. 71); 'o principio feminino... é divinizado e torna-se portador de Deus,
Templo vivo de Deus' (p. 77). Sem dúvida, todas estas proposicoes podem
ter um sentido aceitável, mas, nao obstante, elas ficam sendo ambiguas. Por
vezes parece que o feminino foi divinizado em María urna vez por todas e
que existe no feminino como tal (o 'feminino', segundo L. B., ultrapassa os
termos da mulher; está presente no homem tambám) um elemento divino.
Assim nao se corre o risco de esquecer que a revelacáo do feminino pelo Es
pirito em Maria constituí urna vocacáo para a mulher e urna vocacáo sobre
natural? É muito certo, repitamo-lo, que consideremos María 'unida ontolo-
gicamente' (p. 77) ao Espirito Santo, mas é necessário enfatizar que a essén-
cia de Maria fica sendo a de urna criatura humana.

4. A concepcao virginal e a maternidade divina

Semelhante confusao da natureza e da graca parece-nos existir, salvo


meliore iudiáo (a menos que alguám tenha melhor sentenca), na explicacSo
da maternidade divina de Nossa Sen hora. Segundo L. Boff, esta deve ser ca
pacitada (por sua divinizacao) para gerar o divino. É a sua uniao com o Espi
rito Santo que Ihe dá essa capacidade. O Espirito 'age nela de maneira tao
profunda que Ele eleva as suas facuidades maternais a ponto que ela se torna
a Mae de Deus' (p. 28). 'So Deus pode gerar Deus. Maria é elevada a essa al
tura divina pelo Espirito, que faz nela a sua morada' (p. 36); 'a maternidade
divina de Maria se apresenta como a conseqüéncia desta af¡rmacao: Jesús, o
Filho de Maria, é Deus. Todavía podemos considerar esta verdade a partir de
outro polo, o do Espirito Santo, sob a aca*o do qual Maria Virgem há de se
tornar Míe' (p. 67). 'Qual deve ser acondicáode urna míe cujo Filho é Deus?
É preciso que seja elevada á altura divina. Assim o que déla nasce, só pode
ser Filho de Deus (Le 1,35). A maternidade de Maria é divina em sua fonte,
em si mesma, e nao apenas em sua conseqüéncia, pois o seu Filho é Deus'
(p. 69).

O principio condutor do pensamento, neste caso, á que somente o di


vino pode gerar o divino, é preciso, portanto, que Maria seja divina para ser
Mae de Deus.

219
28 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

Todavía esta reflexao supoe que a Maternídade de María possa exercer


urna causalídade real sobre a divindade do Filho, que ela concebe e poe no
mundo. Ela deve ser Deus para gerar Deus. Tal nao era o modo de pensar do
Concilio de Éfeso. Segundo este, a maternídade de María nao tem por termo
a natureza divina do Filho (esta é gerada na eternidade pelo Pai só) como
também nao tem por termo a natureza humana de Cristo, pois a relacao de
maternidade nlo tem por termo a natureza, mas a pessoa; María é mae da
pessoa do Verbo Encarnado; eis por que ela deve ser dita Mae de Deus. L.
Boff mesmo cita estas af¡rmacoes do Concflio de Éfeso (pp. 66s), mas preci
samente esta explicacáo Ihe parece insuficiente. Para ele, a maternidade de
María há de ser explicada também, se nao principalmente, a partir da su a
uniao com o Espirito ou a partir da sua dívinizacao pelo Espirito.

Notemos que esta verdade nao era estranha a certos Padres da Igreja,
que afirmaram que María foi máe mais pela fé do que por seu corpo, fé que
Ihe provinha da sua divinízacao7. L. Boff cita esta conceppao patrística
(p. 61), quando fala da 'peregrinapáo de fé' de María, e nao quando tenta ex
plicar sua maternidade divina. Segundo L. Boff, a funcao materna, a própria
maternídade é divinizada (ver principalmente p. 68: María, 'com todas as
suas capacidades maternais, é assumida por Deus Espirito Santo. Este trans
forma a sua maternidade em maternidade divina'; e p. 74$: quando o autor
diz que o Espirito assume a carne de Maria, ele quer dizer, a quanto parece,
que Ele assume a funcao materna de Maria para divinizá-la). Encontramos
aqui de novo o que diziamos atrás: a divinizacao do feminíno como tal. Por
tan to, segundo L. Boff, nao é somente em funpao da sua fé, da sua esperan-
pa e da sua caridade teológica que Maria colabora para a Encarnacao do Fi
lho de Deus, mas também em funpao de urna eleva gao e divinizapao do seu

7 Esta idéia está presente em Lumen Gentium (c. VIII): 'A Virgem María...
por ocasiSo da AnunciacSo do An/o recebeu o Verbo de Deus tanto no seu
coraqao como no seu corpo' (53); 'aprouve ao Pai das Misericordias que a
Encarnacao fosse precedida por urna aceitacao da parte dessa Mae predesti
nada' (56); 'concebendo o Cristo,... ela prestou á obra do Salvador urna
cooperacao absolutamente sem igual mediante a sua obediencia, a sua fé, a
sua esperance, o seu ardente amor' (61). Sob a acao do Espirito, Maria con-
cebeu espiritualmente o seu Filho antes de O conceber cama/mente. Ou me-
Ihor: ela só exerceu a sua atividade corporal de conceber no interior da sua
concepcao espiritual, isto é, a partir da fé pela qual ela meditava, aderindo,
com todo o seu ser, á revelado do Filho de Deus que Ihe fora feita. Daía
importancia da 'mensagem' que Ihe foi dirigida, no relato da AnunciacSo.
Esta fé é evidentemente inseparável da sua esperanca e da sua caridade.
Maria concebe o Verbo com toda a sua alma, antes de O conceber corpo-
raímente. Boff nao tem idéia exata das relacoes da alma e do corpo.

220
"O ESPI RITO E O FEMININO" 29

corpo feminino. Esta elevapao substituí a causalidade eficiente de Deus (a


criapáo da humanidade do Verbo}, professada tradicionalmente, explicapao
que, alias, considera a alma como o único sujeito possível da grapa divina
(esta pode, sem dúvida, transbordar sobre o corpo mediante a alma). Con
forme L. Boff, o corpo feminino de María, assumido pelo Espfri.to Santo,
torna-se capaz de gerar Deus. Este gerar já nao é propiamente 'milagroso'
no sentido da Tradipao, que sempre considerou a concepcao virginal de Ma
ría como urna ¡ntervencao milagrosa de Oeus Criador8. O autor nao faz in-
tervir a apao criadora de Deus. Ele nao pensa no Deus que cria, mas no Deus
que diviniza. Urna vez admitido que o Espirito tenha assumido a carne de
María, este gesto produz o seu fruto natural: a conceppáo do Filho de Deus.
Esta conceppáo, se podemos dizer, nao seria senSo urna conseqüéncia nor
mal do assumir a carne de María por parte do Espirito Santo, é bem neste
sentido que L. Boff quer interpretar o dio kai de Le 1,35 ('0 Espirito Santo
vira sobre ti. . .; eis por que, dio kai, aquele que nascer será chamado Filho
de Deus').

Vé-se: para L. Boff, a conceppáo virginal é o efeito aa pneumatizapáo


do Espirito em María, ou seja, efeito da assunpao da carne de María pelo Es
pirito ou, ainda, da divinizapáo de sua capacidade maternal. Ela nao é o efei
to - além da gerapao do Filho pelo Pai no seio de María e da assunpao da
carne pelo Verbo - de urna apao criadora das Tres Pessoas9. Dissemos: o au
tor negligencia este aspecto de causalidade eficiente milagrosa, habitualmen-
te atribuida de modo especial ao Espirito Santo, visto que a razao da con
ceppáo virginal está no amor. L. Boff quer ultrapassar este plano da atribuí-
pao e fálar de urna missio do Espirito Santo. Damos-I he razio neste ponto
(voltaremos a isto), mas a sua teología poderia ajudar precisamente a com-
preender por que essa atribuipáo nao é arbitraría: ela nao o é em virtude da
missáo do Espirito á Virgem María. A apio criadora comum ás tres Pessoas é,
para o Espirito, intrínseca á sua missao, missao santif icadora de María e con-
secratória do Verbo Encarnado. Este aspecto de eficiencia, com a diferenpa
ontológica que ele implica entre o Criador e a criatura, evita toda confusao
entre a apao criadora do Espirito na conceppáo virginal e a apao de conceber

* Por esta acao criadora de Deus na Encamado, entendemos a fundió de


Deus na formacao do corpo de Cristo e na crlacio da sua alma (reconhece-
mos que este modo de falar é deficiente: Deus nao cria um corpo e urna
alma separadamente; Ble cria a humanidade). María concebe seu Filho se
gundo o processo biológico de toda maternidade humana; neste ponto, a
concepcao de Cristo é algo de natural; todavía, por ser virginal, ela é mila
grosa e sobrenatural. Sendo virginal, a concepcao atesta intervencao divina.

9 O ato pelo qual o Verbo assume a sua humanidade, contém o ato pelo
quat Ele a cria.

221
30 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

de Maria. L. Boff nao conseguiu evitar esta confusáo, ao que nos parece.
Quando dizemos no Credo: concebido do Espirito Santo, o ds nao designa a
causa material, mas sim a causa eficiente. É preciso consideremos a acáo do
Espirito Santo como urna agio espiritual, e nao como urna intervencáo psico-
f ísica. Outro sinal da confuslo feita por L. Boff está em que, para ele, o Es
pirito é 'a mae divina do homem Jesús' (p. 750. Voltaremos a isto.

' Já que o Espirito assume a carne de Maria na maternidade divina, é da


da urna dimensáo física á uniao da Virgem com a terceira Pessoa. Nao se cor
re entao o risco de favorecer urna interpretacao mitológica do 'casamento de
Maria com o Espirito Santo' (urna única vez a expressao ocorre a p. 64, com
'casamento' entre aspas) no sentido das 'nupcias divinas' da antiguidade?

Ao contrario, eremos que L. Boff tem razao ao querer completar a exe-


gese habitual, únicamente cristológica, de Le 1, 35, lendo neste versículo,
com o Pe. Manteau-Bonamy, a afirmacáo de urna missáo do Espirito a Ma
ría10. Mas esta exegese pneumatológicaí nao pode excluir a primeira. Sim;
por que o Espirito é enviado a Maria? Para santificá-la em, vista da sua mater
nidade e para consagrar, com a sua missáo, desde a concepeáo, a carne assu
mida pelo Verbo de Deus. Portanto a missao do Espirito está ligada á missáo
do Verbo que se encarna. É: inseparável desta. O Espirito é enviado pelo Pai,
que envia o Filho, e pelo Filho, que é enviado para se encarnar. Mais: a mis-
sao do Espirito a Maria como fruto da Redencao depende da Encarnacáo re
dentora e da Cruz. Por conseguinte, nao há como separar a exegese cristo-
lógica e a pneumatológica de Le 1, 35, como tende a fazer L. Boff quando
ele discute com H. Manteau-Bonamy, S. Lyonnet e L. Legrand (pp. 73s) ou
quando ele escreve: 'Maria é Mae de Deus por duas razoes: primeiramente,
porque é assumida pelo Espirito Santo, que diviniza a sua maternidade; em
segundo lugar, porque ela dá a vida ao Filho Eterno, que, Ele também, divi-

10 Na Anunciacao dá-se urna missao do Espirito a María, pois naquele mo


mento a Virgem inaugurou a missao que devia ser a de toda a ¡greja: con-
ceber, gerar e dar nome ao Cristo Jesús (cf. Le 1,31). Com efeito; a mis-
sao do Espirito é toda dirigida á missao da Igreja. Antes de se perceber em
toda a sua profundidade, como fez Lumen Gentium, o liame do misterio de
Maria com o misterio da Igreja, também nao se podía reconhecer, na ínter-
venció do Espirito na Anunciacao, urna missao no sentido próprío da pala-
vra. Lumen Gentium 59 explícitamente aproximou a missao do EspMto em
Pentecostés e a vinda do Espirito na Anunciacao. Ad Gentes é mais explícita
aínda: 'Foi em Pentecostés que comecaram os atos dos Apostólos, como
também foi pela vinda do Espirito Santo sobre a Virgem Maria que o Cristo
foi concebido, e pela vinda do mesmo Espirito Santo sobre Cristo em oracao
o Cristo foi levado a comecar oseu ministerio' (1,4). Ver também Presbyte-
rorum Ordinis /// 18.

222
"O ESPIRITO E O FEMININO" 31

niza a maternidade de sua mae' (p. 68). Na verdade, estas duas razoes sao
apenas urna, é importante nao quebrar a sua unidade. L. Boff a rompe, quan-
do afirma, por exemplo: 'a santidade de María nao se apresenta como sim
ples reflexo da fonte de santidade que seria Jesús. María nao é a personifica-
cao de um 'misterio da lúa' (mysterium Lunae), que recebe a sua luz de um
'misterio do sol' (mysterium Solis). A sua santidade é original, pois é a santi
dade do Espirito' (p. 60). Mais precisamente, o Espirito tem a sua origem no
Filho. ..

A nosso ver, Leonardo Boff separa demais missao do Verbo, e missao


do Espirito, e a prioridade cronológica do Espirito tende a torñar-se assim
prioridade ontológica. Sabemos que ele poderia objetar-nos o seguinte: des
de toda a eternídade, o Pai concebe seu Filho como dado ao mundo, como
encarnado. Ele nao O pode conceber como Dom dado aos homens senao no
Espirito Santo, que é precisamente, em Deus, o Dom como tal. Sim; o Pai e
o Filho se dao um ao outro no Espirito, que é o seu Dom mutuo em Pessoa.
Sendo em Deus o Dom como tal, o Espirito Santo é principio de todo dom
divino fora da Divindade. Ele é, com relacao a nos, diz S. Tomás, o dom pri-
meíro. Ele aparece assim como quem está no principio de toda a dispensa-
cao da grapa, ou na fonte do exercicio do Misterio de Deus na historia. É,
pois, no Espirito que, desde toda a eternídade, o Pai concebe seu Filho co
mo 'Cristo' (Salvador dado aos homens, ungido pelo Espirito). Aquele que,
em Deus, é o Terceiro, e consuma assim o fluxo do Amor Trinitario, está no
inicio de toda difusao que Deus faz para fora de Si.

Mas essa comunicacao de Deus (criacao e divinizaplo), precisamente


por ser comunicacao de Deus, nao pode contradizer ao que Deus é em si
mejmo na ordem das processoes eternas. Eis por que a ordem das missoes se
gué, lógica e ontologicamente, a ordem das processoes. Boff nao nos parece
levar este principio em conta suficiente.

5. O Espirito, Divina Mae de Cristo

No final do seu livro, L. Boff coloca a pergunta: 'Quando dizemos que


María é assumida pelo Espirito e que o Espirito nela toma forma histórica,
podemos concluir que o Espirito é a mae divina do homem Jesús?' (pp. 75s;
grifado pelo autor). A esta questio responde: 'Cremos que isto se impoe ló
gicamente' (p. 76).

L. Boff nao procura fundamentar essa maternidade do Espirito Santo


ñas relacoes trinitarias eternas. Assim, por exemplo, Scheeben escrevia em
'Misterios do Cristianismo': 'A terceira Pessoa aparece em Deus como o in
termediario entre o Pai e o Filho, de maneira semelhante á da mae, que apa
rece como a intermediaria entre o pai e os filhos na sociedade humana. A
mae é o vinculo de amor entre o pai e o filho; em Deus, o Espirito Santo é o

223
32 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

vt'nculo de amor entre o Pai e o Filho. A meé comunica ao f ilho a natureza


do pai, ela realiza a unidade entre o pai e o filho; assim o Espirito Santo faz
aparecer a unidade de natureza entre o Pai e o Filho, nao por comunicar ao
Filho a natureza do Pai, mas porque Ele é o fruto da unidade e do amor re
cíproco do Pai e do Filho". Quando L. Boff diz que o Espirito é a Mae divi
na de Jesús, 'ele entende urna maternidade temporal referente áhumanidade
de Jesús, pois, na sua dimensáo eterna, a filiacao divina de Jesús nao se deve
ao Espirito, mas ao Pai' (pp. 76s). Assim a filiacao de Jesús se deve ao Pai na
sua dimensáo eterna, ao passo que, na sua dimensáo temporal, ela se deve ao
Pai e ao Espirito Santo12.
Notemos: como L. Boff admite que a maternidade de María teve parte
na geracao da natureza divina de Cristo, assim ele considera que a maternida
de do Espirito se exerce em relacao á natureza humana do Verbo encarnado.
Apesar da sua visao personalista, o autor quase nao raciocina a partir do
principio pessoal estabelecido pelo Concilio de Éfeso, mas reflete muito
mais em funcáo das naturezas.

Chamar Jesús 'filho do Espirito' em virtude da cmcao da sua humani-


dade, da sua justificacio, da sua uncáo, da sua transfiguracao, da sua inspira-
cao, da sua ressurreicáo, é algo que ainda poderia ser compreendido13, mas

1' M.-J. Scheeben, Les Mystéres du Christianisme, traducao de A. Kerkvoor-


de O.S.B., París, Desclée de Brouwer 1947, p. 192.

12 Além do ponto de vista da eternidade e do ponto de vista do tempo, po


demos também considerar o ponto de vista da predestinacao. é neste plano
que se sitúa o Pe. Manteau-Bonamy. O Pai nao gera o Filho no Espirito, mas
é no Espirito (Amor e Dom, principio de toda a economía salvifica) que o
Pai predestina ('concebe', diz também o Pe. M.-BJ o Cristo. Desde toda a
eternidade, o Pai vé seu Filho no Espirito como dado, como encarnado, co
mo Ungido ou Cristo, como Filho de María. O Espirito Santo, sendo o
Amor no qual o Pai concebe ou predestina o Cristo, Ele pode ser chamado a
'concepcao ¡ncriada' do Cristo, isto é, o Amor no qual o Pai concebe o
Cristo e no qual o Cristo é concebido como Cristo. O Espirito Santo é envia
do pessoalmente a María na Anunciacao e se comunica a ela para que ela
possa ser no tempo o amor no qual o Pai pode gerar seu Filho. Por conse-
guinte. María é no tempo o que o Espirito é no plano da predestinacao. Co
mo a missao visivel de urna pessoa divina é orientada é manifestacao dessa
pessoa, María manifesta em nossa historia o que é o Espirito eterno. Ela é
epifanía do Espirito. Visto que Cristo é predestinado no Espirito, a missao
do Filho deve ser precedida, no tempo, por urna missao do Espirito.

13 Orígenes e S. Jerónimo citam sem criticar (num total de tres vezes) o


Evangelho dos Hebreus, que, a propósito do Batismo ou da Transfiguracao

224
"O ESPIRITO E O FEMININO" 33

que nao deixaria de ter graves contra-indicacóes. Sim; implicaría em se admi


tir no Cristo urna dupla filiacSo em relacao a Deus, e isto obscurecería a sua
filiacao com referencia ao Pai. Os argumentos de S. Tomás contra urna pa-
ternidade do Espirito Santo em relacao a Cristo valem igualmente contra
urna matemidade da terceira Pessoa (ver Suma Teológica III, qu. 32, a. 3).

Mas é principalmente em virtude de ter sido concebido por María que


L. Boff considera Jesús dependente do Espirito como de urna mae: na rela
cao mae-filho, há comunicacfo da substancia da míe ao filho; isto quer di-
zer, segundo L. Boff, que na concepcao virginal houve comunicacao, me
diante a carne de María, da substancia do Espirito a Jesús, e que o Espirito
fecundou María á guisa de um esposo (já que Jesús é, segundo a carne, filho
do Espirito). Por conseguinte, a carne de María foi identificada com a subs
tancia do Espirito Santo. — Encontramos aqui de novo o aspecto fisico da
pneumatizacao do Espirito em María, a mistura de Deus e da sua criatura as-
sim como a confusao da grapa e da natureza. Estes pontos sao, fora de dúvi-
da, inaceitáveis14.

6. A missao do Verbo e a do Espirito

Fazer de Jesús o filho do Espirito redunda em inverter a ordem das


missoes divinas. Estas missoes - vimo-lo atrás - o autor tende a concebé-las
em paralelo ou distanciadas, separadas urna da outra. L. Boff é levado a isto,
eremos, pela sua idéia de que o Verbo e o Espirito se consideram mutuamen
te como o homem e a muiher; já nao sao intrínsecos um ao outro. — é bem
verdade que Deus criou o ser humano masculino e feminino, e que, por con
seguinte, a imagem de Deus é masculina e também feminina. é verdade tam-
bém que se pode considerar o Espirito Santo como a personificacao do as
pecto feminino e maternal de Deusis. Mas dai nao se segué que o relaciona-
mentó mutuo do homem e da muiher seja o ponto de partida para se conce-
ber o relacionamento mutuo do Verbo e do Espirito.

de Jesús, fala do Espirito como sendo a Mae de Cristo. L. Boff procura


apoiar-se neles (p. 76).

14 Se María é a encarnacao do Espirito (ver o subtitulo I deste artigo), a


carne de María é evidentemente a carne do Espirito e Jesús deve ser dito
filho do Espiritol
1 s Ver Joao Paulo II: 'O Espirito Santo... é o Amor do Pai e do Filho e,
como tal, 6 o Dom trinitario, sendo ao mesmo tempo a fonte eterna de toda
a liberalidade divina feita ás criaturas. Nele precisamente podemos conosber
como personificada e realizada de maneira transcendente a misericordia'
(Ene. Domínum et Vivificantem n9 39).

225
34 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

A antropología de L. Boff sugere urna teología da pericorese, poís eia


reconhece a presen pa do feminino no homem e a do masculino na mulher.

Ao contrarío, porém, o autor, ao menos duas vezes, fala da primeira


Pessoa da Trindade designando-a indiferentemente como 'Pai e/ou Mae de
infinita ternura' (pp. 34 e 57). Há cortamente no Pai um aspecto maternal16,
mas nao convém colocar no mesmo plano o aspecto paterno e o materno do
Pai. Jesús sempre chama Deus seu Pai; nunca o interpela como sua Mae. Isto
deve ter algum peso teológico.

Receamos que a problemática da complementaridade dos sexos e das


diferencas sexuais, assim como a preocupagao com a igualdade dos sexos, te-
nham imposto a L. Boff límites estreitos demais na sua pesquisa teológica.
Nao basta pensar Deus a partir do homem e da mulher; é preciso também
pensar o masculino e o feminino a partir de Deus e sob a luz de Deus11.

7. Para concluir

A convergencia das observares que apresentamos, mostra que, ñas ci-


tacóes que fízemos do livro de Boff, nao se trata de exageras momentáneos
de linguagem, mas sim de urna teoría que se desenvolve com todas as suas
conseqüéncias.

O autor professa urna diferenca essencial entre a 'pneumatízacao' do


Espirito em María e a Encarnacao do Verbo em Jesús. Embora nao o diga
em parte alguma, nao existe ¡dentidade de pessoa entre María e o Espirito
Santo. A fórmula que exprime a unilo de María e do Espfrito, é, antes, a se-
guinte:duas pessoas numa só natu reza, feminina e maternal. O Espirito assu-
me plenamente a natureza humana de María, que é a forma humana do Espi
rito.

Lendo A Ave-Maria, pode-se pensar muitas vezes na palavra de outro


filho de S. Francisco, Sao Maximiliano Kolbe: 'A Imaculada revela o Espiri
to Santo'. María é epifanía e transparencia do EspCrito. É esta mesma intuí-
cao que L. Boff quer exprimir, mas ele nao retoma a fórmula de Kolbe (e de
Montfort): 'María, esposa do Espirito'. Segundo Boff, o Espirito é mais 'es
posa' (p. 86) do que esposo. É considerado totalmente do lado da Igreja; é
totalmente feminino.

16 VerJoio Paulo II, Ene. Dives ¡n Misericordia/!? 4s.

17 Ver M.-J. Scheeben, Les Myítéres..., citado na nota 11. p. 198: 'Esta
idéia transfigurada e sobrenatural da mulher 6 menos urna imagem visfvel e
independente que nos faz conhecer a terceira Pessoa Divina, do que um re-
f/exo ¡nvisfvel da esséncia do Espirito Santo, reflexo que só pode ser eom~
preendido por essa esséncia mesma'.

226
"O ESPI'RITO E O FEMININO" 35

Todos estes misterios slo teológicamente dif icéis. L. Boff teve o méri
to de tentar penetrá-los. Ao preco de alguns erros, parece-nos. Esperamos
que ele possa repensar sua intuicáo e apresentá-la de maneira satisfatória. O
seu ensaio mostra, em todo caso, que o teólogo brasileiro nao menospreza as
sendas do pensamento contemplativo e espiritual.

Jean-Marie Hennaux S. J.
B. 1040 Bruxelles - Avenue Boileau 2"

II. REFLEXÁO FINAL

A recensáo do Pe. Hennaux ao livro de L. Boff é nítidamente contra


ria ás posicóes deste autor, sem agressoes pessoais.

Em suma, o teólogo franciscano propoe a uniao hipostática do Espiri


to Santo com María, á semelhanca do que aconteceu entre o Verbo de Deus
e a humanidade de Jesús; María seria a encarnapao do Espirito, como Jesús
foi a do Filho de Deus. Ora este paralelismo tem conseqüéncias graves para
toda a teología trinitaria. Com efeito; Sao Paulo afirma que o Pai 6 o Princi
pio sem principio, de quem tudo provém; o Filho é Aquele por quem tudo
nos provém do Pai, e o Espirito Santo é Aquele em quem vivemos a vida do
Pai e do Filho (cf. 1Cor 8,6; Rm 11, 36; Ef 1, 1-14;3. 20s; 2Cor 13,13).
Com outras palavras: o Filho procede do Pai; o Espirito Santo procede do
Pai edo Filho ou pelo Filho (cf. Jo 14,16s.24.26; 15,26; 16,7). Daínaose
poder dizer que o Espirito é a Mae Divina do Cristo ou que o Espirito se en
carna em María.

Vd-se que L. Boff fez urna re-leítura da mensagem da fé a partir de


urna premissa de outra ordem ou de ordem social: a emancipacao e a exalta-
pao da mulher. A Teología da Libertacao é aplicada ao caso, e aparece mais
urna vez como teoría sócio-politica que provoca urna re-leitura das verdades
da fá em chave heterogénea; ora isto significa simplesmente a subordinacao
da mensagem crista a principios de Índole sócio-politica ou um desvirtua-
mento total da revelapao crista. Esta há de ser lida e estudada como tal, sem
preocupacóes sócio-políticas; as suas conclusoes de ordem ética serao sufi
cientemente eloqüentes para provocar remocao das injusticas sociais.

Estas poucas reflexoes, contidas no artigo de Hennaux, evidencíam o


porqué da recusa das teorías de L. Boff por parte do magisterio da Igreja.

227
Um livro polémico:

"Por que deixamos a Batina"

por Syr Martins

Em símese: 0 livro de Syr Martins traz pretensos depoimentos de sa


cerdotes e Religiosos que se passaram para o Protestantismo, e apresenta
"fíazoes pelas quais nao sou católico romano". - A primeira cautela a to
mar diante de tal obra é averiguar até que ponto os casos citados sao históri
cos e reais; atualmente a literatura polémica protestante é de tao baixo ni
vel que recorre a inverdades e distorcoes; o próprio Syr Martins faz á Igreja
Católica acusacóes baseadas em caricaturas. — Nos casos reais, é de notar
que muitos dos que se passaram para o Protestantismo, talvez o tenbam fei-
to por motivos disciplinares, e nao por razoes doutrinárias, pois é mais fácil
ser protestante do que ser católico. Além disto, deve-se frisar que quem se
passa para o Protestantismo, nao se converte ao Evangelho puro ou depura
do, como insinúa S. M., mas converte-se á interpretacao do Evangelho dada
por Lutero, Calvino, John Knox nos sáculos XVI/XVIII, deixando de lado
a Tradicao viva do Cristianismo que bercou e acompanhou o Evangelho, a
partir de Jesús Cristo e dos Apostólos. - Assim o livro de S. M. é de pouco
valor histórico e doutrinário.
* * *

Infelizmente certos livros polémicos exigem resposta. Os leitores de


PR a solicitam, pois percebem os efeitos de tais escritos. Tal é o caso do li
vro de Syr Martins, pastor batista que apresenta, como diz, "depoimentos de
dezenas de Padres e Freirás que deixaram o Catolicismo Romano" sob o tí
tulo "Por que deixamos a Batina". Esta obra saiu em sua quarta edicao no
ano de 1988, com um apéndice intitulado "Por que nao sou Católico Ro
mano?" (alias, sem paginapao).

A leitura deste livro sugere algumas ponderacoes.

1. Fidelidade histórica?
Os casos de padres e freirás aduzidos por Syr Martins mereceriam inves-
tigacáo para se apurar o grau de historicidade dos mesmos. Com efeito;
atualmente a literatura protestante no Brasil mais de urna vez tem apelado
para mentiras, distorcoes, meias-verdades...; a paixao e a hostilidade sao tío
fortes que obcecam a razao. Os protestantes nao estudam o Catolicismo,

228
"POR QUE DilXAMOS..." 37

nem para poder atacá-lo, mas combatem-no na base de generalizacóes, pre-


conceitos e numerosas inverdades; repetem chavóes cujo conteúdo eles mal
conhecem. . . Em PR já tivemos a oportunidade de apontar exemplos disto-
ver 295/1986, pp. 552-563.

O próprio livro de Syr Martins é portador dessas inverdades. Assim,


por exemplo:

No Apéndice (sem paginacáo. . .!), diz que a Missa "tira do inferno as


almas" - o que é falso (ver "Missa e Transubstanciapáo").

Ai também (título "Idolatría") atribuí aos católicos a adoraclo de


pessoas e coisas que eles nao adoram. - Só adoramos a Deus. Pode um cris-
tao, de boa fé, afirmar que os católicos adoram ídolos, quando precisamente
toda a historia da Igreja é palmilhada pela figura de heróis e mártires que
morreram para nao adorar ídolos?

A afirmacao "Béncáos papáis sao maldicoes" é comentada e desmasca


rada neste fascículo, pp. 232-5. Baseia-se no texto de Mt 2,2, erróneamente
interpretado, sem recurso aos origináis e ao respectivo contexto, de modo
que o autor faz a Biblia afirmar o que ela nao afirma.

Quando fala do celibato, o autor cita os textos bíblicos que convém á


sua tese e toma o cuidado de nao mencionar ICor 7,25-35 (em que o Apos
tólo recomenda o celibato).

Quando trata da Eucaristía, nao cita urna vez os textos em que Jesús
diz que o pao é seu corpo e o vinho é seu sangue (cf. Mt 26,26-28; Me 14,
22-25; Le 22,19; 1 Cor 11, 23-25.

Ao falar de Ecumenismo, o autor diz que nao há textos bíblicos que o


recomendem, esquecendo-se de Jo 10,16 ("um só rebanho e um só pastor"),
Ef 4,3-6 (urna só fé, um só Batismo, um só Corpo, um só Deus").

Em suma, todo o Apéndice "Por que nao sou Católico Romano" é


urna caricatura do Catolicismo, cuja doutrina e cuja historia sao tendenciosa
mente desfiguradas para poder ser escarnecidas. Quem lé essas páginas, veri
fica que nao decorrem de um estudo objetivo e sereno do que é realmente o
Catolicismo. A propósito pode-se ler o livro "Djálogo Ecuménico" de E.
Bettencourt (Ed. Lumen Christi, C. p. 2666, 20001 Rio, RJ).

2. Converteram-se ao Evangelho puro?

Quem passa do Catolicismo ao Protestantismo, nao "se converte ao


Evangelho", como repetidamente insinúa Syr Martins, mas converte-se a
urna interpetacao humana do Evangelho, ou seja, á interpretacao que ao
Evangelho foi dada ou por Lutero ou por Calvino ou por Knox (presbrteria-

229
38 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

no) ou por John Smyth (batista), ou por John Wesley (metodista) ou por
Joseph Smith (mórmon) ou por William Miller (adventista) ou por Charles
Parham (pentecostal)...

O Evangelho é sempre o mesmo para todos os cristaos. Ele existe tan


to no Catolicismo como em qualquer denominacao protestante. Todavia no
Catolicismo ele é lido dentro da Tradicao oral que o bercou e o acompanha
- a Tradicáo iniciada por Jesús Cristo e pelos Apostólos -, ao passo que no
Protestantismo o Evangelho é lido dentro da tradicáo que no sáculo XVI Lu-
tero, Calvino, Knox ¡niciaram, ou dentro da tradicao a que John Smyth e
outros fundadores posteriores deram origem: enquanto os luteranos e os cal
vinistas batizam enancas e as batizam por infusao, os batistas só batizam jo-
vens ou adultos e por ¡mersao. Por qué? - Nao por causa do Evangelho, que
é o mesmo lá e cá, mas por causa da tradipáo derivada do fundador humano
seja do Luteranismo, seja da corrente batista...

Com outras palavras: o Evangelho nunca é lido fora de urna corrente


viva de pensamento; ora, no Catolicismo essa corrente viva é a que Jesús ¡ni-
ciou e entregou aos Apostólos, garantindo-lhes a assisténcia infah'vel para
que conservassem íntegro o depósito da fé (cf. Mt 28, 18-20; Jo 14,26;
16,13). Ao contrario, no protestantismo a tradipáo que ilumina o Evangelho
6 a que tem inicio com o respectivo fundador humano nos sáculos XVI/
XVII ou depois, bem distanciada de Jesús e dos Apostólos. Donde se vé
quanto é falso dizer que quem se faz protestante ou batista "se converte ao
Evangelho e segué tao somente o Evangelho"; na verdade. . . converte-se a
um modo humano de entender o Evangelho, desarraigado das origens do
Cristianismo.

3. Maus católicos se fazem protestantes

Seria preciso averiguar quais as razoes que levaram padres e freirás pa


ra o Protestantismo, nos casos em que realmente isto tenha ocorrido. Verif i-
car-se-á talvez que muitos desses se fizeram protestantes nao por causa da
doutrina, mas por razoes disciplinares e moráis. Sim; é mais fácil ser protes
tante do que ser católico, de modo que tornar-se protestante é urna "saída
elegante" para quem tem problemas disciplinares dentro do Catolicismo.
Um protestante, por exemplo, nao tem obrigacao de Missa aos domingos,
nem de Confissao sacramental, nem de celibato sacerdotal; se casado, pode
recorrer ao divorcio (alguns diriam:. . . até ao aborto)... Se nao se dá bem
em sua denominacao, pode passar para outra, fazendo-se presbiteriano, ba
tista, pentecostal. . .; o protestante julga ter o magisterio do Espirito Santo
dentro de si, de modo que recorre ao livre exame e nao precisa de obedecer
a instancia superior que "contradiga ao seu Espirito Santo"; se é presbiteria
no clássico, pode tornarse presbiteriano independente; se é batista calvinista,

230
"POR QUE DEIXAMOS..." 39

pode tornar-se batista congregacionalista ou batista do livre pensamento ou


ainda batista dos seis principios, batista tunker, batista campbellista... Se é
luterano federado, pode fazer-se luterano dissidente (filiado ao Sínodo de
Missouri, USA)...

é freqüentemente esse Vfaeilitárfo" que leva maus católicos ao protes


tantismo, e nao a "veracidade" da mensagem protestante. Por isto já se tem
dito muitas vezes que sao os maus católicos que se tornam protestantes, ao
passo que os bons protestantes se tornam católicos.

Poderfamos tecer urna longa lista de protestantes que se tornaram ca


tólicos e descobriram o Evangelho na Igreja confiada a Pedro. Para nao citar
muitos nomes e nao entrar na seara brasileira, lembramos o Cardeal John
Henry Newmann (1801-1890), o teólogo Pe. Louis Bouyer (contemporá
neo), o ex-pastor Wolfgang Tschuchke (cf. PR 310/1988, pp. 121-130) e
outros varios.

4. Os sacerdotes que nao se tornam protestantes

Muito curiosas sao as afirmacoes feitas por S. M. a respeito dos sacer


dotes que nao se tornam protestantes: seriam homens sem fé e ateus: "Entre
os padres com mais de cinco anos de exercício do sacerdocio, nao há 5% que
acredite na existencia de Deus. . . Nao tém as alegrias espirituais de que go-
zam todos os crentes. . . Sao os homens mais desgranados do mundo!"
(p. 14s). - Estas palavras revelam grande ignorancia do assunto, se nao.
má fé. Mais habilitado do que o pastor S. M. é o autor destas linhas ao se tra
tar do clero e dos Religiosos da S. Igreja Católica: posso atestar que sao ab
solutamente falsas as assercoes de S. M., que, alias, ridiculas como sao, nao
deveriam merecer atencáo. É surpreendente a auto-suf¡ciencia com que o au
tor fala do que nao conhece. Para refutá-lo, basta citar os nomes de sacerdo
tes que se tornaram homens de santa fama no mundo ¡nteiro'S. Jólo Bosco
(T 1888), Sao José Cottolengo (t 1842), o Santo Cura de Ars (t 1859), S.
Jerónimo Emiliano (t 1537). . . e tantos outros, existentes também no Bra
sil, aos quais foram dedicadas mas e pracas das nossas cidades!

O sacerdote católico fiel á sua vocacao tem motivos para ser ¡mensa
mente feliz, visto que trata diariamente a S. Eucaristía e conhece a devocfo
filial a Maria SS. Tal felicidade leva a mais serenidade e menos agressividade
do que a felicidade de S. M.
Estas poucas reflexoes relativizam o significado do livro de Syr Mar-
tins, a quem se pode sugerir que estude melhor antes de escrever polémica
mente.

231
Fatos históricos:

"Bén?aos Papáis produzem


Maldices?"

Em síntese: 0 jornal "A Voz Quadrangular", do protestantismo pen-


tecostal, afirma que a béncao pápalepenhor de desgranas físicas, baseando-
se em alegacoes nSo documentadas. - A noticia comeca evocando o texto
de MI 22, que nada tem a ver com o propósito do articulista. Nao prova o
que assevera. . .; o autor confunde o "depois de. . ." com o "por causa
de...". Esquece que o Papa é, no dizer da imprensa neutra, urna das figuras
mais populares e benquistas do mundo contemporáneo — o que desmente a
noticia tendenciosa ou maldosa do jornal em foco.

Os pentecostais tém o direito de propagar suas crencas, masé para de-


sejar que o facam como cristaos e nao como sectarios, colocando sempre o
amor é verdade objetiva ácima das paixoes.

A ¡mprensa protestante, numa atitude nada evangélica, tem publicado


urna lista de "Béngaos papáis que produziram maldicoes". Entre outras en-
contra-se a do jornal "Voz Quadrangular", ano IX, n? 47, de dezembro
1987-janeiro 1988, p. 12, onde se lé:

Béncáos papáis produzem maldicoes

"Malaquias profetizou que muitas hincaos de pessoas impías, transfor-


mam-se em maldicoes (Malaquias 2:2). Efetlvamente, muí tos fatos e expe
riencias de homens, instituicoes e nacoes, comprovam que as béncaos papáis
tém resultado, muitas vezes, em maldicoes terrfveis e ¡mediatas. Citaremos
alguns fatos reais e impresionantes que a Historia registrou.

a) Carlota de Bourbon visitou o papa, recebeua béncao, masantes de


deixar o palacio do Vaticano enlouqueceu.
b) Maximiliano, do México, após receber a béncao papal, foi preso e
fuzilado, em Queretaro.
c). O exército francés, em 1870, após ser abencoado pelo papa, entrou
em batalha e foi fragorosamente derrotado.

232
"BÉNCÁOS PAPÁIS..." 41

d) O vapor América recebeu a béncao papal e a seguir, no día 24 de


dezembro de 1871, foi destruido pelo fogo, em Mar del Plata.
e) O Banco Católico da Lyon, logo depois de ser especialmente aben-
coado pelo papa, faliu.
f) Napoleio IV, após ser abencoado pelo papa, partiu para ZuluISndia
e de lá só voltou cadáver.
g) Francisco José, imperador da Austria, em 1886, após receber a bén-
cao papal, foi derrotado em Sadowa.
h) A Imperatriz Isabel, após ser abencoada pelo papa, sofreu acídente
em que fraturou a perna e pouco mat's tarde foi deposta do poder e expulsa
do Brasil.
i) O Brasil, am 1905, após receber a béncao papal, sofreu urna violenta
crise económica, ¡nundacóes, secas, miseria, fome e praga de gafanhotos em
S. Paulo.
¡) A América do Norte, após ter recebido a béncao do papa, sofreu
violentíssimo incendio em S. Francisco da California.
k¡ O Brasil, após receber as hincaos dos dois últimos papas que nos vi-
sitaram, tem experimentado terriveis maldicoes, entre as quaisasseguintes:
violenta ditadura militar discricionária e capitalista; multiplicacao das agen
cias de gatunagem, centenas de estafáis insolventes, desprezo ao povo pobre,
desfalques nSo apurados; erkes económica, moral e religiosa; desemprego,
ondas de corrupcao moral e pornográfica; recrudescimento do espiritismo
fetichista, engañador e perverso; multiplicacao da criminalidade, com vio
lencias, roubos, jogatina, assassinatos, despoliciamento das cidades e até do
campo; omissao de autoridades repressivas. resultando multiplicacao da cri
minalidade, do contrabando, de presidios superlotados e inseguranca geral;
contaminacSo, poluicao e depredacao da natureza por Individuos e organiza-
coes que ficam impunes; multiplicacao de falencias e concordatas; inunda-
coes, secas, pragas, doencas, pestes e outros males; evasao do dinheiro e das
riquezas minerais, das rendas públicas (divisas), por falta de fiscalizacao e re-
pressao e muitos outros graves males. Eis a verdade dos fatos e o perígo das
béncaos papáis ".

Estas noticias merecem breve comentario.

REFLETINDO...
Impdem-se algumas ponderacóes a respeito do texto transcrito:

1) Em MI 2,2 lé-se: "Se nao escutardes, se nao levardes a serio dar


gloria ao meu Nome - disse o Senhor dos exércitos -, mandarei contra vos
a maldicao e amaldicoarei a vossa béncao. Sim, eu amaldicoarei porque nao
leváis isto a serio".

Este texto é dirigido aos levitas negligentes após o exilio, ou seja, no


século V a.C. O Senhor Ihes anuncia punicáo; as béncaos a eles concedidas

233
42 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

(isto é, os beneficios temporais que tocam aos levitas, conforme Dt 33,11}'


tornar-se-ao maldicóes, isto é, desgrapas, segundo a advertencia já feita em
Dt 28,20:" O Senhor Deus desencadeará contra ti a confusao e a ameaca em
toda obra em que te ocupares, até que sejas destrui'do e perecas rápidamente
por causa da maldade de tuas acoes pelas quais me abandonaste"..

Como se vé, o texto nao quer dizer que "béncaos concedidas por pes-
soas i'mpias se transformam em maldicoes" para as pessoas "abenpoadas";
isto seria ¡nfquo da parte do Senhor Deus, pois quem recebe de boa fé urna
béncao, nao deve pagar pelas culpas de quem "abencoa". 0 que o texto
bíblico quer dizer, é que os favores prometidos pela Lei de Moisés aos levitas
se transformarao em desgrapas ou maldicóes para esses mesmos levitas por
causa do indigno comportamento destes: em vez de gozarem de prosperida-
de material, serao entregues aos seus adversarios.

Por conseguinte, a observacao do jornal "Voz Quadrangular" comeca


com um sofisma ou urna distorpao do texto bíblico. Ela nao tem o mínimo
fundamento na S. Escritura, ao invés do que pensa o respectivo articulista.

2) Abstracao feita deste tópico, vamos ao conteúdo da nota:

As afirmacoes de ruina ou desgrapa de Carlota de Bourbon, de Maxi


miliano do México, do exército francés... sao vagas e destituidas de docu-
mentacao. - Ora, em materia histórica, é absolutamente necessário que as
assercóes sejam documentadas... e documentadas de maneira fidedigna ou
idónea, pois se sabe que há freqüentes afirmacóes gratuitas (resultantes de
equívocos), como também há preconceitos e interpretacoes unilaterais no
estudo da historia.

Quanto ao Brasil, só recebeu um Papa — Joao Paulo II — em 1980 (em


1982 desceu no Aeroporto do Galeao, RJ, de passagem para a Argentina).
— O Cardeal Joao Batista Montini esteve no Rio de Janeiro como arcebispo
de Milao, e nao como Papa Paulo VI. Donde se vé outra imprecisao no texto
citado, que fala da visita de dois Papas ao Brasil. — Quanto ás desgrapas que
nossa patria tem experimentado, elas nao sao datadas da década de 1980,
mas tém raízes e expressoes bem anteriores. Seria simplório dizer que a atual
infelicidade da napao sucedeu a um período de prosperidade; os males que
afligem nosso povo, tém causas em acontecimentos remotos, que vao dando
maus frutos.

3) Um sadio principio de Filosofía diz-nos que é preciso nao confun


dir "depois de..." com "por causa de...". O fato de um evento se seguir a

1 "Abenfoai. Senhor, os seus estorbos e aceitai a obra de suas maos. Ferí


os ríns dos seus adversarios e dos que odeiam Levi, para que nao se levan-
tem"(Dt 33,11).

234
"BÉNCAO PAPÁIS. .." 43

outro nao quer dizer que haja causalidade do primeiro em re laclo ao según-
do; por exemplo, se o telefone toca numa casa e, logo a seguir, o pai de fa
milia volta do trabalho, pode-se dizer que houve um "depois de...", nao,
porém, um "por causa de...". Conseqüentemente o fato de alguém ter rece-
bido a béncáo papal e, pouco depois, haver sofrido urna desgrapa física nao
quer dizer que a béncao tenha sido a causa da infelicidade; seria falso silogis
mo aquele que assim concluisse (a conclusao excedería as premissas). - Ade
máis, como dito, seria injusto da parte de Deus fazer que a pessoa "abencoa-
da" sofresse o castigo devido a quem abenpoa; nem o Profeta Malaquias quer
insinuar isto, como vimos atrás.

4) Numa perspectiva crista, nao se pode dizer que todas as desgracas


fi'sicas sao castigo. O Novo Testamento dissocia os termos que o Antigo
Testamento combinava entre si: pecado - desgraca material (cf. Dt 28-30).
Assim, por exemplo, diz o Senhor no Apocalipse: "Repreendo e educo to
dos aqueles que amo" (3,19); ver também Hb 12,4-11; 1Cor 11,32. A pro-
vacáo no plano temporal pode ser comparada ao cadinho, que purifica o
ouro, separando-o das escorias; assim a tribulacao é permitida pelo Senhor
Deus para dar aos seus fiéis a ocasiao de se libertarem do velho homem
egoCsta e concupiscente; é neste intuito que o Senhor consente na provacáo
dos seus amigos; nunca há, da parte de Oeus, urna pena meramente víngati-
va; todo sofrimento é medicinal.

5) Ademáis a presenca e a béncao do Papa tém sido estimadas no


mundo de hoje a tal ponto que a imprensa internacional reconhece que
Joáo Paulo 11 é a figura mais popular e benquista da nossa época. Ainda aos
26/12/1987 noticiava o jornal O GLOBO, p. 13:

CIDADE DO VATICANO - "O Papa Joao Paulo II encerrou ontem


as cerímónias do Natal fazendo, em 51 idiomas, um apelo á paz no mundo.
Cerca de 50 mil fiéis se reuniram na Praca de Sao Pedro para ouvir o pronun-
ciamento papal, transmitido para todas as regioes do planeta por 47 cadeias
de TV, atingindo urna audiencia calculada em pelo menos um bilhio de
pessoas...

Os tradicionais festejos do Natal comecaram á meia-noite, quando


o Chefe da Igreja cqncelebrou urna missa so/ene com a presenca de cardeais
e prelados da Curia e embaixadores dos 117 países acreditados ante a San-
ta Sé".

Por conseguinte, os acontecimentos desmentem eloqüentemente a


tendenciosa ¡nterpretacao do jornal evangélico.
Vé-se, pois, quao infundada, e até mesmo maldosa, é a noti'cia de
"Voz Quadrangular". Pode impressionar o leitor desprevenido, mas é vazia
aos olhos de quem reflete; dir-se-ia que procede de preconceitos e nao do
amor á verdade, que deve caracterizar todo cristáo.

235
Urna Alerta Pastoral:

A Restaurado
do Domingo Cristao

Os Bispos da Alemanha Ocidental e os responsáveis pelas comunidades


evangélicas naquele país emitiram urna declaracao comum, em que chamam
a atencáo para a necessidade de se restaurar na sociedade a consciéncia do
que é o domingo cristao. — Eis o texto portugués desse documento, plena
mente válido para o Brasil':

"No Antigo Testamento Deus preceituou ao povo de Israel que guar-


dasse o sábados como día santo. No Novo Testamento os cristaos sempre
festejaran) o domingo como o dia da semana em que Jesús Cristo ressuscitou
dentre os mortos. Jesús lembra aos homens a quem Ele anuncia a mensagem
do Reino de Deus: 'O sábado foi feito para o homem, e nao o homem para
o sábado' {Me 2,27). Isto vale tambóm para o domingo. Se o homem santifi
ca o domingo, voltando-se para Deus na oracao e no culto litúrgico, ele en-
tSo está consciente de que nao deve a sua vida ao acaso, mas a Deus, seu
Criador; ele também professa que a finalidade da sua existencia nao é o desa
pareo mentó e a morte, mas a salvacao e a vida eterna, á qual nos todos so
mos chamados por Deus. A celebracao do domingo torna possfvel aos ho
mens urna experiencia elementar do sentido desse dia.

Já há milito tempo varios aspectos da evolucao da nossa sociedade


poem o domingo em perigo. Muitos cristaos já nem tém consciéncia da ori-
gem religiosa do domingo nem do porqué da santificacao e da celebracao
desse dia. Também na vida pública, o sentido profundo e o significado do
domingo para toda a nossa cultura desapareceram. Ao mesmo tempo, vemos
que urna serie de realizacóes técnicas, económicas e sociais se vao implantan
do, capazos de acarretar urna progressiva erosSo do domingo.

Nesta situacao precisamos de ref letir. Os cristáos, por certo, mas tam
bém todos os homens de boa vontade, os grupos sociais, os homens políti
cos, devem perguntar a si mesmos: que valor tem para nos o domingo e co-

1 A traducáo francesa do original alemao foi publicada por S.N. O.P., órgao
noticioso filiado ao episcopado francés, n° 702 (24/02/88), pp. 7 e 8. - Foi
dessafonte que fizemos a traducáo portuguesa.

236
O DOMINGO CRISTÁO 45

mo o podemos manter qual dia do Senhor e qual valor fundamental da nossa


cultura? No decorrer destes últimos anos, em declaracóas públicas, particu
lares ou colativas, as Igrejas se manifestaram freqüentemente a tal propósito.
Para despertar as responsabilidades neste setor, a Conferencia dos Bispos da
Alemán ha e o Conselho da Igreja Evangélica da Alemanha dirigem-se mais
urna vez ao público numa Declaracao comum: 'Nossa responsabilidade em
relapáo ao domingo'. Pedimos a todos que facam sua a preocupacao das Igre
jas concernentes á observancia do domingo e procedam de maneira coerente.

Bonn e Hanover, 25 de Janeiro de 1988

Mons. Dr. Karl Lehmann Bispo Dr. Martín Kruse


Presidente da Conferencia dos Presidente do Conselho da
Bispos da Alemanha Igreja Evangélica da Alemanha

O texto levanta um problema muito real no mundo inteiro, devido ao


fenómeno da secularizacao; os valores religiosos sao recobertos por bens pro
fanos, que parecem por si mesmos justificar a vida e a atividade do homem;
assim se da com o domingo, com o Natal, com a Semana San^a, com o casa
mento, etc.

Este fato vem a ser um desafio para os cristáos, incitados a afirmar


com mais nitidez o patrimonio da fé por palavras e por seu teor de vida. O
texto atrás transcrito lembra este dever em termos sobrios, sem descer a por
menores ou a explicacoes de alta Teología. O cristao deve saber que o do
mingo é o dia da Páscoa do Senhor, o dia em que se celebra a vitória da vida
sobre a morte e se abrem aos homens as portas da eternidade; é o dia que dá
sentido aos demais dias da semana. Por isto os fiéis procuram vivé-lo intensa
mente, participando da Páscoa do Senhor na Eucaristía; recebendo o sacra
mento, recebem um fermento que os fará viver o resto da semana numa ati-
tude de esperanca e confianca, apesar das inevitáveis lutas de cada dia. - Se
no cristao se apaga a consciéncia do valor do domingo, extingue-se o princi
pal dmamo de sua vida crista, que poderá guardar a fachada, mas nao terá a
sua vitalidade ti'pica. Daí a importancia da alerta que, juntamente com os Bis
pos católicos, os dirigentes evangélicos dirigem aos seus fiéis no sentido de
procurarem restaurar no povo de Deus a observancia fiel do dia do Senhor.

Atualmente a disciplina da Igreja Católica referente ao domingo é as


sim formulada pelo Código de Oireito Canónico:

"Canon 1247. No domingo e nos outros dias de festa de preceito, os


fiéis tém a obrigapáo de participar da Missa; além disto, devem abster-se das

237
46 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

atividades e negocios que impepam o culto a ser prestado a Deus, a alegría


própria do dia do Senhor e o devido descanso da mente e do corpo.

Canon 1248 - § 1?. Satisfaz ao preceito de participar da Missa quem


assiste á Missa em qualquer lugar onde é celebrada em rito católico, no pro-
prio dia da festa ou na tarde do dia anterior.

§ 2?. Por falta de ministro sagrado ou por outra grave causa, se a par
ticipacao na celebracáo eucan'stica se tornar impossivel, recomenda-se viva
mente que os fiéis participem da liturgia da Palavra, se a houver, na igreja pa-
roquial ou em outro lugar sagrado, celebrada de acordó com as prescricóes
do Bispo diocesano; ou entao se dediquem á oracao por tempo conveniente,
pessoalmente ou em familia, ou em grupos de fami'lias de acordó com a
oportunidade".

A propósito observamos: 1) A Missa dominical é de preceito, preceito


que o cristio bem formado deseja cumprir espontáneamente; 2) o Código
nao indica a partir de que horas a Missa vespertina de sábado é válida para o
domingo; 3) o formulario da Missa dominical pode se.', por excegao, o de
casamento ou o de defuntos, para que o cristao cumpra o preceito da Euca
ristía dominical; 4) a maneira de se observar o repouso dominical é expressa
em termos um tanto genéricos: exclui-se tudo o que possa impedir o culto a
Deus e o sadio repouso da mente e do corpo.

EstévSo Bettencourt O.S.B

Livros em Estante
A Biblia do Povo, em 4 volumes, correspondentes aos Quatro Evange-
Ihos, traduzida e comentada por Freí Paulo Avelino de Assis. — Edicao do
Centro Bíblico Católico, Rúa Itaqui 146 (Canindé), Sao Paulo (SP), total
de 840 pp., 140x2 lOmm.

Muitas tém sido as edicoes da Biblia nestes últimos anos. O Centro Bí


blico Cató/ico de Sao Paulo, por intermedio de seu Diretor Freí Paulo Aveli
no, oferece o texto dos Quatro Evangelhos acompanhado de páginas intro-
dutórias, comentarios, mapas, ilustracoes, fotos, breve resumo da Historia
Sagrada... Tudo redigido em estilo fácil e lúcido. 0 autor tem em vista escla
recer o leitor sobre pontos especialmente importantes como sao "os irmaos
de Jesús" (Mt Í3.55), o primado de Pedro (Mt 16,16-19), a Ceia de Páscoa
e a Eucaristía (Mt 26,26-28).... No fim de cada capítulo aprésente urna Vi
vencia ou ñeflexio, que leva o cristio á oracao, como é para desejar; pela
leitura do texto sagrado, Deus fala ao homem; pela oracao, este Lhe respon
de. - A obra merece ampia difusao nos Colegios, ñas Faculdades, nos Cír
culos Bíblicos, nos lares cristaos, pois é muito didática e segura em suas ex-

238
LIVROS EM ESTANTE

planacóes. Parabéns ao benemérito autor, que há decenios se dedica ao apos


tolado bíblico com zelo e tenacidade!
Comunidades Eclesiais de Base, Bases Teológicas, por Faustino Luiz
Couto Teixeira. - Ed. Vozes, Petrópolis 1988, 135x 210 mm, 222 pp.

O autor é jovem teólogo leigo, casado, que estudou na PUC-RJ e na


Universidade Gregoriana de Roma, onde se doutorou em Teología. Tendona
apresentar as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) como genuínas realiza-
cóes da Igreja, segundo a linha depensamento de Leonardo e Clodovis Boff,
Gustavo Gutiérrez, Ignacio El/acuna, Jon Sobrino e outros latino-america
nos. Especialmente neurálgico é o capitulo Vdo livro: "A dimensao eclesiat
das CEBs" (pp. 113-139), pois o autor exalta as CEBs sem levar em conta
os desvíos apontados (corrí documentacao) por D. Amaury Castanho, Bis-
po de Valenca (cf. PR 307/1987, pp. 530-538). 0 Prof. Faustino Teixeira
cita numerosos textos em suas notas complementares, que revelam orienta-
coes e rumos duvídosos adotados pelas CEBs; isto, porém, nao influí na ava-
líacao que o autor faz das mesmas.

A importancia que as CEBs atribuem á acao transformadora da soae-


dade é tal que ameaca os próprios conceitos centráis da fé. Assim, por exem-
plo, rezam dois depoimentos preparatorios do II Encontró Intereclesial de
CEBs: "E preciso nascer de novo para receber o Batísmo" e "Acho que para
mim o Batismo só chegou agora. Antes sabia que era batizado porque tinha
padrinho e madrinha. Agora sei, porque tenho um compromisso com os
irmaos" (p. 213, nota 381). A primeira frase corresponde exatamente ao
pensamento dos Batistas (protestantes), para os quais o Batismo é o teste-
munho de conversSo previamente realizada sem o sacramento.

No tocante á autoridade da Igreja, as CEBs se mostram desejosas de


certa isencao, como transparece á p. 137: "Témese o risco de um controle
institucional da autoridade eclesiástica sobre as liderancas leigas, que pode
levar a urna cristalizacao das mesmas". Com referencia á Conferencia dos
Bispos, diz Freí Clodovis Boff, citado á p. 204, nota 327: "A CNBB tere
que adotar um relacionamento homogéneo á natureza original das CEBs...
De todos os modos as exigencias de comunhao (conceito de reciprocidade
- nao se/a isso esquecidol} serio no sentido de CNBBIZAR as CEBs e de
CEBIZAR a CNBB. Ambos os movimentos sao necesarios e ambos muito
delicados". Tais dizeres sugerem mero paralelismo entre CEBs e CNBB, tai-
vez duas irmas que devem procurar concordar entre si!
A "Igreja Nova" é assim entendida: "Está nascendo agora urna Igreja
do povo, desde que assumiram a liberdade dése responsabilizar pelas coisas
da Igreja; entao se considera nascendo urna Igreja nova, do povo, nao só
de urnas pessoas" (Comunidade de Tacaimbó, Pernambuco; citado á p. 216,
nota 395).

239
48 "PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 312/1988

Em suma, embota o autor queira afirmar a auténtica eclesialidade das


CBBs, deixa entrever, através das interessantes citares que faz, as /acunas
dessa eclesialidade decorrentes de urna "democratizacSo" e de urna "protes-
tantízacao", que nao se coadunan) com o conceito de "Igreja-Sacramen-
to" (cf. Lum«n Gentium n? 1).
O livro éelucidativo do pensamento da Teología da Libertacio radical;
o estudo nSo é polémico, mas tendencioso, além de um tanto prolixo e re
petitivo.
E.B.

* **

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