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ISSN 1518-1227 Nº 17 JULHO-SETEMBRO – 2004

B O L E T I M D E A N Á L I S E D O E S TA D O D A A RT E E M R E L A Ç Õ E S I N T E R N A C I O N A I S

SUMÁRIO
Paz em Paris, 1919: a Conferência de Paris e seu
Carlos Rosa da Silveira
mister de encerrar a Grande Guerra

Felipe B. Itaborahy As mudanças da política externa brasileira nos anos


80: uma potência média recém industrializada

A política externa do Governo Sarney – A Nova


Paula Hitomi Nonaka República diante do reordenamento internacional
(1985-1990)

Rogério de Souza Farias Defending Interests: public-private partnerships in


WTO litigation

Virgílio Caixeta Arraes Tobin or not Tobin. Porque tributar o capital


financeiro internacional em apoio aos cidadãos

Priscilla Brito Silva Vieira Geopolítica e Modernidade: a geopolítica brasileira

Wladimir da Silva Nobre Formiga Foreign Policy and Political Regime

Andréa de Alvarenga Pelagagi O homem, o Estado e a guerra: uma análise teórica

Power, Terror, Peace, and War: America’s Grand


João A. C. Vargas
Strategy in a World at Risk

The use of force: military power and international


Carlos Augusto Rollemberg de Resende
politics

Thiago Gehre Galvão Após o liberalismo: em busca da reconstrução do mundo

Modernidade Reflexiva: Uma Conversa entre Anthony


Rafael Schleicher
Giddens e Ulrich Beck
2

Paz em Paris, 1919: a Conferência de Paris e


seu mister de encerrar a Grande Guerra*
Carlos Rosa da Silveira**

MacMillan, Reitora do Trinity Seguindo cronologicamente situações que interromperam os


College e professora da os temas abordados pelo trabalhos do Conselho Supremo,
Universidade de Toronto, onde encontro, MacMillan versa, em como o atentado a Clemenceau e
leciona história das relações primeiro lugar, sobre a chegada dos a viagem de Wilson aos Estados
internacionais, é uma especialista peacemakers a Paris e acompanha a Unidos. Além disso, houve
em política exterior do Canadá. evolução da Conferência até a questões políticas que ameaçaram
Apesar de já ter publicado assinatura dos representantes os trabalhos desse órgão máximo,
1
anteriormente , seria com a alemães do tratado de paz, no como a retirada da Itália4 e a
presente obra que ela seria Salão dos Espelhos em Versalhes3. abordagem da igualdade racial. As
celebrada e reconhecida, ao A Conferência mobilizou parte negociações eram profundas e,
2
receber inúmeros prêmios . determinante da diplomacia muitas vezes, envolviam temas
Bisneta de Lloyd George, européia e, portanto, mundial e muito diferentes, mas isto era
Primeiro-Ministro da Grã-Bretanha sua estrutura não teria necessário para que o tratado de
entre 1916 e 22, seu texto cativa precedentes na história. A divisão paz fosse aceito por todas as
o leitor pela capacidade de em grupos de trabalho e os partes, visto que cada fronteira
vislumbrar os inúmeros detalhes, comitês técnicos foram inovações remarcada e cada indenização a
ao não dispensar um exame da organizacionais que as ser paga gerariam decisões que
vida pessoal e da psique de cada conferências globais apenas iriam repercutiriam na vida de milhões.
personalidade narrada, concluindo consagrar em caráter permanente A questão alemã é
com uma análise histórica dos após maior popularização das profundamente tratada, pois foi
fatos então recentes. Não se organizações internacionais no tema que exigiu trabalho intenso
limitando aos acontecimentos de correr do século XX. do Conselho Supremo5. Foi
Paris, a autora também aborda a Para a conjuntura também extremamente
situação interna de cada governo internacional, não havia pausas, negociado, pois daí dependia a
envolvido, concomitantemente às ao contrário da reunião que volta existência de muitos países que
reuniões que decidiam o futuro de e meia enfrentava reveses. surgiriam da desintegração do
milhões. MacMillan trata então das império alemão e do austro-

* MACMILLAN, Margaret. Paz em Paris, 1919: a Conferência de Paris e seu mister de encerrar a Grande Guerra. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2004, 672p.
ISBN: 85 20916 05 8
** Bacharelando em Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB.
1 Women of the Raj. New York: Thames and Hudson, 1996, 256p. ISBN: 0500278989; Canada and NATO: Uneasy Past, Uncertain Future. Waterloo, Ont:

University of Waterloo, 1990, 162p. ISBN: 0888981015.


2 Como o Prêmio Duff Cooper, o Hessel-Tiltman, o Samuel Johnson e o Governor General’s Literary de 2003.

3 A assinatura do tratado de paz no Salão dos Espelhos tinha um valor especial para os franceses, pois neste mesmo recinto havia sido assinado o armistício

da Guerra Franco-Prussiana, no século anterior.


4 Após sua retirada da Conferência, aclamada pela sua população que se sentia injustiçada pelas grandes potências, o país retornaria após reviravoltas no

governo. Mesmo assim, não obteria o reconhecimento de suas demandas.


5 A autora cita relatos de amigos e parentes dos peacemakers descrevendo-os abatidos ao término da Conferência.
3

húngaro. Controvérsias surgiam a À contextualização com uma pesquisa bibliográfica


todo instante, pois se temiam o competente, acrescentam-se notável, fazem do livro um
perigo bolchevique, a punição explicações sobre o desenrolar de trabalho magistral. Cada prêmio
demasiada à Alemanha e a decisões tomadas, que nem por ele recebido é um merecido
impunidade. Muitos países que sempre respeitavam o ideal da reconhecimento de uma extensa
nasciam, especialmente no Leste nova diplomacia, e salientam-se pesquisa, abrilhantada pela clareza
Europeu e no Oriente Médio, detalhes que muitas vezes e naturalidade de uma historiadora
seriam resultados de negociações passaram despercebidos, mas eram que escreve como se estivesse
que pretendiam acalmar os ânimos. determinantes nas decisões presente em cada decisão
Contudo, nem sempre o direito à tomadas pelas figuras públicas emanada.
autodeterminação seria respeitado. envolvidas, os quais, juntamente

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O iREL-UnB
Os estudos na área de relações internacionais e política exterior do Brasil fazem parte de uma das mais fortes tradições
da Universidade de Brasília – UnB. A vizinhança dos centros decisórios de poder nacional (Poder Executivo, Congresso
Nacional, Tribunais Superiores) e a presença do corpo diplomático acreditado junto ao governo brasileiro, permitem uma
projeção privilegiada para a reflexão especializada feita na UnB – tanto que o seu Departamento de Relações Internacionais
é o mais antigo e mais importante centro especializado do Brasil e um dos mais tradicionais da América Latina.
Fundada em 1974, a área de relações internacionais da UnB mantém um Bacharelado e um programa de pós-graduação
em Relações Internacionais (especialização, mestrado e doutorado), que já formaram mais de mil profissionais, em
sua maior parte atuando junto às agências do Governo Federal, no Ministério das Relações Exteriores, em organizações
internacionais, empresas públicas e privadas e organizações não-governamentais brasileiras e estrangeiras.

Para conhecer as atividades e detalhes dos programas de capacitação e de pesquisa do Instituto de Relações
Internacionais da Universidade de Brasília, visite a sua homepage em http://www.unb.br/irel
4

As mudanças da política externa brasileira nos anos 80:


uma potência média recém industrializada*
Felipe B. Itaborahy**

A década de 80 foi fluxos financeiros e comerciais a multilaterais. Ele ressalta, porém,


marcadamente um período de partir da década de 1960. O autor, que a filiação política terceiro-
alterações para a política brasileira, com as duas características, define mundista do Brasil tinha caráter
tanto no campo interno, como o referencial de análise a ser tático e não estratégico.
conseqüência direta do fim do utilizado no caso. Tal alinhamento teria como
governo militar, quanto no âmbito No início, estabelecem-se os limite o não prejuízo de possíveis
externo, sendo o objetivo do autor aspectos mais relevantes da análise concessões de ordem econômica
explicar quais teriam sido as do grupo, qual seja: potências que o país poderia garantir por
mudanças e como elas ocorreram, médias recém-industrializadas. meio de seus laços às principais
ao relacioná-las essencialmente São eles: a dupla inserção e a ação potências. Nota-se então uma das
com as transformações ocorridas multifacetada desses Estados, ou características citadas pelo autor
no sistema internacional da época seja, a capacidade de apresentarem anteriormente: a ação
para então caracterizar a nova estratégias acentuadamente multifacetada diante dos
matriz de política externa do Brasil. diferentes dentro do cenário diferentes parceiros, com vistas à
Inicialmente, Sennes procura internacional, principalmente extração de vantagens. O autor
estabelecer um parâmetro de quando comparados o âmbito demonstra claramente que a
comparação para a análise da regional e o global; e o padrão de postura terceiro-mundista tinha a
matriz brasileira, ao buscar um comportamento comum entre finalidade de se valer das nações
grupo de países com eles, principalmente o da em condições similares às do país
características semelhantes às do tendência de atuar em instituições como alavanca para o
país na época. Caracteriza o Brasil internacionais e de estabelecer desenvolvimento, o que permitiria
como potência média, ou seja, um relações bilaterais com as grandes vislumbrar o seu caráter
“Estado cujas capacidades e potências. instrumental.
compromissos internos permitem- Isto posto, Sennes destaca as Mais adiante, ele discorre
lhe desempenhar apenas papéis especificidades da matriz da sobre os fatores que levaram essa
restritos e cuidadosamente política externa brasileira, em atuação a um fracasso relativo, ao
escolhidos e assumir iniciativas especial seu alinhamento com destacar as relações amero-
modestas fora de sua própria países do Terceiro Mundo como brasileiras no princípio do governo
1
região” e, posteriormente, como oposição à influência das grandes Reagan e o recrudescimento do
recém-industrializado, por potências e a sua busca em conflito Leste-Oeste em tempos
apresentar rápido processo de consolidar alianças e acordos com de Guerra Fria, que poria em
desenvolvimento manufatureiro e a finalidade de reforçar sua segundo plano as relações Norte-
aumento de sua participação nos presença nos organismos Sul. Por fim, trata da postura do

* SENNES, Ricardo, As mudanças da política externa brasileira nos anos 80: Uma potência média recém-industrializada. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, 2003, 148p. ISBN: 85 7025 700 7.
** Bacharelando em Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB.
5

país com relação a sua inserção maior autonomia dos sistemas consolidada. Sobressai ainda seus
regional, ressaltando a intenção regionais, o que seria de grande aspectos do âmbito multilateral ao
de se tornar preponderante ao interesse para as potências médias. bilateral e expõe colocações sobre
mesmo tempo que evitaria o O Brasil seria afetado, as fragilidades da nova matriz,
aumento da influência de outros principalmente nas mudanças de como, por exemplo, “(...) a falta
países. cunho econômico, ao passar por de participação ativa dos agentes
Diante disto, o autor várias crises financeiras na década sociais mais diretamente atingidos
apresenta os processos que de 80 e ter de reorientar seus por elas (...) e a postura de risco
acarretaram mudanças na inserção fluxos comerciais e, assumida em termos da
do Brasil e das demais nações posteriormente, sua política viabilidade econômica do país
recém-industrializadas no sistema externa em favor dos países do diante do mercado internacional”1.
internacional, que Primeiro Mundo, com a Diante da aparente
conseqüentemente influenciariam conseqüência de se distanciar do reaproximação do Brasil das relações
alterações em suas políticas modelo anterior que priorizava as Sul-Sul durante o início do
externas. Para ele, dois relações Sul-Sul. governo Lula, o livro configura-se
acontecimentos maiores – o Na sua parte final, o autor como uma estrutura teórica
reordenamento do sistema dispõe, em linhas gerais, a valiosa para a compreensão do
econômico internacional e o configuração da matriz emergente renascimento das estruturas
período final da Guerra Fria – da política externa brasileira, terceiro mundistas da política
permitiriam o surgimento de ainda não inteiramente externa brasileira.

1 SELCHER, W. O Brasil no Sistema Mundial de Poder. Revista de Política e Estratégia, São Paulo, v.1, n.1, p.32, 1983.

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O que é Via Mundi


O Boletim Via Mundi é uma publicação digital de periodicidade trimestral editada pelo Instituto de Relações Internacionais
da Universidade de Brasília (iREL-UnB) e veiculada exclusivamente em RelNet – Site Brasileiro de Referência
em Relações Internacionais, iniciativa conjunta do REL-UnB e da Fundação Alexandre de Gusmão, vinculada ao
Ministério das Relações Exteriores do Brasil (FUNAG-MRE), com o objetivo de congregar a comunidade brasileira de
relações internacionais em torno da oferta pública e gratuita de serviços de informação e de pesquisa (disponível em
http://www.relnet.com.br ).
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A política externa do Governo Sarney – A Nova


República diante do reordenamento internacional
(1985-1990)*
Paula Hitomi Nonaka**

Sobre o período da transição ampla abertura econômica e, por contra desigualdades acentuadas.
democrática, há certa lacuna outro, pelas contradições internas O Brasil começaria a procurar
histórica, que abrange as relações geradas da ditadura, o governo parceiros não convencionais e
exteriores do Brasil. Sob esse Sarney, ao mesmo tempo em que encontraria na Argentina forte
aspecto, Analúcia Pereira, doutora apresentava formulações e aliado, com o qual promoveria
em história, propõe uma análise iniciativas autônomas, encontraria acentuada integração, por meio de
sucinta, mas de grande valor barreiras na nova ordem vários acordos, que futuramente
acadêmico. Avalia, pois, traços de internacional, o que exigiria resultariam no MERCOSUL.
continuidade com as políticas dos enquadramentos. Deste modo, Além da China, outras
governos da ditadura militar, esbarraria em uma situação de parcerias seriam desenvolvidas e
assim como as rupturas derivadas impotência frente à conduta de representariam uma tentativa de
das transformações ocorridas no encaixe naquela conjuntura se obter alguma vantagem no
pensamento brasileiro de política internacional. O período ordenamento mundial, bastante
externa, em decorrência dos caracterizar-se-ia, então, pela nocivo aos países em
processos de redemocratização “adaptação e reação”, como uma desenvolvimento, principalmente
interna e mudanças estruturais tentativa de se ajustar à realidade pelas subordinações às políticas
por que o mundo passava à época. mundial distinta. monetárias da dívida externa e
Segundo ela, o governo José A autora faria referência à retaliações comerciais. Desse
Sarney (1985-90), devido ao seu agenda multilateral e ao projeto modo, o governo tentaria ampliar
caráter de transitoriedade de uma do modelo nacional- sua influência e promover sua
ditadura militar para a globalização/ desenvolvimentista, os quais inserção no cenário internacional,
neoliberalismo, apresentaria fortaleceriam os laços com países por meio notadamente da
pontos de continuidade com os de estrutura semelhante, abertura de seu mercado ao
mandatos passados, evidenciados, distanciando-se de um comércio mundial.
por exemplo, na preocupação com alinhamento automático com os Destaque-se, outrossim, a
a distância (desigualdade) norte-sul, Estados Unidos (EUA). participação ativa do Brasil em
bem como com a preocupação da Portanto, a estratégica seria inúmeros organismos
autonomia brasileira diante dos estreitar os laços com a América internacionais, onde, se
Estados Unidos. Latina e demais países periféricos. comparado ao restante da América
Fortemente marcado por A partir daí, o diálogo sul-sul Latina, possuía notável posição.
pressões da situação econômica fortalecer-se-ia com vistas a criar Segundo ela, os foros seriam locais
mundial cuja exigência era a uma corrente de “solidariedade” em que o governo exporia e

* PEREIRA, Analúcia Danilevicz. A política externa do Governo Sarney – A Nova República diante do reordenamento internacional (1985-1990). Porto Alegre:
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2003, 98p. ISBN: 85 7025 699 X.
** Bacharelanda em Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB.
7

defenderia suas idéias, ao denunciar especialmente dos Estados pagamento da dívida externa.
e protestar contra as injustiças Unidos. Entretanto, ela ressalta No livro, portanto, observa-se
cometidas pelos países que, certo grau de continuidade análise percuciente, ainda que
desenvolvidos, como, por com gestões passadas recentes, se lacônica de período peculiar da
exemplo, no tocante à dívida mostraria incompatível com as trajetória nacional, com a hábil
externa. propostas das principais utilização de exemplos tanto de
Em suma, a autora chega potências, principalmente em continuidade bem como de
à conclusão de que a relação à autonomia que o Brasil alteração com vistas às gestões
redemocratização teria facilitado a tanto aspirava. Assim, a presença passadas. Deste modo, a autora
inserção do país no cenário do país no contexto mundial seria alcança o objetivo de dar
internacional, devido ao destacado feita por meio de retaliações considerável contribuição para a
posicionamento estratégico da comerciais e pressões do Fundo supressão parcial da antiga lacuna
América Latina que chamaria a Monetário Internacional (FMI) histórica existente de meados dos
atenção dos países desenvolvidos, por problemas vinculados ao anos 80.

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Os arquivos com resenhas simples para o Boletim Via Mundi devem conter em torno de 75 linhas e os com
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“Contribuição para Via Mundi”.
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Defending Interests: public-private


partnerships in WTO litigation*
|**

A criação da Organização arcabouço regulatório entre OMC. O autor parte da premissa


Mundial do Comércio (OMC) em Estados na área do direito que nem governos, nem atores
meados da década de 90 e a sua internacional do comércio. Esse têm hoje em dia os recursos
evolução até os dias de hoje marco regulador, no âmbito da necessários para avançar os seus
assinalaram, no âmbito mais OMC, é administrado pelo Órgão interesses derivados do
amplo das relações internacionais, de Solução de Controvérsias funcionamento do sistema
duas grandes contribuições para o (OSC) que tem a competência de interestatal. Por um lado, as
desenvolvimento do sistema administrar conflitos relacionados agências governamentais
internacional do pós Guerra Fria. às mais de 26 mil páginas da ata crescentemente dependem do
A primeira é o papel proeminente final do Acordo de Marraqueche conhecimento e desenvolvimento
que atores não estatais que estabelece à OMC. Ao de uma base factual para a
desempenham no sistema contrário de outros instrumentos articulação de um litígio na OMC
multilateral de comércio. Desde a internacionais que servem para elaborado por atores privados,
influência dos executivos da dirimir conflitos entre Estados, o que, por sua vez, dependem dos
American Express Company e da OSC tem uma sofisticação nunca governos para acioná-lo em
Pfizer Corporation na formulação antes presenciada devido ao seu instâncias multilaterais e
do Trade Related Aspects of caráter automático – não pode ser pressionar governos estrangeiros
Intellectual Property Right (Trips) bloqueado pelo demandado – e para se adequar às normas.
1
da Rodada Uruguai até a pela natureza obrigatória de seus Nessa rede de interesses
impressionante mobilização de relatórios adotados. compartilhados, atores não
grupos não governamentais na Os impactos da interseção da governamentais não exercem o
Reunião Ministerial de Seattle de “revolução do direito internacional mero papel de influência nos
2
1999, a OMC é um curioso econômico” conjuntamente com representantes governamentais.
exemplo da forma como o avanço dos atores não estatais O autor defende que redes
estruturas internas e instituições nas relações internacionais sofisticadas de relacionamentos
internacionais medeiam a instigam ampla gama de estudos entre entidades públicas e
influência de redes de atores não nos últimos anos. Defending privadas coordenam a formulação
estatais no sistema internacional. Interests... é mais uma e implementação das políticas
A segunda contribuição vem interessante obra nesse sentido. públicas.
da intensificação das relações O objetivo dela é examinar as No caso específico analisado,
econômicas internacionais que é relações entre o direito os Estados Unidos (EUA) foram o
facilitada e desenvolvida de forma internacional do comércio e os primeiro país ainda durante a
mais eficiente pelo aumento do interesses privados nos litígios da vigência do General Agreement on

* SHAFFER, Gregory C. Defending interests: public-private partnerships in WTO litigations. Washington: Brooking Institution, 2003, 227p. ISBN: 0 8157 7831 7.
** Bacharelando em Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB – e editor-adjunto do boletim Via Mundi.
1 Cf: PREEG, Ernst H. Traders in a brave new world. The Uruguay Round and the future of the international trading system. Chicago: Chicago University, 1995.

2 TRACHTMAN, Joel P. The international economic law revolution. Journal of International Economic Law. Harrisburg, v.33, mar/may 1996.
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Tariffs and Trade (GATT) a criar Law. Na evolução desse sistema, States Trade Representative
procedimentos jurídicos nos quais portanto, as redes públicos- (USTR) – equivalente a um
entidades privadas podem fazer privadas americanas poderiam Ministério do Comércio – e as
petições ao governo para moldar a aplicação jurisprudencial entidades privadas americanas
questionar barreiras ao comércio das regras da OMC de forma que ativas no comércio internacional.
de países estrangeiros. O papel das proporcionasse mais vantagens Enquanto uma firma tem
entidades privadas na formulação aos Estados Unidos. Contudo, por interesse específico, o USTR
e implementação da política voltar-se cada vez mais para a representa sempre o interesse
comercial começa então ser tão tradição da Common Law, nacional. Dessa forma, ele
ativo que a negociadora canadense diminuir-se-ia, em grande medida, considera a interpretação dos
na Rodada Uruguai, Sylvia Ostry, a potencialidade dos americanos instrumentos legais da OMC
afirmou que “(...) os Estados em influenciar o sistema. baseado na gama maior de
Unidos não tem uma política Isso deriva do fato de que, por interesses de seus constituintes. A
3
comercial. Eles têm clientes” . atuar em um sistema em que o resultante, apesar de poder ganhar
O autor, ao analisar a evolução da “precedente” tem importante muitos mais casos no sistema de
participação de entidades privadas relevância política para solução de controvérsias da OMC
na formulação e implementação contenciosos futuros, os EUA atualmente, é que os EUA, por
da política comercial, teve o zelo muitas vezes diminuem a sua saber do poder da jurisprudência
de entrevistar mais de cem belicosidade no sistema para ter em futuros casos, optam por certa
autoridades europeias e certeza de que o entendimento reserva em litígios que poderiam
estadunidenses para construir sua que se chega sobre uma regra ter impactos sistêmicos nos seus
argumentação. atual, não seria utilizada instrumentos de defesa comercial.
Em um estudo comparativo, posteriormente pelos seus O receio de muitos analistas
vai tentar compreender porque as adversários contra os seus que acreditavam que a presença
entidades americanas são mais interesses. O autor dá o exemplo do arcabouço jurídico americano
ativas do que as europeias em de quando os EUA tiveram um influenciaria a OMC a seu favor
construir essas redes e como a relatório de um conselho não procedeu. Contudo, visto sob
“cultura jurídica” do sistema afeta deliberativo favorável aos seus outra perspectiva, o autor enseja a
o desenvolvimento político do interesses em um caso contra a argumentação que leva à
4
tratamento dos conflitos entre os Austrália . Apesar de seu conclusão de que o sistema
membros da OMC. O autor entendimento ter prevalecido, o funciona em detrimento dos
reconhece que os painéis da OMC governo estadunidense países em desenvolvimento, mas
aplicam gradativamente uma questionou certos entendimentos por razão diversa.
abordagem contextualizada, feitos pelos conselheiros que Como sabido, os processos de
estruturada no caso específico, em poderiam, em casos futuros, ser barganha e negociação no âmbito
detrimento a regras genéricas. aplicados contra seus próprios da OMC acontecem muito
Essa tendência representa arranjos de defesa comercial. raramente e os textos negociados
uma mudança de uma abordagem Desse fato, deriva-se aspecto são vagos pela própria forma de
do direito civil para uma relevante da dinâmica de compromisso político que se
alimentada influência da Common relacionamento entre o United desenvolve entre as partes

3 SHAFFER, op. cit., p.23.


4 CHUA, Adrian. The precedential effect of WTO panel and appellate body reports. Leiden Journal of International Law, Leiden, v.11, n.11, p.45-61, p.1998.
5 KUIJPER, P.J. A legal drafting group for the Doha round: a modest proposal. Journal of World Trade, The Hague, v.37. n.6 p.1031, dec 2003.
10

negociadoras. Em face da mais bem posicionados para Common Law não favorece
imprecisão da linguagem, o OSC influenciar a interpretação e necessariamente os países
acaba tendo que interpretar e, aplicação das regras ao longo do desenvolvidos; por outro, o papel
efetivamente, construir o quadro tempo. Se se analisa o histórico de que o OSC tem em decidir, em
normativo da OMC. A todos os casos da OMC, percebe- última análise, o entendimento
consequência é que casos se que os EUA participaram – específico das regras, sem dúvida
individuais da OMC funcionam dados de Janeiro de 2003 – de 97% alguma, funciona em detrimento
não somente para resolver a dos casos que resultaram em dos países em desenvolvimento.
controvérsia em questão, mas adoção do resultado do conselho Dessa forma, a chamada
também para interpretar e moldar ou decisão da apelação. A União legalização dar relações
as regras da OMC, já que não Europeia vem atrás com 81% de internacionais não coadunaria
existe âmbito legislativo ou participação. Por sua vez, nenhum com o ideal pós-moderno de
executivo no qual se possa realizar país de menor desenvolvimento retirar das relações internacionais
5
essa tarefa . relativo – mais pobres do mundo – a categoria diferencial de poder. O
6
Os governos que participam até hoje participou do sistema . que existe, portanto, são regras
mais ativamente do sistema de Conclui-se, por um lado, que mediadas por ela, sem exerce-las
solução de controvérsias da o fato do sistema caminhar cada diretamente, mas dissimuladas em
organização, portanto, estariam vez mais para o sistema da estruturas de governança.

6 LEITNER, Kara, LESTER, Simon. WTO dispute settlement 1995-2003: a statistical analysis. Journal of International Economic Law. Washington, v.7, n.1,
p.169-181, mar 2004.
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Tobin or not Tobin. Porque tributar o capital


financeiro internacional em apoio aos cidadãos*
Virgílio Caixeta Arraes**

O presente ensaio de restabelecer uma regulamentação assim relativamente, porque não


Chesnais, professor de economia pública internacional”, p.12. Taxar se tocaria na questão do sigilo
da Universidade Paris XIII e ex- as operações de câmbio para bancário. Inclusive, recomendar-
assessor da Organização para apenar a especulação significaria – se-ia aos países da periferia a
Cooperação e Desenvolvimento especialmente para países abertura acionária de seus bancos
Econômico (OCDE), faz parte do periféricos – mais segurança ao à participação dos congêneres
posicionamento que defende a sistema. internacionais; b) realce na
Associação pela Tributação das Todavia, mesmo diante de supervisão do dia-a-dia das
Transações Financeiras em apoio percentual modesto, nem a economias emergentes pelo FMI,
aos Cidadãos (ATTAC) em vista chamada 3ª Via batalhou para com o objetivo de agregar mais
da insegurança perpetrada pela efetivá-lo, por causa do temor informações, que possibilitariam
abertura irrestrita no processo de habitual de melindrar os mercados, restringir o risco de novas crises.
globalização que, nos últimos constantemente abalados por Em tal ambiente, advogar-se-
anos, deságua de tempos em crises, o que implicaria ia a idéia de que os fundos de
tempos em sérias crises como no contradição, dado que exatamente pensão e de investimento
caso do México, Tigres Asiáticos e a partir de sua aplicação haveria a tivessem mais salvaguardas. Para
Rússia. diminuição de tais momentos de isto, seria necessária até mesmo a
Com vistas a diminuir a incerteza. Sua eventual adoção criação de um novo organismo
instabilidade, propõe-se a cobrança seria uma medida modesta se internacional, que se comportaria
do imposto Tobin – referência ao comparada com o controle dos da mesma forma que o Banco
seu inspirador, James Tobin, Nobel movimentos de capitais e Central dos Estados Unidos em
de Economia de 1981 – cujo encaixar-se-ia nos padrões de relação à quebra da bolsa do país,
percentual – entre ¼ a 1 – a ser relativa solidariedade e igualdade ao emprestar recursos com vistas a
cobrado, em escala global ante as do cânone social-democrata. ajudar o fundo especulativo, na
operações do mercado de câmbio, Como contrapartida à visão do autor, Long Term Capital
contribuiria para frear o ímpeto cobrança, haveria duas Management (LTCM). Assim, o
especulativo ao mesmo tempo em recomendações emanadas dos novo organismo socorreria países à
que poderia ser aplicado no governos e meios de comunicação beira da falência, com a
combate à desigualdade. dos principais países, as quais preservação dos investidores ante
Na visão do autor, seria “(...) seriam: a) ênfase na transparência aplicações mal sucedidas.
afirmar a necessidade de destruir o dos bancos em detrimento dos Por que privilegiar os fundos?
poder do capital financeiro e de fundos de investimento, mesmo A justificativa seria porque eles

* CHESNAIS, François. Tobin or not Tobin. Porque tributar o capital financeiro internacional em apoio aos cidadãos. São Paulo: UNESP, 1999, 79p. ISBN: 85 7439 266 8.
** Doutorando em História das Relações Internacionais do Departamento de História da Universidade de Brasília – UnB – e professor colaborador do
Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.
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providenciariam a apropriação dívida pública – obrigações, por estruturadas sob distintas


prévia de parte do ser o instrumento mais eficiente legislações nacionais. Uma das
desenvolvimento internacional, da liberalização financeira no conseqüências, como já
ao deter obrigações e ações que, tocante à transferência de riqueza mencionado, de sua
por sua vez, lhes assegurariam entre classes e países. Destarte, se implementação seria o reforço à
prover elevados e estáveis se fosse alterar profundamente o execução de maior autonomia às
rendimentos a seus associados, sistema atual, dever-se-iam políticas econômicas internas,
incluindo (futuros) aposentados. tributar não só as operações principalmente com relação à
Dentro desta lógica, os fundos, cambiais, mas as relativas ao especulação financeira sobre suas
em ambiente de liberalização investimento externo direto (IED) moedas.
financeira, teriam de especular, se e lucros, que seriam o tripé da Assim, o posicionamento a
almejassem auferir melhores apropriação rentista, na opinião favor do imposto Tobin decorreria
lucros. Não se menciona, por do economista norte-americano mais de seu caráter educativo,
outro lado, que as transferências Howard Watchell. com vistas a estimular reflexão
desmedidas de riqueza entre Ante o exposto, segundo mais ampla sobre os fundamentos
classes e países ocasionam Chesnais, o novo imposto seria do atual capitalismo, de cunho
desemprego, precariedade/ então meio até ponderado e financeiro. Diante da constatação
flexibilização das relações de sensato em face da onda do malogro social produzido por
trabalho e diminuição de salários e avassaladora do liberalismo e da meio da uniformização das
das redes de proteção social. desregulamentação financeira e práticas econômicas no âmbito
Consoante o autor, o campo incomodaria apenas os mundial, na última década e meia,
mais importante para o Fundo movimentos de curto prazo, sem retomar o debate já seria um passo
Monetário Internacional (FMI) abordar os rendimentos notável.
seria o mercado de títulos da decorrentes de ações e obrigações,

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Geopolítica e Modernidade: a geopolítica brasileira*


Priscilla Brito Silva Vieira**

Veterano da Segunda Guerra iniciado no estágio de atenção Travassos, Everardo Backheuser,


Mundial e ex-Comandante da normativa até se consolidar em Alberto Torres, Oliveira Vianna,
Brigada Latino-Americana da conhecimento sistemático e, daí, Gilberto Freyre, Pandiá Calógeras
Força Interamericana de Paz para a em teoria positiva”, p.17, ou “É a e Therezinha de Castro.
República Dominicana (1965-66), política aplicada aos espaços Sob sua influência, Meira
Meira Mattos, doutor em ciências geográficos sob a inspiração da Mattos aponta os rumos
políticas, reformou-se como experiência histórica”, p.29. marcantes do pensamento
General de Exército. Estudioso da Baseia-se em inúmeros autores, geopolítico nacional: a idéia de
geopolítica, é autor, dentre outros, dentre eles: Heródoto, Platão, império; a importância do
de Uma Política Pan-Amazônica Aristóteles, Bodin, Hegel, Kant, desenvolvimento e da defesa da
(1980), Geopolítica e Trópicos (1984) Montesquieu até chegar a Ratzel, região amazônica; a maritimidade
e Geopolítica e Teoria de Fronteiras Vidal de la Blache, Mahan e e a presença estratégica do país no
(1990). Mackinder. Atlântico sul; a necessidade de
Em seu último livro, Meira Da primeira parte, chamam uma política de interiorização e
Mattos busca “(...) avaliar como o atenção os comentários tecidos integração, do desenvolvimento
impacto de modernização (...) sobre o direito internacional, a aeronáutico, do desenvolvimento
poderá vir a influir na equação de soberania, o Estado como econômico, social, científico e
poder do Estado no que se refere à principal ator e o “colonialismo tecnológico, para que o país
importância de sua geografia”, p.5. tecnológico”. Sua conclusão pudesse vir a ser uma das grandes
A obra divide-se em duas: primeira é que os três ramos potências mundiais com força
fundamentos e modernização e científicos formadores da militar de dissuasão estratégica e
geopolítica brasileira – geopolítica enriqueceram-se na diplomacia firme e convincente1.
predecessores e geopolíticos. batalha da modernidade, de forma Na última parte, o autor
Na primeira parte, debate-se que a ela, a geopolítica, está mais ressalta a “(...) importância capital
o conceito de geopolítica, ramo da bem aparelhada para avaliar o da educação para a formação de
ciência política, formado da interesse nacional ou elites diversificadas (...) e de um
interação dinâmica da geografia – internacional de sua causa. povo capaz de utilizar os
espaço físico – da política – Posteriormente, a geopolítica instrumentos de progresso. A
aplicação do poder à arte de é analisada a partir de uma diplomacia, para a preservação dos
governar – e da história – perspectiva brasileira, com interesses nacionais, assume
experiência humana. Para ele, “É o destaque para os nomes de relevância excepcional”, p.105.
produto da evolução da Osvaldo Meira Penna, Gabriel E arremata: “Eis a nossa
observação gradual da ação do Soares de Souza, José Bonifácio e MISSÃO: ‘VITALIZAR O
homem na exploração do meio Alexandre de Gusmão. Além deles, POTENCIAL HUMANO E
natural, percorrendo o caminho há menção também de Mario GEOGRÁFICO DO PAÍS, A FIM

* MATTOS, Carlos de Meira. Geopolítica e Modernidade: geopolítica brasileira. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 2002, 156p. ISBN: 85 7011 306 4.
** Bacharelanda em Relações Internacionais da Universidade de Brasília.
1 MEIRA MATTOS, op. cit., p.90-1.
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DE CONSTRUIR UMA DAS uma revisão bibliográfica a partir estréiam no estudo da geopolítica
NAÇÕES MAIS PRÓSPERAS E do objetivo proposto, ao buscar e almejam ter contato com os
RESPEITADAS DO MUNDO’” – corroborar sua tese com seus principais fundamentos e
grifo do autor, p.106. argumentos dos mais ilustres autores. O próprio autor declara:
O livro ainda contém dois pensadores dos diversos campos “Em síntese, a geopolítica
anexos do professor doutor Philip da geopolítica. continua viva e seu estudo,
L. Kelly sobre o conjunto da obra O seu estilo direto e claro indispensável ao estadista e aos
de Meira Mattos. Por fim, observa- torna a leitura dinâmica, sendo formuladores de política”, p.34.
se que Meira Mattos apresenta indicado para pesquisadores que

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Nota aos Autores de Livros e Editoras


O Boletim Via Mundi é alimentado pelas contribuições autônomas de professores, pesquisadores, estudantes de
graduação e pós-graduação e profissionais ligados à área, que produzem resenhas e artigos de resenhas sobre os
últimos livros publicados no Brasil e no exterior sobre assuntos de interesse para a área. Além disso, o Boletim Via
Mundi conta com a colaboração permanente de um corpo de professores e estudantes de mestrado e doutorado do
Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília, que produzem resenhas sobre a produção bibliográfica
recém-lançada no mercado editorial brasileiro. Se a sua editora deseja ver os lançamentos da área de relações
internacionais e áreas conexas resenhados e divulgados em Via Mundi, envie pelo menos um exemplar para o
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Boletim Via Mundi
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Brasil
15

Foreign Policy and Political Regime*


Wladimir da Silva Nobre Formiga*

O fim da Guerra Fria revelou que eles não estão totalmente Como o comunismo era a
uma falha do racionalismo de errados, pois existem exemplos nova ameaça à democracia, os
realistas e liberais no estudo das históricos que se encaixam com Estados Unidos (EUA) passaram a
Relações Internacionais, ao suas palavras. Cita os exemplos da adotar tal estratégia para conter o
redescobrir-se o valor da história e Alemanha e França avanço soviético em várias partes
da experiência comparativa entre respectivamente: no primeiro do globo, inclusive na instalação e
sociedades no decorrer do tempo. caso, a política externa muda com manutenção de regimes
O livro tem, justamente, o intuito o passar do tempo, de acordo com autoritários em países periféricos.
de revisar o campo da política a ideologia de cada governo; no Tal estratégia é usada até hoje,
externa dos Estados através da segundo, apesar de suas mudanças como a guerra do Iraque e as ações
perspectiva das diferenças entre políticas – da Monarquia até a 5ª antiterroristas.
os regimes políticos. República –, sua política externa Ao abordar o totalitarismo,
Em sua primeira parte, os mostrou certa continuidade. diferencia o totalitarismo fascista
autores preocupam-se em dar base Para tentar desmentir a do soviético, porque o primeiro
para o início do debate, ao associação automática entre estaria diretamente ligado à
mostrar diferentes visões teóricas, democracia e cooperação e entre guerra, ao acreditar que foi decisão
para que se pudesse considerar o autoritarismo e guerra, Frank fala divina a criação de hierarquia
estudo do tema sob nova da síndrome de Munique. No entre os países; o segundo, por
abordagem. Partem da iniciativa momento em que as potências sua vez, busca os ideais de paz,
de que não há relação direta e democráticas poderiam evitar que igualdade, justiça social e não
automática entre regimes a Segunda Guerra Mundial viesse a precisa da guerra para provar
democráticos e política externa de ocorrer, seus líderes, seguindo o alguma coisa. Ele afirma que o
cooperação ou entre regimes ideal democrático, tentaram governo de Stálin era prudente,
autoritários e guerra. Mais resolver a crise na Europa pelos pois tinha a consciência da
adiante, mostram estudos de caso meios pacíficos, mas sem existência de um equilíbrio de
em visão comparativa, ao analisar resultados positivos. Para se evitar poder em escala internacional.
a política externa dos Estados do outras guerras – como a que Também Stalin tentou criar
ponto de vista de seus respectivos acabara de acontecer – os países uma imagem negativa dos EUA,
regimes políticos. democráticos recorreriam à força. voltada para a guerra, enquanto
Dentre os autores da Assim, para os países seu país dizia “não” a ela – a não
primeira parte, destaca-se Robert democráticos do pós-Segunda ser que fosse imposta – e dizia
Frank. Para explicar a relação Guerra, preferir-se-iam “guerras “sim” à revolução. A história
existente entre política externa e pequenas” para a preservação da mostra que, quando um ditador
regime político, Frank menciona o democracia do que tentativas contraria o concerto das nações,
ideal liberal e o realista e assinala pacíficas de parar o inimigo. ele acaba por ser derrotado –

* SARAIVA, José Flávio Sombra, ed. Foreign Policy and Political Regime. Brasília: Instituto Brasileiro de Relações Internacionais, 2003, 364p. ISBN: 85 88270 12 9.
** Bacharelando em Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB.
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Hussein no Coveite em 91 e na política externa, como nos a tomada de decisões e as


Milosevic no Kôsovo em 99. casos da implementação do estruturas de sua inserção
Frank, por fim, aponta as Estado Novo, em 37, ou na fase de internacional à ordem capitalista
contradições entre democracia redemocratização, em 85. A – tratados desiguais.
nacional e internacional. Tal história também demonstra que, Com o declínio das
contradição existe por várias dentro de um mesmo regime, exportações de produtos
razões, dentre elas o fato de que houve diferentes modelos de primários, juntamente com os
nem todos as nações são política externa, como no caso da diversos problemas resultantes das
democráticas e com isso como mudança feita pelo Barão de Rio transformações sociais, haveria a
poderia existir uma democracia Branco em 1902. Cervo frisa que ruptura na esfera política nos
mundial se nem todos os seus há elementos que são países latino-americanos. O
participantes acreditariam nela? A independentes e influenciam o sistema anterior não seria mais
Organização das Nações Unidas modo de inserção internacional de compatível com a nova realidade
(ONU) é um bom exemplo dessa um país, como a identidade internacional, ao levar a criação
contradição. Ela tem a China nacional e cultural e a capacidade de projetos nacionais. No Brasil, a
como país com poder de veto no de estabelecimento de um nova elite se aproveitaria da
Conselho de Segurança. Além do consenso interno, por exemplo. formação de blocos internacionais
mais, os países democráticos não No caso brasileiro, o que – liderados pelos EUA e Alemanha
querem abrir mão de suas parece influenciar mais é a sua – para negociar sua entrada na
soberanias democráticas nacionais identidade, ao trazer mudanças guerra em troca de assistência à
em prol de uma democracia devido a cinco fatores específicos: industrialização, manobra muito
internacional. legado histórico, contexto da bem organizada por Getúlio Vargas
Em sua segunda parte, vizinhança, inserção assimétrica – eqüidistância pragmática. No
sobressai a análise de Amado de potência média, caso, diferentes regimes políticos
Cervo que analisa o caso brasileiro desenvolvimento de novos influenciariam a inserção
na questão abordada pelo livro, ao objetivos de política externa e internacional do país.
afirmar que a mudança da política processo de abertura a partir de Por fim, os seus diversos
externa e do modo pelo qual o 90. Tais elementos minimizariam autores buscam abordar as
país se inseriu internacionalmente o papel dos regimes políticos na relações entre política externa e
ocorre sob influência de fatores definição da política externa. regime político – relações
específicos que podem ou não Porém, o autor também ignoradas pelos estudos clássicos
estar relacionados à mudança de acredita que regimes da área – cada um à sua maneira,
regimes ou à sucessão de governos influenciaram a inserção de forma precisa e direta. Assim,
dentro de um mesmo regime. internacional do país. Como torna-se o livro referência para o
A experiência histórica exemplo, a alteração após a crise estudo de teoria das relações
brasileira mostra que de 29. Antes dela, o Brasil adotava internacionais por sua nova forma
transformações políticas não um modelo político e econômico de abordar o tema.
levam imediatamente a mudanças liberal-conservador, que transferia

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O homem, o Estado e a guerra: uma análise teórica*


Andréa de Alvarenga Pelagagi*

Waltz, cujo cinqüentenário Mais adiante, ele trata da desejo, o conflito, que por vezes
do presente livro celebra-se este segunda imagem, ou seja, do leva à guerra, está fadado a ocorrer.
ano, procura compreender as Estado. A proposição considerada A fim de alcançar um desfecho
causas da guerra através da então é a de que “(...) por meio da favorável nesse conflito, os Estados
análise, como sugere o título, por reforma dos Estados, as guerras têm de confiar em seus próprios
diferentes níveis ou, como ele podem ser reduzidas ou eliminadas dispositivos, cuja relativa eficiência
prefere chamar, por distintas para sempre”, p.105. Neste tem de ser sua constante
imagens: o homem, o Estado e sua momento, o autor se vale da preocupação”, p.198.
estrutura. A parte inicial é tradição liberal para expor o
dedicada à visão do homem, onde argumento e, simultaneamente, Waltz recorre ao pensamento
se afirma que “(...) o local das para refutá-lo. de Rousseau aplicado à política
causas importantes da guerra Assume-se que a fé na internacional. A guerra é apontada
reside na natureza e no democracia, ou em todo tipo de como uma conseqüência da
comportamento do homem. As organização das unidades que anarquia internacional. Enfatiza-
guerras resultam do egoísmo, de compõem o sistema internacional, se a estrutura política: o conflito
impulsos agressivos mal pode levar a dois tipos de ocorreria simplesmente, em sua
canalizados, da estupidez. As posicionamento: o não- visão, porque não haveria um
outras causas são secundárias e intervencionismo otimista – poder superior; deste modo, a
devem ser interpretadas à luz posição de Kant, Cobden e Bright força estaria sempre presente para
desses fatores”, p.24. Para tratá-la, – e o intervencionismo a solução de choque de interesses.
o autor recorre a Santo Agostinho, messiânico – Paine, Mazzini e Isto posto, o autor apresenta
Espinosa e Morgenthau, os quais, Wilson. De qualquer uma destas a tendência à política de equilíbrio
resguardadas suas diferenças, posturas, todavia, infere-se que a de poder, segundo a qual a “ (...)
apontam para as relações razão não seria suficiente para estratégia de todos depende da
internacionais com base na orientar os Estados à busca da paz estratégia de todos os outros”,
natureza humana. – asserção que Waltz procura p.248, e, assim, lança as bases
Waltz, como contrapartida, exemplificar com breve análise para o que seria sua Theory of
argumenta que não podendo a sobre a relação entre o socialismo International Politics, obra de 1979,
natureza humana ser modificada – e a Primeira Guerra Mundial. em que inaugura o realismo
diferentemente das instituições A parte última debruça-se estrutural – neo-realismo. A
sócio-políticas – não seria ela, sobre a terceira imagem, que é leitura desta obra é obrigatória
assim, a chave para alcançar a paz. relacionada à estrutura do Estado, para os que pretendem
Nesse sentido, previne contra a com o seguinte cenário: compreender o diálogo
ingenuidade de autores estabelecido pela escola realista
comportamentalistas e contra a “Com tantos Estados soberanos, das relações internacionais, em
falácia racionalista que sugere a sem um sistema jurídico que possa que se somam filosofia e ciência
“reorientação das mentes”, isto é, ser imposto a eles, com cada política e também para os que
a busca da paz mediante o Estado julgando suas queixas e queiram iniciar o estudo da
aperfeiçoamento dos homens e de ambições segundo os ditames de política internacional nos níveis
suas inclinações. sua própria razão ou de seu próprio propostos e analisados pelo autor.

* WALTZ, Kenneth N. O homem, o Estado e a guerra: uma análise teórica. São Paulo: Martins Fontes, 2004. 331p. ISBN: 85 336 1950 2.
* Bacharelanda em Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB.
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Power, Terror, Peace, and War: America’s


Grand Strategy in a World at Risk*
João A. C. Vargas*

Nos últimos três anos, vários direito internacional. Segundo o Esta negligência permitiu não
autores buscaram entender as autor, a crença na convergência só a ebulição de sentimento
implicações da política externa do harmônica não diminuiu após o antiamericano no Oriente Médio,
governo Bush para o mundo. fim da Guerra Fria; ao contrário, como também entre os seus
Neste livro, porém, Walter Russell com a vitória do liberalismo próprios aliados, divididos em dois
Mead, eminente estudioso da área proclamada por Fukuyama, grupos: um, como a Alemanha,
e membro do Council on Foreign passou-se a acreditar que ela seria que deseja maior força para as
Relations, se coloca outro desafio: acelerada. Todavia, isto mudaria instituições internacionais e vê os
entender a gestão Bush dentro do com os ataques de 11 de Estados Unidos como uma
contexto histórico maior da setembro. ameaça para a convergência
política externa americana e o seu Para ele, os ataques harmônica internacional; e outro,
possível legado. decorreram principalmente de dois como Rússia e França, adepto da
De início, Mead analisa o fatores: a substituição do fordismo tradicional política de poder, que
contexto histórico no qual Bush se pelo capitalismo milenar, tipificado tenta usar as instituições
encontrou após 11 de setembro de pela flexibilização da internacionais como instrumentos
2001. Primordial entre as suas regulamentação do mercado e pela para conter a hegemonia
preocupações é o fordismo, nome difusão da mentalidade americana.
atribuído por ele à forma de consumista gerada pelo próprio Enquanto se processavam
capitalismo caracterizada pela fordismo para outras instituições essas mudanças no campo
colaboração entre o Estado e o sociais, inclusive governos. As internacional, o autor afirma que,
mercado e a regulamentação do mudanças provocadas pelo novo nos Estados Unidos, se
segundo pelo primeiro. capitalismo gerariam desencadeava o ‘revivalism
Intimamente ligado ao conceito, ressentimentos no mundo inteiro americano’, movimento liderado
está a noção de convergência contra os americanos – maiores por conservadores que buscaram
harmônica, um círculo virtuoso no adeptos desta revolução; o reformular os termos do debate
qual o capitalismo traz maior segundo é a “década perdida” da político do país, ao trazer um
produtividade, melhores condições política externa norte-americana – renascimento religioso e moral,
de vida, mais educação, 1989 a 2001 – durante a qual os uma aceitação do capitalismo
fortalecimento da democracia, Estados Unidos (EUA), inebriados milenar e uma celebração do
dentre outros benefícios. No com a vitória sobre o comunismo, “espírito nacional”. Mead examina
plano internacional, a descuidaram da manutenção do o impacto deste movimento nos
convergência harmônica propicia seu “projeto” de construção de principais grupos políticos norte-
uma força cada vez maior para as uma ordem mundial estável, americanos: hamiltonianos –
instituições internacionais e o pacífica e próspera. nacionalistas econômicos que

* MEAD, Walter Russell. Power, Terror, Peace, and War: America’s Grand Strategy in a World at Risk. New York: Alfred A. Knopf, 2004, 226p. ISBN:1 4000 4237 2.
* Bacharelando em Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB.
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passam a aceitar e apoiar o das elites do resto do mundo em Estados Unidos. A liderança do
capitalismo milenar; relação ao país. Contudo, acredita país deverá ser exercida dentro da
jeffersonianos – isolacionistas; que os passos dados pelo governo estrutura das instituições
wilsonianos – internacionalistas Bush apontam a direção do que internacionais, que precisarão ser
idealistas, cada vez mais será a política externa dos Estados reformadas. O autor insiste em
preocupados com valores Unidos nas décadas vindouras, um apoio americano para reforma
americanos e menos com que deverá ser buscada não no da Organização das Nações
instituições internacionais; e esgotamento do revivalism, mas Unidas (ONU) – até
jacksonianos – nacionalistas sim de seu amadurecimento. pormenorizando uma proposta
populistas ansiosos para defender Para o futuro, apontar-se-iam relativa ao Conselho de Segurança
o individualismo tradicional dois desafios: a luta contra a – e também para o fortalecimento
americano. Essa tipologia ameaça terrorista e a revitalização de organizações regionais.
inovadora está entre as mais do projeto americano. Em relação Ademais, será necessário garantir
valiosas contribuições do livro, ao primeiro, Mead traça um a inclusão daqueles até agora
sendo poderosa ferramenta para paralelo entre a “guerra contra o excluídos dos benefícios do
organizar os debates sobre o tema. terror” e a sua antecessora, a capitalismo milenar. Só assim,
Mead, ao analisar a conduta “guerra metafórica”, isto é, a conclui, os Estados Unidos
do governo Bush após o 11 de Guerra Fria. Ele propõe a poderão assegurar a estabilidade e
setembro, vê uma política ressurreição da contenção como prosperidade no mundo.
condicionada fortemente pelo princípio organizador do esforço Embora se possa argumentar
revivalism, tanto no desejo de antiterrorista: adaptada à contra várias de suas propostas e
espalhar valores americanos pelo realidade atual e dotada de caráter conclusões, não há dúvida de que,
globo, quanto pelos seus apelos mais afirmativo, ele crê que ela na presente obra, Russell Mead
populistas. De modo geral, seria um conceito capaz de ser apresenta uma visão coerente,
observa positivamente a política bem-aceito pelos seus aliados. dinâmica e própria da evolução e
externa de Bush, quando não Suas propostas para esse forward dos rumos da política externa
inevitável em prol das mudanças containment são ousadas, detalhadas norte-americana. Recomenda-se
internas e externas; porém, critica e bem-pensadas, ao englobar vivamente o livro não só aos que
duramente a sua implementação, dimensões políticas, militares e se interessam pelo estudo dos
especialmente quanto à culturais. Estados Unidos, porque as
inabilidade de justificar a guerra Ao debater a revitalização do transformações por ele
no Iraque, à incompetência no projeto americano, afirma que se vislumbradas e sugeridas não
trato diplomática com a Europa e vive em um mundo cada vez mais deixam intocadas nenhum
à falta de ação positiva para antiautoritário e menos disposto a aspecto da vida internacional.
combater a progressiva alienação aceitar a liderança unilateral dos

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The use of force:


military power and international politics*
Carlos Augusto Rollemberg de Resende*

Os organizadores da obra são situações em que os Estados internacional. A atenção dada pela
renomados acadêmicos de relações podem e usam seu poder militar e política externa do governo Bush à
internacionais: Art, professor de quais os efeitos militares da ameaça terrorista e proliferação de
política externa americana da revolução nuclear no modo armas de destruição em massa
Universidade Brandeis, é autor de operacional dos Estados – provoca uma revisão, por parte de
United States and coercive diplomacy destacam-se Jervis e Waltz sobre muitos acadêmicos mundo afora,
e International politics: enduring armas nucleares; sobre o papel do uso da força nas
concepts and contemporary issues, Na segunda, há a reflexão relações internacionais.
enquanto Waltz, professor da sobre as idéias levantadas Ao debate sobre o dever de
Universidade Columbia, tornou-se anteriormente, por meio de casos ingerência, soma-se a polêmica
referência com Theory of concretos de uso da força, desde a sobre a defesa preventiva. Depois
International Politics. Ambos têm I Guerra Mundial até a Guerra do de alguns anos de esperança na
conhecida produção sobre a Afeganistão – iniciada após o 11 década de 1990, foi desacreditada
ameaça e uso de força na política de setembro de 2001 – a possibilidade do funcionamento
internacional, sendo que Art sobressaindo os artigos de Louis efetivo da segurança coletiva sob
preocupa-se em analisar esses Morton – sobre a decisão de se égide da Organização das Nações
elementos na política externa usar a bomba atômica contra o Unidas (ONU). A nova doutrina
americana, ao passo que Waltz Japão em agosto de 1945 – e o de de segurança nacional – formulada
atenta para o papel das armas John Gaddis – relativo à Guerra do pelo governo americano após os
nucleares nas relações Vietnã. A última trata de três ataques terroristas à Nova Iorque,
internacionais pós-1945. Outros importantes questões da área de invasão do Iraque, atritos com a
renomados acadêmicos também segurança internacional no pós- Coréia do Norte e Irã e constante
contribuem com o livro como Guerra Fria: a preponderância ameaça terrorista – contribui para
John Lewis Gaddis, Morton militar dos Estados Unidos (EUA), aumentar a noção de insegurança
Halperin, Robert Jervis, Walter a proliferação de armas nucleares e global. Com a continuidade de
Laqueur, John Mearsheimer, Scott a ameaça do terrorismo, conflitos no Afeganistão e Iraque
Sagan e Jack Snyder. merecendo atenção o texto de – além do atentado de 11 de
O livro divide-se em três: Laqueur sobre a nova face do março deste ano em Madri –
estratégias do uso da força; terrorismo internacional. aumenta-se a percepção de que
estudos de caso sobre a sua Não há dúvidas de que, após segurança não se estabelece
utilização; e questões militares 11 de setembro, as questões de somente com a aplicação da força.
atuais. A primeira debate quais as segurança estão no topo da pauta

* ART, Robert, WALTZ, Kenneth, orgs. The use of force: military power and international politics. 6ª ed. New York: Rowman & Littlefield: 2004, 483p.
ISBN: 0 7425 2557 0.
* Bacharelando em Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB.
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Em um contexto em que as país. Saliente-se que há medidas uso da força na política


regras da sociedade mundial para mudar essa situação como as internacional. Deste modo,
parecem desmanchar-se, o estudo especialmente tomadas pelo apresenta-se como coletânea de
de segurança internacional torna- Ministério da Defesa: promoção textos significativos para a
se tanto mais atraente como de ciclos de debates e concursos compreensão de um tema que não
necessário, principalmente no de teses sobre defesa nacional. pode ser ignorado nas relações
Brasil, onde há defasagem entre a Nesse sentido, a obra oferece internacionais contemporâneas: o
produção acadêmica e as interessantes análises de teoria e poder militar.
necessidades e possibilidades do de casos concretos relativos ao

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Boletim de Análise do Estado da Arte em Relações Internacionais


Publicação digital trimestral do Departamento de Relações Internacionais
da Universidade de Brasília – Nº 17 – Jul-Dez – 2004 – ISSN 1518-1227

Publicação digital de periodicidade trimestral do Departamento de Relações Internacionais da Universidade


de Brasília, distribuída exclusivamente em RelNet – Rede Brasileira de Relações Internacionais
( http://www.relnet.com.br ).

Redação: editoria@relnet.com.br

Editor: Virgílio Caixeta Arraes

Editor-adjunto: Rogério de Souza Faria

Conselho Editorial: Antônio Carlos Lessa, Antônio Jorge Ramalho da Rocha, Alcides Costa Vaz, José Flávio Sombra
Saraiva, Pio Penna Filho.

Editoração: Samuel Tabosa de Castro


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Após o liberalismo: em busca da


reconstrução do mundo*
Thiago Gehre Galvão*

O colapso da União Soviética capitalismo iria se expandir sobre como base a idéia dos grandes
(URSS) e as modificações da ele na sociedade internacional ciclos de Kondratieff, que
economia internacional, iniciadas européia e a partir dos processos caracterizariam a evolução da
desde 1945 e intensificadas a imperialistas das grandes economia mundial ao longo do
partir de 1989, cada vez mais se potências entre 1815 e 1914. tempo, de continuada ascensão –
afirmam como marco das Além disso, as sociedades seriam fase A – e declínio – fase B – num
modificações do sistema mundial, transformadas no pós-Segunda intervalo mais ou menos regular
o que tem repercussões tanto do Guerra Mundial com o aumento de 50 anos cada. Mais adiante,
ponto de vista dos processos da participação política da classe identifica os cenários possíveis
históricos quanto dos estudos trabalhadora – sufrágio universal – entre 1990 e 2025, quando se
acerca das relações internacionais. bem como pela sua participação entraria numa nova fase A, assim
Wallerstein, bem conhecido pelo na distribuição do excedente – como as esperanças para a
clássico The modern world system Estado de bem-estar social – que periferia do sistema, em especial o
(1974), apresenta nos últimos seriam frutos da pretensa benesse continente africano, ainda
anos duas obras de peso, Após o liberal. fragilizado e esquecido.
liberalismo e Declínio do império Já o objetivo da obra é o de Mais à frente, retrocede na
americano, que são apresentar todos os elementos história para demonstrar o triunfo
complementares em seus formadores e caracterizadores do da ideologia liberal, que perduraria
objetivos e seguem a mesma liberalismo como tenaz dos entre 1789 e 1989. Aponta para a
tradição teórica (sistema-mundo) processos históricos que polarização do mundo das idéias
e metodológica (longa duração) de movimentaram o sistema mundial em torno do liberalismo que, ao
pensamento. Não por acaso ele é entre 1789 e 1989, ao mesmo servir de base para a legitimação
Diretor do Centro de Estudos tempo que avança para propor as do Estado-nação após a Revolução
Fernand Braudel, sediado na possibilidades futuras – cenários – Francesa, veria nascer e evoluir o
Universidade de Binghamton, em das relações internacionais do conservadorismo e o socialismo –
Nova York. século XXI, num mundo em que a ideologias concorrentes – como
A sua linha central de única certeza é a do colapso da apêndices do liberalismo. Todas
pensamento é que a base ideologia liberal. elas – em especial, o liberalismo –
ideológica das relações Para tanto, o autor divide-a se apropriam do conceito de
internacionais entre 1879 e 1989 em quatro partes: na primeira, desenvolvimento como parte
foi o liberalismo – capaz de debate os acontecimentos dos integrante de seu projeto político
engendrar as bases econômicas, anos 90 do século 20 e as entre 1945 e 1989, criando um
sociais, políticas e ideológicas do perspectivas para o sistema dos vínculos mais fortes entre o
mundo neste período – porque o mundial nos próximos anos. Toma centro desenvolvido – irradiador

1 WALLERSTEIN, Immanuel. Após o liberalismo: em busca da reconstrução do mundo. Petrópolis: Vozes, 2002, 271p. ISBN: 85 326 2834 6.
2 Mestre em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília – UnB – e professor do Instituto de Ensino Superior de Brasília – IESB.
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das ideologias – e a periferia do Estados Unidos (EUA) em moldar história e a vitória liberal, ou o
sistema – dependente do projeto este novo arranjo, bem como as choque de civilizações como
de desenvolvimento nacional. possibilidades que se impõem a principal motor da história.
Em sua terceira parte, avança eles mesmos como potência Ao contrário, ele demonstra a
a discussão no sentido de hegemônica decadente diante das complexidade da evolução do
apresentar o dilema histórico expectativas de mudança da sistema mundial, ancorado sim
imposto aos liberais. Por um lado, comunidade internacional. sobre o liberalismo, embora
a simbiose confusa entre duas O final da obra é dedicado à observe, no momento atual, uma
modernidades – a da tecnologia e comparação entre a morte do (des) ordem internacional, fruto
a da libertação –, enquanto aceita socialismo e o futuro do do esgotamento daquela ideologia
pelas sociedades, funcionou de liberalismo. Para o autor, que como paradigma de atuação das
forma adequada como amálgama analisa a revolução como grandes potências e da periferia do
para o projeto da estratégia e tática de mudança e o sistema. Como colocado por ele, o
internacionalização da economia marxismo no mundo pós- mundo sentirá falta do “(...)
capitalista até o ano de 1968, soviético, o fim do socialismo cimento ideológico fornecido pela
momento em que a revolução representaria o próprio colapso do antinomia wilsoniana-leninista”,
cultural desafiaria suas bases. liberalismo, que sofre p.129.
Daí em diante, o liberalismo continuamente com “angústias de Por fim, ao apontar as
passaria a enfrentar suas afirmação” em diferentes períodos tendências atuais e futuras do
contradições insuperáveis, da história, mas que vê o cenário sistema internacional, Wallerstein
semeadas desde 1789, em que a acentuar-se com o “período negro” não executa apenas um simples
geocultura do sistema mundial – a partir de 1989, momento em exercício de adivinhação, mas se
direitos humanos e os direitos dos que as incertezas e dúvidas quanto vale da formulação de cenários
povos – acabaria por fomentar ao valor do progresso são quase possíveis construídos a partir de
implicações revolucionárias, absolutas. bases teóricas – bifurcação e ciclos
contrárias ao sistema, ao invés de A crítica principal de de Kondratieff – e, sobretudo,
legitimar a economia capitalista Wallerstein ganha importância históricas – evolução da história
mundial. diante de tentativas menos das relações internacionais –
Assim, Wallerstein tenta sucedidas de outros estudiosos que como forma de questionar a base
identificar as alterações desta insistem na reificação de cultural e ideológica da sociedade
geocultura, como o peso dos conceitos e idéias, como o fim da internacional contemporânea.

–❇–
24

Modernidade Reflexiva: Uma Conversa entre


Anthony Giddens e Ulrich Beck*
Rafael Schleicher*

O capitalismo, simplesmente, nas palavras de Giddens “(...) uma tradição, da religião neste novo
é uma via irracional para dirigir o negociação baseada em princípios contexto social? Qual a função da
mundo moderno, porque ele (...) uma tentativa de descobrir as política?
substitui a satisfação controlada preocupações e interesses Do estudo de As conseqüências
das necessidades humanas pelos subjacentes um ao outro, da modernidade, entender-se-iam
caprichos do mercado1 identificando uma variedade de as transformações estruturais bem
Qual a relação existente entre possíveis opções, antes de como as relações entre estas e as
o projeto de emancipação restringir algumas delas”2. operadas individualmente. A
feminina/crise da masculinidade e Assim, a idéia de intimidade – transformação da intimidade
a ordem política global? A “(...) revelação de ações e emoções complementa o leque de
proposição pareceria absurda se os improváveis de serem expostas a transformações no mesmo âmbito
ambos processos não estivessem um público mais amplo”3 – parece individual. Por fim, Risk society:
contidos em um mesmo contexto ser um ótimo ponto de partida towards a new modernity, a priori,
social caracterizado pela tanto para os que buscam traz a interconexão de dois níveis
democratização. É extremamente entender o contexto social em analíticos (estrutural e agente) a
interessante notar como os que se inserem seus próprios partir da idéia de “modernidade
princípios que norteiam a problemas quanto para os reflexiva”, também trabalhada por
democracia política são estudantes que anseiam Giddens. Antes de prosseguir a
convergentes e aplicáveis aos vislumbrar interconexões entre as apresentação dos autores, é
relacionamentos interpessoais. transformações existentes em interessante deixar claro que a
Igualdade política, restrição/ diferentes níveis analíticos. análise se restringirá à idéia de
proscrição ao uso da força, criação Mas qual a relação que existe “reflexividade”.
de um “espaço comunicativo” entre as modificações na idéia de Giddens possui uma extensa
onde as partes possam expor intimidade e as transformações lista de livros publicados, entre
abertamente suas opiniões e sociais que levaram os sociólogos a eles o que institui novo marco
finalmente iguais oportunidades decretar um novo tipo de sociedade teórico: A Constituição da Sociedade,
econômicas para o alcance de pós-industrial, pós-escassez e leitura obrigatória para os alunos
objetivos e potencialidades pós-material? Como se organizam de relações internacionais dedicados
individuais permitem, sejam as os agentes e estruturas nesta nova ao (des)construtivismo4. Além
partes Estados ou indivíduos, um sociedade? Qual o lugar do disto, ele é um dos idealizadores
relacionamento mais “íntimo” ou conhecimento científico, da do projeto da Terceira Via,

* GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade. São Paulo: Universidade Estadual de São Paulo, 1991. 177p. ISBN: 85 7139 022 3; GIDDENS,
Anthony. A transformação da intimidade: sexualidade, amor e erotismo nas sociedades modernas. São Paulo: Universidade Estadual de São Paulo, 1993. 228p. ISBN:
85 7139 017 1; BECK, Ulrich. Risk society: towards a new modernity. London: Sage, 1992. 260p. ISBN: 0 8039 8346 8.
** Mestrando em Relações Internacionais da Universidade de Brasília – UnB.
1 GIDDENS (1991), op.cit., p.140.

2 GIDDENS (1993), op.cit., p.213.

3 Idem, p.153-4.

4 Cf: KATZENSTEIN, Peter, KEOHANE, Robert, KRASNER, Stephen. International Organization and the study of world politics. International Organization,

Cambridge, v.52, n.4, p.645-85, aut 1998.


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executado pelo Partido Trabalhista As três principais “sistemas peritos”10. No


de Tony Blair, atual Primeiro características da modernidade, concernente ao primeiro, define:
Ministro britânico5. Lecionou nas para Giddens, seriam: “(...) são meios de intercâmbio
mais prestigiadas universidades de distanciamento entre tempo e que podem ser circulados sem ter
seu país como Cambridge, por espaço; os processos de em vista as características
exemplo, até se tornar reitor da “desencaixe”; e “reflexividade” específicas dos indivíduos ou
London School of Economics (LSE), social. Em relação à primeira, ele grupos que lidam com ele em
cargo que ainda ocupa. Suas obras propõe que, nas sociedades qualquer conjuntura particular”11.
aqui relacionadas constituem tradicionais, o conceito de tempo As fichas simbólicas são um meio
parte de um debate teórico mais estava visceralmente ligado à idéia de aproximar tempo e espaço,
amplo sobre as conseqüências e de lugar. À medida que o homem como no caso do dinheiro que
transformações sociais na se “apropriou” dele – criação de aproxima tanto o débito do
modernidade tardia6. instrumentos de controle e crédito quanto os indivíduos que
Beck é Diretor do Instituto de padronização de sua medição – o operam uma transação comercial
Sociologia da Universidade de espaço foi virtualmente se específica.
Munique e trabalha com temas “descolando” do lugar. Já os sistemas peritos são
relativos à individualização, Houve uma “deslocalização”, definidos como “(...) sistemas de
modernização e globalização7. ou seja, uma expropriação da idéia excelência técnica ou
Desde 1980, é editor da revista de de lugar no contínuo de tempo em competência profissional que
sociologia Soziale Wel e comanda, que ocorrem as relações sociais. organizam grandes áreas dos
desde 1999, um grande programa Tal visão se torna mais clara com ambientes material e social em
de pesquisa sobre modernização a apresentação da segunda que vivemos hoje”12. Eles
reflexiva. Risk society... foi a característica: o “desencaixe”, que permitem o alongamento das
primeira obra por ele publicada. é o “(...) deslocamento das relações relações sociais no tempo-espaço,
Uma revisão mais recente da sociais de contextos locais de à medida que os indivíduos
teoria de sociedade do risco é interação e sua reestruturação depositam sua confiança nos
encontrada em World Risk Society, através de extensões indefinidas sistemas por eles construídos.
de 99. É importante notar que, de tempo-espaço”9. Se, por um lado, a confiança é
embora Giddens e Beck trabalhem Assim, o conceito é o a base para a existência de
com temáticas idênticas e tenham alongamento das relações sociais relações sociais desencaixadas
chegado a resultados pelo tempo-espaço. Como a segundo Giddens, por outro a
relativamente similares, a modernidade permite o desencaixe? “reflexividade social”,
cooperação entre eles é posterior à Quais são os mecanismos característica definidora da “alta
publicação das três obras ora operacionais? Giddens destaca modernidade” – Giddens – e
analisadas8. dois: as “fichas simbólicas” e os “modernidade reflexiva” – Beck –

5 Cf: GIDDENS. The third way: the renewal of social democracy. London: Polity Press, 2000, 166p; GIDDENS. Para além da esquerda e da direita. São Paulo:
Universidade Estadual de São Paulo, 1996, 296p.
6 No presente texto, alta-modernidade, que diz respeito às características da modernidade incorporadas às instituições e relações sociais, e modernidade tardia

serão utilizadas como sinônimas.


7 CF: BECK. O que é globalização? Equívocos do globalismo. Respostas à globalização. São Paulo: Paz e Terra, 1999, 282p.

8 O resultado da cooperação encontra-se em: BECK, Ulrich, GIDDENS, Anthony, LASH, Scott. Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem

social moderna. São Paulo: Universidade Estadual de São Paulo, 1997, 264p.
9 BECK, GIDDENS, LASH, op. cit., p.29.

10 De fato, a tradução não é das mais primorosas como se vê no caso de “conhecimento perito” – expert knowledge. Apesar disto, manter-se-á a tradução do

livro, com vistas a evitar possíveis confusões ou dificuldades no entendimento.


11 BECK, GIDDENS, LASH, op. cit., p.30.

12 Idem, p.35.
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compromete o grau de confiança caracterizada pela reflexividade Por último, a reflexividade


depositado nos sistemas peritos dos agentes sociais e pela contribui para as inseguranças e
que permitem as relações sociais administração dos riscos perigos que norteiam a sociedade
desencaixadas, pois “(...) a indesejados deste processo de do risco devido à força da
reflexividade da vida social modernização, ainda que muitos modernidade e globalização da
14
moderna consiste no fato de que deles não possam ser previstos, dúvida, ou seja, “(...) in the risk
as práticas sociais são uma vez que o próprio valor e society the unknown and
constantemente examinadas e utilidade do conhecimento unitended consequences come to
reformadas à luz de informação científico são progressivamente be a dominant force in history
15
renovada sobre estas próprias questionados . and society” 17.
práticas, alterando assim Desta forma, a idéia de Se o mundo moderno não é
constitutivamente seu caráter”13. reflexividade é a chave para controlado pela razão, como
É exatamente este caráter compreensão das três obras dirigir o projeto da modernidade?
interativo, ou reflexivo, entre analisadas. No concernente às Giddens propõe algo semelhante a
agente e estrutura que define e transformações da esfera pessoal, um “realismo utópico”, que
distingue a alta modernidade ou há incorporação da sexualidade ao deveria ser o estado de espírito
modernidade reflexiva da “eu”, ou melhor, a sexualidade propulsor das ações humanas. Ele
sociedade industrial. Assim, a passa a fazer parte de um projeto significaria o equilíbrio entre o
produção de bem-estar, por reflexivo do próprio “eu”, ao “dever ser” e o real, com vistas a
intermédio da produção de desvincular-se da tradição e alcançar objetivos.
riqueza, é substituída pela constrangimentos sociais pré- Assim, as dimensões do
produção e administração de estabelecidos para tornar-se uma realismo utópico gravitariam entre
riscos oriundos da atividade escolha de cada indivíduo. o local e o global e entre
humana e do crescente processo Em segundo lugar, a satisfação e autonomia, de modo
de reflexividade em virtude das reflexividade proporciona uma que se deveria ser sensível a
conseqüências indesejadas da releitura da função social do transformações sociais e ter o
modernidade, como poluição, conhecimento científico, pois escopo institucional ampliado
perda de biodiversidade, mudança como lembra Rocha “(...) a ciência para além do Estado-nação, bem
radical dos espaços geográficos, já não precisaria revelar-se como também orientar-se para a
entre outras. fundamentalmente correta, uma política da vida – redução de
Portanto, tanto para Beck espécie de linguagem de Deus, desigualdades materiais e
quanto para Giddens, a capaz de decodificar as estruturas participativas entre os indivíduos.
16
modernidade em que se vive é que regem o universo” .

13 Ibidem, p.45.
14 É importante frisar que há uma diferença substancial entre risco, risco criado e perigo. Risco seria definido como o rol de possíveis cursos de ação futuros
dados a partir de um esforço reflexivo individual, diferentemente de perigo, que pressupõe ameaça às possibilidades futuras de ação. Entretanto ocorre que,
na modernidade, grande parte dos riscos é construída ou produzida, ou seja, a maioria dos riscos a que a humanidade está hoje exposta é por ela própria criada
e é resultado da modificação do meio ou como Beck expõe: “Risk may be defined as a systematic way of dealing with hazards and insecurities induced and
introduced by modernization itself”, p.21.
15 Esta revisão crítica do papel do conhecimento científico é operada essencialmente no campo da filosofia da ciência. Entre os diversos autores que tratam

do tema, podem-se citar Nietzche – O nascimento da tragédia e Assim falou Zaratustra – e Foucault – A microfísica do poder.
16 ROCHA, Antônio Jorge R. da. Relações internacionais: teorias e agendas. Brasília: Instituto Brasileiro de Relações Internacionais, 2002, p.48.

17 BECK, op. cit., p.22.

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